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Despedida

Bye bye

A partir de amanhã não faço mais parte do Portal “V. Mamífera”. Durante o tempo em que lá estive pude exercitar minha vontade de escrever, conjugada com uma necessidade praticamente insana de exorcizar pensamentos e ideias. Em função da minha inabilidade com as limitações políticas da escrita, e o desejo de dizer abertamente e sem anteparos a verdade de minha mente, acabei ferindo suscetibilidades de algumas parceiras do Portal que se sentem incomodadas com a minha presença, a ponto de exigir a minha expulsão. Meu pensamento, livre de amarras ideológicas e aberto para o embate no terreno das ideias, deixou algumas companheiras decepcionadas, o que acho respeitável e compreensível. É provável que na posição delas eu sentisse o mesmo. Entretanto, há alguns meses eu escrevi que faz parte de uma trajetória séria o cultivo de algumas decepções. Mais ainda, disse que “a não gostância dói, mas a unanimidade maltrata ainda mais“. Ser colocado numa posição de expectativa oblitera a liberdade de expressão, e é um castigo que não mereço.

Assim sendo me despeço dos colegas que cultivei e peço desculpas àqueles que decepcionei. Continuarei meus escritos solitários em meu futuro blog onde as pessoas poderão entrar se desejarem ler o que eu escrevo. Peço perdão se minhas palavras feriram alguém, mas no embate das ideias isso pode ocorrer a qualquer momento. É inevitável que o atrito gere calor, que para muitos é insuportável. Minha saída objetiva, acima de tudo, manter ativo um portal que foi construído com muito carinho pela doula Kalu Brum com o desejo de estimular o debate sobre partos e nascimentos no Brasil.

Sobre a fonte da discórdia, não retiro nada do que disse, porque mantenho minhas posições ainda hoje, mesmo admitindo que um dia argumentos melhores possam fazer que sejam alteradas. Continuarei na minha luta, cada vez mais pessoal e isolada, pelo pleno protagonismo da mulher nos seus momentos sagrados de gestar, parir e amamentar. Vou me manter fiel à LIVRE escolha, sem constrangimentos, das pessoas que ELA decide como acompanhantes. Continuarei escrevendo sobre a beleza de um nascimento protegido pela aura sublime da paz, que se conquista passo a passo em cada parto atendido com dedicação e envolvimento. Por outro lado, não me calarei diante dos exageros, da insensatez, da violência, da censura, e da tentativa de cercear a liberdade de pensamento em nome de ideários sectários. Não é calando a boca de alguém que se estimula o debate, e nada se constrói sem o choque dos contraditórios, que energizam o caminho e as conquistas.

Afastar os homens do cenário do nascimento pela constante desconsideração de suas vozes, criando um ambiente negativo e violento, só pode produzir a fragmentação de um movimento, o que atrasa seu progresso. Os opositores, os que fazem parte do “mainstream” do parto cirúrgico, sempre se divertem com essas brigas intestinas. Para os amigos que entenderam minhas posições, principalmente no que tange às diferenças entre “machismo” e “patriarcado“, eu espero que compreendam a atitude de minhas colegas. Para elas, absorvidas na luta diária por um mundo com mais equidade, minhas palavras parecem se contrapor ao que pensam. Não é o que eu disse, e muito menos o que eu penso, mas entendo que no seu ativismo uma voz dissonante (e não discordante) possa desestabilizar as suas lutas.

Obrigado pelo tempo em que pude compartilhar este espaço.

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Trashing

saturno

O artigo anexado – escrito em 1976, quando a honra de alguém levava mais tempo para virar cinzas – nos mostra o significado do “trashing”, ou como se destroem reputações e se joga na lama antigos parceiros que ousam pensar diferente e que vocalizam suas ideias de forma aberta e clara. Sempre que o “movimento”, a “causa”, a “irmandade” são maiores do que as pessoas que os compõem (ou combatem) teremos o que se chama “pensamento totalitário“. Quando Stálin mandava matar centenas de “tavarish” com um simples e prosaico golpe de caneta, em nome da “grande mãe Rússia”, ele também não se importava com o camponês que tinha 4 filhos, era casado com Olga e se chamava Vladimir. Não, o sujeito perdia sua face e sua história diante da “causa maior”. Entretanto, sem o respeito à cada uma das pessoas que vivem nesse planeta como portadoras de um elemento sagrado – sua individualidade – só o que teremos é o terror e o desprezo como elementos de controle social.

A expressão que mais se repetiu no recente episódio da perseguição contra mim (que ousei diferenciar patriarcado de machismo), curiosamente dita por doulas e ativistas dos direitos da mulher, foi “não passará“, uma provável alusão ao “Senhor dos Anéis”, quando Gandalf, o mago, grita da beira de um penhasco para um ser diabólico que tenta alcançá-lo em uma ponte. “You shall not pass!” diz ele levantando seu cajado ameaçadoramente. Pois a frase parece ser plena de sentido nos recentes acontecimentos. Para que a causa tenha sucesso os debatedores contrários aos dogmas do “movimento” são reduzidos a demônios maléficos, imbecis e uma série de outros adjetivos facilmente encontrados quando se procura desonrar um adversário. Para estes seres do mal nenhuma pena é pouca ou suficientemente dura.

Afinal, aquele que trai os nossos sonhos não merece menos do que a destruição de sua reputação.

O movimento feminista é, em alguns aspectos, igual a todos os movimentos de libertação do mundo, como o LGBT ou dos negros, mas em alguns aspectos é único em suas particularidades. Não vou falar o que as feministas devem fazer, mas ouso dizer que esmigalhar publicamente defensores da causa ou destruir reputações de irmãs do movimento jamais serão meios adequados de se alcançar justiça e equidade de gênero. A visão histórica (marxista) dos eventos sempre nos coloca face a face com os nossos dilemas e fragilidades. Não gostamos de falar disso. Não curtimos olhar para as falhas do passado e preferimos glamorizá-lo ou inventá-lo. Mas qualquer movimento que não se critica cristaliza e morre.

Nunca um artigo veio tanto a calhar no atual debate sobre o feminismo X humanização do nascimento. Sei que tê-lo publicado vai fazer incrementar o “trashing” pois os personagens descritos nele se parecem com algumas militantes mais violentas que conheci. O desabafo de muitas das vítimas deste tipo de perseguição poderia ter sido escrito por mim, e a dor e desesperança deles se parecem muito com as minhas. Espero que todos possam assimilar os ensinamentos contidos no episódio para que as ativistas não sejam obrigadas a castrar sua natural criatividade por medo da destruição subsequente de sua honra e imagem social.

Veja o brilhante texto “Trashing – O Lado Sombrio da Sororidade” aqui.

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