Arquivo do mês: abril 2017

Produtividade

Uma das coisas que mais me dá prazer ao visitar o Texas é escutar rádio. Sim, a maravilhosa KUT (kut.org 90.5). É a rádio da Universidade do Texas, para mim a melhor rádio do mundo. Todos os dias são transmitidos programas excelentes e variados, culturais e com profundidade em suas abordagens. Faz um tempo escutei um programa sobre “puns”, a antiga e maravilhosa arte dos “trocadalhos”. Maravilhoso programa. Uma hora depois deste um debate que me chamou a atenção: o que é produtividade e como chegar lá.

Uma das coisas que aprendi escutando o especialista convidado foi o real significado da palavra “motivação”. Dizia ele que uma das regras básicas para motivar uma pessoa é colocá-la na posição de SUJEITO de seu sucesso ou processo transformativo. Por isso, ele nos explicava que é absolutamente contraproducente elogiar uma pessoa por ser bonita, simpática ou inteligente, em razão de que essas qualidades são inatas e não há esforço algum em alcançá-las. O contrário é quando você exalta e elogia o esforço de uma pessoa que não tem qualidades evidentes para uma tarefa. Um exemplo é a menina gordinha que dança balé, ou quando escutamos na escola a manifestação de uma criança declaradamente tímida e que, através do seu esforço em vencer suas próprias barreiras, consegue se apresentar em público. Essas pessoas precisam e merecem ser elogiadas publicamente, pois estão sendo premiadas por algo que ativamente FIZERAM e não por algo que passivamente SÃO.

Outro aprendizado foi com reuniões. Muitas pessoas reclamam que as reuniões sempre tem uma parte inicial em que as pessoas contam seus problemas com marido, mulher, filhos, trânsito etc. Muitos dizem que há uma grande perda de tempo com esse interregno que poderia ser mais bem utilizado indo direto para as razões pelas quais marcamos uma reunião. Todavia, as pesquisas dizem exatamente o contrário: com o tempo, e pela possibilidade de conhecer melhor aqueles com quem convivemos, as reuniões tornam-se mais produtivas e com melhores resultados exatamente porque incentivamos encontros entre PESSOAS, ao invés de focar tão somente nos participantes de uma reunião técnica de negócios. Portanto, pense bem antes de reclamar do amigo que conta piadinhas antes da reunião começar. Por certo que há limites nos devaneios, mas o princípio de permitir a exposição de elementos subjetivos e emocionais deve ser preservado.

Outro ensinamento sobre reuniões produtivas. Qual o melhor time? Onde todos são amigos? Desconhecidos? Extrovertidos? Extrovertidos misturados com introvertidos? Forte líder ou decisões horizontais?

O resultado foi interessante: as reuniões dependem muito menos de como se faz a liderança e quem são os componentes do que como interagem os elementos. Isto é: a regra fundamental é que exista “proteção emocional” dos participantes. Assim, as reuniões tendem a apresentar produtividade e resolutividade maior quando as pessoas presentes tem a oportunidade de se manifestar livremente, sem julgamentos ou violências simbólicas. O chefe é menos importante pelo que faz e mais pelo quanto protege seu time.

Outro elemento é a questão do controle. Um exemplo interessante é quando estamos trancados em um engarrafamento e resolvemos tomar uma via alternativa que é muito mais longa, e na melhor das hipóteses levará o mesmo tempo da via engarrafada. Entretanto, exatamente porque estamos fazendo algo ativamente – ao invés de esperar passivamente no engarrafamento – é que temos a “sensação de controle” que diminui nossa angústia diante de fatos sobre os quais não podemos interferir.

Como bem sabemos, o mesmo acontece na atenção ao parto, quando fazemos qualquer coisa (os protocolos, as rotinas e por fim as intervenções) porque a sensação de controle nos produz alívio e uma sensação de segurança, mesmo que ilusória e falsa.

Sempre que em uma reunião podemos ter controle sobre os eventos através de nossas decisões teremos uma sensação mais clara de realização, e esse sentimento humano precisa ser reconhecido quando fazemos grupos e montamos equipes de trabalho.

Por fim, é importante termos sempre em mente a questão dos objetivos. Eles são divididos em dois grupos principais: os grandes objetivos e os objetivos parciais. Os grandes são aqueles relacionados com a “missão” a que o grupo se propõe, como montar um hospital, derrubar um governo, criar um partido político ou simplesmente organizar uma comunidade autossustentável e ecológica voltada para o nascimento humano. Por outro lado, ninguém acorda pela manhã com essa imagem em sua cabeça: é necessário que os objetivos parciais nos façam ter o estímulo para o trabalho e a construção de algo grandioso. Por isso, ter como objetivo arrumar a cerca, pintar as paredes ou estudar para uma prova são igualmente importantes, pois são as etapas sem as quais as grandes tarefas jamais são concluídas.

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Proletários

O Sindicato dos Médicos do Ceará em uma nota oficial (vide abaixo) avisa que não participará da GREVE GERAL marcada para o dia 28 de abril como forma de combater o desmanche da CLT e as reformas da Previdência danosas aos trabalhadores.

Primeiramente, vamos deixar claro que a nota é natural e não deveria causar nenhuma surpresa. O contrário sim seria digno de espanto: médicos descerem do seu pedestal de barro admitindo que são trabalhadores como quaisquer outros. Infelizmente os médicos do Brasil ainda “comem galinha e arrotam peru“. O tempo do médico filho de latifundiário, que vivia de clínica privada e doava uma tarde por semana aos miseráveis da Santa Casa já acabou há 30-40 anos. É preciso acordar desse sonho de grandeza aristocrática que ficou no passado.

Médico é proletário, estuda pra concurso, é funcionário público e ganha salário achatado. Continuar com essa arrogância tola e falsa é uma estupidez suicida. Manter-se fora da classe trabalhadora, desprezando-a de forma pedante é uma atitude estúpida e retrógrada. Melhor seria assumir sua posição como trabalhador e aderir a um movimento cuja proposta é garantir direitos conquistados que atingem a todos, inclusive os próprios médicos.

Mas essa humildade talvez seja inalcançável para uma categoria que esteve aliada ao golpe desde o primeiro instante. Triste reconhecer que a classe médica no Brasil é a vanguarda do atraso e da exclusão social.

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Evidências

Revisando os antigos manuscritos de Robbie para a preparação de sua “Antologia”, que deverá ser publicada em breve, me deparo com uma frase que pode explicar de maneira muito clara as dificuldades de entender a falta de racionalidade e embasamento de muitas das intervenções médicas obstétricas contemporâneas, em especial a episiotomia. Foi isso que a Dra. Melania Amorim trouxe à discussão através do seu originalíssimo ECR.

“E ainda assim, os significados culturais e simbólicos desses procedimentos são profundos, indicando cada vez mais que os protocolos hospitalares para a atenção ao parto não fazem sentido numa perspectiva científica, mas permanecem por estarem repletos de sentido cultural”.

Assim sendo, uma episiotomia, um Kristeller ou uma cesariana não precisam ter embasamento científico para serem dominantes na cultura obstétrica contemporânea. Para que sejam preponderantes basta que possuam “sentido cultural“, isto é, que estejam adaptados a uma visão cultural subjacente e silenciosa (uma ideologia) que desmerece a mulher e suas capacidades reprodutivas, e que coloca a tecnologia e o saber racional como válidos e autoritativos, desta forma desvalorizando a fisiologia feminina, em especial no momento do parto e nascimento.  

Quando ouço críticas a alguns procedimentos relacionados com o termo “humanização” – como parto extra-hospitalar, posições alternativas à litotomia, doulas, períneo íntegro, acompanhantes, livre deambulação, etc – e vejo colegas exigindo as “comprovações científicas” de tais condutas (que existem em abundância) eu acho engraçado e curioso o desejo insano de que tais procedimentos tenham a devida e justa comprovação quando praticamente nada do que é feito rotineiramente num atendimento ao parto tem qualquer embasamento científico – apesar de se conformar às normas culturais que colocam a intervenção como “salvadora” e a fisiologia feminina como “perigosa”.  

Pensem bem, onde estão as evidências que sustentam os seguintes procedimentos que ocorrem em praticamente todos os hospitais brasileiros de forma rotineira:  

– Trocar a roupa ao chegar
– Tomar banho
– Soro de rotina
– Ocitocina para apressar o parto
– Raspagem de pelos
– Enema glicerinado
– Restrição ao leito
– NPO (jejum forçado)
– Afastar a família e/ou acompanhante
– Monitorização eletrônica de rotina
– Parto em posição de Litotomia (deitada de costas)
– Episiotomia de rotina – Kristeller
– Afastamento do RN para rotinas
– Perda da “hora dourada” da amamentação
– Cesarianas (88% no setor privado e convênios)
– Cesarianas (43% no SUS e 55% no geral)

Não estão em nenhum lugar, não é? Se elas não existem, por que continuam sendo feitas inclusive em hospitais universitários, que deveriam zelar pela atualização e adequação de seus protocolos?

Ora, porque a Medicina é um sistema hierárquico e totêmico. Ela não se expressa primordialmente como ciência, mas como poder. Só isso explica que os procedimentos não se adaptem à ciência, mas a uma determinada cultura que coloca os profissionais médicos acima de seus pacientes e acima da própria ciência. As realidades científicas serão sempre bem vindas quando se adaptarem à norma cultural (cesariana, episiotomia, parto hospitalar, etc..) e serão sempre rechaçadas com extrema violência quando afrontarem os valores culturais dominantes (parto domiciliar, atenção por enfermeiras, casas de Parto, presença de acompanhantes/doulas, etc…).

A Medicina é a fiel guardiã disseminadora dos valores profundos do patriarcado.

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A Vingança dos Oprimidos

Recebi com surpresa uma petição via internet contra uma das mais importantes batalhadoras pela humanização do nascimento no mundo, na qual as proponentes a acusam de racismo. As palavras são ásperas, violentas e cruéis, e me oportunizaram uma reflexão sobre a existência de manifestações como estas, em especial no mundo virtual. Foi apenas depois de conversar com alguns amigos e entender o momento político americano contemporâneo fez muita diferença na minha visão do problema.

Existe uma grande insatisfação com o fato de o movimento de humanização do nascimento nos Estados Unidos ser sido criado e liderado por mulheres brancas e de classe média. Para a minha percepção, nada mais natural que isso fosse assim levando-se em consideração as características óbvias desta classe: mais dinheiro, mais tempo para se dedicar a tarefas não pagas, mais acesso a cultura, mais facilidades no mundo universitário e tantos outros privilégios de classe e raça que tão bem conhecemos. Acrescente-se o fato de que a comunidade negra americana não é mais do que 10% da população neste país. Entretanto, o que poderia ser visto como uma ajuda por parte das pessoas privilegiadas para DIMINUIR estes privilégios e tentar aproximar estas categorias sociais é visto por um grupo de ativistas-feministas-negras como uma invasão e uma tentativa de espoliar o protagonismo, seja das desfavorecidas seja das não-brancas. Esse assunto vai e volta e temos sempre que lidar com essa classe de ressentimentos.

Quando eu li as declarações desta ativista e as comparei com os ataques que recebeu em resposta fiquei estarrecido com o desnível absurdo de penalização a que ela foi submetida. É como você roubar um pacote de biscoitos no supermercado e ser sentenciado à morte. A condenação das ativistas, por sua vez, não foi direcionada às suas ideias, suas proposições, sua narrativa ou a frase – infeliz ou não – que tenha dito. Não, a penalidade visa atingir a sua moral, sua história e a sua honra. Não é uma resposta ao estilo “Discordamos de você por sua frase, que pode acrescentar mais um fardo às mulheres negras americanas, vítimas de uma sociedade racista”. Não, a petição deixa claro que esta personalidade do mundo do parto humanizado é uma “racista”, “supremacista branca” (“white supremacist”, tipo Ku Kux Klan) e é por causa DELA (ou de “gente como ela“) que existe racismo na atenção às mulheres nos Estados Unidos. Todavia, bastariam 5 minutos de conversa com essa pessoa para se chocar com o despropósito de tamanha agressividade. Como disse Debra Pascali-Bonaro “there´s not a single racist bone in her body“. Isso me deixou claro que a petição diz muito mais a respeito do ódio, frustração e rancores imensos que emanam dessas pessoas do que de alguma falha cometida pela minha amiga e ativista.

Imediatamente percebi que a petição era parte de uma estratégia de ataque às ativistas históricas que militam na humanização do nascimento. Reli a declaração da minha amiga e, por mais que tenha tentado, não consegui perceber nenhuma declaração inquestionavelmente absurda ou racista, mas uma frase que poderia ser interpretada de diversas maneiras. Lembrei da famosa frase do meu pai sobre um técnico de futebol que estava entrando em evidência. Disse meu pai, tomando um café comigo no shopping: “Contra ele pesa o fato de ser negro”. Quando você tira essa frase do contexto parece que que sua intenção era dizer que “ser negro” é um defeito para alguém que almeja ser técnico de futebol. Entretanto, o que ele queria dizer é que, por ser negro, esse sujeito sofreria muitos preconceitos e teria tremendas barreiras que nunca ocorrem contra brancos que almejam a mesma posição. A mesma frase pode ser lida de duas diferentes formas, de acordo com o DESEJO de quem a lê; pode ser considerada racista por pessoas que preferem atacar a todos para fazer valer seus postulados, mas pode significar o OPOSTO se você quiser contextualizar e – mais ainda – se quiser perceber que a frase foi dita por um combatente na luta contra o racismo.

Depois da conversa com outras ativistas pude entender o contexto americano e perceber que minha colega e amiga foi vítima de um processo que não está acontecendo apenas agora. Ela está sendo usada por uma “patrulha” que tenta atacar o movimento de humanização por suas raízes brancas e de classe média, como se a culpa pudesse cair nas poucas ativistas brancas que resolveram trazer o nascimento digno ao debate.

Minha primeira reação foi pensar? “Quer saber? Não quero mais nenhuma interlocução com essas ativistas. Não aceito debater com fanáticas, com gente que acredita no ódio e na vingança como elementos de transformação positiva e que não se importam em dividir um movimento que já é pequeno e que sofre com ataque dos poderosos toda a hora. Que se ferrem!!”

Depois de alguns minutos, um pouco mais calmo, pensei que existe uma necessidade enorme de diminuir as diferenças entre as classes sociais e as raças em nossa sociedade. A luta dessas mulheres é justa e nobre, e a importância de suas ideias não pode ser sacrificada pelo mau uso que algumas ativistas de hoje fazem delas. O fato de serem portadoras de ódio e negatividade não pode me levar a desconsiderar essa luta – assim como a luta contra o machismo, a opressão, a iniquidade, os direitos sexuais das minorias e tantas outras. Se a mensagem delas é de ódio a minha (a nossa) não pode ser de desprezo, mas precisa necessariamente ser pautada pelo respeito e consideração por suas dores e feridas abertas.

Tenho certeza absoluta que minha amiga, Ina May Gaskin, não merece o tratamento indigno que recebeu. Os ataques direcionados a ela atingem todos os que se preocupam com o nascimento humano e com suas repercussões na sociedade. Ina May é um exemplo de mulher, mãe, avó, ativista e lutadora pela causa das mulheres, de qualquer cor, religião ou estrato social. Estarei ao seu lado sempre, porque a conheço como um dos mais iluminados seres humanos que já tive a honra de conhecer.

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Mestres

Max estava conversando pelo WhatsApp comigo há uns 5 minutos e terminou a conversa com uma fase que ficou na minha memória. Falava sobre professores e mestres, e a diferença entre ambos. Disse que um bom professor tem três características:

1- Conteúdo (informação, profundidade e atualização)

2- Capacidade de transmitir seu conhecimento

3- Humildade para que os dois anteriores não o transformem num arrogante cuja personalidade o afastará dos alunos.

Concordei com a ideia de Max e fiquei pensando que não tive nenhum professor na Universidade que tivesse  estas três características. O mais comum era sucumbirem na terceira e acabar soterrando capacidades e talentos sobre uma grossa camada de arrogância e vaidade.

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Free Speech

Palavras do parlamenta americano democrata Bernie Sanders sobre os ataques de manifestantes ao discurso da sua adversária, a conservadora Ann Coulter:

“To me, it’s a sign of intellectual weakness,” he (Bernie Sanders) said. “If you can’t ask Ann Coulter in a polite way questions which expose the weakness of her arguments, if all you can do is boo, or shut her down, or prevent her from coming, what does that tell the world?”

“What are you afraid of ― her ideas? Ask her the hard questions,” he concluded. “Confront her intellectually. Booing people down, or intimidating people, or shutting down events, I don’t think that that works in any way.”

A primeira vez que eu disse isso fui metralhado por pessoas que não suportavam o fato de que eu criticava de forma veemente a cusparada de um parlamentar em outro. Não importa de que lado eles estão; um parlamento (como o nome diz) é o lugar onde a palavra precisa ser respeitada sempre.

Da mesma forma eu considero como suprema tolice ver manifestantes de esquerda (porque o autoritarismo na direita me parece coerente) impedindo pessoas que apoiam o líder da direita racista e misógina de se manifestarem.

A propósito, para justificar o respeito à diversidade de opiniões o líder da esquerda americana usa os MESMOS argumentos que eu uso para defender a LIVRE expressão das ideias: “Afinal vocês tem medo dos argumentos dela?

Calar os outros, quando dessa manifestação não resulta delito (como incitação ao crime, racismo, etc) é SEMPRE um sinal de fraqueza. Mas agora não reclamem de mim, façam a queixa diretamente ao Bernie.

Atrás dessas manifestações está escondido – encolhido e envergonhado – o pânico de termos nossas ideias confrontadas e, desse confronto, a perda das certezas absolutas. Por esta razão, silenciar o outro nos oferece o falso convívio com “A Verdade” e o ilusório sentimento de termos vencido nossos opositores, quando na verdade apenas nos negamos – por medo e não por virtude – a escutar suas razões e sua visão de mundo.

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Maçaneta

A cafeteria jogava sobre nós seus vapores de café enquanto Max ajeitava o cabelo cada vez que aproximava a boca da xícara. Tive ímpetos de dizer-lhe, pela milésima vez, que já era hora de cortar seu cabelo. Max mantinha o mesmo penteado desgrenhado de quando estava na faculdade, mas agora os fios de cabelos brancos estavam em franca vantagem contra os originais. Logo me dei conta de que este comentário seria apenas mais uma tolice minha; criticar os cabelos de Max era uma intromissão em um assunto absolutamente privado. Pior, temo que sua resposta seria: “respeite seu lugar de fala, careca”. Dizer-lhe para cortar o cabelo seria o mesmo que pedir para Salvador Dali aparar o bigode, ou para Einstein pentear seu cabelo. Não se mexe em marcas tão fortes de uma personalidade. Ainda prefiro o incômodo de vê-lo ajeitando o cabelo insistentemente do que correr o risco de ver seu espírito questionador e inquieto esvair-se no chão de um barbeiro

– Eu sei do que falas, Ric. Se o que move estas pessoas. Sei como sofrem e porque é tão complexo o perdão. Sei também que, por mais que estas pessoas sejam confrontadas com a realidade, tal encontro não é capaz de produzir nenhuma transformação significativa. O que se obtém de forma irracional e afetiva não pode ser extirpado pela razão.

– Sim, eu compreendo, e me resigno. Sei que não há muito o que dizer diante de uma construção emocional tão poderosa. Não se joga fora uma bengala de uma hora para outra. O ódio e o desprezo servem como potentes apaziguadores da alma quando a dor é intensa e sobre ela não existe consolo possível.

Max jogou-se para trás na cadeira e ficou me olhando fixamente por alguns instantes. Nunca entendi exatamente o sentido destas paradas abruptas, o enquadramento do corpo como a preparar um bote seguido de um movimento rápido para frente em que arrojava seu corpo sobre a mesa e dizia algo sem tirar seus olhos dos meus. Funcionava como um script preestabelecido do qual ambos sabíamos como funcionava.

– Eu já te falei a história de Dulcinéia? Não a namorada de Dom Quixote, uma outra, muito mais triste.

Neguei com a cabeça, sem desviar os olhos de Max.

Ele sabia que eu não desviaria o olhar até o final de sua narrativa. Max domina a arte de criar suspenses e contar histórias.

– Dulcinéia era uma mulher triste. Era casada e tinha três filhos. Eu a conheci nos primeiros anos depois de sair da residência em um ambulatório da prefeitura.  Nos primeiros quinze minutos da consulta ela me contou as mentiras previsíveis que as pessoas contam na frente do médico, como um teatro tosco de olhares cruzados, histórias escolhidas, pausas, palavras sonegadas, atos falhos e enganos.

Interrompi Max abruptamente com a mão espalmada à frente.

– Para lá, Max. Não venha me dizer que as pessoas procuram médicos para mentir. Você não pode reduzir as consultas a interrogatórios, como se os pacientes estivessem acossados por um agente da lei, procurando encontrar as palavras menos incriminatórias, buscando subterfúgios para não dizer a verdade.

– Caro Ric, você descreveu muito bem como funciona uma consulta. Este encontro está regulado pelas necessidades humanas, por suas dores e medos e pelo nosso sentido de urgência. Entretanto, o que o paciente nos traz como demanda, como queixa e como sofrimento, é tão somente a parte visível de um gigantesco Iceberg. Aquela pontinha branca que desponta da imensidão aparentemente calma do oceano é apenas uma fração minúscula do que se esconde por debaixo das suas águas plácidas. Infelizmente, o que aparece como gelo na superfície deveria ser o guia para a descoberta da massa gigantesca que o sustenta. O que o paciente traz como queixa deveria ser um sinalizador para que um cuidador isento de preconceitos pudesse investigar o que se esconde por debaixo da superfície do seu discurso dissimulador.

Como eu um flash milhares de pacientes, palavras, histórias, gestos, expressões e sorrisos passaram diante dos meus olhos confirmando a tese de Max. Havia muito mais do que a nossa vã observação era capaz de apreender em um encontro breve e tímido. Os pacientes escondem, até de si mesmos, um tesouro de emoções escondidas debaixo de grossas capas de proteção e o adoecimento, qualquer que seja, enfraquece essas barreiras e nos oferece a oportunidade única de encontrar o que se esconde por “debaixo do véu que nos separa do meramente manifesto aos sentidos grosseiros”.

Repeti para Max a frase que ele havia me dito há muitos anos e pela qual tinha uma certa afeição. Sim, Max se afeiçoava a frases como alguns tem paixão por cães e gatos. Pedi que continuasse a história de Dulcinéia.

– Permiti que Dulcinéia continuasse a contar as naturais mentiras enquanto nutria a esperança de que ela fizesse a “manobra da maçaneta” que é tão comum nesses casos.

Pedi que continuasse, mas com o compromisso de descrever a tal manobra mais tarde.

– Dulcinéia era triste, como já lhe disse. Tinha olhos azuis profundos e frios. Seu rosto era magro e seu corpo esguio. A pele era de um brancor ofuscante, onde ressaltava o azul de suas veias delicadas decorando de mármore a face interna de seus braços de cera. Seus gestos eram delicados, mas seu olhar para mim dizia muito mais do que suas pequenas mentiras. Ela carregava uma dor que não cabia em suas palavras, que não aparecia em suas queixas e que devia estar dormindo nos porões úmidos e escuros do inconsciente.

Tentei buscar alguma Dulcinéia em meu arquivo de imagens, mas preferi que a descrição pormenorizada de Max me ajudasse a criar uma nova. Siga, Max.

– Em um determinado momento, e não recordo exatamente porque a conversa chegou a este ponto, suas mãos se espalmaram sobre o granito da mesa e ela me disse com uma voz dura: “Eu sei o que é sofrer por um erro!

Max, depois de uma breve pausa – ele conhece como contar histórias com seus altos e baixos e esperando o momento certo para encaixar as palavras da narrativa – continuou.

– Preferi ficar em silêncio. Havia naquele momento um instante raro nos encontros adornados de puerilidades que somos obrigados a testemunhar. Uma vaga do oceano chocou-se contra a torre gelada que aparecia altiva no meio do oceano de placidez, e com isso descobriu uma porção maior do iceberg que a sustentava. Ali estava algo verdadeiro, uma emoção clara e forte; uma dor que não se conteve e mostrou sua face.

Esperei mais alguns momentos de silêncio e ela resolveu continuar. Disse-me que sua irmã foi vítima de um erro médico há muitos anos, e que este fato acabou por fazê-las desconfiar de todos os médicos com quem consultou desde então. Um médico do Pronto Socorro foi o responsável pelo sofrimento terrível que se abateu sobre sua pequena irmã, na época com sete anos. A dor produzida naquele momento de sua vida jamais a abandonara e ela não se sentia capaz de perdoar aquele que tanto mal havia causado à sua irmãzinha e à toda sua família.

Aguardei sem nada falar pelo seu relato, pois via que ela estava tocando uma parte dolorosa de sua vida, um momento de profunda dor e angústia. Ficava claro que deveria ser algo de muitos anos passados, mas a emocionalidade da descrição mostrava que a dor ainda era atual, apesar da distância de décadas que a separava do evento.

A tudo eu ouvia com atenção, mas meu coração disparava quando eu sentia na própria carne as emoções contidas no relato de Max.

– Que idade você tinha quando isso ocorreu? continuou Max em seu relato. Ela respondeu que tinha 16 anos quando sua irmã sofreu o grave acidente. Ela era uma irmã “temporona”, a mais mimada, a mais amada, a mais querida por todos na família. “Um anjo que a vida presenteou a todos nós”, disse ela.

Olhando seus olhos úmidos perguntei se ela desejava falar sobre esse caso, caso isso pudesse lhe trazer algum conforto ou consolo. Ela respondeu que sim com a cabeça, como que a desejando economizar palavras que lhe custavam a sair da boca rósea de lábios finos, que mais pareciam uma linha a cruzar transversalmente o rosto.

Foi um erro terrível do médico, disse ela. Ela foi atropelada quando voltava para casa de um passeio e levada imediatamente ao hospital. Chegou lá muito mal, entre a vida e a morte. Sofreu várias fraturas, em vários ossos, e chegou no Pronto Socorro inconsciente. Foi internada e começaram a fazer cirurgias. Uma depois da outra; nem lembro quantas foram feitas no período em que estivemos no hospital, lembro apenas que foram muitas. Ossos, hemorragias internas, reintervenções, drenos, soro, sangue, anestesias. Depois as complicações, os antibióticos e as febres. Ela foi desenganada várias vezes, os médicos foram perdendo as esperanças.

Dulcinéia continuava sua descrição da tragédia de ver uma irmã lutando contra um infortúnio, que não apenas se apossou de sua saúde, mas acabou levando consigo o brilho dos olhos azuis de sua irmã. Ela prosseguiu em sua narrativa.

Eu rezava todos os dias e fazia todas as promessas. Chorava copiosamente nos corredores do hospital. Não conseguia aceitar que uma criança sofresse tanto, alguém que jamais fez qualquer ato ruim contra ninguém. Agarrava-me a tolas crendices e palavras de estranhos, todas bem-intencionadas, mas essencialmente vazias.

Subitamente, algo aconteceu. Em princípio não quis acreditar pois não queria me agarrar a falsas esperanças. A febre cedeu, os rins voltaram a funcionar, as cirurgias não mais supuravam, a respiração parecia melhor e mais calma. Até seu rosto voltou a se parecer com a menina alegre e vívida que todos conheciam. Chorei demais de alegria, mas ainda mantinha minhas orações e meus pés no chão.

Os dias se seguiram e ela aparentava franca recuperação, e depois de mais de dois meses internada pela primeira vez os médicos usaram a expressão “alta hospitalar”. Conseguia sair do quarto na cadeira de rodas e, apesar das dores, ensaiava alguns sorrisos com as brincadeiras das enfermeiras e dos médicos. Meu coração exultava de alegria e esperança.

O dia finalmente chegou. Apesar de ainda restrita à cama e com muitos cuidados o médico nos procurou e avisou que daria a alta no dia seguinte. Ela precisaria de controle cuidadoso e muita atenção. Estava se alimentando com cuidado, havia perdido muito peso, não podia fazer nenhum esforço. Passei a noite no hospital aguardando para levar minha irmã de volta para casa no dia seguinte.

Então sobreveio a sombra que nunca mais me abandonou, disse ela com uma voz pausada e grave. Durante a noite minha irmã pediu um copo de suco de laranja. Solicitei a enfermeira que lhe fosse dado, já que iria para casa na manhã seguinte e havia passado o dia inteiro tomando uma dieta líquida; devia ter sido  apenas um esquecimento do médico. A enfermeira voltou com a informação de que ela estava sem dieta. Insisti com a enfermeira de que ela estava com sede e precisava beber algo “energético”, e ela respondeu que ligaria para o médico de plantão para saber se ele liberava o suco, diante do fato de que pela manhã ela iria para casa.

A autorização do médico foi dada.

Ela bebeu seu suco, me deu um beijo de boa noite e dormiu.

Nunca mais falei com minha irmã. Na manhã seguinte ela se sentiu mal, ficou com falta de ar, reclamou que estava difícil respirar e logo depois pude ver que estava ficando pálida. Chamei a emergência e ele foi imediatamente removida para a UTI. Ainda pela manhã, uma enfermeira conhecida voltou para o quarto onde eu aguardava informações, me deu um abraço e chorou comigo, avisando que minha irmã havia morrido. Não havia causa conhecida ainda, e só com o tempo poderiam descobrir.

Fez uma pausa para secar as lágrimas e levou as mãos ao rosto. As emoções de tantos anos voltavam como se tivessem ocorrido há poucos dias.

Que Deus a houvesse levado no dia em que morreu, Dr Max. Que tivesse ela ficado no chão, sem vida, atirada no asfalto quente da rua, mas porque foram me dar as esperanças de ter minha irmã de volta para depois ser arrancada dos meus braços assim?

Não foi difícil entender que a culpa era o suco de laranja. Sim, doutor, deram a ela um suco que não poderiam ter liberado. Deram para ela um “veneno” que a matou. Foi um erro grosseiro do médico por ter liberado um suco que não devia ter recebido.

Max pausou a narrativa nesse momento e voltou a colocar o corpo para trás, encostando a vasta cabeleira na parede atrás.

– O que você disse a ela Max? Acredita mesmo que aquele suco de laranja poderia estar implicado no que me parece uma embolia?

– O que eu penso não importa muito, Ric. A dor dela era verdadeira e a melhor resposta que eu tinha a lhe dar era o meu silêncio. Ela continuou sua triste história.

Processei o médico. Virei uma fera. Contratei um advogado que imediatamente encampou a minha causa. Levei o caso ao conselho de medicina. No dia da audiência eu o encontrei, alguém que eu jamais havia visto mas que odiava do fundo do meu coração. Ele se levantou e me cumprimentou constrangido, mas certamente foi capaz de ver as faíscas de ódio que saíam dos meus olhos. Sem saber o que falar, ele se limitou a dizer, sem raiva ou indignação, apenas com uma espécie de assombro.

– Por que está fazendo isso comigo?

Não consegui lhe responder tudo o que tinha em minha cabeça pois meu advogado me puxou pelo braço e pediu que eu sentasse e me acalmasse. Foi a única vez que o vi em minha vida.

Perguntei a ela o que havia acontecido com o caso e ela respondeu com uma risada de sarcasmo.

Ora, Dr Max, você sabe muito bem o que houve. Simplesmente nada. O conselho de medicina disse que não havia prova alguma de má conduta diante de um caso tão grave como o dela e encerrou o caso. Cheguei a pensar em levar adiante e processá-lo em todas as instâncias, mas meu advogado disse que a visão do conselho era muito forte, os juízes são muito incompetentes para entender casos médicos, haveria um desgaste ainda maior para a família e os custos subiriam, etc. Aceitei seu conselho e virei essa página, mas a minha dor e a minha indignação jamais terminaram, e sei que vou morrer com elas.

Fiquei olhando para aquela paciente sem saber o que dizer, sem ter como ajudá-la e sem poder debater sobre um caso que lhe trazia tanta dor, mais de 25 anos passados. Tinha vontade de lhe falar que não acreditava que o suco de laranja tivesse qualquer participação no óbito, que o mais provável era uma embolia, o que seria um diagnóstico provável diante de tanto tempo imobilizada e das fraturas que teve. Mas, de que adiantaria mexer nessa ferida sem ser capaz de lhe oferecer uma luz qualquer, e sem ter condições de trazer razão para um caso em que havia um domínio total das paixões?

Disse apenas que sentia muito por tudo que havia acontecido e que ela podia contar comigo sempre que tivesse o desejo de contar uma história que compõe o tecido sutil de sua vida. Ela sorriu, secando uma última lágrima dos olhos azuis.

Levantou-se e dirigiu-se à porta. Neste instante, sem saber exatamente o porquê, resolvi lhe fazer a derradeira pergunta. Em verdade, creio que a fiz apenas para tentar me solidarizar com sua dor, ou para encher de palavras o pequeno trajeto que separava a mesa onde estávamos até a porta.

– Como ela foi atropelada?, disse eu.

– Ela desceu do ônibus e atravessou a rua sem olhar. Soltou-se e correu para a calçada à frente, mas foi atingida por uma motocicleta em alta velocidade e arremessada há mais de 20 metros de distância.

– Soltou-se?, perguntei eu sem refletir

Dulcinéia colocou a mão na maçaneta e, olhando levemente para trás, respondeu

– Soltou-se da minha mão, Dr Max. Era eu quem havia saído com ela para passear. Foi de minha mão que ela se desprendeu.

Meu olhos se arregalaram diante do fim da história. Olhei para Max como a entender a manobra que ele me havia anunciado.

– A maçaneta, Max…. agora eu entendi.

Max ajeitou seus cabelos caóticos mais uma vez e sorveu o último gole de seu cappuccino. A brisa sombria entrava pelas frestas da porta à frente enquanto os sons da noite nos convidavam a um abraço e um até breve.

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Usufruto

A cultura enxerga o corpo da mulher como usufruto de todos, por isso é exposto, vendido, adorado, perseguido e manipulado. Já o corpo da mulher grávida é de todos, menos dela mesma. A sociedade diz: “A gravidez é um evento grandioso demais para ser confiado às mulheres. O fato de elas guardarem para nós os bebês não pode lhes garantir o direito de tratar seus corpos-cofres como bem desejam”.

Um corpo grávido é um bem social, enquanto a grávida é um estorvo e um risco ao nosso patrimônio.

Jeffrey  Edmonds, “Atirem no Mensageiro – Crônicas à beira do abismo“, Ed. Vulture, pág 135 (no prelo)

Jeffrey Edmonds é um ginecologista americano, nascido em Seattle em 1980. Escreveu muitos estudos e trabalhos relacionados a parto e nascimento sob uma perspectiva sociológica e com viés psicanalítico. Em seu livro descreve os embates pela desmedicalização da saúde – em especial no parto e amamentação – que se chocam contra os interesses corporativos e do próprio capitalismo como forma de organização econômica da sociedade. Deixa claro que a humanização do nascimento só terá plenitude na sociedade com a suplantação do capitalismo, visto que as forças que lutam contra o parto humanizado são as mesmas que sustentam o capitalismo e sua vertente neoliberal. Assim, insere a luta pelas mulheres (parto e amamentação) e a luta anticapitalista (solidariedade e democratização da saúde) num mesmo corpo e demonstra que estas lutas precisam estar unificadas para obter sucesso. Mora em Seattle e coordena o núcleo local de “Socialist Doctors for America”.

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Muro

O que me deixa triste desde 2013 é o fato que preciso refrear minhas críticas ao campo das esquerdas porque a bipolaridade do momento determina que se você questiona líderes ou práticas dos progressistas está automaticamente alinhado com o fascismo redivivo e o mais abjeto conservadorismo golpista que se apresenta no outro lado do espectro político.

Ovner Messider, cientista político e artista circense. In “Poética da esquizofrenia”, pág 135

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Socialista de IPhone

Li e nas redes sociais:

Emilio Odebrecht falou de uma conversa que teve com o general Golbery do Couto e Silva, um dos ideólogos da teoria de Segurança Nacional da Ditadura. Na ocasião, Golbery fez uma descrição do ex-presidente Lula que marcou Emílio Odebrecht: “Emílio, o Lula não tem nada de esquerda. Ele é um bon vivant”.”

O grande erro e o monstruoso preconceito da direita é (ainda!!!) imaginar que um homem da esquerda ou um socialista não pode ser um “bon vivant” ou usar IPhone. Por quê? Por que Lula não tem o direito de gostar de um bom vinho ou um bom charuto? Onde está a incoerência? Onde está escrito que um socialista não pode usufruir o que seu trabalho lhe proporciona? Que leitura equivocada e pervertida do socialismo tem essas pessoas!!!!

A direita precisa abandonar o discurso dos anos 60 o quanto antes. Sério, gente… tá chato.

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