
Uma dica para aqueles que gostam da “censura do bem” que parece consenso entre os formadores de opinião da esquerda: leiam em que contexto Karl Popper – um liberal profundamente anticomunista – proferiu sua famosa frase. Entendam que a perspectiva de não “tolerar os intolerantes” pressupõe que alguém terá o poder de arbitrar a intolerância. Quem seriam os vestais a determinar quais palavras são permitidas e quais devem ser proibidas? Quem, dentre nós, está acima do bem e do mal?
No caso do Brasil o Alexandre – ou o STF inteiro, que inclui Fux, Fachin, Kassio Nunes Marques, André Mendonça – tem o poder de determinar que algo (ou alguém) rompeu os limites da livre expressão. Ou seja: no caso recente, quem determinou o limite da tolerância é um sujeito que foi colocado na posição de Ministro da Suprema Corte através de um presidente que chegou ao cargo por um golpe de Estado. É justo admitirmos isso?
No caso de Popper “intolerância” o limite seria alguém se atrever na defesa do socialismo e eliminar o controle privado dos meios de produção – algo intolerável para um liberal. Mas quem é Popper na fila do pão da democracia? Sua visão de “Sociedades abertas” é uma clara contraposição ao marxismo e ao totalitarismo, mas é um caminho de liberalismo burguês que conduziu o planeta à destruição que testemunhamos e ao neofeudalismo corporativo que se estabelece sobre o planeta.
Não esqueçam que a “intolerância com os intolerantes” é o mantra das forças de ocupação de Israel, que usam dessa mesma lógica para dizimar os “intolerantes palestinos”. Na Arábia Saudita cabeças rolam contra “intolerantes” que atentam contra o poder absoluto de seus monarcas. No Brasil essa estratégia será usada sempre que houver vozes contrárias à democracia burguesa, controlada pelas corporações e a elite financeira. Esse é o principal tropeço: não perceber que essa censura a certos termos, temas e expressões serve sempre aos poderes constituídos. É uma manobra intrinsecamente conservadora.
PS: Sim, Alexandre de Moraes tem méritos em salvaguardar a nossa frágil democracia, mas não fez nada além da sua obrigação de punir como crime o que realmente é crime. Todavia, acreditar que ele é o guardião moral dos nossos valores democráticos – nem a pau, Nicolau. Ele representa os velhos valores da direita, o conservadorismo e a perspectiva punitivista mais anacrônica do direito. A distância entre Alexandre e Moro é muito menor do que imaginamos, e inclusive o primeiro já deu total apoio ao segundo.