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Futebol, arte e imagem

Nesta época do ano os clubes de futebol no Brasil fazem as principais contratações para a temporada. Com a injeção que as Ligas recém criadas estão fazendo no futebol, alguns clubes receberam somas muito grandes de dinheiro referentes aos direitos de televisionamento. Com isso, para as estrelas que devem chegar, são prometidos salários inacreditáveis como 2 milhões de reais mensais, ou o salário de quase 2 mil trabalhadores. Eu sei: paga quem quer, ninguém é obrigado a consumir. Entretanto, as somas são impressionantes, e sempre me fazem lembrar da “Febre das Tulipas”.

Este fenômeno merece uma consideração. Por que tanto dinheiro investido em futebolistas? Pagar 2 milhões mensais para jogadores medíocres (ou seja, comuns) é a medida justa da nossa neurose, e o quanto o capitalismo, ao nos sonegar o sonho da riqueza e do sucesso, nos faz gozar através do sucesso alheio. A glorificação de jogadores de futebol, mas também do tênis, golfe, xadrez, basquete, basebol assim como antigamente o foram os gladiadores e esportistas de todo tipo, mostra que usamos destes artifícios – o circo – para anestesiar o sujeito comum, oferecendo a ele uma felicidade tão fugaz quanto alienante, já que o sistema o mantém alijado de conquistas próprias. “Você continuará um inútil, pobre e medíocre, mas seu time será campeão e seu ídolo vai conquistar as mulheres (ou os homens) que você tanto sonha”.

Aliás, li agora mesmo que o ator “exilado” em Portugal Pedro Cardoso escreveu algo na mesma linha ao dizer que se vende muito mais Beyoncé do que Tracy Chapman. Apesar de preferir a cantora de “Fast Car” à intérprete de “All the Single Ladies”, ele reconhece que Beyoncé vende muito além do que apenas sua música. Ela expõe sua vida pessoal, sua vida sexual, seu casamento, suas posses, seus perfumes e produtos, suas fofocas (ela recentemente “trocou de cor”) e seu cotidiano incrível de mulher milionária. Ela faz parte do pequeno e seleto universo de mulheres tão etéreas que sequer fazem cocô…. apenas sublimam.

Já a Tracy Chapman vende apenas arte, e através dela, seu modo especial de ver o mundo. Ela lança sobre o mundo seu olhar cheio de poesia e crítica social. Quem realmente se importa? Para quem consome o “pacote celebridade” este é um produto muito menos valorado. “Sim, mas não tem um escândalo, um “bafão”, um namoro secreto, um divórcio milionário?”Não – diz ela constrangida, apenas a minha arte, música, minha sonoridade. Desculpe” . Sim, nós não queremos arte. Queremos a gloriosa projeção que o artista nos oferece, sua fortuna, suas lágrimas, seu prêmios, sua vida fantasiosa de glamour. Queremos a vida dela, não seu olhar sobre a vida. Queremos ela, não sua arte.

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Quer apostar?

Uma forma fácil de comprar jovens entusiastas na construção de um mundo novo é oferecer apoio e financiamento para seus sonhos. As ONGs brasileiras ficaram tão viciadas e dependentes do dinheiro das agências imperialistas que não sabem viver sem ajuda dos capitalistas transnacionais. Estes não podem sequer ser criticados. Afinal, o que pode haver de errado em grupos de capitalistas que desejam auxiliar mulheres, transexuais, combater a pobreza ou lutar pela erradicação da fome? E de que importa a origem desse dinheiro? Em função destas esmolas multinacionais, e dos cheques polpudos que eles depositam nestas instituições viramos um paraíso de ONGs sedentas de dinheiro ofertado por “americanos bonzinhos”, como Gates, Buffet ou Soros (que não é americano, mas parece). Criticar um dinheiro que vem “de graça”, a partir destas agencias de fomento – que em verdade são gigantescos “think-tanks” liberais – passou a ser uma atitude estúpida, ou no mínimo suicida. Eu mesmo passei há pouco tempo pela experiência de criticar uma agência de fomento de projetos para mulheres e, como recompensa, recebi ataques, assédio e o definitivo afastamento da ONG pela qual me dediquei por décadas.

Um fenômeno semelhante de silenciamento está ocorrendo na grande mídia brasileira nos dias de hoje, A partir do surgimento da Internet, as grande empresas de apostas esportivas conseguem burlar as legislações nacionais sobre jogos de azar porque a sede de seus negócios se encontra em países onde o jogo não é ilegal. Desta forma, pouco importa a proibição que o Brasil impôs aos Cassinos desde 1946 pelo presidente Eurico Gaspar Dutra, que resultou no fechamento de famosas casas de jogos como a do Copacabana Palace, o Palace na cidade mineira de Poços de Caldas e o cassino de Petrópolis. Hoje em dia as apostas são virtuais, recebidas por gigantescos computadores distribuídos pelo mundo todo. Já é possível perder dinheiro sem sair de casa, comendo pipoca embaixo de edredom enquanto torce olhando para a TV pela aposta que realizou, e não mais pelo seu time do coração. Hoje assisto tristemente amigos torcendo pelos seus investimentos nos resultados, deixando em segundo plano o seu próprio time. O futebol se tornou um jogo solitário, onde você se torna o jogador/apostador, e a própria qualidade do esporte passa a ser uma questão de menor validade. O que vale é chegar na segunda feira sendo um vencedor, nem que seja apenas nas apostas que fez.

O futebol moderno já está infestado de empresas multinacionais de apostas, e se torna difícil imaginar como seria possível obstaculizar esse tsunami de grupos empresarias que as exploram. Estão por toda a parte e inclusive já patrocinam clubes de futebol, tudo sob o olhar da FIFA, das confederações nacionais e de uma imprensa que quase nada fala, não critica, não questiona e não tenta analisar o quão deletério pode ser para o futebol a mistura de esporte e jogatina. Escândalos estão pipocando por toda a parte mas a imprensa esportiva tupiniquim ainda não deu a este tema a devida seriedade, exatamente porque foi totalmente comprada por estas empresas. Para confirmar esta constatação basta assistir os analistas de futebol no YouTube e ver que seus comentários têm o patrocínio de KTO, MyBET, Betano, Bet365, Betpix, 1XBet, etc…

Uma exceção digna de nota é a matéria assinada pelo colunista PVC sobre o tema, anunciando que o próximo escândalo no futebol de grandes proporções virá do mundo obscuro das apostas. Ao mesmo tempo, praticamente todos os Youtubers que tratam do tema futebol profissional são financiados por casas de apostas virtuais. Seus negócios dependem do patrocínio que recebem destas casas de jogo. Assim… o silêncio é comprado, e bem baratinho.

Estamos entrando numa fase do “futebol negócio”, totalmente despregado da paixão clubística, afastado das motivações iniciais que os criaram, apodrecendo os clubes por dentro e desvirtuando jogadores. Todavia, essa nova face do futebol mega empresarial carrega a semente venenosa de sua própria destruição. Mas… ainda acredito que a morte do futebol moderno, em sua vertente ultra capitalista e elitizada, deverá ser algo a ser comemorado, para o próprio bem do esporte.

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