Na imagem, Sophia Loren e Jayne Mansfield em um evento da Paramount em 1955
Acho interessante que essa moda de fazer “avatares” de si mesmo, como imagens idealizadas, defeitos suprimidos, exaltação de qualidades, sorrisos enigmáticos e poses fatais, se adapta bem ao tipo de mundo em que se vive – onde a ficção de si mesmo é apresentada como folhetim diário nas postagens do Instagram. E vejam, não há crítica moral alguma a essa tendência, até porque ela seria totalmente hipócrita, basta dizer que qualquer um se deixa seduzir por uma imagem melhorada. Por mais falsa que possa ser, é apenas mais uma capa de imagens irreais que colocamos sobre nós mesmos.
Entretanto, o que eu só percebi agora é que esta empresa coloca todas as mulheres com dois números de sutiã a mais. Sem exceção, elas ficam voluptuosamente adornadas pelos mais maravilhosos amortecedores que a natureza jamais criou. Ou seja: o capitalismo sabe que, por mais que o mundo siga em sua trajetória no rumo das estrelas, e por mais que tentemos fugir do essencialismo dos gêneros, a gente continua querendo uma chance melhor – mesmo que ilusória – de captar o olhar alheio para os nossos atributos sexuais.
Vi há pouco o vídeo da movimentação da língua de um bebê recém-nascido dormindo, simulando os movimentos da amamentação. Minha observação foi:
“Sonhando com teta, um sonho que vai acompanhá-lo por toda a vida”.
A ideia por trás desta observação é de que nesses estratos primitivos pré-verbais é que se alicerça a sexualidade humana. Nessa fase, chamada de “fase oral”, a boca é a grande ferramenta de prazer sexual. Só bem depois, passada a longa infância humana e com a lenta maturação sexual, encontraremos prazer genital, o qual será fundamental para a vida adulta e a reprodução.
Entretanto, as marcas da oralidade manterão resquícios por toda a vida. Arrisco dizer que o beijo é a característica de expressão afetiva mais saliente nas culturas exatamente porque carrega as memórias prazerosas da amamentação. Não fosse por isso – nossa oralidade e a ligação ao seio como fonte de prazer – e teríamos uma humanidade sem bitocas, selinhos ou beijos “desentope-pia“.
É evidente que a amamentação carrega essa carga enorme de erotismo o qual vai entrelaçar de forma amorosa mãe e bebê. “Se amor existe, este é o sentimento de uma mãe pelo seu filho e todos os outros amores são dele derivados“, diria o mestre Freud. É ali na imbricação de mútuos prazeres que uma mãe cumpre seu mais alto fim: ensinar seu filho a amar. Não resta mais muita dúvida sobre esta questão.
Também é óbvio que na mente da criança haverá marcas indeléveis desse período. A fixação ancestral dos humanos pelos seios produziu um fenômeno único entre os mamíferos: as mulheres humanas são os únicos primatas que mantém a turgidez das mamas fora do período de amamentação. Olhe uma fêmea chimpanzé, gorila ou orangotango e se pergunte: “onde estão as mamas?“
Ora… do ponto de vista evolutivo as mamas das fêmeas humanas se mantiveram grandes e túrgidas pelo forte apelo atrativo e sexual que desempenham na nossa espécie. Foi um processo seletivo que ocorreu nos últimos milhões de anos. No Museu de história natural de Nova York, Lucy (australopitecus afarensis) é retratada com as mamas murchinhas, dando a entender que a mama como objeto de desejo ainda custaria a aparecer. Quando então começou essa transformação? Homo erectus? Homo rudolphensis? Ou junto com a razão – no Homo sapiens sapiens?
Por isso podemos apostar na ideia de que o sonho dourado desse bebê vai se manter em sua mente por toda a vida. Essa experiência primitiva de prazer vai acompanhá-lo, mesmo que não perceba. A estética graciosa, redonda, macia e voluptuosa das mamas permanecerá como ícone máximo do prazer.
As mamas, no imaginário humano – em especial no Édipo masculino – vão nos seguir, guiando nossas escolhas, direcionando nossos olhares e construindo nossos sonhos – nem que venham disfarçadas, como balões, flores gigantes e até bolas de futebol (as gorduchinhas).
Pois bastou tocar com essa singela frase na questão da eroticidade da amamentação para – de novo – aparecerem ataques no sentido de questionar a “erotização das mamas”. Ataques, como sempre, violentos.
Claro… mea culpa, mea maxima culpa, respondi de forma exagerada aos ataques. Peço perdão por isso. Entretanto, sempre me assombro com a onda puritana da geração atual. A mera menção do desejo relacionado à amamentação faz com que essas pessoas reajam com ferocidade. A simples ideia de que homens (e mulheres) venerem as mamas como sublime objeto de desejo deixa furiosas(os) as(os) jovens ativistas.
Suspeito que o problema é desnudar a própria existência deste desejo e trazer à tona um gozo escondido, recôndito e dissimulado. O que emerge com tanta voluptuosidade é a denegação do prazer que brota quando se amamenta em liberdade.
Os seios são conflituosos porque demonstram que a sexualidade feminina se expressa à despeito e além da ordem monogâmica patriarcal. “Escandaloso” é o prazer que uma mulher tem ao amamentar, prazer esse que só pode ter origem em seu vasto repertório erótico.
Evelyn Forsythe, “”The roots of Pleasure”, Ed. Reuters-Smith, pag. 135