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Ultrassom

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Outra sensação agradável em contraposição ao meu notável e inexorável envelhecimento físico: minha mente ainda mantém boa parte dos atrevimento da juventude. Há mais de 25 anos eu denuncio os abusos de ecografias pela obstetrícia ocidental, questionando a validade do exagero e as desvantagens econômicas, médicas e relacionais deste uso.

No podcast do Dr. Stu desta semana ele se reporta a um artigo publicado no Wall Street Journal que expõe o uso excessivo de ecografias sem a contrapartida de melhorias nos resultados pós-natais, tanto para mães quanto para bebês. Aos poucos o cerco se fecha sobre esse “modismo”…

Todas as nossas pacientes grávidas já tiveram a oportunidade de escutar a minha explicação sobre os “três tipos de ultrassom”, quais sejam: médico, sedativo e recreativo. Apesar de soar como uma “restrição” essa explicação faz parte da informação que precisa acompanhar qualquer negativa ou consentimento de exame. É importante que as pacientes e seus(suas) companheiros(as) saibam exatamente do que se trata e quais os limites de uma investigação como esta. Por isso, quando as perguntas recaem sobre a “translucência”, “a morfológica”, a “ecocárdio” – além daquelas típicas “pra ver se está tudo bem” – elas já sabem que receberão uma longa explicação conjugada com a minha visão sobre os riscos inerentes de tais exames.

Felizmente hoje escutei a opinião do meu colega “homebirther” americano, que mais pareceu uma telepatia transoceânica, explicando que se limita a pedir apenas UMA ecografia entre 18 e 22 semanas de gestação e com as mesmas razões que oferecemos às pacientes: certeza do sítio placentário, análise de malformações graves e confirmação da idade gestacional. Mas a justificativa que ele fornece para este pedido único de ultrassom é a mesma que damos: “Só peço porque algumas pacientes planejam partos domiciliares”, que é a mesma ressalva que fazemos para as pacientes que pretendem parir com seus cuidadores (enfermeiras obstetras) em ambientes extra-hospitalares.

Os rituais contemporâneos da medicina, por serem sustentados por elementos pré-racionais e ligados ao desejo, são complexos e, por vezes, impossíveis de eliminar em curto prazo. Episiotomias, enemas, tricotomias e ultrassons são apenas alguns exemplos. Todavia, quando observamos a inexistência em nosso meio de “virgens queimadas” por uma colheita ruim percebemos que os rituais, por mais fortes que sejam, um dia enfraquecem até que, por fim, desaparecerem. A racionalidade é uma luz que nos guia em meio à treva, e que mesmo custando tempo e vidas, um dia vence as resistências e ilumina o pensamento.

Práticas abusivas e exageradas podem levar séculos para serem eliminadas, mas um dia serão apenas páginas amareladas da nossa longa história de equívocos na assistência.

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