Sim, é possível que Jesus – filho de Maria e José – não tenha sequer existido, como afirmam vários estudiosos, e com argumentos bem consistentes. Por outro lado, pode ser que o fato de não ser encontrado nos relatos de escribas até 1 século após sua passagem pela terra, tenha uma explicação bem mais simples, e muito mais plausível: Jesus foi – em sua época e no século que se seguiu à sua morte – absolutamente desimportante, assim como o foram os mais de 400 autoproclamados Messias de sua época, todos eles considerados “fracassados” pelo próprio povo judeu, que conectava a figura do Messias prometido à necessária libertação do jugo romano. Essa hipótese é interessante e bem razoável e, para aqueles que duvidam de sua possibilidade, temos aqui mesmo no Brasil um exemplo bem próximo e típico da “criação de mitos” que comprova o uso político de figuras do passado.
Sim, ele mesmo: Tiradentes. O alferes Joaquim José da Silva Xavier foi totalmente esquecido após sua morte e “ressuscitou” um século depois de sua execução, para ser usado como símbolo para os republicanos em sua luta para derrubar o império. Sua memória dormiu por cem anos e foi trazida do mundo dos mortos – com inaceitáveis cabelos compridos, barba e semblante crístico, criação do pintor Décio Villares – para ser usado politicamente, como o Cristo da mais “Nova República do Novo Mundo”.
A história de Tiradentes é uma cópia da própria narrativa de Cristo “o salvador”, com direito à um traidor, via crucis, apóstolos, a luta pela liberdade contra o opressor, a exposição pública de sua morte e a posterior sobrevida de suas ideias. Uma narrativa clássica dos heróis que pode ser encontrada em diversas épocas da história, e em várias latitudes.
Desta forma, assim como Tiradentes foi trazido de volta como mito para liderar um movimento político, por que o mesmo não seria feito com um obscuro palestino e sua mensagem direcionada aos pobres, miseráveis e oprimidos? Nada mais justo e lógico.
Se hoje Jesus pode ser visto como alguém que pegaria uma pistola para defender o direito à propriedade privada, por que não poderia ter sido de outras formas transformado – e até desfigurado – nestes 20 séculos passados desde a sua partida?
Ainda acredito que o “Jesus histórico” realmente existiu, mas suas lendas e mensagens são basicamente criações coletivas humanas produzidas por aqueles que o seguiram. Aliás, exatamente como fazemos com qualquer mito humano, de Zoroastro a Lula. Suas existências podem ser verificadas, mas suas obras são construções culturais carregadas de acréscimos e supressões destinadas a levar adiante projetos e visões de mundo do tempo em que vivemos.