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Amor

Há alguns dias li uma entrevista do baixista John Paul Jones do Led Zeppelin em que ele afirmava que os integrantes da banda não eram amigos. “We weren’t friends”, disse ele secamente. Com isso não desejava dizer que eram inimigos, longe disso; negou que existisse qualquer tipo de animosidade, rancor ou mágoa entre eles, mas que apenas eles compartilhavam uma banda, tinham um trabalho juntos, e nada mais. Tão logo acabava uma turnê ou uma apresentação voltavam para suas casas e suas vidas.

“A questão é que nunca socializamos. Assim que saímos da estrada, nunca mais nos vimos, o que sempre achei que contribuiu para a longevidade e harmonia da banda. Não éramos amigos.”

O falecido psicanalista italiano Contardo Caligaris certa vez disse uma frase que me impactou muito durante uma de suas aulas na APPOA. Em meio a sua palestra, e questionado sobre o casamento e suas repercussões, ele respondeu de forma provocativa: “O casamento é uma instituição de sucesso. Entretanto, o único elemento que pode colocá-lo em risco é o amor. Sem este detalhe ele sempre foi a mais harmoniosa das instituições humanas”. Essa frase veio à minha mente ao ouvir a descrição de John Paul Jones sobre sua banda. Por certo que a inexistência do amor – em sua forma mais sofisticada, a amizade – seria capaz de oferecer sucesso e longevidade à banda. A amizade transtorna completamente qualquer relação de trabalho. Por isso, se acrescentarmos a este encontro uma pitada – mesmo que minúscula – desse afeto tão popular e o risco do equilíbrio se desfazer cresce exponencialmente.

Não deveria nos produzir qualquer surpresa este tipo de análise. O amor por sua potência é uma força descomunal. Quando ele se mistura com as relações puramente profissionais acaba trazendo consigo toda sorte de sentimentos conflitantes e igualmente poderosos. Ciúme, inveja, ressentimento, abandono, raiva, mágoa, etc. Não há dúvida que os casamentos insossos e puramente operacionais dos tantos séculos que nos antecederam eram muito mais consistentes e firmes do que os de hoje, onde o amor é a peça essencial. Foi o amor, a fissura bizarra da ordem cósmica, quem produziu o que entendemos por humanidade, mas ele está diretamente ligado à crise nos casamentos. Talvez ele seja o golpe definitivo para a sua desaparição, e as sociedades futuras não terão mais que se preocupar com fatiotas, grinaldas, vestidos brancos e listas de presentes.

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