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Tríptico Amor Romântico – 1. Amores decadentes

Tenho uma curiosidade sobre a “decadência do amor romântico” e gostaria de saber a opinião das pessoas sobre essa ideia. Por que tantos acreditam que o amor romântico “não funciona” e precisa ser eliminado? Qual a alternativa a ele? Se o amor romântico não funciona a alternativa seria a construção de uma cultura hedonista, baseada em múltiplos encontros sexuais e amorosos fugazes, superficiais e “operacionais”, tipo, objetivando apenas a reprodução? Poliamor seria a resposta para o desejo? Relacionamentos abertos? E as crianças? Tribos, comunidades, comunas? Como podemos imaginar as sociedades, as famílias, as crianças e a velhice num mundo pós amor romântico?

A questão proposta é apenas esta: se o amor romântico como o entendemos não tem mais sentido, como seria a estrutura social do futuro? Amores líquidos, meteóricos? Prazeres descompromissados? Surubas cibernéticas? Sexo casual? Filhos comunitários? Admirável Mundo Novo?

Para ser mais explícito, não é sobre apaixonamento, tesão ou outros tipos de amores que estamos falando. “A crise do amor das relações surgiu no horizonte como um impacto muito forte, com as separações tanto das relações mais formais como as informais. O casamento oficializado entra em crise.” (Edson Fernando Oliveira). A crise está na ideia de que precisamos nos relacionar por amor, pelo desejo de formar parcerias longas, “até que a morte os separe”, uma vida conjunta envelhecendo em parceria, ao lado de filhos, netos e bisnetos. É sobre esse “contrato social” de pessoas que estão juntas e decidem se manter assim porque se amam. Não é sobre paixão e desejo, mas a forma de acomodá-los, criando uma dualidade afetiva duradoura.

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Comunidades

Publiquei em outros lugares esta minha breve análise sobre vida em comunidade mas acredito que possa ser pertinente expandir o debate para mostrar o que realmente significa “viver em comunidade”. Minha motivação foi o fato de morar há 3 anos em uma comunidade, ter visitado comunidades como Osho Rashana e Findhorn (em Inverness na Escócia), e por ter lido esse post, que é uma bela provocação. Minha intenção é mostrar o quanto do que está escrito nele é profundamente fantasioso e idealista.

De uma forma geral as comunidades são empreendimentos de altíssimo risco. Quando me perguntam se é difícil uso o mesmo argumento para abordar o problema do “trissal“: se já é um terror com duas pessoas, imagine adicionar 50 pessoas no projeto.

Antes de abordar o sonho de criar uma vida comunitária é forçoso saber que existem 5 grandes fatores de dissolução de comunidades, a saber:

1. Comida. O tipo de alimentação é muito importante em especial nos grupos cuja motivação congregacional – também chamada “cola” – é religiosa. Mesmo em grupos pequenos o convívio de um churrasqueiro com grupos veganos pode se tornar insuportável. Também algumas restrições ligadas à religião, como carne de porco e crustáceos podem ser motivo de atrito. Na maioria das vezes a questão é vegetarianismo e carnivorismo, geralmente um “osso duro de roer”.

2. Religião. Não exatamente as crenças, normalmente bem toleradas, mas suas práticas. Isso até mesmo é importante em vertentes diversas dentro de uma mesma religião, como xiitas e sunitas, católicos e protestantes. Ateus e suas práticas niilistas em geral são mal tolerados. Satanistas são festeiros e em geral são gente boa, mas quem aguenta alguém dizendo “Deus é uma mera criação humana” todos os dias, ou “Onde está teu Deus agora?”.

3. Animais domésticos. Esses conflitos são terríveis em comunidades, e basta ver as brigas em condomínios de apartamentos para ver o quanto uma comunidade sem muros pode produzir atritos e até dissoluções por gatos, cães, galinhas, passarinhos, coelhos, etc. Os cachorros largam pelo, os gatos dão alergia, galos cantam ao alvorecer, galinhas cacarejam e, para piorar, as “mães e pais de pet” tem tolerância zero com atitudes é palavras grosseiras dirigidas aos seus filhos.

4. Drogas. Sim, mas qualquer droga, da caipirinha às metanfetaminas, passando por maconha e ópio. Até café, chá e Coca-Cola podem ser motivo para disputas, dependendo se houver mórmons na comunidade. Maconha é o uso mais frequente depois do álcool e cigarros, e todos são potencialmente conflituosos. Gente passada no álcool ou “muito loucos” destroem uma comunidade em minutos.

5. Conflitos pessoais. Nem precisa pressionar muito a imaginação para perceber o quanto a proximidade em uma vida comunitária estimula conflitos. Basta ver namorados que nunca brigam, mas bastou viverem juntos para que os enfrentamentos apareçam e tornem a vida de ambos insuportável. Coloque num caldeirão vários indivíduos com traumas, tristezas, vivências e valores diversos e a chance de sair uma sopa bem azeda é enorme. Além disso, ninguém conhece suficiente bem alguém antes de conviver com ele e suportar os choques inevitáveis do cotidiano.

Em suma, como diria León Tolstói em Anna Karenina, “Todas as famílias felizes são iguais; as infelizes o são cada uma à sua maneira“. Da mesma forma as comunidades que perduram são iguais em sua tolerância às diferenças e pela manutenção de uma cola unificadora firme e persistente. São caracterizadas por resiliência e respeito aos modos de cada família, estabelecendo regras e muros sólidos para evitar que conflitos perdurem mais do que o suportável. Já as comunidades que fracassam o fazem cada uma à sua maneira específica, que pode ser através de qualquer um dos elementos mais frequentes listados acima ou por fatores absolutamente únicos. As tragédias, como bem o sabemos, tem seu curso variado, insidioso, silente e muitas vezes imperceptível.

É claro que a pessoa que publicou este post o fez por puro humor. Criou uma situação idílica onde todos seriam felizes juntos, tão irreal quanto o “viveram felizes para sempre” que encerrava as histórias de príncipes e princesas nos contos de fadas. Entretanto é bom ter em mente que a salada de valores e projetos que consta no texto levaria muito facilmente o projeto a um retumbante fracasso – e num curto espaço de tempo. Em verdade, a estatística sobre o tema é bem clara: apenas uma de cada dez comunidades que se iniciam prospera. As outras todas sucumbem, muitas vezes deixando um rastro de ressentimento e decepção para trás.

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Childfree

Sobre páginas “Childfree” – grupo de pessoas que combatem a discriminação contra indivíduos sem filhos…

Minha percepção sobre estas comunidades nas mídias sociais é que TODAS essas páginas de grupos oprimidos passam pelo mesmo processo. Observe bem: se você fizer uma página de pessoas negras que lutam contra o preconceito racial com o tempo vai aparecer alguém que odeia brancos e deseja destilar todo o seu ódio contra essas pessoas, devolvendo a violência que sofre com mais violência – agora com sinal trocado. Certamente serão uma grande minoria, mas a veemência de seu discurso, fruto de dores continuadas, fará sua voz reverberar mais alto do que a maioria silente.

Da mesma forma, se um grupo feminista se une para combater a opressão machista vão inevitavelmente aparecer mulheres com discurso de ódio – e não contra os machistas, mas contra todos os homens. É fácil descobrir quem são: rapidamente dizem que o estupro é algo “natural” para todos os homens, são todos “esquerdomachos“, não passam de “escrotos” e não são dignos de nada. Escrevem sobre a superioridade moral de um gênero sobre o outro e, apesar de serem minoria, acabam contaminando os grupos com a potência do seu ressentimento. Devolvem a opressão que dizem sofrer com ódio, exclusão, violência e vingança.

Os grupos “childfree” eu pouco conheço. Minha posição de admiração ao parto e às crianças nunca me permitiu qualquer aproximação com pessoas que desprezam esses aspectos essenciais da vida. Entretanto, a escolha PESSOAL de não ter filhos é tão respeitável quanto qualquer outra. Eu não diria o mesmo de uma postura institucional ou proselitista – pois ela atenta contra a própria continuação da vida humana no planeta – porém, esta decisão pessoal, como qualquer outra, precisa ser respeitada.

Esse grupo não poderia fugir da sina de todos os outros. Se foi mesmo criado para combater o preconceito contra sujeitos que decidem não ter filhos, rapidamente atraiu pessoas cujos traumas pessoais as levam a odiar crianças, grávidas e casais que desejam engravidar. Não há como evitar que estes nichos se tornem atraentes para o deságue de ressentimentos e rancores antigos de pessoas cuja vida é salpicada de traumas.

Cabe a quem coordena tais ambientes depurá-los de indivíduos que usam uma boa causa – combate ao racismo, feminismo e preconceito contra sujeitos sem filhos – como palco para que seu drama pessoal seja encenado e onde possa distribuir sua mágoa destrutiva.

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