Existe algo recorrente na Internet, desde que a escrita se popularizou nas mídias sociais, que é a crítica – mordaz e preconceituosa – com os erros cometidos por quem se expressa em português. Hoje mesmo uma senhora perguntava “Por que está geração tem tanta dificuldade de se expressar em português?” criticando as falhas gramaticais das mensagens recebidas em um debate.
Bem, em verdade eu creio que as pessoas não tem dificuldade para se expressar em língua portuguesa, tanto é que não é difícil – via de regra – entender o que está escrito. O que as pessoas não conseguem – ou não desejam – é se expressar através daquilo que denominamos “norma culta”, o português “clássico”, que adota a rigidez das construções gramaticais e ortográficas e obedece as suas regras de concordância verbal e nominal. A questão é que, escrever de forma “não culta” não é “errado”, pois este é um conceito equivocado quando tratamos de organismos vivos e mutantes – como as línguas. Veja, não seria justo dizer que “uma cobra é um animal errado por não ter pernas”, porque apesar de não ter pernas as cobras são adaptadas perfeitamente ao seu meio ambiente. E essa adaptação é o que conta…
Desta forma, ao falar ou escrever não existe “erro”, mas pode existir “inadequação”, pois este conceito tem a ver com os contextos e as circunstâncias. Como exemplo, não cabe escrever em uma dissertação de mestrado “quando tu vim aqui“, mas é aceitável falar assim em uma conversa de boteco. O sentido da língua é a conexão entre os sujeitos, que precisa de um mensageiro (quem fala), um receptor (quem ouve ou lê) e um meio comum a ambos (o idioma). Se estas etapas são respeitadas a vinculação à norma culta é secundária, e por vezes desnecessária.
A questão é que esta adesão à linguagem mais sofisticada produz a exposição da divisão de classes. Se você falar “a gente fomos na praia” fica evidente que sua classe social é mais baixa e é exatamente isso que produz rejeição, e não o bom ou mau uso da língua. O modo como falamos funciona como os dentes incisivos: se você não os têm demonstra onde se situa na hierarquia das castas sociais; se você não fala como a burguesia expõe a todos que não se insere nela, e está relacionado(a) ao proletariado.
Na internet esta correção ostensiva da forma de escrever é reservada aos “grammar nazis”. Se querem um conselho, não se juntem a eles. Não é um lugar legal.