
Quando pensamos em retirar as estátuas que homenageiam mercadores de escravos, racistas inveterados, matadores de índios e ditadores eu me pergunto sobre o que fazer com as “Estátuas Virtuais” erigidas a grupos que impuseram terror, genocídio, limpeza étnica e massacres e que ainda hoje são glorificados através de um processo de “limpeza cultural’, que transforma monstros em heróis e crimes contra a humanidade em atos de bravura.
Lembro muito bem das séries de TV da minha época, onde os “colonos” com suas carroças, mulher e filhos loiros rumavam para o Oeste cheios da paixão pela aventura e plenos de coragem para enfrentar os perigos de uma terra selvagem.
Só muitos anos depois pude perceber o engodo dessas narrativas. Em verdade, nós poderíamos com toda a justiça chamar “Os Pioneiros” mais corretamente de “Os genocidas invasores de terras indígenas”.
Sim, eles nada mais eram que selvagens, assassinos, ladrões de terra e genocidas que produziram limpeza étnica de dezenas de nações indígenas nativas da América do Norte, herdeiras das populações Clóvis. O livro “Enterre meu coração na Curva do Rio”, de Dee Brown, deixa muito claro como tudo ocorreu – e o nível inacreditável de crueldade desse genocídio norte americano.
Todavia, a imagem que nos chegava era completamente diferente dessa dura realidade. “Daniel Boone”, “Os Pioneiros”, “Rin tin tin”, etc, eram programas que tentavam retratar estes invasores e assassinos como “bons cristãos”, “cidadãos de bem”, com suas Bíblias e carroças levando a palavra de Cristo aos selvagens. Estas séries se ocupavam de fazer uma limpeza da história, transformando invasores em “colonos” – como se estivessem ocupando terras vazias – enquanto os indígenas eram retratados de duas formas básicas: o “índio ruim”, cruel, bárbaro, traiçoeiro e vil, ou então o “bom índio“, domesticado, civilizado, de feições ocidentalizadas, que auxiliava os brancos e aceitava docilmente sua submissão à invasão europeia.
Em verdade, os índios que moravam nas terras à oeste por mais de 100 séculos foram massacrados por sujeitos movidos pela ganância e pelo desrespeito à posse das terras dos “first nation” – nativos da América. Não há outra forma de descrever as “Guerras Indígenas” americanas com um nome diferente de “massacre colonialista”.
Assim fala a Wikipédia sobre o massacre iniciado pela “Corrida do Ouro” em direção ao “Wild West” durante o século XIX:
“O Genocídio dos povos indígenas dos Estados Unidos durante o século XIX, que resultou no massacre de milhões e na destruição irreversível de várias culturas, feito sob a alegação de uma guerra justa, ou guerra indígena, teve características próprias, que diferem o que aconteceu nos Estados Unidos do que aconteceu no restante da América. A limpeza étnica do oeste americano tornou-se política oficial do governo americano, que passou a declarar guerra às tribos indígenas sob qualquer pretexto.
Assim os apaches foram destruídos pela ação do exército americano após a entrada de mineiros e bandidos no território dos apache. A eliminação dos índios também foi defendida por dificultarem o trabalho dos empreiteiros e empresários de ferrovias que construíam e cortavam suas terras com a nova malha viária, ou como uma forma de se desobstruir o solo das planícies, destruindo suas culturas de subsistência, substituídas por lavouras comerciais em contato com os mercados consumidores através do novo sistema ferroviário.
Os indígenas foram paulatinamente empurrados pelo governo americano para territórios cada vez mais áridos, inférteis, isolados e diminutos. O antigo “Território Indígena”, que cobria a superfície de 4 estados da União, acabou sendo abolido e trocado por pequenas e esparsas reservas indígenas.
Em um discurso diante de representantes dos povos indígenas americanos em junho de 2019, o governador da Califórnia, Gavin Newsom, pediu desculpas pelo genocídio cometido em seu estado. Newsom disse: “Isso é o que foi, um genocídio. Não há outra maneira de descrevê-lo. E é assim que ele precisa ser descrito nos livros de história.”