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Criei um blog há 11 anos para guardar tudo que eu escrevia, não para mostrar para alguém ou para se tornar algo relevante. Queria tão somente um relicário, um baú cheio de papéis misturados, com notas escritas em pedaços de papel, em alvas servilletas, uma pasta de documentos velhos, recibos de vida, notas fiscais de sentimentos, duplicatas de idéias, holerites de sensações confusas. Sabia da brevidade da vida e desejava manter meus pensamentos vivos depois ainda da decomposição da minha última célula.

Durante os últimos 11 anos colecionei histórias pessoais e contos, crônicas e aulas, e as depositei silenciosamente nesta caixa virtual. O nome “Orelhas de Vidro” é a mistura de “Entre as Orelhas” e as “Memórias do Homem de Vidro”, meus dois livros publicados, e este título só tem uma única virtude: contei para o meu pai o nome e ele sorriu.

Hoje percebi que algumas pessoas vão até lá para espiar e ver o que há dentro dessa caixa. Na última década acumulei quase 2500 artigos, histórias, piadas, relatos e tudo aquilo que me parecia relevante. Não são muitas estas pessoas, mas são muito mais do que eu achava possível. O que Deus me sonegou de talento me ofereceu de impulsividade; se não aprendi a escrever, não foi por falta de vontade ou treino. Ainda acredito que tudo que aqui se faz poderá ser usado em outra dimensão; portanto jamais haverá trabalho inútil. Tudo se acumula e se transforma.

Para quem aceitou se arriscar, meus agradecimentos…

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Bloqueios

A dificuldade de interpretação continua sendo a tragédia das redes sociais. Um drama que parece não ter sido ainda controlado pois se assenta sobre um fato inconteste, e talvez insolúvel: só lemos o que nosso desejo permite e apenas o que se adapta ao molde previamente determinado por nós na fala do outro.

Criamos espantalhos cujas palavras não tememos (dis)torcer, desde que, assim construídos por nós mesmos, sejam mais facilmente atacados pela fúria de nossas crenças.

No fim acabamos debatendo solitariamente, gritando contra nossas próprias contradições e fragilidades. Solilóquios que se multiplicam em milhões de respostas agressivas e “lacrações”, navegando no cyberspaço a milhões de bytes por segundo.

Todos os dias, em toda parte…

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Observações a partir de um texto de Zizek

Observações pessoais, sujeitas à críticas:

Sim, a ideia (ou o clichê) de que “Freud está ultrapassado” é muito comum em alguns grupos. Algumas feministas ficam enfurecidas quando o mestre austríaco é citado em qualquer contexto. Muitas vezes li e ouvi de forma bem clara que a queixa contra Freud ultrapassava suas concepções sobre a mulher e o feminino, e invadia a própria essência da mensagem freudiana, ou seja, a existência de uma dimensão do inconsciente. Nestes momentos eu vejo claramente a imagem do discurso pré freudiano, onde a negação do inconsciente leva a uma arrogância racionalista.

Eu também acho pura arrogância a ideia de ser “fiel a si mesmo”, no sentido de obedecer as suas vontades e desejos. Via de regra ignoramos por completo o que verdadeiramente desejamos. Quando eu vejo relatos de pessoas sobre o que são, como pensam, seus valores, suas virtudes eu chamo de “síndrome de pocanálise”, pois os relatos nunca falam da verdade do sujeito, que lhe é interditada. Por isso precisamos de Freud mais do que nunca. O mundo não vai ultrapassar Freud até que surja algo tão revolucionário quanto sua obra para compreender a alma humana, o inconsciente e a sexualidade.

A ideia do jogo, da ficção, sempre foi uma estratégia que usei em consultas, baseada no fato de que pedir que alguém fale (a verdade) sobre si mesmo é ingênuo e inútil, e produz apenas alegorias, fantasias e auto enganos. Assim, eu pedia para que os pacientes descrevessem os outros, seus amores e seus desafetos, ou pedia que vestissem uma máscara qualquer, ao estilo “no lugar dele, o que você faria”, e escutava atentamente o paciente descrevendo seu personagem como em um jogo de RPG. Somente nesses momentos era possível que alguma verdade surgisse, desviando do retrato enganoso que sempre fazemos de nós mesmos.

Concordo que a repressão do desejo leva ao desejo da repressão. Essa característica fica muito fácil de ser percebida no proibicionismo. Pode ter certeza que aqueles que mais querem punir, castigar e proibir são os que mais sofrem pela repressão de seus desejos. Vemos isso com facilidade na legião de fascistas que querem a repressão a todo custo, que desejam prender o Lula, fechar o STF, diminuir a idade penal, a volta da ditadura, prisão, encarceramento, pena de morte ou que apoiam linchamentos de toda sorte. Estes, que tanto querem proibir e punir, são os que mais se martirizam como o bloqueio da expressão de seus desejos.

Por certo que todo o jogo da sexualidade está em jogar com os obstáculos. O segredo do desejo é a proibição, e por isso tanto desconforto ou desinteresse na sexualidade ocorre na medida em que os seus obstáculos desaparecem ou são suprimidos pela cultura. No filme “O Piano” de Jane Campion, aparece a bela metáfora do “furo na meia” que, ao meu ver, simboliza o gozo de brincar de driblar os obstáculos. Por isso eu gosto tanto do pudor: ele é exatamente essa proibição, esse bloqueio, o muro, que produz a vontade constante de brincar com os véus que se interpõem entre nós e o objeto de desejo.

Uma vez reclamei da facilitação que pais faziam para o exercício da atividade sexual de seus filhos adolescente. Fui atacado exatamente por entender que nenhuma sexualidade madura vai se estabelecer sem que ela esteja associada à suplantação de barreiras e muros – quanto mais alto mais será a significativa a conquista. Há ajudas que são profundamente destrutivas.

Por fim, concordo com Zizek que a sexualidade se baseia na possibilidade de manter um espaço de impossibilidade.

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Protegido: A procura de um pai

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Fantasia

No brilhante documentário “Pervert´s Guide to Cinema“, de Slavoj Zizec o excêntrico psicanalista e marxista esloveno pergunta: “por que afinal precisamos da ficção?“. Por qual razão nossa imaginação cria universos paralelos, conta histórias, relata fantasias e se refugia na literatura, no teatro e na última das artes, o cinema? Por que o desenvolvimento da nossa espécie não poderia se fixar na vida real, concreta, física, deixando de lado as complexas elaborações do simbólico?

A resposta talvez seja porque a ficção nos oferece um relaxamento para a crueza do real, assim como o sonho – a ficção subjetiva de cada noite – nos oferece uma forma de apaziguar as tensões da vida conflituosa que surge com o nascer de cada dia.

A fixação das crianças pelas histórias é algo impressionante. Mais do que apenas escutar as narrativas, elas as criam cotidianamente. No mundo em que vivem elas apenas esporadicamente visitam a realidade palpável, enquanto passam a maior parte do tempo imersas em suas fantasias. Para elas estas histórias são instrumentos que utilizam para dar conta da infinidade de decisões complexas que precisam tomar todos os dias. Mais do que o alívio para seus temores e medos, o mundo das fantasias é uma grande escola onde encontram as ferramentas para lidar com os monstros que enfrentam na dura tarefa de amadurecer.

– Mas, ela poderia se atirar do alto da torre, pois lá em baixo os ursos a segurariam. Como Sophia tem poderes, ela jogaria lá de baixo uma corda mágica e salvaria seus amigos. Pode ser vovô?

E por que não? Se assim o desejas, que assim se faça.

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