Muitas pessoas colecionam arrependimentos durante a vida, mas vamos combinar que não é possível atravessar o charco da vida sem embarrar os pés. Eu também tenho a minha lista de erros constrangedores, que poderiam ser organizados em lista alfabética, mas sobre eles eu tenho outro sentimento, igualmente pernicioso: a vergonha.
Sim, eu tenho vergonha principalmente por ter cedido a uma tentação terrível, que muitos sequer reconhecem como um defeito, mas que é tão grande a ponto de destruir potencialidades incontestes: a tentação de agradar.
Sim, tenho vergonha de ter dito certas coisas apenas porque sabia que isso ia agradar meus interlocutores. Fico corado ao lembrar das vezes em que falei determinadas palavras sabendo da satisfação que colheria de quem as escutou. Isso é a melhor definição de “lacração“: a ideia que suas manifestações serão aceitas e bem recebidas não pela verdade que contém, mas pelo efeito emocional que geram nas pessoas que as escutam. No meu tempo a isso se chamava “jogar para a torcida“, uma prática corriqueira entre os políticos, mas que atrasa o crescimento pessoal e coletivo.
Hoje eu me envergonho muito de ter aceito a imposição da opinião alheia, de ter acolhido a pressão do contexto, de não ter falado verdades inconvenientes, de não ter sido mais impopular do que já sou. “Mea culpa, mea maxima culpa”.
Meu pai, quando ficou velho (pelo seu próprio critério subjetivo) costumava dizer algumas verdades dolorosas e depois complementava: “Já tenho X anos; conquistei o direito de ser sincero”. Eu ficava satisfeito de poder ouvir alguém que me dizia coisas pouco agradáveis e que o fazia mesmo sabendo que a recepção não seria das melhores. Isso foi algo que invejei demais e que me fez acreditar na promessa das “benesses da senectude“.
Hoje eu creio que, se algum valor há em envelhecer, talvez este seja alcançar o lugar onde é possível ser fiel a si mesmo.