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Censura e proibicionismo

Não gostou da piada? Corte a amizade. Não fale mais com o sujeito, não vá no seu show, cancele, reclame. Escreva um textão nas redes sociais denunciando a visão preconceituosa que ele dissemina. Temos nas mãos o poder de mostrar que esse humor não é engraçado, que não é construtivo e que se baseia em estereótipos inadequados. Porém, o desejo de calar e censurar os “humoristas do mal” deixa claro que as pessoas que apoiam tal censura não acham que podemos fazer boas escolhas. Na verdade, acreditam que a proibição pode ter efeitos positivos, e pensam ser mais efetivo combater a mentira com a censura, ao invés de oferecer a verdade como contraponto. Não ensinamos a chapeuzinho vermelho a fazer boas escolhas, pois achamos mais certo perseguir todos os lobos. Lembrem que, da mesma forma, o samba já foi proibido, pois havia a ideia de que sua prática incentivava a vagabundagem. Alguém acha ainda que o samba produz preguiçosos?

Vejo que as pessoas têm dificuldade de entender é que o humor de um comediante não produz nada, ele apenas reflete os valores e crenças de uma determinada sociedade. As pessoas que vão no show do comediante Leo Lins não se tornam racistas ou preconceituosas devido às palavras e piadas que escutam no show; o Leo Lins não tem esse talento, não tem esse poder de conversão e muito menos essa capacidade. Todavia, não há dúvida que ele atrai os racistas e reacionários para o seu show, provavelmente os mesmos que se exaltam nas motociatas de líderes fascistas, pois as pessoas sabem com precisão o conteúdo que será oferecido. Da mesma forma, uma missa não converte ninguém a Jesus, mas oferece um local de encontro para os aqueles crentes que há muito desejam exercitar a fé num Salvador.

A prisão ou a penalização desses comediantes, políticos, partidos, programas, religiosos não acabará com a audiência, não vai sequer diminuir o número de pessoas interessadas em suas ideias, apenas vai impedir que estas ideias sejam reconhecidas na sociedade. O mais triste é ver que a lógica usada aqui é a seguinte: se prendemos todos os gays e proibirmos que eles falem desse pecado mortal, os homossexuais vão desaparecer; se ninguém falar desses assuntos acaba tudo, eliminamos o problema. Acrescente a essa ideia punitivista as tentativas de perseguição ao comunismo, ao islamismo, ao álcool, e a ideia de acabar com o crime exterminando os criminosos.

Tudo isso já foi tentado, até mesmo hoje. Spoiler: não funcionou.

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Lobo em Pele de Cordeiro

Prestem atenção no voto do todo-poderoso Ministro Alexandre de Moraes: caso você tenha a oportunidade pouco agradável de um encontro com a polícia, não ouse correr. Se você se afastar da polícia (entre outras razões, porque tem medo de ser morto por um policial mal treinado e em pânico), isso dará aos policiais o direito de invadir a sua casa – mesmo com o uso da força, derrubando sua porta à patadas – sem mandado judicial e sem flagrante delito, apenas por ter se portado de forma “suspeita” (como dizem os americanos, de forma irônica: “suspicion is a felony or a misdemeanor?”). Ou seja: uma atitude “suspeita” – segundo os critérios subjetivos do policial – poderá justificar a invasão da sua casa. Essa invasão violenta do Estado ao caráter “inviolável” do domicílio foi defendida pelo “Príncipe da Democracia”, Alexandre de Moraes.

A sedução de aplaudir o algoz do Bolsonaro assumiu proporções quase incontroláveis. Espaços virtuais como “esquerda compra de esquerda” já vendem memorabilia com a face do “Xandão”, tratando-o como um verdadeiro ícone nacional. Passamos a tratar como herói um sujeito cuja história é marcada por episódios de autoritarismo explícito. A exaltação do ministro psdbista por sua ação nas últimas eleições é uma profunda ingenuidade, pois que sua postura autoritária se tornou evidente desde o episódio do corte dos pés de maconha.

Esse pendor para as ações punitivas não deveria causar espanto no campo progressista, mas boa parte da esquerda liberal ainda se deixa seduzir por frases de efeito, demonstrações de virilidade e ações pirotécnicas. Alexandre foi indicado pelo golpista Temer, o que já deveria nos causar repulsa, e suas posições sempre tiveram como norte uma perspectiva arrogante e autoritária. Aplaudir suas ações é um ato de expressa ingenuidade que a esquerda raiz deve repudiar.

E vejam bem; os lavajatistas confessos Facchin e Barroso foram contrários a tese da liberalidade oferecida às forças repressoras do Estado de invadir sua casa. Ou seja, até mesmo os ministros mais reacionários compreendem a gravidade de permitir estas invasões e defendem a manutenção da proteção do cidadão diante do poder massacrante da polícia. Para a surpresa de nenhum marxista consciente, Xandão se associa às forças sociais mais retrógradas e escolhe a perspectiva abusiva que atropela o direito individual.

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