Saudade das borracharias raiz, em que você entrava numa espécie de “clube do bolinha” onde as paredes eram forradas de imagens de mulheres seminuas, voluptuosas, curvilíneas e apetitosas, retiradas de revistas de “moda lingerie”. Nada era abusivo ou explícito – as imagens hoje passariam na Sessão da Tarde na Globo – mas o que valia ali a exaltação da beleza feminina, cuja admiração reforçava aos olhos alheios nossa adesão ao universo masculino.
Creio que, ao pregar uma “pin up girl” nas paredes engraxadas da borracharia, o sujeito sentia um notável alívio. “Enquanto você estiver aqui, minha Santa, ninguém poderá duvidar de mim”. Penso até que estas imagens funcionam como um salvo conduto, um passaporte para a boa imagem social, o mesmo que os mais admiráveis torturadores usavam nos “anos de chumbo”, indo à Igreja com a família aos domingos para depois passar a semana arrancando unhas de esquerdistas.
Por outro lado sinto falta do tempo em que a admiração pela beleza feminina era aceita sem culpa, quando o desejo por elas não era motivo de vergonha ou visto como forma de diminuí-las. Entendo que muito dessa beleza era usada para calar qualquer outra virtude, mas criminalizar o olhar de desejo não me pareceu jamais uma boa solução. A admiração e atração pelos corpos femininos é, ao meu ver, a própria exaltação da vida e do mistério profundo através do qual ela se multiplica
