Arquivo do mês: setembro 2016

Estética do Poder

casa-grande

Não se trata de combater a corrupção ou de “moralizar o pais”. Fosse isso verdade e toda a fúria contra o PT estaria igualmente direcionada contra os mais corruptos partidos: PMDB e PSDB. Mas por que não vemos panelas gritando contra eles?

Ora, porque no fundo achamos que a opulência e a riqueza lhes cai bem. Acreditamos como natural FHC ter um apartamento em Paris, afinal ele era um acadêmico, mas não aceitamos um igual a nós com um modesto sítio em Atibaia ou um Triplex mixuruca em Santos. Acreditamos que o “mentor supremo de um mega escândalo de corrupção” aceitaria migalhas desprezíveis para colocar seu pescoço a prêmio. Acreditamos na “falta de prova como a prova definitiva“, apenas porque não suportamos a (falta de) estética do povo.

Na verdade acreditamos em qualquer coisa capaz de nutrir nossos preconceitos, os quais se assentam sobre o desejo, e não na razão.

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Denúncias e Fanatismo

moro-globo

Aos poucos a Internet se dá conta do fiasco absurdo e inédito dos patetas do Ministério Público Anti-Lula. É inacreditável que operadores do direito que um dia pisaram numa faculdade como estes procuradores (eu não tenho provas disso, mas tenho convicção) tenham sido capazes de tamanha irresponsabilidade. Fazer um show midiático e terminar assumindo publicamente a inexistência de provas ficará para a historia como o maior vexame dessa instituição.

E eu achava que nada poderia… ser mais vergonhoso e primário do que confundir Hegel com Engels… ou Carlos Magno com o rei Arthur. A desmoralização que esses jovens produziram no MPF entra no anedotário nacional e mancha a sua seriedade. Que Deus nos livre um dia de sermos acusados com tamanha leviandade e desonestidade como Lula e sua família foram. Se essa é a verdadeira face da instituição então estamos todos correndo o risco de recebermos denúncias vazias e carregadas de desejos e motivações políticas. Espero que essa vergonha seja o golpe definitivo contra a partidarização dos espaços jurídicos da nação.  

Por favor… essa é a pior demonstração de nosso subdesenvolvimento. Tentem imaginar um Ministro da Suprema Corte americana – ou mesmo o juiz que julgou o caso O. J. Simpson – dizendo em frente às câmeras: “Não temos as provas de que esse crime foi cometido mas, bolas… Foda-se, eu tenho convicção. Vamos condená-lo!!!”.

Conseguem entender como isso é escandaloso?

 Conseguem perceber como esse tipo de brincadeira com a justiça rebaixa o Brasil aos olhos do mundo? Conseguem perceber que não é por acaso que sofremos um golpe e agora o governo se esforça ao máximo para caçar aquele que simboliza a reação a essa barbárie contra a democracia? Moro é contestado, por seu partidarismo e seus métodos, em todo o mundo civilizado. Mas… se você procurar publicações de países com vocação ditatorial ele será certamente tratado como um “homem forte”. Este tipo de personagem é sempre deletério em médio e longo prazos. O poder concentrado mais cedo ou mais tarde se torna despótico e corrupto. Por isso mesmo eu votaria contra o PT nas próximas eleições: para arejar o poder. Moro não passa de um autoritário com costas quentes, pois em qualquer país decente do mundo ele estaria preso.

Para quem acha que “vale a pena para acabar com a corrupção” lembrem que TODAS as ditaduras, das mais suaves às mais cruéis, começam com essa retórica. Depois de estabelecidas elas descambam para o terror e, por vezes, o genocídio. A democracia levada a sério, por mais lenta e custosa que pareça, é sempre o caminho mais seguro. Infelizmente a “torcida organizada” pelo juiz Moro (torcida que há pouco tempo era para o esquecido Barbosa, lembram?) oferece o campo ideal para ações afastadas da legalidade e da equidade.

Repetindo: em que país civilizado se permitiria a escuta privada (mesmo que não fosse ela o objeto inicial) de um presidente?

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Comentários

demonio

“A seção de comentários das notícias é o que o demônio lê todas as manhãs em busca de novas ideias para o dia”

Que Deus nos perdoe por tanta maldade

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Nova Direita

A indefinição e a postura dissimulada caracterizam o novo discurso dos conservadores, que, aliás, foi predominante nos carnacoxas. “Eu não tenho partido; meu partido é o Brasil” (o que lembra o governador Sartori, do RS, em sua indefinição proposital). Outra muito comum é “esquerda ou direita não me definem“, mas a gente já sabe – há décadas – que quando um sujeito rejeita essas definições ele é, seguramente, de direita e conservador.

Esta tática nada mais é do que um “descompromisso” discursivo, e junto com ele ganha-se a possibilidade de se manter franco atirador. “Atiro no PT e depois me refúgio atirando balas de festim no Aécio, Cunha ou Renan, pois sei que essas não machucam ninguém, mas fazem barulho e me oferecem a máscara da isenção. Ninguém vai me cobrar que eu bato panela só contra a esquerda, né?

Essas manobras da direita buscam uma espécie de isolamento crítico cujo objetivo é sempre colocar o outro como fanático, enquanto simula um discurso de equidade e parcimônia. Para essa nova estratégia lembro de Brecht: “Dos rios dizemos violentos, mas não dizemos violentas as margens que o oprimem“. Calar-se diante das encruzilhadas tentando com sua mudez oferecer uma imagem de sobriedade apenas favorece o lado mais forte.

O silêncio dos opressores não é sabedoria ou moderação, é conveniência a favor da estagnação.

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Terêncio e o Humano em nós

terencio

Uma das formas corretas de entender o drama humano é honestamente colocá-lo dentro de si mesmo. A radicalidade dessa tarefa expressou-a Públio Terêncio Afro ao dizer sua famosa frase “Sou um homem e nada do que é humano me é estranho“. Peço especial atenção à última palavra dessa frase que já percorre os séculos, sempre se mantendo atual.   A palavra “estranho” vem do latim “extraneum“, de extra, aquilo que vem de fora. O “estranho” – assim como seu derivado “estrangeiro” – está fora de nós, não compartilha ideias, idioma, conceitos e valores. É um alienígena, não humano.  

Uma das formas mais corriqueiras de persuadir um interlocutor à aderir aos seus argumentos é desumanizar seu opositor, tratando-o como louco, estúpido, assassino ou insano. Vê-se diariamente na forma como tratamos os “terroristas” palestinos, os governantes de quem não gostamos, os abusadores ou os adversários de qualquer ordem.

Na ficção usa-se a loucura para justificar condutas que o trânsito pela sanidade impediria, e nas novelas existe um número imenso de personagens que se refugiaram na absoluta falta de lucidez para cometer crimes e desatinos. A loucura é uma forma de desumanização, por colocar o sujeito fora de um padrão lógico semelhante ao nosso. O louco vira “estranho”, alguém diferente de nós, que não se adapta ao nosso modo de ver e sentir o mundo.  

A importância da frase do ex-escravo de origem bérbere se deve à sua visão profundamente humanista. Para ele o que é o humano não está fora do sujeito; pelo contrario, é compartilhado com todos os que pertencem à grande família humana. Assim sendo, não apenas a beleza, a virtude e o amor nos são comuns, mas também o ódio, a vingança, o egoísmo, o orgulho e o todo o mal de que somos capazes. Desta forma, os assassinos, canalhas, estupradores, abusadores, vigaristas, meliantes, gênios e anjos, todos estão dentro de mim a fazem parte do que sou. O que você vê agora é muito mais obra de contexto e circunstância do que virtude ou perversão. Somos uma construção única, inacabada e complexa, onde nosso Eu é o resultado de experiências de tempos distantes em choque com as múltiplas faces com que o universo se apresenta.  

Diante do absurdo de um massacre, o abuso de uma criança, a violência explícita ou a expressão crua do horror é útil lembramos da extensão da frase de Terêncio. Ela nos lembra que o mal que nos causam estes relatos não se dá por serem estranhos, mas – paradoxalmente – por encontrar ressonância dentro de nós. O horror é parte do que nos constitui como humanos, pois somos feitos de sombra e luz, magia e mistério, pureza e podridão.  

Ao analisar os relatos cotidianos da miséria humana é sensato encará-los como parte dos atos que nós mesmos lançaríamos mão diante de circunstâncias semelhantes. Desumanizar o outro serve apenas para ignorá-lo e, assim fazendo, ignorar o que existe de confuso e contraditório em nós mesmos.

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Sócrates e Epicuro

socrates

O primeiro jogou no Corinthians, mas na época não tinha essa barba. O segundo jogou no infantil do Madureira, mas rompeu o menisco esquerdo num carrinho maldoso por trás e teve que abreviar a carreira. Ambos foram colegas na Faculdade de Filosofia (mas naquele época era Philosophia) e fizeram bons trabalhos de conclusão, pelo menos eles passaram a vida divulgando suas ideias. Eles tiveram muito seguidores apaixonados.

epicuro

Em sua despedida da escola de Philosophia Sócrates escreveu sobre “O não saber-se quem se é-se“, um épico do desconhecimento absoluto de si mesmo. Enquanto isso, seu colega Epicuro resolveu dedicar-se a um tema que lhe foi muito próximo, por isso apresentou o tema “A ataraxia e meu joelho – a inutilidade da filosofia nas rupturas meniscais“. Tanto Sócrates quanto Epicuro foram aprovados com “C”, mas apenas porque as fotos que usaram na apresentação eram de baixa resolução. Banca de TCC é sempre essa aporrinhação.

Ambos desistiram de Filosofia. Sócrates, como sabemos, dedicou-se ao futebol mas faleceu por efeitos da bebida. Epicuro teve vários empregos, mas no fim da vida trabalhava como plastificador de estátuas e escovador de cães em pet shops de Aricanduva.

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Túnel do Tempo

Parto realizado no Hospital da Aeronáutica de Canoas em 25 de março de 1992. Parabéns aos pais pelo lindo parto e pela filha, que veio trazer alegrias e esperanças.

Repetindo, para que não reste dúvida: o parto, como componente da vida sexual normal de uma mulher, será SEMPRE palco de disputas. Negar estes conflitos, entendendo o parto como evento meramente mecânico e biológico, serve aos interesses daqueles que historicamente oprimiram as mulheres fazendo delas objetos de troca. Aceitar que a visão sobre o parto muda no tempo e nas latitudes nos permite sonhar com uma era de pleno protagonismo e segurança para o nascimento.

A quem interessa impedir esse sonho?

“O parto vai congregar de forma exemplar todos os valores que circulam no campo simbólico. Sendo um aspecto da sexualidade feminina sua expressão será tão livre quanto livre for a mulher no tempo e espaço no qual ocorrer. Não existe parto livre em sociedades opressivas com as mulheres, e ele jamais será violento em um lugar onde a mulher sabe o papel fundamental a ela destinado pela vida.”

Esse parto aconteceu no HACO, hospital da aeronáutica em Canoas no ano de 1992. A paciente me trouxe essa cópia, a qual pude assistir quase 1/4 de século depois. O privilégio de atender nascimentos por 34 anos foi o maior presente que eu poderia imaginar para uma vida. A todas as mulheres que me ensinaram sobre o milagre da vida através dos seus partos os meus mais calorosos agradecimentos.

Ha 24 anos o simples fato de ser um parto de cócoras causava horror na comunidade médica. Tamanha era a repulsa por qualquer método “alternativo” de atenção ao parto que até hoje, duas décadas e meia depois, o parto deitado e imóvel ainda é ensinado nas universidades e serviços obstétricos anacrônicos da minha cidade como se fosse a única forma possível – e aceitável – de atender um parto. A pesquisa “Nascendo no Brasil” mostrou que 91% dos partos no nosso país acontecem nessa posição, que há décadas sabemos ser prejudicial para ambos, mãe e bebê.

Imaginem como os meus colegas me olhavam naquela época, e terão uma ideia do ódio e ressentimento que os “donos” do parto aqui na província sempre cultivaram por mim.

Parto realizado no Hospital da Aeronáutica de Canoas em 25 de março de 1992. Parabéns aos pais pelo lindo parto e pela filha, que veio trazer alegrias e esperanças.

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Humaniza

escadaria

“Para mudar o mundo é necessário coragem para produzir o enfrentamento necessário, resiliência para suportar os ataques inevitáveis e sabedoria para entender as dores que surgem como elementos de uma trilha natural de crescimento.”

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