Quando eu estava entrando na adolescência visitava famílias muito pobres na vila Restinga ou no morro Santa Teresa em Porto Alegre. As pessoas nos esperavam com a casa arrumada para receber algum auxílio para si e para os filhos, além de fazermos juntos uma oração. Era a chamada “Caravana Auta de Souza”. Quando chegávamos à casa delas era visível a precariedade e a falta de recursos, mas igualmente notável o capricho, o asseio, o cuidado e o respeito que tinham pelas suas poucas posses, e a preocupação com a nossa presença. A ideia que tenta associar pobreza com porquice é apenas uma mentira, uma jogada oportunista e tosca para gerar identificação.
Bolsonaro cria uma “ficção de pobre”, uma alegoria caricatural criada pelo seu preconceito com as camadas proletárias da sociedade brasileira. Aquele sujeito sujo, descuidado e emporcalhado é a imagem que ele próprio tem dos pobres, que confunde com vagabundos, descuidados e sem higiene.
O retrato triste que celebra o ocaso da tragédia bolsonarista diz muito mais do Bolsonaro, sua família, seus preconceitos de classe e sua ignorância sobre o proletariado brasileiro do que sua descrição dos pobres de quem ele, ingenuamente, tenta se aproximar.