
A expectativa de vida dos médicos é muito menor do que a população em geral. Para homens 70 anos, para mulheres menos ainda. Câncer é uma das principais causas. Por que esta profissão é uma escolha mortal?
O estilo de vida dos médicos é profundamente doentio. A luta por vaidades, dinheiro, posição social, domínio, “cargo”. Excesso de trabalho associada a uma imagem de infalibilidade. Medo dos processos, da culpabilização, da humilhação pública pelas redes sociais, medo de perder o status, de perder ganhos. Medo dos chefes de hospital, medo de perseguições no ambiente de trabalho. Medo dos conselhos, via de regra anacrônicos e corporativistas ao extremo.
Raiva dos calotes, dos planos de saúde, das glosas. Raiva dos pacientes que nos desafiam, dos colegas maldosos, da enfermeira que boicota seu trabalho, da burocrata do hospital que não entende sua conduta.

Frustração por ter sido um pai ausente. Pior ainda, uma mãe relapsa com seus filhos. Depressão por um paciente que morreu e as acusações descabidas de uma família envolta em dor. Tristeza por não conseguir salvar quem se queria. Mágoa pela ingratidão de alguns pacientes. Ódio da falta de material, pela super lotação, pela sobrecarga de trabalho, pelo dilema entre atender rápido ou no tempo correto, deixando a fila se avolumar.
Angústia pelo porvir. Pelos filhos que mal viu, pela mulher que vai deixá-lo, pelo marido que vai encontrar outra, pelos pacientes que nunca mais voltaram, por uma fofoca que andam dizendo por aí, pela mentira absurda sobre um caso que atendeu, por ter deixado um sinal claro passar despercebido. Pelo erros cometidos, pelas falhas das quais se envergonha, pelos esquecimentos, pelos lapsos, por não lembrar o nome da paciente de tantos anos.
Pela falta de esperança de que vai melhorar, pela medicina capitalista e insensível, pelo excesso de drogas, pelo buraco na alma onde se jogam remédios, pelo excesso de exames mentirosos, pelas práticas indecentes, pelo mercantilismo, pelas cirurgias desnecessárias, pelo anacronismo dos tratamentos, pela coisificação dos pacientes, pela objetualização de seus corpos, pela pressão da indústria, pela traição dos colegas, pela falta brutal de reconhecimento pelo esforço.
E…. mesmo assim é preciso seguir. Para muitos médicos o passo em frente é apenas por encontrarem no meio de tantos escombros a chama diminuta que um dia, nos idos da infância, os fez sonhar em dedicar a vida no trabalho de ajudar.