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Sexualidade masculina

Vocês bem sabem que não sou psicólogo, psiquiatra ou mesmo da área psi. Tudo o que falo é por que sou velho, e os velhos acumulam informações e pensamentos em demasia. Estes, ao mesmo tempo que queimam os folículos pilosos da cabeça, precisam de expressão sob pena produzirem constipação e gases.

Li agora uma placa numa escola americana sobre o “dress code” das alunas, dizendo que cada vez que a escola reclama do comprimento do short – ou da alça do sutiã das meninas aparecendo – estão perdendo uma oportunidade de educar os meninos de que as garotas não são “objetos sexuais”.

Desculpem ficar chocado com isso, mas eu realmente não entendo como pode este discurso ser ainda tão prevalente.

É claro que os abusos devem ser coibidos e até punidos, em especial na escola, pois ali temos crianças em formação. Devemos impedir ao máximo que meninas tenham seus corpos tocados ou invadidos sem autorização. Devemos educar sobre “body shaming”, “slut shaming” (desculpem os anglicismos) e qualquer ato que desmereça as meninas e suas capacidades. Porém…

Meninas são objetos sexuais e não há o que se possa fazer sobre isso. É da nossa constituição psíquica desejá-las. Pedir para um adolescente parar de olhar para as meninas como objetos sexuais faz tanto sentido quanto solicitar a um gay que não tenha pensamentos… gays.

As mulheres são objetos de desejo dos homens desde os primórdios, e só por isso estamos aqui. Por outro lado, é claro que não gostamos da palavra “objeto”, pois ela coisifica pessoas, entretanto o erro está apenas quando REDUZIMOS alguém à condição de objeto, quando todas as suas outras dimensões subjetivas, sociais, emocionais e espirituais são apagadas para ressaltar apenas sua “persona sexual”. O mesmo é feito com os proletários, retirando deles a condição de sujeitos e reduzindo-os apenas a engrenagens inominadas de uma máquina de produção. Portanto, não está na essência, mas na forma como objetualizamos alguém, e na extensão dessa coisificação.

Mas o que me apavora é a ideia que existe por trás deste tipo de cartaz. Parece que, pela brutal incompreensão do que seja a sexualidade masculina, algumas pessoas imaginam ser possível perverter sua expressão para um modelo mais “adequado”, “civilizado”, ou quem sabe mais “feminino”. E veja, não se trata de modificar os modos machistas que ainda persistem – com o que todos devemos concordar – mas mudar a própria essência do desejo objetual masculino, fazendo os homens deixarem de desejar as mulheres, suas formas e seus encantos.

Quem em sã consciência consegue imaginar alguém em uma escola doutrinando meninos adolescentes para que não olhem e não sonhem com as meninas sem que isso esteja em um sketch de comédia juvenil?

Acho que ultrapassamos os limites quando ao invés de combatemos o machismo, a violência de gênero, os abusos, as humilhações e as agressões culpamos a própria sexualidade masculina, como se ela fosse, “equivocada” e suja. A modernidade produziu uma noção curiosa: o desejo masculino heterossexual é o “desejo errado”. Ao invés de tentarmos coibir o machismo e suas ramificações na cultura procuramos inutilmente anular o próprio desejo masculino, o que me parece apenas sexista e criminoso.

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Mister Bento e João Gilberto

Depois que o Mister Bento teve seu xaveco revelado nas redes sociais ele veio a público fazer uma declaração onde se diz arrependido e pede “desculpas” por seu erro. “Afinal, errar é humano”, disse ele.

Diante desse singelo pedido de escusas, eu pergunto: desculpas pelo quê e para quem? Pelo que vi da conversa ele foi respeitoso, não baixou o nível, não agrediu e não atacou a moça. Foi, talvez, um pouco insistente, mas nada além do jogo de vai-e-vem da conquista. Se a moça tivesse achado que a conversa era abusiva não o teria chamado de “querido” e teria deixado de responder. Não, apenas deixou claro para o rapaz que ele “não era seu tipo”. Aliás, uma conversa que provavelmente acontece todas as noites em milhões de danceterias espalhadas pelo mundo onde se pratica o jogo da sedução.

O que chama a atenção na conversa não é nenhum “erro”, mas o discurso que desvela uma auto estima espetacularmente alta, ilimitada, de alguém que toma a negativa da menina como algo inconcebível. Ele me lembrou imediatamente Gastón, o personagem musculoso de “A Bela e a Fera”, que não conseguia acreditar que a pequena Belle não se deixasse encantar pelos atributos físicos do homem “mais lindo da aldeia”.

Mas… por que pedir desculpas por mostrar-se como verdadeiramente é, despido das capas sociais de ocultação? Por que deveria pedir perdão por dizer o quanto se acha lindo, maravilhoso, belo e talentoso? Por que deveria se desculpar pela desabrida imodéstia? Se essa demonstração de vaidade pode ser desagradável aos nossos sentidos, certamente não é ofensiva ou violenta. Por qual razão deveria ele, então, pedir perdão?

Perdão pelo xaveco? Pela cantada? Pelo convite para saírem? Perdão por “se achar”? Por mostrar sua “nudez” emocional na intimidade de uma conversa? Pela autoimagem exaltada e magnificada?

Não faz sentido para mim. Não há o que se desculpar.

Isso me lembrou uma velha piada atribuída ao genial João Gilberto.

O já famoso João Gilberto recebe antes do seu show um jovem aflito em seu camarim. Diz o jovem bastante nervoso ao cantor:

– Preciso de um favor seu. Estou com uma garota que há anos tento conquistar. Descobri que ela é sua fã e consegui comprar ingressos para uma mesa bem próxima do palco. Se você viesse me cumprimentar depois do show acho que isso a impressionaria. Meu nome é Ricardo. Poderia me ajudar?

João Gilberto sorriu ao entender o plano do rapaz. Sabia ele que ser íntimo de um cantor famoso deveria garantir muitos pontos na luta para conquistar uma mulher. Concordou com sua ideia e se despediram.

Terminado o show, seguido de efusivos aplausos, lembrou da promessa e se dirigiu à mesa onde Ricardo estava com a vistosa loira de decote hipnótico e generoso. Acercou-se de ambos e com um sorriso cumprimentou o “amigo”.

– Então Ricardo, que bom que você veio. E pelo visto trouxe uma linda jovem.

Ao ouvir as palavras do pai da Bossa Nova, Ricardo franziu o venho e disparou:

– Não posso conversar não, João. Depois falamos. Agora estou conversando com a Rita.

Moral da história: ser amigo de João Gilberto pode lhe dar pontos, mas esnobá-lo quebra a banca.

Da mesma forma, receber uma cantada do “homem mais lindo do Rio Grande“, pode inflar seu ego, mas esnobá-lo e expor sua vaidade a todos, tornando pública uma conversa privada e exibindo a intimidade de uma conversa (mesmo com o risco de humilhar alguém que não lhe fez mal algum) pode lhe jogar às alturas. Melhor ainda: ninguém vai questionar a ética dessa atitude, pois todos ficarão focados na auto estima gigantesca do Mister Bento, tanto quanto Ricardo e João ficaram hipnotizados pelo decote de Rita.

Quem deveria pedir desculpas?

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