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Santa Ceia*

“Ahhh, eu a-do-rei da abertura das Olimpíadas, principalmente porque a extrema direita está furiosa!!”

Sério? Não podemos mais cometer o crime da ingenuidade. A extrema-direita do mundo inteiro está dando gargalhadas com a abertura das Olimpíadas. Claro, não todos, mas em especial aqueles da direita que são responsáveis pela manipulação dos fatos e pela propaganda dos valores conservadores (e aqui defino conservador como aquele que conserva a dor daqueles a quem oprime). Precisa ser muito tolo para não entender que este clamor identitário, e essa manifestação de “diversidade” são esforços gigantescos da direita e dos liberais para domesticar a esquerda, retirando dela qualquer característica de enfrentamento aos modelos econômicos vigentes. É preciso enganar essa franja imensa de “esquerdistas” que se dedicam a temas que não afetam a estrutura política e econômica das sociedades, mas que nos oferecem a ilusão da transgressão, do avanço e do progresso. Para essa direita, a esquerda ideal é aquela que perde tempo discutindo pronomes e “paradas gay”.

Ora, quanta ingenuidade. Aliás, o mesmo tipo de propaganda mentirosa que tentará identificar a feroz direitista Kamala Harris (casada com um ferrenho sionista) com a “esquerda”, apenas por ser mulher e não-branca. “Vamos entupi-los com discussões estéreis sobre “life style”, liberdade sexual, pronomes, releitura da história, derrubada de estátuas, orientação e identidade sexuais, e impedi-los de debater a obscenidade da distribuição de renda no planeta, a miséria crescente, a concentração indecente de riqueza, as guerras imperialistas, as 200 mil pessoas mortas em Gaza, a guerra absurda da OTAN na Ucrânia e o declínio político, moral e econômico do capitalismo“.

Um sujeito de direita minimamente inteligente, esperto e maquiavélico perceberá a genialidade da manobra diversionista do identitarismo, e o esforço que foi feito pela França para que esta fosse a questão debatida por todos, e não a decadência da antiga potência imperial e o fracasso do governo Macron. Este sujeito de direita com algum discernimento agora está rindo sozinho e pensando: “Conseguimos enganar todos esses tolos. Agora eles pensam que a verdadeira luta é por gays, travestis, transexuais e costumes em geral e deixarão de nos atacar por um bom tempo em nosso ponto fraco: a luta de classes. Vencemos, pelo menos por enquanto, até que a esquerda venha a acordar do seu delírio liberal. Mas, de minha parte, continuarei a fazer cara de bravo com a tal da “Santa Ceia” para que ninguém perceba o meu alívio!!” 

* Sim, a encenação da abertura das Olimpíadas Paris 2024 não se refere à Santa ceia, mas a “Festa dos Deuses”, de Jan Harmensz van Biljert, pintada no século XVII, por volta de 1635, e que está exposta no museu Magnin na cidade de Dijon. Não é Jesus Cristo quem está no centro da imagem (a moça gordinha), mas Apolo sendo coroado, e em primeiro plano está Dionísio, pintado de azul. Entretanto, para a análise acima isso não faz diferença alguma, pois o objetivo do artista foi chocar através da exposição da diversidade. O objetivo dessa análise é apontar que este tipo de narrativa interessa à direita, como manobra de diversionismo, para evitar que a esquerda se posicione de forma propositiva no combate ao capitalismo, origem primeira dos males da humanidade.

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