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Razão

Se as pessoas agissem racionalmente, usando a plenitude do pensamento iluminista no seu cotidiano, a humanidade que surgiria a partir desta ação seria algo absolutamente irreconhecível por nós. Sequer poderíamos chamar tais indivíduos de “humanos”, pois que a contradição entre as emoções e o pensamento racional é o que nos constitui enquanto sujeitos, na divisão essencial da alma humana. Somos formados por um núcleo de medos atávicos, primitivos e pulsionais, cobertos por uma camada de crenças irracionais que, apesar de não nos livrarem dos medos, nos oferecem uma couraça de proteção diante do caótico da vida. Por sobre esta camada de crenças se estabelece uma fina camada de racionalidade, transparente e diáfana, como um verniz intelectual, porém suficiente para nos oferecer a arrogância de pensar que suplantamos nossa herança animal e transcendemos ao mundo luminoso da razão.

Francesco Cacciatore, ” l’umanità in una lolla di riso” (A Humanidade numa casca de arroz), Ed. Volare, pág 135

Francesco Mário Cacciatore é um sociólogo italiano nascido em Florença em 1946. Filho do famoso antropólogo florentino Giuseppe Cacciatore, ele estudou no conservatório de Florença e se formou em Ciências Sociais em 1972. Sua dissertação foi sobre a luta de classes na sociedade italiana pós fascista. Sua contribuição à sociologia se dá em especial no estudo das populações de imigração africana que aportam na costa Amalfitana. Escreveu vários livros da área sociológica, em especial “Tornando a Casa” (De Volta para Casa, Ed. Barrett) sobre o retorno de imigrantes da Etiópia na Itália retornando para África após o fracasso da aventura em terras europeias. Francesco Cacciatore mora em Torino, é casado com Giulietta Berlese e tem dois filhos, Mário e Isabel.

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Calabouço dos desejos


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Das minhas motivações sei eu; as dos outros, só eles mesmos poderiam saber. Também não carrego a esperança de um dia entendê-las ou descobrir-lhes a intimidade, pois sequer os autores dos crimes mais hediondos as conhecem plenamente.

Fico feliz de saber que as pessoas  que condenam os sujeitos (e não seus atos) o fazem agindo pelo primado da consciência e jamais tenham feito algo de forma claramente irracional e irrefletida. Nestes momentos é que percebo que durante toda a minha vida muito me afastei da lucidez e da clarividência das condutas acertadas pois que 99% das minhas ações diárias tem quase nenhum controle consciente.

Minha racionalidade é mesmo um verniz intelectual, uma fachada altiva que me dá a sensação de afastar os medos e as superstições através de uma ilusão de controle, mas que funciona como um soberano cuja imponência apenas esconde sua fragilidade.

Somos governados pelas sombras e as vozes mais poderosas que proferimos vem dos porões úmidos e frios, e não das altas e ensolaradas torres.

Condenar os que se afastam do nosso horizonte de ações não nos torna superiores, mas demonstra o quão limitado é o nosso conhecimento da alma humana no que ela guarda de luz, penumbra e profunda escuridão.

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