Arquivo do mês: dezembro 2023

O Mais Temido

Por qual razão as torcidas de fora do Rio Grande do Sul historicamente consideram que o Grêmio é o time mais difícil, mais aguerrido, mais temido e aquele que mais deve ser evitado?

Existem várias formas de explicar este fato, a maioria delas clubista. Entretanto, vou deixar aqui a minha teoria, que acredito ser a menos enviesada: nosso coirmão, o Internacional, nunca fez festa na casa alheia, com exceção dos campeonatos regionais. Todos os campeonatos acima do Mampituba (divisa entre o Rio Grande do Sul e Santa Catarina) vencidos pelo Colorado foram com a volta olímpica sendo realizada em seu próprio estádio. Os três campeonatos brasileiros da série A foram vencidos no Beira Rio (Cruzeiro, Corinthians e Vasco) nos anos 70, assim como as duas Copas Libertadores. A sul-americana idem. O mundial não conta, porque hoje em dia ele é realizado em estádio neutro. Além disso, as duas Copas Libertadores do Internacional foram, respectivamente, contra um time brasileiro (São Paulo) e um time mexicano (o Chivas Guadalajara), o que não melhora o cartaz entre os clubes sul-americanos e não produz a imagem de clube guerreiro, ameaçador, imbatível e “imortal” entre as torcidas da América Latina.

Por seu turno, o Grêmio tem vários campeonatos vencidos fora de sua casa, fazendo festa nos domínios do adversário inúmeras vezes – e de forma épica. Isso marca muito a imagem do clube fora de suas fronteiras. Temos 5 copas do Brasil, sendo que duas delas ganhamos contra os times de maior torcida do Brasil, fora do nosso estado e com estádios lotados: Flamengo de Romário e Corinthians de Marcelinho Carioca e Luxemburgo. Também fomos campeões brasileiros sobre o São Paulo de Valdir Perez e Serginho vencendo as duas partidas finais, sendo a grande final no Estádio Morumbi repleto. São derrotas “em casa” que os adversários jamais esquecem.

No âmbito da América, ganhamos 3 libertadores, duas dela na casa do inimigo: uma na Colômbia contra o Nacional de Higuita e outra contra o Lanús em Buenos Aires. Ou seja: fizemos a festa da América na casa “deles”, expondo a torcida adversária à dor de uma derrota em seus próprios domínios. A terceira foi no nosso estádio, mas contra o campeão do Mundo, o Peñarol de Fernando Morena. Desta forma, ganhamos 3 libertadores vencendo na final clubes das 3 maiores praças futebolísticas da América – além do Brasil: Uruguai, Argentina e Colômbia. Até nossa vitória no Brasileirão da série B foi fora do nosso estádio, e de forma épica: em Recife, contra o Náutico, na Batalha dos Aflitos, que o Brasil inteiro lembra como o feito mais heroico da história do futebol profissional. Também a falecida Copa Sul ganhamos em Curitiba, contra o Paraná Clube, jogando em seu estádio.

Ou seja: o Grêmio é o mais aguerrido dos clubes do Sul do Brasil e o adversário mais temido pelos “hermanos” dentre todos os clubes brasileiros da Libertadores. Essa fama – e o temor causados nos adversários – foi forjado porque criamos a imagem de um time guerreiro que não se intimida com a torcida adversária e por termos uma história de imortalidade. Ganhamos campeonatos importantes e de forma espetacular na casa dos nossos inimigos. Por isso quanto mais nos odeiam, mais nos admiram.

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Cancelado

A primeira vez que testemunhei esse fenômeno foi há uns 10 anos ao resolver comprar um produto pela Internet quando estava nos Estados Unidos. Recebi o produto pelo correio alguns poucos dias depois da compra e ele veio com um papel onde se lia algo como: “Se o produto tiver qualquer avaria avise-nos antes de fazer sua avaliação no site. Faremos o possível para resolver a questão e estaremos à disposição para ouvir sua reclamação. Não nos avalie negativamente antes de nos dar a chance de resolver seu problema”.

Percebi, pela primeira vez, o quanto valorizavam minha opinião, minha avaliação do produto e o que achei do atendimento. Eles preferiam mandar um produto novo – sem custos!! – do que lidar com uma avaliação negativa na seção de “comentários” da página. Ficou óbvio que uma avaliação muito negativa deveria afastar centenas de potenciais compradores. Imagine olhar os comentários antes de decidir comprar e ler: “Não compre. Quebrou em uma semana e não devolveram meu dinheiro”. Não há dúvida que manter o comprador satisfeito é a política mais segura. Para alguém que passou a vida inteira sem nenhuma alternativa depois de fazer uma compra, esse empoderamento súbito da minha perspectiva como comprador pareceu um milagre, o que foi possível com a popularização das compras on line. Pois naquele singelo bilhete eu estava, em verdade, vendo as primeiras manifestações de um fenômeno tão significativo quanto novo: o surgimento do sujeito solitário que expressa sua opinião sobre produtos publicamente, mas agora com inédita relevância.

Não há dúvida que o medo do comerciante gerou uma necessidade de melhorar os produtos e os serviços. Já fiz reclamações em compras da Amazon por envio errado de produtos cujo conserto por parte dos vendedores custou mais do que o próprio produto que comprei. Ficou evidente que uma avaliação mordaz e negativa poderia causar muito estrago. E não se trata de criticar a força que a ponta consumidora acabou ganhando, longe disso. Porém, outro fato se associou a este “novo poder” garantido ao comprador: não apenas os produtos passaram a ser avaliados, mas também as pessoas. A partir de então, as figuras públicas passaram a ser vistas e tratadas como produtos que consumimos nas redes sociais. Caso elas não cumprissem nossas expectativas, poderíamos usar da nova ferramenta social chamada “cancelamento“. A partir deste novo modelo de interação social, passamos a cancelar gente “à rodo”, pelas mais diferentes razões, mas em especial pelas escolhas políticas, as posturas morais, o comportamento, as manifestações públicas, etc. “Fez o L?”, cancelado. “Votou no Bozo?” cancelado. “Separou da mulher?”, você não vale mais nada. “Talaricou?”, você está fora. “Foi acusado de algo horrendo, como abuso sexual?” então você será destruído impiedosamente, sem direito a perdão, mesmo que no futuro se prove que era tudo mentira.

Nesse novo modelo, o trabalho das pessoas, sejam elas jogadores de futebol, cantores, pensadores, jornalistas, médicos, etc. passou a ser secundário à persona pública do sujeito. O que você faz é menos relevante do que o que parece ser. Hoje inclusive existem “gerentes de imagem”, funcionários que controlam tudo o que o sujeito pode dizer, de que lado deve se postar, se deve apoiar este ou aquele candidato, o que deve dizer sobre a Palestina, a Ucrânia, o aborto, as mulheres, o machismo, os gays, os negros, as trans, o sexo, etc. Isso determinou que hoje em dia nenhuma opinião é real e verdadeira; todas são, determinadas por aqueles que controlam a imagem do “influencer” e são moduladas pelo interesse dos fãs – que em última análise controlam como seus ídolos devem ser.

Hoje o cancelamento é uma adaga que balança sobre nossas cabeças. A mera suspeita de um malfeito não confirmado causou o cancelamento de PC Siqueira, sua depressão e posterior morte. A menina, sobre quem se criou uma série de mentiras sobre o namoro com um comediante, também não suportou a pressão das redes. Outros fizeram piadas que ofenderam identidades (ou identitários) e foram imediatamente cancelados. Calados, amordaçados, enviados para a “Zona Fantasma”, desapareceram ou foram destruídos, mandados para onde são jogados aqueles cuja opinião não podemos tolerar. Ninguém está livre de ser julgado e condenado pelo tribunal da redes, basta ter uma opinião contra-hegemônica.

Sequer estou me referindo à ação autoritária da justiça, que deseja “regular” as redes sociais para evitar “abusos”. Sobre isso o caso Monark (youtuber cancelado por dizer que era a favor da criação de qualquer partido, até mesmo o nazista) é didático ao nos mostra como o conceito de “abuso” pode ser absolutamente subjetivo e também servir oportunisticamente aos interesses dos poderosos. A censura nos ameaça tanto de maneira formal quanto na informalidade das redes. Não…. aqui falo apenas aqui do sujeito que, na condição de relativo anonimato e segurando um celular nas mãos, decreta a destruição de um outro baseado em antipatia, discordância ou mera implicância. Esse sujeito, empoderado como consumidor, é capaz de gerar pequenas – e até grandes – tragédias.

Como diria o filósofo contemporâneo Roger Jones “…as redes sociais nos jogaram ao mesmo tempo na modernidade e na idade média. Basta abrir o “x”, ex-Twitter, e veremos que todo dia há uma nova vítima jogada à fogueira; é assim que funciona. É o mercado da punição, algo que está enriquecendo muita gente, porque funciona como um negócio. Anotem: semana que vem surgirá um novo “monstro” para ser empalado publicamente, porque esse é o combustível, a força que nos impele a ligar o celular e gozar com o novo linchamento. As redes sociais vivem de pecados alheios; esse é o grande barato e o grande lucro desse negócio”.

E você? Já cancelou alguém hoje?

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Sionismo não é judaísmo

Nem todo judeu é sionista e a maioria dos sionistas sequer é composta por judeus; são cristãos sionistas, como Biden ou os bispos Malafaia e Edir Macedo, pragas surgidas respectivamente pelo israelismo da política americana ou pelo neopentecostalismo tupiniquim, que lucra milhões com suas viagens turísticas à Terra Santa. Portanto, qualquer confusão entre estes termos é oportunismo, serve como manobra diversionista, cujo único objetivo é evitar que apontemos os horrores da aventura colonial racista no Oriente Médio. Para qualquer sujeito intelectualmente honesto, não é difícil entender que atacar o nazismo não significa ser antialemão, assim como criticar o retrocesso civilizatório do bolsonarismo não é o mesmo que ser antibrasileiro. Da mesma forma, criticar a inquisição da idade média não é o mesmo do que atacar Cristo ou sua doutrina.

Passei anos sendo perseguido por sionistas da aldeia que acusavam minhas críticas veementes ao apartheid de Israel como sendo “racismo”, ataques injustificados aos judeus ou ações antissemitas. Muitas dessas pessoas me xingaram e usaram de violência verbal pelas minhas palavras duras, em especial durante e após as “operações especiais” realizadas em Gaza e nos territórios ocupados da Cisjordânia, que matavam centenas de crianças e mulheres, números que agora chegam aos milhares. Nunca me intimidei e desafiei aqueles que me contestavam para que respondessem perguntas simples sobre a vida em Gaza e na Cisjordânia, as quais demonstram sem sombra de dúvida a brutalidade da ocupação.

Para quem acompanha este debate há décadas, é simples de ver que a defesa de Israel é sempre recheada de mentiras. Desde uma terra sem povo para um povo sem terra até as crianças decepadas, estuprosou não atiramos em civis, as mentiras são inexoravelmente imbricadas na narrativa sionista. São falsidades repetidas à exaustão, auxiliadas pela parcialidade criminosa das grandes plataformas digitais (Facebook, Instagram, Google) e a imprensa corporativa, toda ela nas mãos dos sionistas e dos senhores da guerra, que lucram bilhões quanto mais mortes aparecem nas capas dos jornais.

Já aqueles que defendem o povo palestino são, via de regra, pessoas que, como eu, acordaram para a realidade da geopolítica do Oriente Médio há muitos anos, o que só ocorre quando ousamos investigar o que existe por detrás das capas de enganação que são despejadas pelos telejornais há décadas. Nossas posições são essencialmente humanistas, pois que expõem a barbárie da ocupação, as mortes, a limpeza étnica, a indignidade do tratamento, os abusos, a prisão de crianças, as detenções administrativas que duram anos, as mortes e os processos kafkianos de violência jurídica. Por outro lado, o “whitewashing” (prática de selecionar informações, enfatizando ou omitindo, a fim de melhorar a imagem de uma pessoa ou de uma instituição frente à opinião pública) sempre foi a forma de apresentar Israel ao ocidente, e por isso era chamado de “a villa in the jungle” e, com o mesmo cinismo característico, difundem ideia de serem a única democracia na região – uma mentira asquerosa – e usam a questão identitária (em especial de mulheres e gays) para vender a imagem de uma civilização justa, europeia, branca e semelhante à nossa. Por seu turno, todo e qualquer grupo que lutasse pela libertação do povo palestino era imediatamente rotulado de “terrorista”, da mesma forma como os presidentes anti-imperialistas de qualquer nação são automaticamente chamados de “ditadores”, inobstante serem democráticas as eleições que os tenham levado ao poder.

Cabe a nós não retroceder na exposição, cada vez mais intensa, das contradições do sionismo. Não é mais possível aceitar o colonialismo genocida a controlar com mão de ferro a Palestina, e cada um de nós é responsável por espalhar a necessidade de democracia na região. E “cada um de nós” inclui os nobres irmãos judeus que na Palestina, no Oriente, na Oceania, na América e na Europa se levantam contra o sionismo e seu modelo supremacista e excludente. Judeus estarão lado a lado com os palestinos na luta pela liberdade, do rio ao mar.

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Colonialismo

Eu sempre fui muito fã do Tintim e, por causa disso, assistir o longa metragem sobre suas aventuras foi a derradeira vez que fui ao cinema com meu pai. Passei a infância e a juventude lendo as histórias escritas por Hergé. Meu pai comprava os “gibis” repletos de viagens a lugares estranhos e lutas contra bandidos de outras terras e eu viajava longe junto com os personagens. Aliás, o nome “gibi”, que deve estar em desuso, se devia às letras GB no alto da capa da revista que indicavam a editora – GuanaBara.

Meu pai cresceu apaixonado por estes gibis e se alfabetizou com eles. Ele descrevia a chegada do meu avô, vindo da cidade (meu pai morava no interior, Três Cachoeiras) com uma pilha de revistas, com a mesma excitação da criança burguesa que ganha um smartphone novo no seu aniversário. Na época dele (e também na minha) gibis valiam ouro. Era comum a gente visitar uma outra família e minha mãe dizer “levem os gibis de vocês para trocar”. As histórias preferidas do meu pai eram Tex, Anjo, Popeye, Capitão Midnight, Reis do Western, todas as revistas de caubói e o indefectível Tintim.

Ser um jornalista internacional, um menino prodígio, visitar todos os lugares exóticos do planeta era o sonho dourado compartilhado pela gurizada da minha geração. Sim, bem diferente do sonho de ser YouTuber, influencer ou jogador de Free Fire. Tintim era tudo isso, além das qualidades morais que acrescentava à sua inteligência e tenacidade. Tinha uma relação paternal com seu cãozinho Milu (Milou, em francês, Snowy em inglês – um gracioso Fox Terrier) e cuidava do capitão Haddock – sua figura paterna – como um filho cuida de seu velho pai doente, alcoolista, com síndrome pós traumática e problemático.

Aqui é que se estabelece a minha grande dor. Enquanto adorava os dramas e as intrigas internacionais nas quais Tintim e o Capitão Haddock estavam envolvidos, eu não percebia que, por trás de todas essas narrativas maravilhosas, se escondia a brutalidade do colonialismo europeu em África. Ou seja: para adorar o herói que despertava em mim o fervor revolucionário e investigativo era preciso fechar os olhos para a barbárie genocida da invasão europeia da África, regada com o sangue da exploração de seus recursos naturais. Entre os maiores “investidores” na África estava o Rei Leopoldo, rei belga que dominou o Congo, lugar onde ocorriam muitas das histórias de Tintim. Leopoldo, com 10 milhões de mortes na sua ficha corrida macabra, é provavelmente o sujeito mais brutal que já passou pelo Planeta. Talvez não exista no inferno ninguém mais conhecido e celebrado que ele. Mas, à época, essa não era uma história contada nos jornais.

As aventuras de Tintim retratam exatamente o olhar colonialista, a desumanização dos povos da África, a ganância da exploração e o desrespeito com as culturas nativas, mas os quadrinhos que meu pai e eu devorávamos eram envoltos em uma bruma de heroísmo, coragem, inteligência superior, determinação e força moral. Esta, por certo, é a receita básica dos colonizadores, que precisam glamurizar a conquista dos nativos tornando-a uma sequência de episódios épicos da necessária luta da “luz contra as trevas”. Algo parecido com a perspectiva que Israel apresenta sobre as chacinas e os massacres contra os palestinos na “conquista da Terra Santa” – a Nakba, na perspectiva dos palestinos. É preciso forçar a narrativa, torturar os fatos, até o ponto em que os próprios colonizados acreditem que a servidão lhes ofereceu benefícios.

Hoje Tintim é uma lembrança apenas, mas muito de sua personalidade e temperamento apareceram em outro “desbravador” contemporâneo. À maneira de Tintim, tratam como herói um ladrão de relíquias de povos da África e Oriente Médio como Indiana Jones. Desta vez o colonizador é americano, não belga, mas a forma de tratar os nativos como “inferiores” e incapazes de cuidar de suas próprias riquezas é essencialmente a mesma. Isso me faz pensar que o colonialismo usa de criativas metamorfoses para continuar impondo uma perspectiva etnocêntrica ao mundo, fugindo enquanto pode da incômoda multipolaridade cultural.

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Disparidade

População de ascendência judaica nos Estados Unidos é de 7.5 milhões, o que significa ao redor de 2% dos habitantes do país. Fica então a pergunta: como pode uma parcela tão pequena da população ter tamanho poder, a ponto de enviar 4 bilhões de dólares anuais para armar Israel e manter a opressão dos palestinos, enquanto coloca os outros 98% dos seus habitantes em risco de uma guerra que pode destruir o planeta? Por certo que a grande massa dos seus cidadãos, como demonstram as manifestações em apoio à Palestina, não aceita esse uso do dinheiro público para fomentar e financiar guerra, destruição, mortes e apartheid. Somente a falsa democracia liberal, onde os políticos podem ser facilmente comprados pelos interesses capitalistas, pode explicar essa disparidade entre o que o povo deseja e o que sua elite financeira faz…

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Dio Come ti Amo

Conheci uma senhora que era apaixonada por esse filme, tendo visto mais de uma dezena de vezes – no cinema!!! Eu mesmo o assisti na adolescência. Ele narra a historia de Gigliola, uma jovem e humilde nadadora que concorre em uma competição na Espanha e acaba se apaixonando pelo noivo de sua melhor amiga. Entretanto, quando o casal vêm visitá-la na Itália, ela finge ser rica, tendo a cumplicidade dos pais para manter a farsa. O filme nada mais é que um dramalhão romântico sobre as idas e vindas de uma relação, cujo roteiro parece ter sido feito apenas para essa cena final. Nela, a mocinha canta o tema (e nome) do filme no sistema de som do aeroporto para convencer o bonitinho a perdoá-la pelo mau julgamento que fez dele.

A música se chama “Dio Come Ti Amo” e foi composta em 1966 (mesmo ano de lançamento do filme) e fez um sucesso imenso durante o período em que estivemos próximos da música italiana, em especial quando Roberto Carlos ganhou o festival de San Remo em 1968 com a música “Canzone per Te”. Eu também achei interessante o avião usado nas tomadas finais do filme, que é um Fokker 27 com dupla hélice, que fez sucesso nos anos 60. Quem é coroa como eu há de lembrar…

Aliás, minha música italiana favorita na infância foi “Noi, innamorati d’improvviso”, de Fred Bongusto. Claro, não sabia nenhuma palavra da letra, além do titulo, mas achava linda. Acho que um italiano coroa poderia me educar dizendo que esta música é uma espécie de “Garçom, nesta mesa de bar” ….que parla.

PS: Esta é Gigliola Cinquetti, ano passado (2022) no Festival Eurovisão, aos 75 anos. Na época do “Dio Come ti Amo” tinha 19 aninhos. Ainda hoje é uma gatona!!!!

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A obrigação moral de resistir

Não fiquem bravos comigo: a libertação da Palestina é o grande clamor civilizatório da nossa época. Não há como me calar diante da necessidade de apoiar a grande luta libertária do século XXI.

Não me perguntem se eu aceito os ataques do Hamas às bases militares sionistas situadas ao lado de Gaza. Sim…. eu aceito as bombas, os foguetes, os ataques e as emboscadas, sim. Por mais que sejam inaceitáveis e injustificáveis a violência e a brutalidade, há que aceitar a motivação de tais ações heroicas. Entendo perfeitamente que aos palestinos, depois de sete décadas de massacres e humilhações, só restava a possibilidade do ataque militar aos fascistas de Israel. Acreditar que depois de 75 anos de massacres haveria consideração e interesse de debater a questão palestina por parte dos invasores é uma ingenuidade que os palestinos não se permitirão nunca mais.

Ou por acaso a liberdade dos povos se consegue com abaixo-assinados? Por acaso o fim da monarquia na França e a ascensão da burguesia ao poder na Revolução Francesa se deu por uma petição no Avaz? Os americanos venceram os ingleses e conquistaram sua independência através do diálogo? A liberdade da Argélia do jugo horrendo da França se deu numa mesa de bar? E o que houve com todas as colônias em África que se libertaram do colonialismo? Por acaso sua liberdade ocorreu numa sala acarpetada na ONU?

Seria justo pedir moderação a quem sofre a barbárie racista e colonial há décadas? A estratégia do consenso e da diplomacia funcionaria agora, depois de jamais ter produzido resultados? O que houve com Camp David? Qual o resultado dos acordos de Oslo? E por que exigimos diálogo por parte dos Palestinos, mas jamais exigimos isso dos brancos europeus invasores sionistas? Por que os passos para a paz são exigidos apenas de quem é oprimido, mas não da parte opressora? Porque nós (as vitimas do imperialismo) somos pressionados a dialogar, esperar, aceitar, suportar e nos resignarmos, enquanto aos invasores é oferecido tudo: aviões, armas, foguetes, canhões, tanques, o controle da narrativa e ainda por cima uma máquina gigantesca e mortífera de propaganda?

Se a guerra é necessária que seja aceita, lutada e vencida. Chega de abuso, chega de racismo e apartheid. Chega de opressão e morte. Os povos de todo o planeta exigem: Palestina livre!!!

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Seu Passado Condena

Os fatos atuais, que mostram de forma explícita e inequívoca a barbárie do colonialismo racista de Israel, tornaram ainda mais vergonhosas as visitas de Caetano, Gil e Jean Wyllys à Palestina há poucos anos. A visita destes ocorreu mesmo depois dos avisos reiterados – inclusive de Roger Waters – para não visitarem um país que tinha uma imensa ficha corrida de abusos e violações de direitos humanos contra a população original daquela terra.

A ideia dos ativistas pela Palestina era reforçar o bloqueio cultural à Israel como parte do esforço para isolar um país que tem o supremacismo étnico e a invasão de terras palestinas como cimento cultural. Apesar dos avisos, estes personagens, identificados com a esquerda brasileira, foram a Israel, fizeram shows e palestras de cunho identitário e tiraram fotos com notórios terroristas – como Shimon Perez. Cabe também dizer que outro queridinho da esquerda liberal festiva do Brasil, Gregório Duvivier, também proferiu palestras a convite de Israel em sua campanha de propaganda e “whitewashing” do colonialismo. Esses convites “boca livre” de Israel são tradicionais para a compra de mentalidades na América Latina. Há poucos dias uma nova leva de influencers (como Rogério Vilela e André Lajst) foi para Israel receber uma versão distorcida e mentirosa para o ataque do Hamas em 7 de outubro. 

As imagens de Jean Wyllys na universidade sionista e dos músicos brasileiros ao lado do ex-presidente de Israel são as mais chocantes – e das mais difíceis de engolir. Quanto ao político israelense, Shimon Peres, nasceu na Polônia em 1923, em Wiszniew, Polônia (hoje Vishnyeva, Bielorrússia) e seu nome original era Szymon Perski. Ele foi um os fundadores de Israel, mas também de sua milícia terrorista mais cruel, chamada Haganah. Este comando terrorista se ocupava em exterminar e expulsar palestinos de seu território com o suporte das forças imperialistas para criar uma grande base militar no Oriente Médio. Anos após, foi Shimon Peres quem negociou o apoio imperialista para que Israel tivesse armas atômicas.

Shimon Peres foi também primeiro ministro e presidente de Israel – parte de uma longa lista de terroristas que se tornaram políticos de destaque naquele país. Nesta condição é responsável direto pelas violências, abusos, massacres, bombardeios, execuções extrajudiciais e múltiplas violações dos direitos humanos aplicados ao povo palestino durante mais de sete décadas. Peres foi ideólogo do terrorismo israelense em sua mais clara manifestação. Ele é responsável pela nomeação de Ariel Sharon, que o sucedeu, para o comando das tropas que invadiram o Líbano, as mesmas que posteriormente estiveram presentes no massacre de Sabra e Shatila. Não por acaso, Shimon Peres foi parceiro dos mais sanguinários ditadores genocidas latino americanos, como Pinochet, Videla e Hugo Banzer.

Não deveria causar surpresa que Shimon Peres (que faleceu em 2011) pertencia à esquerda israelense, do partido trabalhista, porque para Israel a esquerda e a extrema direita são visceralmente unidas no etnocentrismo racista que sustenta a ideologia sionista.

A culpa que estas personalidades da cultura brasileira carregam eu não gostaria de ter sobre as minhas costas. Não há justificativa para ser fotografado ao lado de reconhecidos genocidas ou para posar sorridente à frente de uma universidade erguida sobre terra Palestina furtada pelo estado terrorista que a controla. Todavia, espero que eles tenham a capacidade de rever suas posições (algo que até agora não ocorreu de forma clara), reconhecer seus erros e, enquanto ainda houver tempo para limpar suas biografias desta nódoa, colocar suas vozes a favor da independência, da autonomia e da liberdade do povo da Palestina.

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Arquivado em Causa Operária, Palestina, Política

Proibições

Proibir os comentários perversos e ofensivos da internet acreditando que isso possa “limpar” o ambiente das redes sociais é o mesmo que passar massa e tinta nova nas rachaduras da casa imaginando que assim ela ficará mais firme e segura. Prefiro combater os monstros no claro do que escondidos na escuridão do silêncio. A censura nunca é boa para a verdade, mas pode ser útil para quem usa a falsidade e a mentira como ferramentas. Como diria Douglas Hawthorne, “Se há uma virtude nas redes sociais esta é a capacidade de mostrar a feiura que a hipocrisia esconde“.

Admoeser Rufus, personal communication

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Velhos

Muitos dos meus conterrâneos e contemporâneos, nascidos – ou que viveram a infância – durante a ditadura militar brutal que nos acometeu, se tornaram reacionários patéticos e subservientes ao imperialismo. Uma boa parte ainda exalta o autoritarismo da direita e os golpes contra a democracia que ocorreram em um passado não muito distante. Alguns deles hoje são auto exilados no exterior, e justificam o abandono do Brasil dizendo que viver fora do país sempre foi “o sonho dourado da sua juventude”.

Em verdade, esta fuga ocorreu porque não suportam o cheiro da brasilidade e o jeito do nosso povo. Doentes de xenofilia, amam tudo que não é Brasil, veneram a cultura branca europeia e amam sua história repleta de violência colonizadora. Mais ainda, desprezam tudo o que representa nosso povo e nossa cultura e odeiam tudo que é nosso: a música, as peles escuras, o samba, as artes, os livros. Afinal, para tudo isso existe uma versão melhor, mais limpa, mais sofisticada e mais nobre na América do Norte ou no velho mundo.

Tamanho é o nojo que sentem do que aqui deixaram que a eles mais vale serem cidadãos de segunda classe no exterior do que se olhar no espelho e enxergar um brasileiro na terra em que nasceram. Distantes daqui, aplaudem a Lava Jato e debocham do pleito justo da Venezuela sobre seu território histórico. Por certo fariam o mesmo para proteger as “Falklands” das reivindicações abusivas dos argentinos sobre a soberania das ilhas já que, como nós, estes não passam de sul-americanos grotescos e ignorantes.

Exaltam figuras execráveis como Bolsonaro, Moro e Dalanhol, três notórios meliantes despudorados, que por pouco não destruíram por completo a soberania deste país, vendendo nossa dignidade e nossas riquezas à sanha colonialista dos emissários do Império. Tratam Lula com epítetos maldosos, injustos e covardes, insistindo em fake news há muito derrubadas, mas vomitando a cada frase o preconceito de classe que jamais lhes permitiu aceitar um nordestino oriundo da classe operária como supremo mandatário do seu país. “Burro”, “nove dedos”, “cachaceiro” é como expressam seu despeito, revelando que as justificativas para odiar o presidente descrevem muito mais a si mesmos do que ao próprio Lula.

Minha geração é composta por velhacos ranzinzas, ressentidos, egoístas e conservadores. Falsos puritanos, defensores das ditaduras, apoiadores de Israel, violentos e antidemocráticos. Os anos de chumbo não marcaram em suas almas qualquer lição duradoura de valor, e sequer a velhice os ensinou a esconder seus preconceitos mais infames. Por fim, não me venham dizer que “no meu tempo é que era bom“, pois se a minha época juvenil produziu tantos velhos de camisa da CBF e tantas senhoras de laquê com palavras de ordem racistas ela não pode ter sido boa.

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