Arquivo da tag: ciência

Autoridades

A ideia de questionar autoridade não é, em essência, ruim. Em verdade, toda a ciência parte dessa insubmissão, não só à perspectiva dos outros, mas em combate constante contra a própria a ignorância. Assim sendo, ver alunos questionando cientistas e autores não é um sacrilégio ou um pecado. Faz parte de uma educação crítica o exercício da contestação. Por outro lado, as perguntas que cabem a estes “alunos petulantes” poderiam ser: “Afinal, em nome do quê você questiona este autor e como chegou a uma resposta diferente da que ele nos ofereceu?.

A resposta dos alunos de hoje não deve variar muito. Elas se referem a revisionismos que contestam o entendimento oficial baseados em autores apócrifos, sem formação reconhecida (Olavo de Carvalho é o ícone), afirmando que toda a estrutura do conhecimento contemporâneo está corrompida e baseada em falsidades e mentiras. Os interesses que haveria por trás dessas “mentiras oficiais” são o “marxismo cultural” (uma tolice divulgada por Jordan Peterson), associada à descrença crescente nas instituições (políticos, cientistas, religiosos, Academia etc.).

Quando falamos que a burrice tomou a dianteira nas narrativas contemporâneas é importante pensar o que significa isso. Não se trata de um amor puro à ignorância, um elogio à tolice. É algo além; uma revolta contra a opressão das instituições.

Todos os dias somos assaltados por notícias de corrupção na administração pública, até porque o poder REAL no Brasil tenta de todas as formas desmerecer a política como cola social. Além disso, vemos a corrupção nas corporações, como os remédios que matam, os médicos que abusam de cesarianas, a corporação médica acabando com os Mais Médicos, com o STF fazendo política partidária, com o exército ameaçando a democracia, com o judiciário corrompido por juízes fazendo política, uma mídia corrupta e golpista e com a Academia sendo uma fogueira de vaidades onde o ensino é relegado a segundo plano e as fraudes nas pesquisas estão sendo denunciadas de forma crescente.

Desta forma, com o aparecimento da internet, a autoridade que se afunilava nessas corporações acabou sendo diluída e espalhada de forma crescente. Não existe mais uma única fonte de informação; podemos questionar tudo e todos com uma pletora de informações, ideias e contraditórios sem precedente na história.

Claro que isso abre espaço para a estupidez e a contestação tosca de verdades bem estabelecidas. Muitas burrices como “Hitler de esquerda” e “terraplanismo” apareceram, mas não há como voltar atrás. A partir de agora nossas evidências precisarão ser conquistadas palmo a palmo e as antigas autoridades intocáveis vão aos poucos desaparecer. Não há volta…

Um exemplo que demonstra como nosso enfrentamento à autoridade faz sentido basta ver a miséria que escreveram juízes como Moro e Gabriela Hardt na sentença de Lula e o que escreveu uma professora da PUC sobre Simón Bolívar e o “marxismo”.

Não há como negar que, dentro do capitalismo, todas estas instituições estão em crise. Existem mentiras e corrupção na política, na ciência, na religião e nas Academias, mas o convite aos alunos deveria ser para que não se entregassem à simples contestação e o nivelamento de tudo em torno do rótulo “opinião” – onde a minha vale tanto quanto a de Stephen Hawking. Não, a ideia seria desafiá-los a caminhar os mesmos passos de dedicação, pesquisa, labuta, contestação e análise que estes pensadores percorreram, para só então nos oferecer uma visão alternativa.

Claro que isso serve para os alunos que desejam saber. Para os que apenas escolhem no que acreditar ou duvidar, uma religião, com suas regras e dogmas, é o caminho mais rápido e fácil.

Deixe um comentário

Arquivado em Pensamentos

Criança

Na ciência o ceticismo e a dúvida são as mais nobres virtudes; o entusiasmo o pior defeito.

Em que momento essa criança se perdeu? Em que ponto distante no tempo de sua vida sua história parou? Queria voltar lá e dizer a ela: “Pode chorar, mas seja forte; siga em frente, tire essa roupa de dor, esqueça essa mágoa, perdoe quem lhe machucou e volte a brincar.”

Alfred Bruegel, “Essays of Dark Times“, Ed Fraternitat, pag 135

Deixe um comentário

Arquivado em Citações

Vacinas e Religião

É impressionante como nos Estados Unidos o debate sobre os perigos e as inconsistências das vacinas é aberto e franco. As conferências reúnem milhares de pessoas de várias partes do país, com a presença de médicos, professores, bioquímicos, pais de crianças prejudicadas, pesquisadores e políticos. Entender a vacinação – seus riscos e benefícios – é um assunto sério e que mobiliza muitas pessoas. No Brasil o assunto é tratado com o mais completo escárnio e deboche. Questionar a validade da vacinação é tratado como “negacionismo” e as pessoas que o fazem são colocadas ao lado de sujeitos que negam o holocausto e os terraplanistas. Os pouquíssimos profissionais da saúde que ousam questionar e decidem apontar os perigos e os riscos evidentes da injeção de tantas substâncias perigosas e não testadas são levados ao ostracismo, quando não francamente perseguidos.

Falta muito ainda para tirarmos a religião de dentro da ciência. Vacinas são crenças de caráter religioso. Se elas funcionam ou não, ou se os malefícios encontrados são graves o suficiente para interromper seu uso, é uma outra questão. Todavia, a vinculação que temos com elas é de caráter dogmático e irracional. Elas ocupam o lugar das comunhões religiosas do passado: para ser aceito em uma determinada comunidade é preciso passar por um ritual de aceitação dos seus pressupostos básicos. Ontem, o batismo no cristianismo; hoje as vacinas no cientificismo.

Deixe um comentário

Arquivado em Ativismo, Religião

A Fantasia cientificista

A medicina enquanto “prática científica” é uma fantasia implantada desde muito cedo na cabeça dos jovens estudantes, que se mantém ao se tornarem profissionais. Quando eu era estudante ouvi de um colega que desejava trabalhar com fertilização in vitro e inseminação artificial – a rendosa especialidade emergente da época – que “nem todos os médicos podem ser cientistas“. Dizia isso com uma espécie de fervor religioso, como se diante de um grupo de seminaristas um deles se erguesse e afirmasse: “Nem todos nasceram para ser cardeais; para alguns o céu se limita a ser um cura em sua paróquia interiorana“.

A migração que testemunhei para medicinas afastadas dos pacientes e próximas das tecnologias desnuda de forma categórica esta tendência. As cirurgias laparoscópicas, os “médicos de imagem”, os patologistas, os pesquisadores e tantas outras modalidades mostram o caminho inequívoco da medicina atual, onde o pretenso “cientista” é valorizado enquanto o profissional que escuta seu paciente e tenta traduzir suas dores e sofrimentos é relegado a um plano secundário

Para os médicos a ciência é o elemento sagrado de seu trabalho, mesmo diante da evidência de que sua prática cotidiana é baseada em tradições e empirismos sem qualquer base científica.

Deixe um comentário

Arquivado em Medicina

Religião

Oração_religião

Desculpem-me os religiosos e crentes.

Sei das suas crenças e as respeito, pois um dia também as tive. Quando cito textos retirados das palavras de Jesus e de Deus faço-o para mostrar que a Bíblia é um livro escrito por humanos e para humanos, com valores humanos e não divinos. Qualquer pessoa retira o que bem entender dos livros “sagrados”. Podemos usar qualquer fundamentalismo sobre tais livros , seja ele a Bíblia, o Corão ou o Torá. Podemos olhar as palavras como são, ou interpretá-las da maneira como bem entendermos. É por isso que este e qualquer outro livro “sagrado” não são confiáveis para ditar normas humanas. Eles são num testemunho de histórias contadas há séculos, com valores e personagens daquela época, e que cumpriam funções políticas adaptadas à sua época também.

Quando esprememos a Bíblia e retiramos o sumo doutrinário mais essencial aparecem apenas frases como “amai-vos uns aos outros“, “seja teu falar sim-sim, não-não“, “o amor cobre a multidão de pecado” que, de forma variada, todas as outras religiões dizem no seu intento civilizatório de otimizar o esforço de progresso das sociedades humanas através da fraternidade. Portanto, não é necessário submeter-se a senhores, “intermediários de Deus”, para assumir uma atitude fraterna. Eu, pessoalmente, não procuro ser fraterno ou justo porque Jesus ou Buda me pediram ou exigiram, mas somente porque acho justas e corretas tais ações. Um Deus que criou o universo não poderia ter defeitos piores que os meus, como ódio, vaidade, rancor e raiva, mas a Bíblia é recheada de chiliques divinos, típicos de um menino manhoso e mimado, sujeito a ódios e vinganças. Certamente que a Bíblia – e menos ainda o Corão – não me oferece uma imagem adequada de criador.

Contínuo a crer que as religiões atrasam o mundo, e suas crenças mais separam do que unem os homens. A fraternidade não precisa de palavras mágicas ou gurus; ela se expressa como um roteiro natural de progresso humano, superior a qualquer outra forma de relação entre as criaturas. Esta é sua força essencial, e não as palavras de qualquer Avatar.

Eu respeito este tipo de visão de mundo, mas tenho muita dificuldade de entender. Uma coisa que me deixa atônito é os adesivos em automóveis onde pode-se ler: “Propriedade de Jesus“. Como alguém pode se sentir feliz ou orgulhoso por ser propriedade de outro, mesmo que seja um outro supostamente maravilhoso? Eu pergunto: se o seu filho fosse adulto e dissesse “sou propriedade do meu pai” você se sentiria satisfeito, orgulhoso da criação que proporcionou a ele? Você se consideraria um bom pai por ter mantido um filho atrelado a você, dependente de você, idolatrando você, sacrificando-se para agradar as suas vaidades e caprichos? Que tipo de pai acha bonito um filho subir uma escadaria destruindo os joelhos para honrar seu nome? Que tipo de pai acha bonito um filho se humilhar diante de todos confessando sua fragilidade e dependência? Pois eu não consigo entender que o “criador de todas as galáxias e mundos conhecidos” seja mais tolo, vaidoso e egoísta do que o mais mundano dos mortais.

Um Deus poderoso o suficiente para construir o Universo teria que ser pelo menos melhor do que eu. E eu não trataria um filho com tanta displicência como Deus – todo poderoso – trata seus filhos.

1 comentário

Arquivado em Religião