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Brits

Quando eu era pequeno, e ainda mais na infância do meu pai, a influência da Inglaterra era enorme na cultura do Brasil. Não foi a toa que minha família paterna saiu de Manchester e veio para cá há 100 anos: o império tinha muita influência por aqui. Dizer que um carro, um casaco ou um produto qualquer era inglês significava garantir sua qualidade. A Inglaterra, no ocaso da era vitoriana, era vista como o centro intelectual do mundo. Entre outras coisas eles, estabeleceram no Brasil uma prática chamada “preço inglês”. Hoje parece muito comum passar na frente de uma loja e olhar os preços de um produto, seja na vitrine ou na etiqueta com código de barras, mas nem sempre esse foi o padrão. Em países de cultura árabe, ainda se negociam os preços diretamente com os vendedores, hábeis artistas na arte da negociação e do desconto. Quando se viaja para alguns lugares – como o Marrocos – a gente percebe que o preço dos artesanatos, calçados, roupas só é definido na conversa com o vendedor. Já vi preços caírem de 100 para 10 nesse tipo de arte.

O problema é que esse tipo de negociação, onde o valor dos produtos varia de acordo com o comprador, exige muito do vendedor, em termos de talento e tempo. Com a evolução do comércio ficou mais fácil colocar uma etiqueta com uma margem variável de lucro e evitar tanta negociação e tanto tempo despendido para cada venda. Meu pai chamava isso de “preço inglês” e dizia que os jornais anunciavam as lojas da cidade garantindo que os produtos tinham essa precificação. Quem saia de casa já sabia o valor que pagaria por qualquer produto, sem precisar negociar com o vendedor.

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Lembrei disso porque países ligados à “British Commonwealth“, como a Índia e a África do Sul, decidiram não participar da reunião convocada pelo Rei Charles e comparecer à reunião dos BRICS, demonstrando a crescente perda de protagonismo britânico no planeta. Hoje em dia a Inglaterra não tem mais a influência de antes, e não passa de um “puxadinho” dos Estados Unidos, um cãozinho velho e banguela carregado na coleira pela política externa americana; os anos de glória da realeza britânica estão agora definitivamente no passado. O que outrora foi um Império sanguinário, poderoso e extenso – onde o sol jamais se punha – hoje não passa de uma nação decadente, com graves problemas internos, subserviente ao poder imperialista e sem a importância geopolítica de outrora.

Os declínios são da ordem natural das coisas. Primeiro os sumérios, fenícios e egípcios; depois com a Grécia e Roma na idade clássica; mais tarde os franceses, ingleses e agora os americanos. Quando vejo a derrocada da importância da Inglaterra no planeta fica ainda mais claro para mim que nenhum sistema opressivo é eterno, e o consórcio americano israelense, que durante 80 anos nos pareceu sólido, imponente e invencível, será derrubado mais cedo ou mais tarde. O planeta não aceitará por muito tempo a perspectiva supremacista, racista e genocida de Israel. Hoje este país já é um pária internacional, rejeitado por 90% da população do mundo, sendo apoiado apenas pelos governos imperialistas burgueses. Essa situação não pode se manter por muito tempo. Em que época do mundo um exército qualquer procurou as crianças como alvo para suas balas? A barbárie homicida de Israel um dia acabará, e o destino deste país está selado: pode levar mais um ano ou uma década, mas o sionismo será enterrado definitivamente, e o apartheid será apenas uma triste memória para o planeta.

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Propinas

Minha crítica a esse instituto tipicamente americano de dar “tips” (gorjetas, propinas) para as tarefas mais braçais e diretas vem de longa data. Lembro bem de um filme com Brad Pitt em que ele tenta oferecer uma ajuda em dinheiro a uma dupla de árabes que ajudaram sua mulher a se salvar e a expressão de assombro de ambos ao rechaçar a oferta. “Como assim me dar dinheiro por fazer minha obrigação? Como poderíamos agir diferente?”.  

Já pensou que ninguém dá gorjeta para médicos, advogados e engenheiros? Também ninguém da gorjeta para o cozinheiro, que igualmente ganha muito mal. Entretanto, a gente dá gorjeta para o garçom, o entregador de pizza e o taxista. No fundo a cultura da gorjeta é um tratamento preconceituoso e que desonera o patrão. E digo mais… assim como acabou no mundo todo também está acabando nos Estados Unidos. Esta semana li um artigo na Time sobre a mudança nesse cenário partindo de redes de restaurante que estão adotando uma estratégia que “nunca ninguém pensou” (irony on): incluem a gorjeta na conta. Propinas não passam de um anacronismo.  

É como a adoção do “preço inglês” nos anos 30-40 em substituição à livre negociação. Antes as lojas não colocavam preço no produto e tudo era negociado diretamente, como ainda hoje ocorre em lugares como as Medinas de Marrakesh. Tente imaginar entrar numa loja de eletrodomésticos e “negociar” o preço com o vendedor. O problema é que essa estratégia toma tempo demais e por causa disso se adotou o chamado “preço inglês” que nada mais é do que o preço fixo do produto. Isso poupa energia e tempo, mas deixa a compra-venda menos artística e folclórica.  

Não há nenhuma razão para que a tradição das gorjetas se mantenha nos tempos modernos, mas a argumentação de que tal relação tem que continuar existindo porque “os salários são baixos” é a mais absurda possível. Ora… lutem por melhores salários!!!   Imagine contratar uma secretaria ou uma balconista e lhe dizer “O salário é baixo mas batalhe umas gorjetas que você pode ganhar melhor“.

Mas… como se “batalha” uma gorjeta? Ora… com as armas do constrangimento. Na verdade os trabalhadores (verdadeiramente mal pagos) raciocinam assim: é mais fácil pressionar e constranger o consumidor do que lutar contra os patrões poderosos. Essa é a receita para a exploração: empurrar a culpa pelos baixos rendimentos para o mais frágil na relação. No caso, aqueles consumidores que temem um motorista rude, um atendimento constrangedor ou uma comida mal feita e mal servida.  

Ah… mas falar isso aqui nos Estados Unidos é como questionar a virgindade de Nossa Senhora dentro do Vaticano.

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