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Protocolos

Existe na medicina uma tendência quase irresistível de criar rotinas, fluxogramas, protocolos, etc. É da natureza das ciências criar formas de normatização e análise para um entendimento mais preciso dos fenômenos. Aliás, este tipo de abordagem ofereceu uma fantástica oportunidade para a ampliação do conhecimento, uma ferramenta preciosa para o progresso. Obrigado, Descartes…

O problema ocorre quando está perspectiva se aplica à fisiologia do parto, onde os aspectos pessoais e sexuais das mulheres se associam aos fenômenos fisiológicos, hormonais e mecânicos envolvidos na expulsão fetal.

A aplicação de regras, rotinas e protocolos vai ser sempre conturbada pois a abordagem rígida das ciências aponta para um ponto complexo: os aspectos subjetivos, únicos, pessoais, eróticos e afetivos que circundam este evento. Nesta circunstância os fenômenos se tornam erráticos ou pouco previsíveis.

Quando analisamos, como na velha escola obstétrica, o parto por duas variáveis – conteúdo e continente – ele se torna simples para entender, para manipular e para controlar. Essa fórmula é tão sedutora quanto falsa, na medida em que o ser humano, inserido num universo de linguagem, não se adapta ao plano do real, envolvido que está num mundo simbólico de significados mutantes e intransferíveis. Assim, os protocolos sempre vão esbarrar na evidente característica rebelde do corpo erotizado de uma mulher parindo.

Este comportamento selvagem é o que existe de mais precioso no parto, assim como em todas as manifestações sexuais e, por esta razão, fugir dos protocolos homogeneizantes é uma atitude sensata.

Para atender partos e nascimentos é essencial ter princípios, como autonomia, liberdade, protagonismo, ajuda capacitada, ambiência, afeto, cuidado, etc; estes são os objetivos da atenção que é oferecida às todas as parturientes. Todavia, para se chegar a isso os caminhos são infinitos, assim como são infinitas as mulheres parindo, e qualquer cuidador consciente do seu lugar precisa ter esta realidade como norte em qualquer ação utilizada.

(em conversa com Eloiza Fernandes Giraldi)

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Arquivado em Causa Operária, Parto

Regras

Quando meus filhos eram pequenos eu também era muito jovem; antes que eu chegasse nos 30 ambos já eram alfabetizados. Agora, observando as brincadeiras dos meus netos, descubro que o mundo deles é baseado na produção de regras e limites. Qualquer jogo ou disputa é precedida de um extenso desfiar de regras, do que pode ou não pode, do que é lícito e o que é proibido.

“Vamos fazer que a gente era transformers, mas tu não pode me atacar e só pode usar as armas comuns, e eu posso usar esses poderes aqui”. Eu fico encantado com esses diálogos pois eles são a encenação lúdica dos dilemas angustiantes que carregam em sua adaptação ao mundo. Tudo depende se pode, se foi combinado, se vale, se deixam, etc. É com o eles enxergam o mundo: um lugar cheio de interdições civilizatórias chatas e incômodas.

Na minha juventude eu fui esmagado pelo peso torturante das ideias, algo que me envolveu de forma completa e onde me joguei de maneira compulsiva. Não tive tempo e/ou sabedoria para saborear essas lições maravilhosas com meus filhos, pelo menos não o quanto deveria. Hoje, já consigo parar e escutar dos meus netos a beleza destes encontros, saboreando a dor e a delícia que vivenciam enquanto crescem.

Quero ter saúde só para curtir essas maravilhas mais um pouco…

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