Mas afinal, porque o parto sofre tantas intervenções na obstetrícia contemporânea?
É impossível analisar a importância da episiotomia na cultura ocidental sem levar em consideração a emergência da medicina no cenário da atenção e nos cuidados com o parto contrapondo-se à parteira no início do século XX. Para eliminar as parteiras do cenário do parto e tomar para si o cuidado do parto e nascimento fazia-se necessário convencer a sociedade dos perigos terríveis do parto quando deixado à própria sorte ou sob o cuidado das próprias mulheres – mães e parteiras.
Assim, era necessário fazer valer suas técnicas cirúrgicas exclusivas que visavam curar ou consertar um corpo entendido como defectivo. Toda a obstetrícia surge dessa elaboração ideológica que passa a entender as mulheres como intrinsecamente incompetentes e defectivas para as tarefas do parto. Como consequência, a obstetrícia expropria o parto e o nascimento das mulheres – os médicos passam a “fazer” os partos – domesticado sua potencialidade selvagem, por entender necessário impor às mulheres a realização de infinitas intervenções técnicas para deixar esse corpo – defeituoso, mal feito, fraco e perigoso – mais afeito ao nascimento seguro dos bebês, produtos sociais que usam as mães como contêiner temporário.