Desmistificar o parto e garanti-lo às mulheres permite que ele seja vivido em sua plenitude, com suas características subjetivas e suas possibilidades transformativas.
Outro elemento essencial diz respeito a livrarmos a atenção ao parto de todo o ranço patriarcal e toda a violência que ainda o caracteriza. Dia haverá em que o nascer em paz e liberdade será a regra e a indignidade de atos agressivos contra a mulher será apenas uma página triste na história dos direitos humanos. Para que isso ocorra faz-se necessário questionar toda violência, visível ou invisível, assim como todas as ações de misoginia – ideológica, institucional ou estrutural.
Esta é uma luta que vale a pena lutar. Precisamos ultrapassar a etapa de ter liberdade para fazer escolhas e entrar na era de ter conhecimento e informação para fazermos boas escolhas.
Chiamaka Mugambi, “Letters to Nairobi” (Barua kwenda Nairobi), Ed. Kalunga, pág 135
Chiamaka Mugambi, nasceu em Nairobi no Quênia em 1953, no início da Guerra Civil no país, também conhecida como a “Rebelião Mau Mau”, a Emergência Queniana ou a Revolta Mau Mau. Esta foi uma revolta contra o governo colonial britânico no Quênia, que durou de 1920 a 1963, entre o Exército Terra e Liberdade do Quênia (Kenya Land and Freedom Army – KLFA – também conhecidos como “Mau Mau”) e as autoridades britânicas. Por esta razão Chiamaka – filha de um funcionário britânico e uma queniana – mudou-se para a Inglaterra, onde passou sua infância e realizou seus estudos, formando-se em enfermagem no ano de1978. A partir dessa data começou novamente a estreitar laços com suas origens na África, visitando o país por várias vezes para estudar as práticas de assistência ao parto produzidas pelas “mkunga”, parteiras tradicionais do seu país de origem. A partir desse retorno às suas origens, Chiamaka começou a questionar as práticas ocidentais e a hiper medicalização do parto, mostrando como a extremada artificialização do evento produz uma desconexão entre as mulheres e suas funções fisiológicas mais profundas e constitutivas. Escreveu um manual de assistência ao parto baseado nessa experiência para ser distribuído em swahili e inglês, chamado “Mãos na Terra” (Mikono Duniani), que se tornou um sucesso entre as estudantes de parteria do Quênia. Posteriormente escreveu “Cartas para Nairobi” (Barua kwenda Nairobi) onde descreve em primeira pessoa suas aventuras na redescoberta do parto “as it really is”.