Estou aguardando com ansiedade o dia em que as pessoas deixarão de usar o argumento “você pode ofender pessoas sensíveis se falar isso”. Ora, sabemos que qualquer debate pode ofender alguém e faz parte do risco de debater sentir-se ofendido – ou ofender involuntariamente. É claro que os argumentos não podem ser construídos com o único objetivo de ocultar as ofensas, assim como piadas que são contadas “inocentemente” tão somente para carregar racismo, sexismo, classismo e outros preconceitos sob o véu de um gracejo.
Todavia, é óbvio que algum conflito há de ocorrer no choque de ideias. É inadmissível – por ser anti intelectual – cedermos a este tipo de “censura pelos sentimentos“, como se os interlocutores fossem de algodão e conceitos duros fossem como água a lhes desmanchar. A cultura dos “flocos de neve” precisa ser abolida em nome da diversidade e do progresso das ideias.
Quem deseja debater com honestidade precisa ter maturidade para aceitar estes riscos. Abolir a necessária racionalidade em nome da candura e do “respeito aos sentimentos alheios” é tratar os oponentes como crianças.
Eu vi a notícia sobre um congresso de aleitamento no México que não continha nenhuma mulher entre os expositores e achei absurda tal comissão que debateria o tema. Não gosto de nenhum tipo de sexismo e a exclusão de homens para debater amamentação – pelo simples fato de serem homens – é para mim um grosseiro equívoco. Digo o mesmo sobre o tema do parto e uso a explicação de que “homens nascem e homens são amamentados”, portanto, esse assunto igualmente nos atinge e nos diz respeito. Ressalvas sejam feitas aqui ao “lugar de fala”, por favor.
Eu convidaria aqui no Brasil Marcus Renato e João Aprígio sem pestanejar para um congresso como este, e poderia colocá-los inclusive na presidência do mesmo porque são grandes defensores e batalhadores incansáveis pela amamentação…. e são homens. O gênero importa menos que o engajamento no tema, mesmo que a vivência no processo de amamentar seja um fator relevante e significativo.
Entretanto, a ausência de mulheres na mesa fala muito mais de uma negação a elas do que de uma pretensa falta de especialistas sobre o tema da amamentação do sexo feminino. No Brasil – e posso garantir que também no México – existem médicas, enfermeiras, psicólogas ou nutricionistas capazes de levar adiante esta bandeira com pleno embasamento científico e com grande experiência no ativismo. Portanto, a ausência de mulheres e a presença de representantes da indústria láctea neste evento é um claro sinalizador de que as mulheres não estão presentes porque a sua “substituta” – a indústria de fórmula – veio para ocupar sua voz e seu espaço.
As causas são PROFUNDAMENTE masculinas. Elas são mudanças no rumo da história, do roteiro das ideias. São golpes de machado nas raízes da natureza. Os homens sempre estiveram por trás delas. As revoluções foram todas lideradas por homens, assim como as lutas, as guerras, as conquistas. Todas estas são “causas”, mais ou menos nobres, que estimularam a inventividade, a coragem e a genialidade. Todas, sem exceção, determinaram vontade, desprendimento e sacrifícios.
A história está repleta de homens que sacrificaram tudo – em especial a própria vida – em nome de causas que ajudariam a todos. Pense em qualquer movimento paradigmático no mundo e houve ali um homem envolvido em uma grande luta que envia a todos de sua etnia, seu grupo, comunidade ou país.
Sim, homens não se preocupam tanto com câncer de pênis ou próstata o quanto deveriam. Entretanto se preocupam com o de mama e o de colo uterino, que sequer é no corpo deles. Todos os recursos, a energia, a vontade e a dedicação está focada para ajudar as mulheres, as matrizes, suas mães, filhas e esposas.
Mas… claro que isso é apenas mais uma faceta do machismo. Os homens cuidam das mulheres porque as odeiam e querem escravizá-las. Curam suas doenças, tratam suas feridas, deixam suas vidas mais dignas, mas o motor destas ações é o ódio. Este mesmo ódio que todo homem carrega por uma mulher é fruto da…. da… raiva que sentem da primeira mulher que os abandonou. Por isso tanta mágoa e desprezo. Por isso as poucas causas em que os homens se engajam dizem respeito apenas ao seu gênero, sua infinita vaidade e seu infindável egoísmo.
The acknowledgement of the importance of male partners in the struggle for better births is essential exactly because we all live in patriarchal societies. It’s natural for women in this kind of society to know their own strength, but it is unusual for men in a chauvinistic culture to see – thru the mist of male dominance – the pure and amazing power women have during childbirth.
In other words, it is much easier for women to see that reality than for a male obstetrician, in a masculine and interventionist profession, inside a male and chauvinistic culture and against the opinions of his colleagues, professors and even the women he assists. Instead of criticizing the attention that these rebels receive from the humanistic field women activist should welcome their decision in choosing the women’s perspective in childbirth. All male obstetricians I know face prejudice and explicit attacks from their peers, and some – like me – lose their licenses to practice because of their willingness to honor women’s full autonomy in birth.
These guys all over the world have a hard time with the medical Mafia and the cesarean industry, but continue to fight for the right for every woman to have a doula and a midwife at their side. Even thou we should honor and embrace all women around the world, which help other women to give birth for thousands of years, it is important to recognize the “good guys” that fight the system from inside.
It is sad to read women writing “men are inferior creatures”. My question is “do women actually say that to their boys”?
It is also sad to see women doing the same mistakes and using the same prejudices in their words that we men did for centuries.
O reconhecimento da importância dos parceiros masculinos na luta por melhores nascimentos é essencial, exatamente porque todos nós vivemos em sociedades patriarcais. É natural que as mulheres neste tipo de sociedade conheçam suas próprias forças, mas é incomum que os homens em uma cultura machista vejam – através do olhar do domínio masculino – o poder puro e surpreendente que as mulheres têm durante o parto.
Em outras palavras, é muito mais fácil para as mulheres ver essa realidade do que para um obstetra homem, numa profissão masculina e intervencionista, dentro de uma cultura machista e contra as opiniões de seus próprios colegas, professores e até mesmo das mulheres que ele ajuda. Em vez de criticar a atenção que esses rebeldes recebem do campo humanista, as ativistas do parto deveriam acolher sua decisão pela escolha da perspectiva das mulheres no parto. Todos os obstetras homens que conheço enfrentam preconceitos e ataques explícitos de seus pares, e alguns – como eu – perdem suas licenças para praticar por causa de sua disposição de honrar a plena autonomia das mulheres no nascimento.
Esses médicos em todo o mundo têm dificuldades com a máfia médica e a indústria das cesarianas, mas continuam a lutar pelo direito de toda mulher ter uma doula e uma parteira ao seu lado. É certo que deveríamos honrar e abraçar todas as mulheres ao redor do mundo que ajudam outras mulheres a parir – por milhares de anos – mas é igualmente importante reconhecer os “mocinhos” que lutam contra o sistema por dentro.
É muito triste ler as mulheres escrevendo que “os homens são criaturas inferiores”. Minha pergunta é “as mulheres realmente dizem isso aos seus meninos”?
É triste ver mulheres cometendo os mesmos erros e usando os mesmos preconceitos em suas palavras que nós homens fizemos durante séculos.
E mais fácil estereotipar e ter preconceito com homem, né? Não dá nada, afinal eles são os opressores, certo?
Podemos rotular e pré julgar sem correr o risco de sermos chamados(as) de sexistas. Barbada. É só dizer que homem não pode ser doula ou não pode cuidar de criança e tudo bem; ninguém faz um escândalo por isso. Mas experimenta dizer que mulher não pode ser cientista nuclear, tomar conta de uma empresa, de um avião, de uma cirurgia delicada, que isso não é algo “feminino” pra ver o mundo cair na sua cabeça.
O teste preciso para o preconceito é quando combatemos um que nos beneficia.
A partir de amanhã não faço mais parte do Portal “V. Mamífera”. Durante o tempo em que lá estive pude exercitar minha vontade de escrever, conjugada com uma necessidade praticamente insana de exorcizar pensamentos e ideias. Em função da minha inabilidade com as limitações políticas da escrita, e o desejo de dizer abertamente e sem anteparos a verdade de minha mente, acabei ferindo suscetibilidades de algumas parceiras do Portal que se sentem incomodadas com a minha presença, a ponto de exigir a minha expulsão. Meu pensamento, livre de amarras ideológicas e aberto para o embate no terreno das ideias, deixou algumas companheiras decepcionadas, o que acho respeitável e compreensível. É provável que na posição delas eu sentisse o mesmo. Entretanto, há alguns meses eu escrevi que faz parte de uma trajetória séria o cultivo de algumas decepções. Mais ainda, disse que “a não gostância dói, mas a unanimidade maltrata ainda mais“. Ser colocado numa posição de expectativa oblitera a liberdade de expressão, e é um castigo que não mereço.
Assim sendo me despeço dos colegas que cultivei e peço desculpas àqueles que decepcionei. Continuarei meus escritos solitários em meu futuro blog onde as pessoas poderão entrar se desejarem ler o que eu escrevo. Peço perdão se minhas palavras feriram alguém, mas no embate das ideias isso pode ocorrer a qualquer momento. É inevitável que o atrito gere calor, que para muitos é insuportável. Minha saída objetiva, acima de tudo, manter ativo um portal que foi construído com muito carinho pela doula Kalu Brum com o desejo de estimular o debate sobre partos e nascimentos no Brasil.
Sobre a fonte da discórdia, não retiro nada do que disse, porque mantenho minhas posições ainda hoje, mesmo admitindo que um dia argumentos melhores possam fazer que sejam alteradas. Continuarei na minha luta, cada vez mais pessoal e isolada, pelo pleno protagonismo da mulher nos seus momentos sagrados de gestar, parir e amamentar. Vou me manter fiel à LIVRE escolha, sem constrangimentos, das pessoas que ELA decide como acompanhantes. Continuarei escrevendo sobre a beleza de um nascimento protegido pela aura sublime da paz, que se conquista passo a passo em cada parto atendido com dedicação e envolvimento. Por outro lado, não me calarei diante dos exageros, da insensatez, da violência, da censura, e da tentativa de cercear a liberdade de pensamento em nome de ideários sectários. Não é calando a boca de alguém que se estimula o debate, e nada se constrói sem o choque dos contraditórios, que energizam o caminho e as conquistas.
Afastar os homens do cenário do nascimento pela constante desconsideração de suas vozes, criando um ambiente negativo e violento, só pode produzir a fragmentação de um movimento, o que atrasa seu progresso. Os opositores, os que fazem parte do “mainstream” do parto cirúrgico, sempre se divertem com essas brigas intestinas. Para os amigos que entenderam minhas posições, principalmente no que tange às diferenças entre “machismo” e “patriarcado“, eu espero que compreendam a atitude de minhas colegas. Para elas, absorvidas na luta diária por um mundo com mais equidade, minhas palavras parecem se contrapor ao que pensam. Não é o que eu disse, e muito menos o que eu penso, mas entendo que no seu ativismo uma voz dissonante (e não discordante) possa desestabilizar as suas lutas.
Obrigado pelo tempo em que pude compartilhar este espaço.
O artigo anexado – escrito em 1976, quando a honra de alguém levava mais tempo para virar cinzas – nos mostra o significado do “trashing”, ou como se destroem reputações e se joga na lama antigos parceiros que ousam pensar diferente e que vocalizam suas ideias de forma aberta e clara. Sempre que o “movimento”, a “causa”, a “irmandade” são maiores do que as pessoas que os compõem (ou combatem) teremos o que se chama “pensamento totalitário“. Quando Stálin mandava matar centenas de “tavarish” com um simples e prosaico golpe de caneta, em nome da “grande mãe Rússia”, ele também não se importava com o camponês que tinha 4 filhos, era casado com Olga e se chamava Vladimir. Não, o sujeito perdia sua face e sua história diante da “causa maior”. Entretanto, sem o respeito à cada uma das pessoas que vivem nesse planeta como portadoras de um elemento sagrado – sua individualidade – só o que teremos é o terror e o desprezo como elementos de controle social.
A expressão que mais se repetiu no recente episódio da perseguição contra mim (que ousei diferenciar patriarcado de machismo), curiosamente dita por doulas e ativistas dos direitos da mulher, foi “não passará“, uma provável alusão ao “Senhor dos Anéis”, quando Gandalf, o mago, grita da beira de um penhasco para um ser diabólico que tenta alcançá-lo em uma ponte. “You shall not pass!” diz ele levantando seu cajado ameaçadoramente. Pois a frase parece ser plena de sentido nos recentes acontecimentos. Para que a causa tenha sucesso os debatedores contrários aos dogmas do “movimento” são reduzidos a demônios maléficos, imbecis e uma série de outros adjetivos facilmente encontrados quando se procura desonrar um adversário. Para estes seres do mal nenhuma pena é pouca ou suficientemente dura.
Afinal, aquele que trai os nossos sonhos não merece menos do que a destruição de sua reputação.
O movimento feminista é, em alguns aspectos, igual a todos os movimentos de libertação do mundo, como o LGBT ou dos negros, mas em alguns aspectos é único em suas particularidades. Não vou falar o que as feministas devem fazer, mas ouso dizer que esmigalhar publicamente defensores da causa ou destruir reputações de irmãs do movimento jamais serão meios adequados de se alcançar justiça e equidade de gênero. A visão histórica (marxista) dos eventos sempre nos coloca face a face com os nossos dilemas e fragilidades. Não gostamos de falar disso. Não curtimos olhar para as falhas do passado e preferimos glamorizá-lo ou inventá-lo. Mas qualquer movimento que não se critica cristaliza e morre.
Nunca um artigo veio tanto a calhar no atual debate sobre o feminismo X humanização do nascimento. Sei que tê-lo publicado vai fazer incrementar o “trashing” pois os personagens descritos nele se parecem com algumas militantes mais violentas que conheci. O desabafo de muitas das vítimas deste tipo de perseguição poderia ter sido escrito por mim, e a dor e desesperança deles se parecem muito com as minhas. Espero que todos possam assimilar os ensinamentos contidos no episódio para que as ativistas não sejam obrigadas a castrar sua natural criatividade por medo da destruição subsequente de sua honra e imagem social.
A violência contra as mulheres é uma ferida aberta em nossa sociedade. Ponto. Não há como negar esta realidade e nem é possível colocar panos quentes em uma tragédia cotidiana que tira a vida de centenas de mulheres todos os anos por um machismo violento e desmedido. Por outro lado, eu creio ser possível complexificar a questão, mesmo sabendo que qualquer sujeito que fale da violenta perpetrada PELA mulher será sempre julgado como “machista”, insensível, ou que vê o cisco e não enxerga a trave diante de seus olhos. Porém, quando uma mulher inteligente, aparentemente madura, com curso superior e bom emprego te conta que há 5 ou mais anos apanha sistematicamente do seu parceiro(a) fica a dúvida até que ponto existe uma violência doentia por parte do parceiro e quando, associado a isso, há uma patologia da relação que faz aparecer nela um gozo (não confundir com prazer ou vontade) de apanhar. Estudar este gozo é fundamental para que esta mulher desfaça um sistema de violência que se retroalimenta. Acontece muito com alcoolistas: uma menina testemunha as violências aplicadas na mãe pelo pai durante toda sua infância e quando mais tarde se casa, adivinha quem é o marido? Um alcoolista violento. Ela repete a cena infantil em sua relação adulta.
Dizer que uma mulher participa inconscientemente de um jogo erótico patológico destrutivo NÃO é a mesma coisa que dizer que “ela pediu“, ou que “ela merece“, e muito menos que o parceiro dela está desculpado, perdoado ou é inocente. Significa apenas que ela também precisa ser ajudada para que possa fugir do padrão. Caso contrário ela corre o risco de se separar desse sujeito perturbado e encontrar outro drogadito violento, por nunca ser capaz de entender o que a levara a procurar relações em que sofre e é violentada. Existe um campo de estudo e pesquisa da psicologia (e da criminologia) chamado “vitimismo” que estuda as relações patológicas de pessoas que sempre são vítimas de relações ou situações deste tipo, mostrando haver um determinismo psicológico inconsciente que as leva a se colocar neste modelo de relação. Eu mesmo conheci uma mulher, minha paciente, que namorou três sujeitos na vida, e todos eles acabaram se mostrando no transcorrer da relação como homossexuais, o que pôs fim aos relacionamentos. Ela ficava muito decepcionada e não acreditava como podia ser tão azarada. Nunca acreditei na tese que ela mesmo trazia do azar, mas o caso dela parecia provar um tropismo por trejeitos e manifestações sutis que ela identificava como atrativos, e a surpresa pela descoberta da homossexualidade operava na ordem do inconsciente, ao invés de conscientemente percebido.
A violência das mulheres só é mais branda porque elas são fisicamente e politicamente mais frágeis. No filme “O Senhor das Moscas” este tipo de ilusão é desfeito não com relação às mulheres, mas com os pequenos. Nós temos a ilusão de que as crianças são “do bem“, anjinhos inocentes e carentes, apenas porque NÃO conseguem fazer muito mal, pela sua fragilidade. Esse filme desmistifica a “candura” das crianças, assim como Freud desmistificou as relações eróticas que elas estabelecem com suas mães.
As mulheres não batem em maridos – ou os agridem com a mesma intensidade e frequência – apenas por serem frágeis e não por serem virtuosas. Esse essencialismo “mulheres do bem, homens truculentos e violentos” é tosco e tolo. Basta até você acompanhar os relatos de violência doméstica para perceber que, em muitos casos, a mulher foi vítima apenas porque era a mais fraca e não porque era moralmente superior, mais calma, ponderada, ou uma vítima silenciosa. Não é justo tratar os homens desta forma estereotipada, porque isso não ajuda a causa das mulheres. Temos que combater a violência contra a mulher sem romantizar estas relações e entendê-las como uma interação patológica de gozos destrutivos, em que ambos tem responsabilidade, mas que uma parte – a mais fraca – corre sério risco de vida.
Quando falamos de minorias como as mulheres (são maioria, mas politicamente e socialmente podem ser consideradas uma minoria) qualquer menção às perversidades femininas – inclusive em uma relação violenta por parte do parceiro – será julgada como “acusar a vítima“, quando na verdade muitas vezes se usa para que fique claro que uma relação é SEMPRE uma dualidade feita da interação de sujeitos, amalgamados e entrelaçados em seus fantasma. Se não é justo absolver os homens das violências e mortes praticadas, também é certo entender que nessa junção de almas existem parcelas de responsabilidade em ambos os sujeitos.