Presentes da Vida

Barriga-de-grávida
O quanto de desejo se esconde numa barriga?

O quanto de desejo se esconde em uma barriga?

Poucas mulheres, percentualmente, chegam ao meu consultório “planejando” engravidar. A ideia de uma preparação prévia, que poderia ser o modelo mais racional possível,  não é o mais prevalente. A maioria das mulheres chega à primeira consulta com um papelzinho na mão e um sorriso maroto nos lábios. As explicações são variadas, mas contém uma linha que pode ser percebida nos espaços dos discursos. “Não estávamos pensando para agora, mas já que veio, que seja bem recebido“. Ou então “Ah, estávamos com uma relação cheia de idas e vindas, e eu acabei engravidando numa dessas voltas“. As gravidezes nos surpreendem mais do que seria de esperar. Afinal, se temos tanta informação, como podemos cair nas artimanhas de uma gestação “fora de hora”?

Todavia, existe mais em nossas ações do que a fina e tênue camada de racionalidade que nos recobre. O que eu percebo, de forma clara e intensa, é que o desejo é o mestre soberano a comandar nossas ações. Essas determinações inconscientes são o vento que empurra a embarcação da vida, e a nossa consciência não passa de um tímido leme, pequeno e frágil, que apenas corrige, quando possível, as rotas sopradas.

Aliás, ainda bem. A previsibilidade racional da vida sempre me assustou. Quando vejo a ponta do desejo aparecendo na teia do cotidiano eu penso na arquitetura inconsciente que arbitra a existência, para além do pensado e planejado. Como diria uma colega psicanalista, “não existem gravidezes indesejadas, apenas aquelas em que o desejo não ascendeu à consciência“. E, nas gestações assim como em outros aspectos da sexualidade humana, a libido se manifesta à despeito da vontade expressa, comandando nossa vida adiante do que as conveniências determinam. Se pode ser adequado, tanto do ponto de vista da saúde como dos aspectos logísticos, um planejamento gestacional, eu ainda consigo ver uma beleza recôndita nas surpresas que a vida reserva, pois elas mostram a roupagem mais humana que vestimos.

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