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Auto amor

Nas redes sociais são comuns as mensagens que tentam acalentar os egos dilacerados pela vida competitiva, corações cheios de percalços e derrotas desafiadoras. Esses textos procuram estimular a autoestima combalida das pessoas que sofrem da desconsideração que os outros fazem do seu trabalho, seu corpo imperfeito, seus afetos, sua maternidade, etc. Para isso apostam na auto exaltação, na visão positiva de si mesmos e na desqualificação das críticas maldosas e inconsistentes a que são submetidos . Ou seja… para não ser uma pessoa manipulada pela maldade alheia daqueles que não reconhecem seu “alto valor”, é preciso buscar o oposto, apostando na arrogância e, muitas vezes, no autoengano.

Essas dicas de “influencers” e apóstolos da autoajuda sempre nos servem quando estamos em sintonia. Os sentidos procuram avidamente palavras que se encaixem na nossa necessidade de acolhimento. Ora, é sabido que todos nós acreditamos que o mundo nos deve consideração, admiração e amor para muito além do que efetivamente recebemos. Estamos constantemente a cobrar do resto do planeta o que pensamos ser o nosso devido quinhão de felicidade e conforto – por eles sonegados. Para além disso, o mundo é, via de regra, injusto e severo demais com nossas pequenas ou grandes conquistas. Não recebemos o reconhecimento devido e ainda nos jogam uma crítica por demais feroz sobre nossas falhas e erros. Como lidar com tamanha injustiça?

A resposta a isso pode ser recolher-se em silêncio na humildade, entendendo que nossas virtudes, se forem reais, aparecem inexoravelmente com o tempo. Por outro lado, podemos gritar a plenos pulmões nossas qualidades imaginando que, assim agindo, conquistaremos corações e consciências. Estes são os extremos de nossa reação ao amor que (não) nos dão. Eu prefiro uma posição intermediária: creio que devemos ser humildes até onde nossa simplicidade afete o amor que devemos devotar a nós mesmos, e devemos ser exuberantes até o ponto em que a vaidade destrua nossos princípios. Essa é a lógica que imagino também ser adequada para criar os filhos: “Ame-os infinitamente, mas até o limite da falta, para que seu amor não destrua neles a necessidade de encontrar o amor por si mesmos”.

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Nunca mais

Há muitos anos uma paciente me contou que, algum tempo após se casar, viu seu marido desaparecer por várias horas. Quando confrontado, a explicação que deu de onde estivera não foi muito convincente. Uma amiga sua havia desaparecido na mesma hora, com uma explicação igualmente frágil, e ela imediatamente juntou as histórias. Na sua cabeça, mesmo que ambos negassem, algo havia ocorrido. Ela decretou o fim do seu casamento e assim o fez. Anos mais tarde, quando perguntei a ela o quanto de certeza tinha sobre aquele evento, e se considerava que realmente houve um encontro amoroso, ela me deu uma resposta muito significativa.

–  Não sei e não importa; hoje tenho certeza de que este fato não foi decisivo. O casamento havia terminado meses antes, e eu apenas buscava uma boa desculpa para dar fim àquela relação. Aquele fato – e só agora tenho essa clareza – serviu de forma oportuna para este fim. Mas foram necessários muitos anos para reconhecer essa verdade.

– Por que, então, seu casamento havia acabado? Se é que você sabe….

Ela suspirou e tentou colocar o sentimento em palavras.

–  A admiração se foi. Eu creio que o amor se sustenta por cuidado e admiração. Existe amor quando admiramos algo no outro: coragem, inteligência, beleza física, posição social, etc, algo que nos faz reconhecer uma virtude. Amar também é um compromisso de cuidado. “Quem ama cuida”, sabe? Eu deixei de admirá-lo porque ele não pareceu ter qualquer conexão com meu filho, nosso filho, e isso foi determinante. Sua distância e seu desinteresse mancharam a visão que tinha dele; estas falhas secaram a fonte de admiração que tive por tantos anos. Não houve nenhuma briga, nenhuma voz se levantou, nenhuma raiva; apenas uma pequena vela se apagou em meu coração, deixando tudo escuro.

Colocou as mãos nos joelhos e baixou os olhos para continuar

–  Hoje eu penso naquele fato mal explicado como um alivio; eu finalmente poderia dar corpo a um sentimento etéreo, diáfano, inexplicável e sujetivo. Durante muito tempo eu tive medo de confessar a ele minha infelicidade e receber como resposta um cliché desesperador: “Mas o que eu te fiz? Não te falta nada em casa. Eu nunca levantei a mão e nunca te tratei mal. Diga o que eu fiz!!”. Eu não teria nada para responder, pois não haveria como mostrar a ele o vazio que eu carregava no peito.

Eu achei a historia dela muito pedagógica, e a carreguei por muitos anos. Pensava nela sempre que tentavam me explicar a razão por terem rompido com alguém e fiquei convencido que nossos sentimentos são fugidios, enganosos, traiçoeiros e muitas vezes se escondem por detrás de fatos corriqueiros, pois admitir as reais motivações de nossas ações seria insuportável – ou pelo menos embaraçoso. É difícil admitir que nossas escolhas e desistências são por vezes causadas por egoísmo ou oportunismo, e por isso colocamos acontecimentos banais para carregarem por nós essa culpa.

Por outro lado, estas despedidas são sempre muito tristes. Já tive oportunidade de pensar sobre amigos que estiveram muito próximos e que, subitamente, vi desaparecer qualquer admiração. Nessas ocasiões meu sentimento sequer era de raiva, mas de luto, como a me defrontar com um triste adeus. “Não poderei jamais voltar a ser amigo dessa pessoa, nunca mais”. Sei que algumas histórias se modificam através do perdão, mas também sei que os vasos quebrados não retomam sua forma original. Algumas amizades lamento profundamente terem desaparecido do meu horizonte, mas reconheço que estas perdas são inevitáveis e fazem parte da trilha dolorosa e cheia de percalços que constitui nossas vidas.

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Pin Up Girls

Saudade das borracharias raiz, em que você entrava numa espécie de “clube do bolinha” onde as paredes eram forradas de imagens de mulheres seminuas, voluptuosas, curvilíneas e apetitosas, retiradas de revistas de “moda lingerie”. Nada era abusivo ou explícito – as imagens hoje passariam na Sessão da Tarde na Globo – mas o que valia ali a exaltação da beleza feminina, cuja admiração reforçava aos olhos alheios nossa adesão ao universo masculino.

Creio que, ao pregar uma “pin up girl” nas paredes engraxadas da borracharia, o sujeito sentia um notável alívio. “Enquanto você estiver aqui, minha Santa, ninguém poderá duvidar de mim”. Penso até que estas imagens funcionam como um salvo conduto, um passaporte para a boa imagem social, o mesmo que os mais admiráveis torturadores usavam nos “anos de chumbo”, indo à Igreja com a família aos domingos para depois passar a semana arrancando unhas de esquerdistas.

Por outro lado sinto falta do tempo em que a admiração pela beleza feminina era aceita sem culpa, quando o desejo por elas não era motivo de vergonha ou visto como forma de diminuí-las. Entendo que muito dessa beleza era usada para calar qualquer outra virtude, mas criminalizar o olhar de desejo não me pareceu jamais uma boa solução. A admiração e atração pelos corpos femininos é, ao meu ver, a própria exaltação da vida e do mistério profundo através do qual ela se multiplica

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Amor romântico

Não acho que amor romântico seja uma “ilusão”, acho apenas que ele ele é um fetiche que tem tanto valor quanto bunda grande, seios voluptuosos, carros esportivos ou peito cabeludo. Acreditar que ele é o “verdadeiro amor” é um erro; ele é tão somente uma forma de amar.

Para mim o amor se resume em três elementos básicos: desejo, cuidado e admiração. A forma como você vai organizar estes sentimentos pode variar infinitamente, mas se eles não estiverem presentes eu penso que uma outra palavra precisa ser usada.

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