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Brega

Não haveria amor sem declarações rasgadas e tolas. Todo amor é brega, porque amar é fragilizar-se, reconhecer seu desejo, aceitar sua incompletude. E cada vez que além declara seu amor brega, em uma estrela distante, de uma galáxia fugidia, uma cigarra cintilante começa a cantar uma música do Amado Batista.

Yendis Lahgam, “Amor e seus Confins” Ed. Parole, pág 135

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Você é romântico?

Muitas vezes ouvi esta pergunta dirigida a um homem e até para mim mesmo. Sempre achei essa questão interessante, em especial porque ela esconde um truque.

Eu acredito que existem dois tipos de românticos. Via de regra, quando as mulheres fazem este tipo de pergunta estão querendo saber se aquele sujeito é um “romântico performático”. Isto é: um sujeito que manda flores, escreve bilhetes, faz declarações de amor, produz performances públicas de afeto, etc. Em verdade, se refere a uma manifestação exterior, uma encenação – verdadeira ou não – de conteúdos internalizados de desejo e afeto.

Todavia, esta não é a minha definição preferida, pois ela se refere a uma manifestação externa e superficial, que bem pode ser enganosa. Não são poucos os psicopatas que exercem o “donjuanismo“. Em verdade, a literatura e as colunas policiais descrevem sujeitos especializados em roubar senhoras solitárias usando essas sofisticadas técnicas de sedução com extrema capacidade e eficiência. Muitos são “românticos” que possuem um deserto no peito, e uma vida afetiva vazia. Outros amam a si mesmos, e usam o outro como escada para seu narcisismo.

Todavia, a definição que me atrai é a do “romântico raiz“, como um sujeito que acredita – de forma irracional – na ideia do amor romântico. Isto é: alguém que acha que a vida é melhor a dois, que uma união estável é prazerosa, que dormir de conchinha, ter alguém para contar as agruras do seu dia, ter filhos e netos e envelhecer juntos tem valor e sentido. O romântico seria alguém que sonha em ter alguém “para si”. Por esta classificação, o “romântico raiz” parte de uma posição subjetiva que dispensa qualquer performance. Não se trata de como atua, como se expressa, mas como sente e percebe sua própria sexualidade.

E vejam, aqui não faço nenhum julgamento de mérito. Acho o amor romântico um fetiche como qualquer outro, apesar de reconhecer que – ao contrário das cintas liga, dos chicotes e das roupas de couro – ele é socialmente aceito, admirado e estimulado. Creio que esse engajamento ajuda a oferecer mais estabilidade social ao patriarcado, e por isso valorizamos tanto os longos casamentos de figuras públicas – e mesmo dos nossos amigos.

Porém, não acredito que um sujeito seja mais feliz se for casado, ou eroticamente “comprometido”. Não existe nada que me convença que uma ligação amorosa estável, única e perene produz maior chance de uma vida feliz. Mesmo assim, reconheço que em nossa cultura amar e desejar seu/sua parceiro(a) para sempre é a suprema fantasia erótica.

E, por essa definição, sou um romântico irrecuperável

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Romance

Sempre me perguntei se haveria alguma razão para que eu fosse um sujeito romântico. Aqui vou conceituar “romântico” como alguém que acredita no amor entre duas pessoas, que pensa que uma relação assim pode gerar filhos e que constituir uma família pode ser um dos objetivos mais nobres da vida. Não se trata do romantismo de gestos externos como flores, bombons, declarações grandiloquentes ou, modernamente, carro de som na porta da casa – substituindo as serenatas. Não… apenas a crença no amor entre duas pessoas.

E vejam, coloco a crença no amor romântico apenas como mais um fetiche humano, tão válido quanto qualquer outro – cintas-liga, poliamor ou roupas de couro incluídas. É uma conexão afetiva de ordem irracional, portanto infensa às análises racionalistas e objetivas. Não acho que alguém se torna “superior” por se dedicar a essa fantasia, mas reconheço que os românticos assim definidos se tornam sujeitos mais fáceis para manter relacionamentos duradouros.

Escrevo isso porque arrumando livros antigos dos meus pais encontrei uma singela pista para o meu acanhado romantismo: uma carta que minha mãe escreveu ao meu pai uma semana antes de ganhar seu primeiro filho, meu irmão mais velho. A carta é um primor de romantismo, como não se encontra mais na literatura, mas também explica porque as mulheres nos anos 50-60 tinham muito mais facilidade para parir. O estado se espírito da minha mãe poucos antes do “grande dia” era de pura excitação com o que estava para ocorrer. Não havia uma linha sequer de angústia, preocupação ou temor, apenas uma viva ansiedade para ter seu filho nos braços…. e uma alegria imensa em poder cumprir aquilo que o “destino” havia legado a ela. Outros tempos, por certo…

Achei invasivo mostrar a carta inteira escrita por ela, mesmo que ambos já tenham partido, mas creio que a última frase é um primor de amor romântico e retrata bem as mulheres de sua época, que apostavam sua felicidade no amor profundo por seu companheiro e por seus filhos, dedicando-se uma vida inteira para que eles fossem felizes.

Lendo a derradeira frase daquela simpática missiva parece que estou assistindo uma novela escrita pela cubana radicada no Brasil Glória Magadan…

“My romance doesn’t need a castle rising in Spain
Nor a dance to a constantly surprising refrain
Wide awake I can make my most fantastic dreams come true
My romance doesn’t need a thing… but you”

Carly Simon – My Romance

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Fetiche

Acordem desde torpor; romantismo é uma fantasia sexual tão válida quanto bundas, peitos ou pés.

Jeffrey Mallone, personagem de “A Mangled Desire”, de Emett Drurys, pág. 135

Emmet Drurys nasceu em Chattanooga, Tenesse em 1967. É basicamente um escritor autodidata, tendo iniciado sua carreira escrevendo roteiros de humor para a rádio local – 98.1 FM – THE LAKE. WLND-FM. Seus sketchs humorísticos fizeram muito sucesso local e por causa disso foi convidado a fazer parte da grade nacional de grandes emissoras de rádio. Escreveu seu primeiro livro – No Earth Connection – com recortes de suas histórias e piadas e foi um sucesso de vendas. Já em seu primeiro livro de ficção “A Mangled Desire” ele descreve as desventuras de Matt Rifkin, um “loser”, sujeito feio, pobre e sem sorte nenhuma com as mulheres e que tinha um inédito talento como cantor. Todavia, sua falta de atrativos físicos obrigou o produtor Edmond Baxter a criar uma farsa. Seu rosto não podia ser mostrado porque destoava de sua voz e por isso convidou Jeffrey Mallone, um bonitão charmoso, canastrão e sem talento algum para a música, para emprestar seu corpo e seu rosto para a voz espetacular e o talento musical de Matt. As desventuras da farsa criada e a amizade que se criou entre Jeff e Matt nos fazem questionar os valores e as valências que a vida oferece graciosamente, desafiando nossas concepções sobre beleza, riqueza, talento e sucesso.

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Fetiches

fetiches

Fiquei pensando sobre os fetiches e me veio à mente a pergunta é: não temos um preconceito irracional sobre a expressão dos fetiches, desconsiderando sua natureza e aplicando sobre eles valores morais? Poderia um homem que expressa seus fetiches aparentemente bizarros – fazer sexo vestido de mulher, vestido de bebê ou caubói, em lugares exóticos, com múltiplas(os) parceiras(os), etc. – ser criticado, humilhado e censurado pelas sua “escolhas”, a forma como recobre de realidade suas fantasias?

A questão, entretanto é mais complexa. Os fetiches e as fantasias não são escolhas racionais e livres; são emanações do inconsciente e vinculadas aos estratos mais profundos do psiquismo humano. Nenhum sujeito escolhe racionalmente (apesar da expressão do desejo ser racional) ser espancado durante o sexo como forma de gozo, mas estas atitudes expressam significados muito profundos e da ordem do inconsciente.

Todavia, não seria o romantismo uma manifestação fetichista socialmente aceita e valorizada? Essa foi a ideia que algumas amigas mulheres me trouxeram e que eu achei muito interessantes. O romantismo de homens e mulheres é tão fetichista quanto uma orgia ou uma fantasia “bizarra”. O romantismo pode fazer diferença para o(s) parceiro(s), pois que são convidados a participar ou ser cúmplices dele; todavia ele é igual a qualquer outra fantasia para o sujeito que a produz.

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