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Desdentado

Meu notebook perdeu um dente. A tecla “alt gr” saiu da boca do teclado e foi ganhar o mundo sem suas irmãs. Apesar de ainda ser possível apertar o buraquinho que restou, achei que valia a pena consertar por razões estéticas. Liguei para o “Rei dos Notebooks” (nome fictício) e perguntei se faziam o conserto da tecla faltante. Disseram que sim.

Fui até a loja e mostrei o teclado banguela. O jovem funcionário coçou o queixo como fazem os obstetras olhando traçados de tocografia, olhou para mim e disse: “humm, vou falar com o técnico”. Deu três passos e parou. Olhou para mim e completou: “… mas já vou avisando que a troca custa 80 reais”.

Sorri e agradeci. Peguei o notebook de volta e coloquei na pasta. Antes de sair de casa pesquisei o preço de um teclado novo, deste modelo, caso fosse necessário trocar: valor com envio: 49 reais. O preço para a troca de uma única tecla que o funcionário me deu foi acintoso. O “Rei dos Notebooks” não ia lucrar comigo dessa forma.

Saí da loja e caminhei uma quadra quando vi uma lojinha minúscula onde se lia “conserto de computadores”. Era uma loja cheia de computadores, carcaças, CPUs e memórias RAM no balcão. Resolvi entrar para perguntar se ele trabalhava com “odontologia informática”. Mostrei a dentadura falha e o senhor imediatamente pegou uma caixa com uns 200 ou mais teclados velhos, de todos os tipos e formatos imagináveis, arrancou de um deles o “alt gr” e colocou a prótese no meu notebook. Quanto? 10 pila, 2 minutos de atendimento.

Saí da loja com mais esperanças na humanidade

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Volúpia da escrita

As vezes escrevo coisas duras porque me deixo levar pela volúpia da escrita. Enquanto bato nas letras escuto, no silêncio que separa as palavras, aquela voz conhecida que me diz: “Não é o momento“. Paro e olho para a tela, mas volto a maltratar o teclado e resisto. Em desespero ela volta a dizer “Estar certo não é o suficiente, pois a verdade não tem valor por si; ela precisa promover o bem“.

Reluto, mas sou de súbito tomado por um sentimento de dever, assaltado pelo medo de me calar quando deveria estar puxando as palavras de ordem. “Vai se acovardar?“, me pergunto. Consigo novo alento e termino a derradeira frase. No momento que minha mão se aproxima da tecla “enter” sinto um frio a percorrer a espinha, a sensação de culpa antecipada pela possibilidade de produzir dor e angústia com a ponta afiada de uma verdade. Leio de novo o pequeno parágrafo. Tento conversar com as ideias que eu mesmo coloquei à minha frente. Sou soterrado pela dúvida. A voz novamente me fala “Você consegue“, diz ela. “Sei que é capaz“.

Respiro fundo e apago tudo. Procuro fazer de uma vez só, para não cair na tentação de guardar um trecho na memória e voltar a escrever mais tarde.

Pronto, apagado. Um karma a menos para resgatar.

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