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Humor

Entre as minhas mais antigas manias está tentar descobrir a origem das coisas. Sim, teorias sexuais infantis levadas às últimas consequências. De onde vem os bebês, como chegam lá, mas também porque eles existem? Qual o sentido último de existir? Para quê? Meus colegas do Grupo Vocal DaBocaPraFora ficam bravos quando insisto em perguntar porque cantamos, qual o sentido da harmonia, quem inventou a música e com qual objetivo. Por qual razão os grupos mais primitivos já se reuniam e buscavam o ritmo e a sonoridade, primeiro pela boca e depois por meio dos objetos? Por que arrepiamos os pelos quando reproduzimos, pela voz, notas distintas que, juntas e em sintonia, produzem harmonias? O que esta conexão pelas vozes representa e onde ela nos leva a ponto de nos emocionar pelo som?

A propósito, lembro da conversa com um famoso psicanalista e nossa viagem épica de Santa Catarina até Porto Alegre. Entre xícaras de café, fiz a ele uma pergunta que misturava antropologia com psicanálise: “Qual a origem do inconsciente?” perguntei. Ele deu uma risada e respondeu: “Foi um dia em que dois pré-humanos caminhavam pela floresta e encontraram duas mulheres lavando pedaços de carne à beira do rio. Os dois se entreolharam e um deles perguntou ao seu parceiro (provavelmente com sussurros guturais e gestos) qual delas lhe interessava. O outro apontou para a de cabelos compridos e nádegas amplas. O primeiro, abrindo as mãos espalmadas e encolhendo os ombros, perguntou a razão de sua escolha, ao que o outro, sem o saber, ofereceu a resposta que inauguraria o inconsciente: “Eu não sei”, disse ele, fixando o olhar em seu objeto de desejo”. Claro, meu amigo psicanalista disse isso com a liberdade para, também ele, contar piadas de tiozão do pavê enquanto tentava desvendar o mistério do surgimento do calabouço escuro e úmido dos nossos desejos.

Há alguns dias li uma pesquisa que apontava a qualidade que mais atrai as mulheres quando se aproximam de um homem: a capacidade de fazê-las rir. Acho curioso, pois o humor refinado das mulheres não é um fator que possa, mesmo que minimamente, competir com peitos e bundas na perspectiva masculina. Mas, por que haveria de ser o humor masculino tão atraente? Por que até o cinema explora esta qualidade dos homens, colocando-a como um elemento a mais no charme dos galãs? Por certo que devem existir estudos e ensaios sobre o humor como elemento constitutivo do “sex appeal” dos machos, mas estou com preguiça de investigar, e por isso vou me limitar a dar minha opinião.

O humor é algo que nos humaniza. Ele mostra nossas falhas e erros; nossa pequenez e nossas incompetências. Ele tira a capa de idealização que criamos sobre pessoas e personalidades – e sobre nós mesmos. Mostra os pés sujos dos políticos, o dente torto da modelo, a tolice do astro do futebol. Também mostra a fragilidade da vida, da beleza, da juventude e do poder. Os tombos, as quedas, a torta na cara, nada mais são do que a exposição de nossos egos frágeis. As piadas mostram nossa face menos bela, desengonçada, falível e delicada. O humor, imagino, pode ter sido criado por aqueles dois amigos, os mesmos que inventaram o inconsciente, quando, depois da escolha pela parceira preferida, um disse ao outro: “é muita areia para seu caminhãozinho”, e riram, mesmo sem saber que os caminhões só seriam criados mais de 1 milhão de anos depois.

Talvez as mulheres se atraiam por homens que não apenas façam gracejos, mas que sejam capazes de fazer piadas sobre si. É possível que o autoesculachamento seja visto inconscientemente por elas como um elemento claro de humanização, que retira do macho a imagem ancestralmente construída do sujeito poderoso, duro, tirano e violento, de cuja fúria ela precisaria proteger até os próprios filhos. Quem sabe esse seja um dos mais potentes elementos de atração, exatamente porque oferece às mulheres uma promessa de suavidade, de cuidado e de respeito mediante uma visão crítica de si.

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Ranking

Mais uma vez eu vi a expressão “pessoa de alto valor”, que é muito usada por esses coaches de relacionamento que instituíram uma espécie de métrica para os sujeitos no que diz respeito à sua capacidade de atrair. Funciona como se cada um de nós fosse um personagem de RPG que tem “x” pontos de beleza, outros de dinheiro, uma pontuação por sua família, outros pontos obtidos por formação, outros por carisma e no final o indivíduo tem um “score” que vai lhe garantir uma posição no ranking do seu gênero. Tudo isso parecendo um capítulo de “Black mirror”.

Isso funcionaria se os elementos perceptíveis e objetivos de cada um de nós fossem os únicos determinantes das escolhas sexuais. Entretanto, é enganoso pensar assim. Somos um gigantesco núcleo de medos, cobertos por uma capa de crenças inconscientes e irracionais, e sobre ela repousa uma fina e translúcida camada de racionalidade, uma fachada enganosa e diáfana, que nos oferece o diferencial da razão. Este fino verniz nos afasta dos medos criando uma sensação de controle sobre a natureza. A fina camada cinzenta que recobre nosso cérebro, uma novidade no processo evolutivo, oferece alternativas racionais às escolhas cotidianas, ao mesmo tempo em que nos ilude fazendo crer em uma luminescência apenas aparente.

Somos dominados pelas trevas do inconsciente, e o calabouço sombrio e úmido onde ele impera conduz nossas escolhas afetivas de forma muito mais efetiva que os elementos objetivos destes escores contemporâneos. Aliás, prefiro crer no “amor à primeira vista” e nas “almas gêmeas” do que acreditar que essas pontuações objetivas possam produzir qualquer vantagem na busca por um parceiro ou parceira para a vida. No que diz respeito ao amor, confio mais nos meus intestinos do que na minha cabeça.

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Autoimagem

Quem já não escutou essa manifestação, carregada de arrogância e autoconfiança?

“Eu me conheço. Sei muito bem quem sou.”

Em verdade, somos as piores pessoas possíveis para avaliar em profundidade quem realmente somos. Por sermos uma construção do olhar alheio, a estrutura mais profunda da nossa alma é invisível ao olhar que lhe dirigimos. Só quem nos percebe de fora percebe o tanto que a nós é interdito. Como medida de proteção somos excessivamente condescendentes com nossas falhas, e nos tornamos propícios a exagerar pequenas conquistas que obtemos. Aliás, aqui se encontra um velho truque dos médicos antigos e perspicazes: se quiser saber da intimidade de um paciente, suas emoções mais recônditos e seus prazeres mais mórbidos, jamais peça que fale de si mesmo; tal descrição é inútil e redundante. Ao invés disso, peça que fale com minúcias dos seus desafetos; na projeção que joga sobre eles aparecerão de forma clara e reluzente as mazelas que, em segredo, carrega.”

Edmond Carriére, “Les frontières de la connaissance” (As fronteiras do Conhecimento) Ed. Printemps, pág 135

Edmond Carriére é um psicanalista francês nascido em Rheims em 1942. Foi aluno dos seminários de Jacques Lacan em Paris e seguidor fiel de suas ideias. Em 1970 criou o Instituto Freudiano de Calais, cuja inauguração contou com a presença da pediatra e psicanalista francesa Françoise Dolto que fez uma palestra sobre a educação infantil na perspectiva da psicanálise. Escreveu várias obras na área da psicanálise, mas também da ficção, sendo sua obra ficcional mais conhecida o romance “Sob a Tormenta da Martinica”, onde descreve a vida de uma pequena aldeia próxima a Fort de France quando da passagem do Grande Furacão de 1780, tratado pelo historiadores e climatologistas como o mais mortífero furacão já registrado no Atlântico, assim como o ciclone tropical com mais fatalidades do Hemisfério Ocidental. É estimado que 22 mil pessoas tenham perecido nas Pequenas Antilhas por ocasião da grande tempestade ocorrida de 10 a 16 de outubro. A história do livro está centrada em Heléne Césaire e seus dois filhos, suas dificuldades como jovem mãe viúva, a pobreza, o vazio de esperanças e a chegada da tormenta assassina. Sua luta para encontrar os filhos perdidos durante a fuga desesperada foi retratada no filme homônimo dirigido por Michel Dufour com Michelle Duprat no papel de Heléne e Jean Maurais como o Capitão Rosine. Na área da psicanálise, além de “Les Frontières de la Connaissance” escreveu muitos artigos na “Revue du Psychanalyse” e sua obra sobre o transtorno obsessivo “Quand beaucoup est encore peu” (Quando o muito ainda é pouco – sem versão para o portugues). Edmond Carriére mora em Nice , é casado com Marie Carriére e tem três filhos, Michel, Paul e Fabrice.

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Pensamentos e emoções

Correto. Acontece que para chegar no pensamento as ideias precisam percorrer inúmeros filtros; não existe pensamento que seja a perfeita expressão do que você sente. Já a emoção brota de forma rebelde, livre e espontânea. Por isso o sujeito se revela de forma mais pura nas epifanias e nos paroxismos de medo, raiva e paixão. O terapeuta atento e isento de preconceitos precisa prestar a máxima atenção nestes episódios, e ter uma desconfiança radical com racionalizacões e autoavaliações que o sujeito produz. Somos mentirosos e dissimulados sobre nós mesmos; condescendentes e parciais. Na profundeza do inconsciente, onde impera a escuridão e o segredo, tudo é úmido, sujo, empoeirado e feio; porém, quando as ideias emergem à consciência aparecem penteadas e de banho tomado.

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Objetos

Quase todos as noites ouço meus netos correndo com seus passos miúdos e os pés descalços em direção ao meu quarto. Trazem no rosto o olhar que conheço muito bem: a avidez por alguma novidade, uma conversa, algo para contar da escola ou um bicho diferente que viram perto do galpão de sementes. Mas na maioria das vezes eles apenas dizem em uníssono:

– História!!

Eu sempre reclamo, pois na hora que me pedem eu estou invariavelmente fazendo alguma coisa “importante”, seja estudando para uma prova, escrevendo ou olhando um vídeo. E eu sempre paro tudo o que estou fazendo porque sei que, no meu leito de morte, vou imaginar que todo o dinheiro do mundo seria pouco para poder reviver estes momentos. Melhor vivê-los agora, enquanto ainda é tempo.

Ato contínuo, o menor se volta para a vó e grita poucas palavras, mas que servem como um código para a sessão de aventuras que se aproxima:

– Vovó!!! Chá e bolacha!!!

E lá vem ela com três xícaras de chá de casca de limão (colhido na Comuna) e uma travessinha que ela trouxe do Japão quando fez estágio pela JICA em Osaka. A rotina então se repete: eles tomam o chá enquanto eu conto a história e depois distribuem farelo de bolacha salgada por todos os cantos do quarto. Terminado o capítulo, com o famoso “qua qua qua qua…” decrescente, eles ficam brabos, fazem ameaças, choram e reclamam, mas por fim aceitam ir para casa dormir.

Entretanto, o que mais me chama a atenção são estes objetos aleatórios que ficam marcados nas vidas das crianças, guardados nas memórias mais profundas. Só muito mais tarde reaparecem em suas vidas adultas, já modificados, codificados, transformados. Estes objetos fazem parte do acervo de pequenas coisas do período inicial das nossas vidas, e que depois desaparecem, porém jamais completamente. Ficam adormecidos em algum lugar da mente, para serem trazidos em formas diversas em outros momentos.

Tenho vários destes do tempo em que eu convivia com minha avó materna, a vó Irma. Quando eu passava fins de semanas inteiros na sua casa eu lembro das pequenas coisas, do quarto de ferramentas, do jardim nos fundos, das orquídeas bem tratadas e de tantos outros badulaques.

Não tenho a menor dúvida que estes artefatos ainda me acompanham, mesmo que travestidos de outras coisas, das quais não me desfaço por saber que são parte do simbólico que me constitui.

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Há na lista


Quando eu conto que fiz quase 30 anos de análise as pessoas geralmente se espantam e me perguntam, com genuína estupefação: “Mas afinal, o que foi que você descobriu?”

Eu acho que essa curiosidade é legítima, mas sempre fico com dificuldade em dar uma resposta objetiva, baseada em fatos claros para este questionamento. Parece que todo mundo aguarda uma réplica ao estilo: “Descobri que sempre odiei meu pai e amei a minha mãe” (ou vice versa), “durante a gestação minha mãe me rejeitou”, “sempre quiseram um(a) menino(a)” ou então aquela tradicional “nunca me recuperei do fato da minha mãe ter me esquecido no portão da escola”.

Tenho uma regra básica para os eventos marcantes da nossa vida: se eles podem ser resgatados com essa facilidade, emergindo ao consciente como uma bola que largamos no fundo da piscina, então é porque se trata de uma “falsa explicação”, provavelmente algo que usamos no lugar do conflito verdadeiro. Mesmo que eu acredite na dor que cerca tais eventos, eles apenas existem como intensificadores de sofrimentos mais antigos, recônditos e não-sabidos. Estes, por serem violentos e estruturadores de nossa neurose, estão, via de regra, escondidos nos porões úmidos e frios do nosso inconsciente.

Imaginar que uma análise se presta a descobrir estes fatos catastróficos é desmerecer a importância dos pequenos eventos na formação do sujeito. Lembro de uma conversa como uma amiga psicanalista a respeito de um quadro psíquico muito pesado, e a pergunta que lhe fiz: “Que evento escondido em seu passado pode ter ocasionado tamanha repercussão?”, ao que ela respondeu: “as vezes um olhar, uma palavra, ou a falta de ambos”.

A psicanálise atua na sutileza, na delicadeza, nas filigranas do discurso. Sua busca é pela imbricação de afetos, o conflito dos amores, a disputa de desejos e o desatar destes nós que carregamos. Não aguarde de uma sessão o espetáculo ilusório dos “insights” maravilhosos, uma sucessão de epifanias, um “ah-rá!!” a nos confirmar antigas suspeitas ou para abrir “as portas da esperança”. Não, uma análise é algo que se faz até mesmo depois de terminada a sessão, quando nossas próprias palavras fazem eco em nossa mente, ao voltarmos para casa enquanto nossas lembranças dominam a paisagem. A boa análise é paciente e silenciosa, muda a nossa percepção oferecendo um conceito muito mais humilde de nós mesmos. Assim, quando a pergunta “o que você descobriu” me atinge os ouvidos, minha resposta invariavelmente é: “milhares de coisas, mas nenhuma que eu me lembre no momento“.

PS: quando fiz minha primeira sessão de análise eu disse: “Pensava em fazer esta consulta a mais tempo, e tentei lhe ligar faz alguns meses, mas descobri que “telefone de analista não há na lista.” É inacreditável que uma análise tenha se estabelecido depois de um trocadalho miserável desses…

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Eduardo e Mônica

Afinal, quem queria impressionar quem? O jovem garoto simpático ou a menina intelectual? A questão colocada por algumas pessoas é: por que ela, tão inteligente e profunda, se interessaria pelo Eduardinho – que ainda jogava botão com o avô e vivia no esquema escola-cinema-clube-televisão?

Ora, porque é assim que funciona a vida. Cultura e erudição não são as únicas moedas de troca no jogo da sedução. Ela podia gostar desses autores e artistas e ser uma menina insegura e carente. Quantas meninas cultas se apaixonam por caras cuja maior virtude é cuidar do seu próprio gato? Aliás, até eu me apaixonaria por um cara que joga botão com seu avô.
Ou será que ninguém aqui conheceu em sua vida um rapaz limitado em seus conhecimentos e estudos mas que transborda autoconfiança e charme? E quantas mulheres brilhantes acabam se envolvendo com canalhas, broncos ignorantes e superficiais tão somente porque lhes falta amor próprio?

De outra forma, quantos homens igualmente capazes, competentes e com profundidade se envolvem com mulheres egoístas e interesseiras que possuem como patrimônio apenas curvas, bunda e sexo exuberante?

A discussão sobre quem estava tentando impressionar é como o debate Capitu – traiu ou não? Creio que qualquer das opções é válida, só o que não se pode é esterilizar o desejo tornando-o objetivo e racional. Dizer que era Eduardo, ou Mônica, diz mais de quem fala do que da realidade desse romance.

Como diria Freud, se você explica o amor é porque não é. Se você sabe – conscientemente – porque ama alguém é porque há razões para esse afeto, então não pode ser amor, um afeto irracional. O desejo não pode ser tratado de forma racional, pois que ele habita em estratos muito profundos e primitivos de nossa estrutura psíquica.

Essa escolha não é racional. Em verdade, na escolha de um novo amor, nada mais justo que sejam repetidos nossos objetos de desejo, já que a forma que os constrói é a mesma. Sim, o amor da sua vida pode ser um profundo canalha, porque estas escolhas dormem nos porões obscuros e úmidos do nosso inconsciente.

Parem de tentar simplificar o desejo humano, que é algo complexo e misterioso.

Existem argumentos bem interessantes para todos os lados. A premissa inicial é de que os caminhos do desejo não podem ser racionalizados, como o fez a menina com círculo vermelho que está na imagem acima. Ora, uma moça intelectualizada, ou erudita, pode muito bem pendurar seu fantasma num adolescente que estava recém saindo aos trancos e barrancos da infância. Eu mesmo tenho uma amiga linda, maravilhosa, culta, inteligente que namorava um sujeito que trabalhava como agricultor, a quem ela chamava de “homem das cavernas”, um neanderthal. Mas, como poderia ser possível alguém criticar essa fantasia e esse desejo que era estranho apenas na superfície?

E é claro que podemos, sim, imaginar na letra do Renato múltiplas interpretações que, como eu já disse, falam muito mais de nós mesmos do que da letra, de Renato ou da vida. Uma letra, como qualquer obra artística, é fruto de seu tempo e dos valores de então, e cabe a nós função antropofágica de “comer Renato, digerir sua letra e expelir nossa interpretação”, junto com nossos próprios sucos gástricos.

Temos todos o direito de fazer uma interpretação “não problematizadora”, mas acho interessante que a gente queira problematizar ao limite esse encontro entre dois jovens em uma festa nos anos 80. Afinal, o que é “problematizar” senão retirar da superfície tudo aquilo que seduz o olhar mais falseia o conteúdo?

Acho muito interessante todas as perspectivas nesse caso assim como em Capitu. Parece que todos tem a resposta definitiva, a mais certeira percepção. E até nos convencemos, mas esta certeza dura até que alguém traga outra série de argumentos igualmente bons e convincentes. Por isso é que esses truques da literatura (no caso de Machado de Assis proposital, no de Renato creio que foi totalmente inconsciente) a engrandecem e produzem aquilo que existe de mais sagrado para um escritor: fazer seu leitor pensar junto, provocá-lo e colocá-lo contra a parede para, só então, revelar-se.

É incrível o quanto se coloca de paixão nestes argumentos… e também muito divertido ver o quanto uma estrofe pode gerar tanta profundidade.

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A Neurose Necessária

Eu sempre falei aos colegas que tentavam se aproximar da humanização do nascimento que a “curiosidade” não é uma motivação suficiente, realizar partos vaginais é muito pouco e seguir protocolos mais sensatos e embasados em evidencias, também. É necessário mais do que este desejo, mesmo sendo justo e correto; é preciso buscar uma mudança tão profunda quanto dolorosa e radical. É fundamental inserir o parto nos direitos reprodutivos essenciais das mulheres e garantir a elas o protagonismo pleno do seu exercício. Sem isso teremos apenas médicos curiosos e simpáticos, cujos esforços se limitam a sofisticar a tutela sem que jamais atinjam a profundidade de sua missão. É por isso, e por nada mais, que essa tarefa é tão complexa e difícil.

“Certa vez, eu queria interromper minha análise e perguntei a Lacan porque era tão duro iluminar nosso inconsciente. A resposta dele pode ser resumida assim: a verdade é sempre incômoda, e a psicanálise nos mostra o que preferimos ignorar. Quanto mais nos aproximamos de nossa verdade mais temos vontade de ignorá-la. Por isso mesmo ele desencorajava aqueles que o procuravam para se conhecer melhor. Isso não é o suficiente. É preciso que algo nos atrapalhe e no interrogue para sobreviver ao longo das sessões. É preciso almejar uma mudança radical.” (Gérard Miller)

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O início do mundo

Queria aproveitar a oportunidade para discutir as razões profundas pelas quais nos (des)conectamos a uma pessoa. Não acredito que qualquer resposta racional possa seguir a esta pergunta. Eu sempre me lembro da história da criação do mundo.

Dois sujeitos há 200 mil anos andando no meio da floresta e encontram duas mulheres lavando carne na beira do rio. Um cutuca o outro e diz: “vamos pegar?” O outro responde afirmativamente.

“Ok, mas qual delas tu queres?”, diz o primeiro, procurando evitar uma briga. O segundo, sem desviar os olhos de uma delas, responde: “a gordinha”.

O primeiro se conforma com a escolha, mas resolve fazer a pergunta cuja resposta iria inaugurar o gênero humano: “Mas, por que ela?”, ao que seu amigo solenemente responde: “Eu não sei”… (a desenvolver)

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