Pesadelo

Meu pesadelo renitente:

Estou em um programa de auditório, tipo Sérgio Groisman ou outro qualquer deste formato, e durante um debate o apresentador volta sua atenção para mim, que estou sentado silenciosamente na plateia. Com o dedo apontado na minha direção ele pergunta:

– E você, o que pensa sobre este tema? Concorda ou discorda?

Imediatamente aparece um microfone a meio palmo da minha cara. Durante uma fração de segundo eu penso nas alternativas. Depois de escutar as palavras dos debatedores percebi que existe uma versão que acompanha o senso comum, aquela que a maioria das pessoas, ou a média da população, valoriza e aceita. Existe também a versão do programa, que as perguntas do apresentador demonstraram ser a perspectiva da emissora ou do poder que a controla. Existe, por fim, o que eu penso, que – via de regra – é uma posição contra-hegemônica, politicamente incorreta, impopular e que desagradaria praticamente a todos, do público aos entrevistados.

Por alguns instantes olho para o infinito cósmico pensando se devo escolher o aplauso insípido e amorfo da concordância ou a fogueira flamejante da reprovação. Diante de mim um dilema claro: a sinceridade e a fidelidade aos meus princípios vale o preço de ser linchado publicamente por um tema que sequer tem tamanha relevância? Por outro lado, de que me serviriam essa fugaz popularidade, esses aplausos anódinos e essa aprovação popularesca, se não for pela expressão de algo que penso, sinto e vivo?

O apresentador insiste.

– Então? e repete a pergunta como seu o meu problema fosse auditivo e não o drama de uma escolha complexa entre duas perspectivas dolorosas.

Penso mais… se eu falar o que todos querem ouvir, como poderei me encarar sabendo que minha escolha apenas escondeu minha fraqueza, a covardia de se erguer, o medo de subir na classe e dizer a todos de peito aberto o que carrego como valor. Porém, se disser aquilo que penso – a minha verdade pessoal – expressão dos valores que cultuo, como suportar as críticas, o desamor, o desprezo, as costas se virando e a fuga dos amigos?

– Bem, no meu modesto ver….

Acordo. Existem sistemas psíquicos de segurança que atuam até na fantasia dos sonhos, que previnem os desastres, nos protegem dos dramas insolúveis e resguardam nossa sanidade emocional. Entretanto, toda vez que vejo alguém enfrentando esse dilema ao falar em público, eu bem sei que as palmas que se seguem foram, muitas vezes, às custas do silêncio das verdades guardadas, palavras escondidas, cuja manifestação foi trancada no peito pelo medo das dores que poderiam provocar.

Qualquer um diz o que todos desejam ouvir; só os bravos e fortes dizem o que querem falar.

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