Diante do questionamento que surgiu a partir do brutal e estúpido assassinato de um cidadão que placidamente andava de bicicleta no Rio, muitas vozes furiosas clamaram por justiçamento, pena de morte e até linchamentos sumários. Isso me fez pensar nos clamores em Israel quando morre um soldado judeu e o silêncio brutal quando centenas de crianças palestinas morrem carbonizadas numa guerra desigual entre o mais armado exército do mundo e uma população prisioneira, sem armas e sem soldados.
A pergunta que cabe, reconhecendo a brutalidade do ato e a insegurança que todos sentem diante de um assassinato – e também a dor da família enlutada – é “o que podemos fazer de efetivo para combater essa e outras barbáries contemporâneas?“.
Primeiramente é preciso rechaçar o que é falso e “plantado” nas redes sociais com o único objetivo de gerar discórdia. Depois, é importante entender que esses debates não se resumem em um lado certo (nós) e um lado errado (os outros). Na questão da violência é fundamental se perguntar se as medidas preconizadas como solução ajudam a você (na sua necessidade de vingança) ou ajudam a todos, a comunidade inteira, a resolver (ou melhorar) um problema endêmico e de raiz estrutural.
De nada adianta eletrocutar esse menino pobre e negro; outros virão ocupar seu lugar. Não esqueçam que ele JÁ estava condenado; se não fosse preso agora dificilmente passaria dos 25 anos, vítima da guerra do tráfico. Ficar com raiva dele e santificar o “doutor” (que era alguém comum, como eu, mas acabou sendo pintado como santo) de nada adianta, e apenas aprofunda o fosso dos lados que se opõem no debate.
Precisamos mais policiais e mais inteligência no combate ao crime, mas é tolice imaginar que esse problema acaba com repressão. É MENTIRA. O tráfico não acabou nos Estados Unidos, e só cresce, mesmo com o aparato de repressão mais caro do mundo. O crime não deixa de existir porque policiamos a vida até o extremo. Não, ele existe – e se mantém – pela “sensação de injustiça” a que são submetidos os pobres, ao perceberem que a opulência oferecida a uma determinada casta nunca é oferecida à sua. Eles não se julgam bandidos ou malfeitores; pelo contrário, sentem-se heróis a combater uma injustiça, Batmans da favela, e nenhuma repressão vai fazê-los parar. Quanto mais apanham ou morrem mais cresce a indignação com o que consideram injusto e perverso. É por isso que o assassinato patrocinado pelo estado (pena de morte) ou pela iniciativa privada (chacinas e guerras de pontos de tráfico) nunca coibiu a violência e, mais ainda, contribui para o seu incremento.
É preciso mais do que raiva e indignação para resolver esta questão. Mais ainda, é necessário suplantar o ódio para encontrar uma resposta segura e sensata, que contemple o desejo de todos, e não apenas do nosso grupo.