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Vingadores do presente

*atenção: contém spoilers*

Finalmente pude assistir com meus netos um dos meu filmes prediletos de ficção científica: Total Recall (no Brasil, “Vingador do Futuro”), da dupla Arnold Schwarzenegger – Paul Verhoeven, clássico que já completou 30 anos de idade. O filme se passa num futuro não muito distante em que o planeta Marte foi colonizado e suas minas de minério são exploradas por uma empresa privada da Terra, controlada a mão de ferro por um tirano chamado Cohaagen. No planeta as pessoas vivem enclausurados em uma redoma onde o oxigênio é racionado, o que, ao lado das péssimas condições sanitárias, produziu uma legião de seres mutantes. Por causa do sistema opressivo sobre a classe operária de Marte, criou-se uma força de resistência liderada por um mutante de nome Kuato, que vive na barriga de um outro sujeito (um esconderijo perfeito).

O filme lida com uma questão filosófica extremamente interessante: é possível mudar a essência de um sujeito? Seria possível mudar o caráter de um indivíduo, através de drogas, cirurgias, reprogramações, etc? O personagem Douglas Quaid (Arnold Schwarzenegger) anteriormente se chamava Hauser e era um escroque, um canalha amigo do governador corrupto de Marte. Através de um tratamento de “férias mentais” pela empresa “Rekall Inc.” ele se submete a uma transformação mental para se esquecer de sua personalidade passada e assumir uma nova, tornando-se um militante idealista para, infiltrado entre os insurgentes, poder se aproximar do líder dos rebeldes marcianos. Nesse processo, apaixona-se por uma mutante marciana chamada Melina. Tendo o líder mutante sido descoberto e morto, é hora de desfazer o processo e fazer Quaid (o idealista) voltar a ser Hauser (o infame e mesquinho braço direito de Cohaagen). Quando revelam a Quaid quem ele era no passado – alguém desprezível, interesseiro e egoísta – o novo sujeito se nega a retornar à personalidade anterior. Luta contra toda malta de corruptos de Marte, mantém sua nova “persona idealista” e libera a máquina alienígena que inunda o planeta de oxigênio, desta forma “terraformando” o planeta vermelho. Nesse processo salva os rebeldes da morte por sufocamento e fica com a morena bonitona.

Eu não entendo como é possível assistir esse filme e não se identificar com os rebeldes explorados, os sofridos operários de Marte, com suas mutações grotescas, falta de recursos, cicatrizes horrendas, degradação social e falta de oxigênio. Mesmo sendo a força motriz que produz a riqueza do planeta (o minério extraído) viviam enjaulados, expostos à radiação, enclausurados em seus guetos, sem direitos e sob o controle dos poderosos capitalistas. Sem o saber, Philip Dick, que escreveu o livro em que o filme se baseia, descreveu a situação de Gaza atual, onde o planeta Marte é a Palestina ocupada e os tiranos sionistas matam e aniquilam sem qualquer consideração pelas vidas humanas. Para os opressores e colonizadores “os mutantes/palestinos não são como nós, os escolhidos; deixe-os sufocar até a morte”.

Durante a rebelião pela libertação do povo marciano por certo que houve mortes de soldados do exército de Cohaagen, nas lutas entre o poder tirânico e as milícias dentro dos túneis de Marte, mas fica fácil entender que os rebeldes tinham o direito de lutar por sua liberdade e sua dignidade. A reação dos oprimidos é vista como natural e justa, por mais que se lamente as mortes que ocorrem. No final todos respiramos aliviados pela libertação dos oprimidos e a derrota dos colonizadores sem escrúpulos. Por isso é difícil para mim entender quem ainda critica a resistência Palestina e prefere que a força brutal dos colonizadores racistas vença a guerra. Como conseguem se identificar com os guerreiros pela liberdade na ficção e não conseguem enxergam a mesma dinâmica na realidade, vendo a resistência do povo massacrado há 75 anos na Palestina ocupada? Roger Waters tem razão em criticar os fascistas que vão ao seu show. “Cantaram minhas músicas por anos e nunca entenderam nada”. Pois eu digo que estes que ainda apoiam o Estado terrorista e racista de Israel ainda não entenderam nada sobre dignidade e luta de um povo.

PS: nem falei da Sharon Stone como a vilã mais gostosa da história da ficção científica.

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Arquivado em Palestina, Pensamentos