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Os Tempos e as Dores

Certo que perdemos muito tempo antes de empreender um tratamento para nossos dramas psíquicos. Certo também que sempre lamentamos não ter começado a resolvê-los antes de se agravarem. Não há como fugir dessa culpa. Todavia, todo aquele que consegue resolver seus problemas numa roda de cerveja é porque realmente não estava “pronto” para procurar uma psicóloga para auxiliá-lo na busca das origens profundas de suas angústias.

A mesma lógica eu usaria para o sujeito que quer colocar um quadro na parede ou fazer uma mudança na casa que se limitava a trocar os móveis de posição. Nesse caso não era necessário um arquiteto ou engenheiro. Pela simplicidade do problemas, soluções simples. Posso oferecer mil exemplos com médicos, advogados, cozinheiros e decoradores com este mesmo raciocínio.

Minha tese é que para procurar uma analista – e vou me deter na análise – é necessário ter passado por estes passos intermediários sem sucesso, como um processo lento de maturação. Comprar roupas, trocar de namorado(a), rezar, viajar, emagrecer, fazer cirurgia plástica, mudar de emprego etc. são ações que podem aplacar a sua angústia, caso esta seja superficial e conjuntural. Entretanto, depois que todas estas atitudes foram tomadas e o vácuo na alma ainda estiver presente e a dor ainda persistir, somente aí teremos o momento adequado de procurar uma análise. Antes disso o sofrimento imposto pelo tratamento psicanalítico será muito penoso e provavelmente intolerável.

Assim sendo, não há como procurar tais recursos sem um quinhão adequado de neurose. A curiosidade ou a “vontade de resolver alguns problemas” não são motivações suficientemente fortes para empreender tal aventura nos domínios do inconsciente.

” And,of course, there’s the financial problem of people who really need and want a psychological help but that such a thing is not available, or is too expensive so that the regular person cannot afford it. Certainly, millions would get relief for their pains and suffering if we offer them adequate psychological treatment instead of giving the false idea that consumerism is the ultimate path to happiness.”

Portanto, não se culpe por ter retardado por tanto tempo sua procura por uma ajuda mais profunda. As borboletas nos ensinam que sair do casulo demanda uma espera para secar as asas. Se ela se apressar, cai sob o peso das asas molhadas. Para nós, o tempo para amadurecer o mergulho no inconsciente é o exato tempo de aceitar a dor como ferramenta de crescimento.

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Paixão

Paixão

Do outro lado da rua escuto uma briga de casal. Os decibéis eram tantos que pensei chamar a polícia. Escutei apenas pedaços de desespero e fragmentos de rancor. “Chega“, “não chegue perto do meu filho“, “vá embora“. Tudo muito dolorido. A voz dele era mais forte e raivosa, mas a dela não ficava muito atrás. Muita dor, raiva e angustia.

Em outras palavras, pura paixão.

Sim… o que eu escutei foi amor. Degenerado e doente, caótico e violento, mas feito da mesma energia que une os amantes desde que o mundo se criou das cinzas de nossa animalidade. Paixão intensa, na sua forma enferma e destrutiva, mas por trás disso amor deturpado.

“Paixão vem do latim passio, cuja tradução seria algo como “sofrimento, ato de suportar”, de pati, “sofrer, aguentar”, do grego pathe, “sentir ”. Com o tempo, entretanto, lá pelo século XIV, ela passou a designar também “forte emoção, desejo”, e mais tarde ainda, “entusiasmo, grande apreço, predileção”. (Wikipédia)

Como canta João Bosco: “Quem quer viver um amor, mas não quer suas marcas qualquer cicatriz. Ah, a ilusão do amor, não é risco na areia desenho de giz“.

A paixão é sempre dor e sofrimento. Os sons da noite passada nada mais eram do que a paixão em megafonia, o amor em sua versão trash, o desejo rechaçado que retorna como mágoa e dor. Porém, não consigo deixar de ver – e ouvir – nesta cena o mesmo gemido e a mesma languidez dos amantes envoltos na energia inebriante que um dia os uniu. O que era amor tornou-se ódio; o que era desejo tornou-se dor.

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