Arquivo do mês: setembro 2020

Evidências

Não se trata de uma questão de evidências científicas, observação e mensuração de resultados e análises racionais sobre o parto. A mudança não se dá lá em cima, na cabeça, mas uns 30 cm mais para baixo.

Tenham em mente que evidências e ciência não abrem a cabeça das pessoas!!! Esse mito caiu de forma retumbante nos últimos tempos, onde o terraplanismo e o bolsonarismo são exemplos suficientes. O que muda nossa percepção do mundo são os sentidos, as emoções, os sentimentos. Por isso é que hoje se dá tanta importância à sensibilizar, pois só depois de estar aberto às informações é que a ciência e as evidências farão sentido para o sujeito. A evidência funciona para quem desenvolve por ela a necessária transferência.

Não importam quantas provas da eficiência de partos domiciliares, Casa de Parto ou da assistência ao parto por enfermeiras e obstetrizes forem oferecidas aos profissionais médicos; sem que estejam sensibilizados para absorver estas informações elas jamais encontrarão terreno fértil. As provas e os estudos são ferramentas insuficientes para mudar atitudes.

Funciona como uma intervenção em análise; o analista até pode falar, mas só quando o analisando está pronto para dizer por si mesmo a sua verdade. Da mesma forma, a verdade científica só fará sentido quando já estivermos preparados para recebê-la. .

É como convencer alguém de algo que seu coração não aceita. Quantas mulheres e homens já nos contaram histórias assim: “Muita gente me falava que ele(a) não tinha caráter, mas eu não conseguia enxergar. Estava cego(a).” Como explicar o fato de que tantas provas foram inúteis? Ora… a razão obliterada pelas emoções produz este fechamento dos sentidos.

A tecnocracia impede os profissionais do parto de enxergar as múltiplas dimensões deste evento. Para além disso, os profissionais têm um medo profundo de perder o respeito e a consideração de seus pares. Aqueles que se permitiram enxergar o parto humano em todas as suas perspectivas descobrem também o preço imenso que este saber lhes custa. Por isso mesmo, muitos fogem das evidências exatamente para escapar da angústia que tal conhecimento inevitavelmente lhes causará.

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Biden x Trump

Disso não tenho dúvida: Trump é um boquirroto, megalomaníaco, arrogante e psicopata mas, ainda assim, o mundo estaria MUITO pior se Hilary estivesse à frente da maior potência mundial. Ela sempre demonstrou – enquanto chanceler americana – que tinha interesses muito mais abrangentes no Oriente Médio e Afeganistão, não importando quantas vidas seriam sacrificadas.

Os democratas no poder – veja-se o queridinho Obama, um verdadeiro criminoso de guerra – são muito mais violentos e imperialistas. Obama bombardeou covardemente SETE países durante sua presidência, sendo o responsável por milhões de mortes, flagelos, assassinatos de mulheres e crianças e pelo retorno da escravidão à Líbia. Biden, que dá sinais inequívocos de senilidade, será um fácil joguete nas mãos da indústria armamentista e o candidato que mais pode aproximar o mundo de uma hecatombe nuclear.

Paradoxalmente, o Brasil pode se beneficiar da vitória de Biden apenas porque cortará os laços do Brasil com a dinastia Trump. Figuras como Eduardo Bananinha ficarão sem o amparo dos patrões americanos. Porém, a Venezuela ficará ainda mais em risco, porque é óbvio o antagonismo desses imperialistas contra países que assumem posições soberanas e autônomas em desafio ao poder central do Império. Cuba, igualmente, deverá receber um reforço das sanções que impedem seu pleno desenvolvimento.

Por questões meramente locais – o desamparo de um genocida e psicopata na presidência do Brasil – eu prefiro que as previsões se cumpram e que Trump seja derrotado. Espero que essa derrota da extrema direita fascista produza uma nova onda de democracia e respeito às leis. Mas, a vitória de Biden deverá deixar o mundo inteiro em alerta. Sabemos muito bem o que a perversão do capitalismo é capaz de produzir de destruição, opressão e morte.

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Cesaristas

Sejamos justos: criar a imagem do cesarista oportunista e antiético é um erro. Não é isso que move estes profissionais, mas elementos inconscientes e mesmo inconfessos.

É claro que existem profissionais que são comandados pela ambição e falta de escrúpulos, mas não são a maioria. A maior parte dos cesarianas tem fé no seu trabalho. Acreditam mesmo na superioridade da tecnologia sobre a natureza. Acreditam piamente na defectividade do corpo feminino e na sua excelsa tarefa de salvar as mulheres da crueldade de uma natureza injusta. Medicina funciona como uma religião e para exercê-la é necessário acreditar em seus postulados. Como qualquer religião tem os seus oportunistas, enganadores e perversos, mas eles são minoria. A grande parte se associa a ela pela fé.

O que comanda as ações destes profissionais é o MEDO e o despreparo para atender partos em toda a sua complexidade bio-psico-social. Médicos absorvem parto com a mesma lógica que assimilam todos os outros dilemas médicos: a escolha do procedimento mais simples, mais fácil e com menores riscos PARA SI MESMOS. A cesariana é a solução rápida, mágica e tecnológica para as angústias do nascimento.

Repito o que já disse anteriormente: o maior erro da medicina no século XX foi a expropriação do parto normal das parteiras. Milênios de experiência acumulada jogados ao lixo em nome de uma experiência cientificista e intervencionista sobre um evento fisiológico. O desaparecimento do parto normal nas sociedades ocidentais, em especial no Brasil – onde menos de 5% das mulheres têm acesso a um parto sem intervenções – nos cria, pela primeira vez na história, um estranhamento com a própria essência natural deste evento. Este, subjugado à visão artificial criada há pouco mais de um século, só pode ser conhecido através do mapa desenhado pela obstetrícia. Tão distante está da realidade e da essência do parto que este mapa em nada mais se assemelha ao caminho percorrido por tantos milênios.

O PARTO em sua plena capacidade transformativa, só pode ser visto e sentido na marginalidade, nos partos domiciliares, na assistência das parteiras e no suporte das doulas. O resto da população precisa se subjugar a um modelo centrado no médico e nas instituições, objetualizando a mulher e deixando esse evento cada vez mais longe de sua essência feminina e sexual.

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Sobre encontros sexuais

Um assunto onde é importante lucidez por ser um terreno onde sobram ofensas e dedos apontados.

Minha tese é simples e pode ser resumida em um adágio: “vitimizar-se é o contrário de ser protagonista”. Colocar-se eternamente na posiçao de vítima do sexo ruim que recebem dos parceiros mantém a sexualidade (e os homens) como protagonistas do sexo e da sexualidade, controladores da narrativa que produz os encontros. Agir assim é tratar a sexualidade como se fosse um produto que os homens entregam às mulheres – bom ou ruim – e a elas caberia apenas avaliar, reclamar e criticar – ou aprovar.

Eu discordo dessa visão. Sexo é uma busca que ambos empreendem. É um “embate” de fantasias, desejos, limites e buscas onde os dois se responsabilizam. Um bom sexo é uma procura compartilhada.

Outra coisa: onde houver respeito à integridade fisica e aos desejos do outro não há fantasia errada, justa, moralmente correta ou “suja”. Deixemos as lutas de gênero longe das fantasias. O ex diretor do FBI John Edgar Hoover foi um dos mais cruéis perseguidores de comunistas da America, mas era gay, gostava de se vestir de mulher e ser submisso em suas fantasias, o que não o deixou menos violento e abusivo.

Esse cara “ruim de cama” ou “pinto pequeno” desprezado por uma mulher pode ser o principe encantado de outra; o mesmo com a mulher tachada de “fria”. Não há sexo ruim: há encontros errados, onde os parceiros estão na mesma festa do desejo, mas um quer a alegria e o molejo de um “samba” e o outro deseja dançar a sutileza de uma “valsa”. Não estão errados; estão desencontrados.

Portanto, é tanto a tarefa das mulheres virar esse jogo e exigirem ser escutadas, quanto é tarefa dos homens estabelecer para si um sexo que seja pleno e satisfatório.

Culpar o outro (ou os outros, os homens e as mulheres) é sempre muito mais fácil do que olhar para dentro de si para descobrir suas falhas e vazios.

Eu prefiro não culpar pessoas, por isso descobri o Feng Shui e agora só culpo os móveis. 😂 😂

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Gurus

Qualquer grupo religioso onde se destaca a figura de um “guru”, um mestre cujas palavras assumem aspectos de “revelação” ou “verdade” corre o risco de se decepcionar com a práticas de abusos – morais e sexuais. Acontece com os padres (escândalos imensos), os evangélicos (todos os dias), os mestres espiritualistas (como João de Deus), os orientalistas (como Prem baba) e certamente ocorreria entre os praticantes da Ayahuasca.

O que se faz necessário nestas circunstâncias é orientar as pessoas desde muito cedo a não acreditarem em pessoas que tem “A Mensagem”, entregue diretamente a eles por “Deus”, ou pelos “espíritos de Luz”. TODAS são seres humanos, alguns deles perversos e abusadores cruéis, mas é impossível que seus egos não se deixem inflar pela veneração que seu carisma recebe como resposta. Eu procuro orientar a todos para que SEMPRE desconfiem de qualquer misticismo e qualquer encenação de “pureza e espiritualidade”.

Mesmo vestindo o mais alvo dos mantos por baixo dele existe apenas um ser humano deslumbrado com sua influência sobre mentes frágeis e carentes.

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Revelação

Algumas questões contemporâneas:

Quando o pessoal faz “chá de revelação” a mãe também não sabe o sexo do bebê ou ela já sabe e só finge surpresa? Caso seja surpresa também para ela, como faz isso? Combina com o ecografista para avisar apenas ao confeiteiro?

Minha curiosidade vem do fato de que meus filhos nasceram exatamente na época da introdução das ecografias na prática obstétrica. Não foram realizados estes exames durante as gestações de Zeza, mas também não havia nenhuma curiosidade sobre o sexo dos bebês que justificasse a invasão da intimidade do ventre materno. O sexo era uma descoberta emocionante, mas o que havia era o “parto revelação”. O parto revelava tudo: peso, cara, cabelos e o sexo de nascimento.

Entretanto, esse “modismo”de descobertas precoces seguidas de um espetáculo de revelação enseja uma série de perguntas: por que exatamente no momento histórico onde o sexo biológico é tão desprezado como “determinante de gênero” essa comemoração é mais intensa, espetacularizada e pervasiva? Afinal, aqueles pequenos detalhes têm ou não importância? Qual o significado último dessas cerimônias de “revelação”? O que essa aparente contradição tem a nos “revelar”?

Para além dessas preocupações sobre os sentidos da revelação, muitas vezes estas festas se transformam em espetáculos de grosseria explícita. Há inúmeros exemplos de como a revelação extemporânea do sexo de uma criança pode ser tratada de forma abusiva, fazendo do momento um Fla-Flu grotesco e sem graça. Pior: a criança enquanto sujeito não vale nada, resumida ao valor das apostas sobre qual sexo pertence. Um objeto de brincadeira entre os adultos.

Fica claro que no mundo atual os eventos precisam ser espetacularizados, e parece que ser reservado significa abdicar do protagonismo. Hoje mesmo vi alguém reivindicando o direito das mulheres em fazer “topless”. Eu acho que esse direito deve ser garantido, mas deixar de cobrir o corpo tem muitos outros significados para além de evitar o calor e proteger-se do fio. O principal deles é a perda insidiosa da intimidade. O corpo deixa de ser algo privado e se torna público.

Assim, tudo o que é seu é exposto, passa a ser de todos, e a noção de pudor ou intimidade se desfaz como um anacronismo sem sentido. Tudo, inclusive sua sexualidade mais pessoal, precisa ser exposto, aberto e iluminado pelos holofotes das redes sociais. O que vejo acontecer, como era de esperar, é um questionamento cada vez mais intenso sobre esse modelo de auto exaltação. Eu, pessoalmente, acho muito bom que haja esta revisão.

Minha inquietude se mantém, e minha pergunta é honesta: Por que logo agora a descoberta do sexo passa a ser valorizada e espetacularizada, exatamente quando aquilo que por milênios definiu nosso sexo está caindo por terra, em nome de uma identidade de gênero muito mais fluida – mais da palavra e menos do corpo?

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Dentista

Hoje meu neto foi ao dentista e esse fato mobilizou traumaticamente a todos. Mas, essa sua aventura me fez lembrar minhas próprias experiências prévias com dentistas e dor.

Fui à dentista quando tinha uns 7 anos de idade, e acho que sei até o edifício onde ficava o seu consultório, no bairro Menino Deus que Caetano cantou. Lembro também que era uma dentista bonitona e quarentona com um nome muito curioso e diferente. Algum tempo depois fiquei sabendo que era separada, ou “desquitada”, algo muito incomum na minha época onde os casamentos eram eternos e a separação era um estigma social, em especial para as mulheres.

Certa feita, enquanto me atendia, convidou uma amiga que estava na sala de espera para lhe dar algumas informações. Entretanto, a simples troca de informações se transformou em um bate papo entre duas mulheres maduras. Enquanto ela fazia curativos nos meus dentes iniciaram uma conversa sobre assuntos absolutamente banais, até o momento em que resolveu dizer à amiga algo do tipo:

“Sim, mas é exatamente isso que nós mulheres sempre procuramos nos homens”.

Ato contínuo, olhou para mim um pouco constrangida e completou: “… mas acho que essa não é uma conversa que um menino de 7 anos deveria estar ouvindo. Esqueça isso tudo”.

Sua conversa e o comentário que se seguiu demonstraram duas coisas para mim: a primeira é a negação renitente, contra todas as evidências, de que as crianças estão atentas a tudo o que os adultos dizem. Para ela, um menino de 7 anos objetualizado em uma mesa cirúrgica era não mais que um ser inerte e passivo, e não alguém que captava avidamente todas as sensações, odores, palavras e sentidos do ambiente. A pergunta “o que ela estava querendo dizer sobre os homens?” me acompanha até hoje. A segunda lição que brotou desse encontro foi que exatamente por ter pedido que “esquecesse a conversa” estou aqui contando uma história erótica que me ocorreu há mais de meio século.

Aqui vai um ensinamento interessante: se quiser que alguém mantenha vivo na memória um evento perturbador peça que o tire da sua mente. Depois dessa proibição não haverá como apagar.

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Paulo Freire 99

Essa frase de Paulo Freire sempre me perseguiu, e durante muitos anos. Infelizmente, não somos dados a conhecer saberes alheios, visões diferentes e encarar paradigmas desafiadores. Muito é perdido quando nosso conhecimento impõe viseiras que nos impedem de olhar para fora da nossa caixa de conhecimentos.

Para mim, um dos mais vibrantes ensinamentos foi o contato com as parteiras tradicionais mexicanas, convidado por Robbie a conhecê-las em suas viagens por Temixco, Tepostlán, Cuernavacca, San Miguel de Allende, Oaxaca, San Cristóbal de las Casas e o “DF”, a Cidade do México. Com elas pude ver que era possível enxergar o parto de uma forma “diferente”, nem pior e nem melhor, mas diversa daquela que eu havia aprendido na escola médica.

Curiosamente, mas não de forma surpreendente, muitas destas parteiras olhavam para mim como “el doctor“, aquele que trazia o “conhecimento autoritativo“, que seria superior ao saber acumulado em décadas por elas, com suas “sobadas“, o uso de ervas, do rebozo mexicano e, em especial, a abordagem emocional do parto e as divisões sutis e quase diáfanas entre os ambientes privados e públicos no seu trabalho.

Jã na minha perspectiva elas eram professoras e eu apenas um médico inseguro cuja única virtude era saber que havia outras formas de traduzir o nascimento para além do que eu havia aprendido.

Paulo Freire nasceu há quase 100 anos e, seja pelos seus ensinamentos diretos seja pelas mensagens e ideias que ficaram, ele é um grande marco na educação e na pedagogia para o mundo todo. Eu espero que a ideia democrática de respeito aos saberes, de forma livre de hierarquias, siga como um farol a iluminar sua obra.

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Desejo feminino

“O desejo feminino e sua ameaça à estrutura patriarcal pode ser analisado lendo-se o livreto “Traumnovelle”, de Arthur Schnitzler, que deu origem ao filme “Eyes Wide Shut” do diretor Stanley Kubrick com Tom Cruise e Nicole Kidman.

Para mim a cena mais impactante do filme é a descrição da fantasia que Nicole confessa que teve com o militar, seguidas da cara boquiaberta de Tom ao escutar o relato riquíssimo em detalhes e nuances oferecidos por sua mulher. É exatamente nesse momento, ao defrontar-se com a descrição detalhada das fantasias dela, que ele entra em pânico e vê desmoronar diante de si a ilusória supremacia fálica que tanto acalenta.

O resto do filme inteiro é a busca por esta imagem perdida de si mesmo.

Por outro lado, todo o filme pode ser interpretado reconhecendo o parto como parte da vida sexual de uma mulher, e entendendo que sua exuberância funciona também como uma ameaça ao sistema falocêntrico contemporâneo, tanto quanto a fantasia sexual da esposa colocou a mente do marido em espiral. Por isso a voz do parto é calada e suprimida, assim como toda a eroticidade que ele é capaz de expressar.”

Veja aqui o fragmento que tanto me impactou….

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Panegírico

Há alguns dias escrevi um texto sobre o “Mister Bento” e suas diatribes pelo zap-zap. No episódio ele xavecava uma menina de sua região dizendo-se “o homem mais lindo da cidade e um dos mais belos do RS” e em suas palavras, sucintamente escritas, transbordava indignação e estupefação diante da declaração da menina de que ele “não fazia seu tipo”.

“Como assim, se até lésbicas e homens se encantam por mim?”, disse ele em outras palavras. Ainda tentou mais alguns argumentos para demover a moça de sua recusa, mas sem resultado.

No texto anterior eu questionava se a pena imposta – por todos nós – a ele não era exagerada e perguntava se a sua atitude auto elogiosa, porém não violenta e não agressiva, merecia tanta reprovação a ponto de fazê-lo alvo de nossos ataques. Muitas pessoas acharam que “macho escroto(??) que age assim tem mais é que ser exposto”. Para muitas a pena foi até branda, pois suas ações não merecem perdão. Penso que para estas o fato de ser homem torna qualquer pena irrisória.

Mantenho a pergunta. O que fez ele de tão agressivo? Qual seu vitupério mais imperdoável? Por que foi tão impiedosamente atacado?

Ouso responder: o que há de insuportável e que nos choca de forma direta é o encômio, o elogio a si mesmo, a auto adulação, a louvação de si próprio. Estas são ações socialmente reprováveis e repulsivas. Vou adiante: mas por que elogiar-se publicamente é feio? Qual a razão para soar tão mal aos nossos ouvidos uma apologia às nossas virtudes pessoais? E veja que curioso paradoxo: aceitamos graciosamente a mentira da falsa modéstia e repudiamos com vigor a verdade do autoelogio. Então, qual o pecado de nos amarmos tanto em público?

Meu amigo Julio Cesar compôs uma música na nossa juventude cujo refrão era “Eu sou bonito, eu sou bacana, eu sou bonito, eu sou bacana”. Fazíamos troça com algo proibido. Brincávamos com o absurdo de criarmos para nós uma imagem de beleza.

O crime de exaltar-se explicitamente é ainda mais agravado quando é um homem a falar de sua própria beleza física, algo que também não é aceito na sociedade patriarcal. Esculachar-se (como eu faço com minha falta de cabelos) é até elogiável, mas descrever-se como lindo merece a pena da humilhação pública.

Minha humilde resposta para essa pergunta é que o auto elogio é uma usurpação. Em verdade, ao ouvirmos uma exaltação laudatória de si mesmo, pensamos: você não pode dizer isso…. porque não sabe do que fala!! Só nós temos esse direito. Você é o que dizemos de você, construído pelos nossos olhos e nossos valores estéticos. O encômio não cabe a você; espere que um outro lhe promova e reconheça suas virtudes, jamais você mesmo. Você está falando de um lugar que não é seu!! Saia já daí!!!

Talvez isso ajude a esclarecer a razão de tanto mal estar causado pelo panegírico que o Mister Bento fez de si mesmo. Ele roubava um lugar que não era seu. Ou há outra explicação para tanto desconforto com suas palavras?

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