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Partos, fases e luas

Em meados dos anos 80, um pouco antes da minha formatura e o início da residência em ginecologia e obstetrícia, decidi fazer uma análise da relação entre as fases da lua com dois fenômenos conhecidos: o inicio do trabalho de parto e o parto propriamente dito. Meu objetivo era bem simples: esclarecer a influência das fases da lua com o nascimento humano, já que popularmente esta relação era feita, mas sem uma metodologia adequada para sua avaliação. Era muito comum encontrar, inclusive entre os médicos, comentários ao estilo: “plantão passado foi terrivel, mas é compreensivel: era lua cheia”. Entretanto, eu sempre achei que este era um viés de observação. Ou seja: por ter sido um dia com excesso de atendimentos o observador se preocupava em saber a fase da lua; fosse um dia sem partos ele sequer se importaria com isso.

Diante disso, resolvi tabelar todos os nascimentos e as internações em trabalho de parto de 1⁰ de janeiro a 31 de dezembro de um ano especifico do hospital escola onde eu havia estudado e estava prestes a cursar a residência. Fui aos arquivos do hospital e dividi essas ocorrências entre as fases da lua para ver se alguma correlação poderia ser encontrada entre estes dois fenômenos: a posição do nosso satélite em relação sol e a emergência dos sinais que iniciam a expulsão fetal. Feito isso, era necessário tabular e usar fórmulas matemáticas de bioestatística para encontrar – ou não – uma relação de causalidade.

Nesse interim eu me formei e comecei a fazer plantões no centro obstétrico do hospital. Num desses plantões eu recebi na emergência uma paciente com queixa de contrações. Era mais de meia-noite e o plantão estava bem calmo. A gestante chegou acompanhada do marido e ambos pareciam muito ansiosos. Mostrou seu cartão do pré-natal e os exames protocolares. Primeiro filho, 39 semanas de gestação, pressão ok, batimentos fetais idem. Sem intercorrências na gestação. Fiquei avaliando os exames com uma demora proposital, esperando testemunhar uma contração. Nos 15 minutos em que ficou na sala, ao lado do companheiro, nenhuma contração foi relatada. Pedi que a atendente a ajeitasse na mesa de exames, e só quando se ergueu da cadeira relatou que estava sentindo uma cólica no útero, que foi rápida e sem muita intensidade. Ao fazer o exame vi que ela tinha não mais do que 2 centímetros de dilatação, contrações frágeis e somente duas cada 10 minutos. No jargão obstétrico, “pródromos” (pró – dromo, precursor, aquele que corre na frente). Recomendei que voltassem mais tarde. Diante da minha indicação o marido me encarou de forma preocupada dizendo:

– Doutor, não há condições. Já é madrugada e moramos na Restinga (bairro afastado da cidade). Não temos dinheiro para pagar um taxi de novo. Para nós é muito caro; somos pobres e esse gasto seria impossível. Como o senhor mesmo disse, ela pode iniciar as dores fortes dentro de 1 ou 2 horas, talvez até antes. Ou depois, mas como saber? Não tem como ela ficar aqui aguardando?

Senti a angústia do casal e entendi a preocupação. Resolvi conversar com o contratado de plantão, o qual aceitou a ideia de deixá-los no hospital esperando as contrações, já que o centro obstétrico estava vazio e, para eles, um retorno mais tarde seria por demais dispendioso. Era o que chamávamos de “baixa social”, uma internação determinada por fatores não médicos, mas relevantes. Essa é uma prática muito comum, que existe em qualquer lugar até hoje. O casal agradeceu, ficaram a noite toda dormindo, as contrações desaparceram e apenas voltaram ao amanhecer. Passei o caso para o novo plantonista que estava assumindo o plantão e este resolveu induzir, usando soro com oxitocina. Sim, precisavam fazer aquele bebê nascer, “já que a paciente havia ficado a noite inteira sem desenvolver um franco trabalho de parto e ocupando um leito que poderia ser necessário mais tarde”. Foi instaurada a indução e eu fui para casa.

Ao sair do plantão ainda estava escuro e percebi que aquela noite havia sido de lua cheia, mas o plantão tinha sido monótono e com poucos casos. Cheguei em casa, peguei todas as minhas anotações sobre partos e fases da lua e guardei em uma pasta, onde então até hoje. Nunca mais me interessei por este estudo. Aquele caso corriqueiro me havia feito perceber que, no mundo ocidental e nas sociedades complexas, é impossível observar a relação dos fenômenos da natureza com as gestantes e o parto. As influências externas são tantas e tão mais intensas que seria impossível depurar os casos de suas interferências de ordem social. A paciente daquela noite internou sem necessidade médica real e recebeu um soro pela manhã igualmente sem ser preciso, apenas porque seu parto tinha que se enquadrar na ideologia obstétrica de nossa época e na grade dos tempos de seus assistentes. Nada naquele nascimento foi natural; inobstante a fase da lua, e se ela poderia ter alguma influência no parto, tudo foi atropelado por fatores sociais e por crenças médicas, impedindo que qualquer correlação pudesse ser observada.

Lacan deixou claro que a “palavra matou o real”. Não existem mais “partos naturais”, pois que estes ficaram perdidos num passado muito remoto, sobrevivendo apenas enquanto fantasia ou utopia. O parto, inserido na linguagem, é o que nossas mentes fazem dele; é um evento da cultura que ocorre no corpo das mulheres, carregando consigo o reflexo dos nossos valores e das nossas crenças. Envolto nesse contexto simbólico ele não pode ser mais avaliado pela suas características primitivas, fisiológicas e “naturais”. A mulher que poderia parir esse “bebê natural” já não existe mais; expulsos do paraíso, somos todos condenados a parir e nascer no contexto da palavra.

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Rosebud

Há alguns dias, meu neto de 8 anos veio me pedir para ajudá-lo a fazer uma maquete para levar à escola. Era necessário unir 3 latas de café para fazer uma torre. Entregou para mim as latas para que fossem unidas com fita colante. Quando peguei as latas percebi que estavam vazias mas com as paredes ainda sujas de café.

– Precisa limpar, Zuki, senão vão ficar cheirando a café.

Levei até a pia e comecei a lavar. Ele ficou me olhando por alguns instantes, deu um sorriso e comentou:

– Que sorte eu pedir ajuda exatamente para o especialista.

Na divisão de tarefas da Comuna coube a mim a função de lavar a louça. Esta não era das tarefas mais disputadas entre as que estavam sobre a mesa; afinal já somos 11 comunas, fora os convidados esporádicos; por certo que era uma das funções menos desejadas. Entretanto, lavar a louca, nunca foi um peso para mim. Ao longo dos anos desenvolvi técnicas para fazer deste tempo algo produtivo. Coloco fones de ouvido e fico ouvindo podcasts, entrevistas, as notícias do dia, às vezes músicas e o tempo passa muito rápido.

Entretanto, esta é tão somente uma meia verdade; de certa forma é apenas uma racionalização barata. Mesmo sem as “técnicas”, a verdade é que eu gosto de lavar a louça. Gosto do barulho da água, de organizar os pratos, dos gestos repetitivos e calmantes com a esponja, do cheiro do sabão e de ver tudo limpo no final. Tenho o costume de lavar a própria pia após a tarefa, até deixá-la brilhando. Quando quis descobrir a chave para explicar este meu estranho gosto lembrei que quando criança minha mãe colocava eu e meu irmão mais velho a ajudá-la nas tarefas após o almoço. Era uma rotina diária, e só podíamos brincar depois de terminá-la. Quando bem pequenos ela contava histórias sobre as aventuras de dois garotos: Patrick e Bolão. Quando ficamos mais velhos, ela ligava o rádio e ficávamos escutando “2001”, um programa de ciência narrado por Flávio Alcaraz Gomes, ícone do rádio gaúcho, transmitido pela saudosa Rádio Guaíba (que ainda existe, mas se transformou em um antro bolsonarista). Aliás, foi ele quem adaptou para o rádio brasileiro a “Guerra dos Mundos“, de Orson Welles.

Por certo que a lembrança destas cenas de convívio com a minha mãe no passado criaram pontos de luz na memória, transformando uma tarefa enfadonha em uma atividade quase lúdica. Lá nas profundezas escuras do meu inconsciente profundo ainda escuto a voz da minha mãe contando as histórias enquanto passo detergente nas panelas. Na verdade, qualquer sujeito que procure atividades prazerosas em sua vida acabará encontrando conexões com fatos escondidos do passado.

Em Cidadão Kane o protagonista morre dizendo o nome do fabricante do trenó com o qual brincava no dia em que foi levado de casa para viver com a família que o adotou. Orson Welles desejava, mostrar que a construção do Império jornalístico de Charles Foster Kane (baseado no barão do jornalismo americano William Randolph Hearst) estava ancorada em um trauma do passado: o desligamento precoce dos laços que tinha com a mãe e a família. Aliás, o fato de Kane ter o nome do meio “Foster” (adotivo) já deveria nos acender um alerta. Sua fortuna imensa e seu poder estavam concentrados na solução da dor profunda criada naquele dia, como um buraco negro poderoso que o sugava de volta para aquele momento decisivo.

Todos carregamos nossos “Rosebud” particulares; eles podem ser vistos em nossas manias, fixações, desejos, fetiches, taras e prazeres. Somos constituídos por estas marcas feitas de lembranças do passado, que nos ligam ao prazer e à dor de forma intensa e vívida, mesmo quando a conexão consciente já foi há muito perdida na neblina do tempo.

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Materialidade

Tenho um querido amigo que nasceu na Turquia mas é grego. Explico: existe um bairro grego em Istambul (creio que é o bairro Fener) no qual os habitantes tem cidadania grega, mesmo tendo nascido em solo turco, porque as reivindicações gregas sobre sua capital Constantinopla nunca cessaram. Assim, não se pode chamá-lo de “turco” nem de brincadeira. Pois esse amigo grego, ainda bem pequeno, mudou de país e foi criado na Suiça desde tenra idade. Fez formação em TI e uma vez resolveu visitar o Rio de Janeiro. Lá conheceu uma gaúcha que estava de férias e logo se apaixonaram. Essa amiga era uma paciente e querida amiga minha. Passado algum tempo se casaram e tiveram uma filha, cujo parto eu atendi, o qual, por si só, é uma história espetacular sobre parto e tecnologia – ou o quanto a tecnologia tem a possibilidade de atrapalhar a fisiologa de um parto. Porém, esta história eu contarei em outra oportunidade.

O casal resolveu morar no Brasil. Meu amigo até que tentou viver aqui; adorava o país, gostava de Porto Alegre, tinha uma profissão para a qual havia demanda, etc. Porém, a diferença de pagamento do quanto ganhava na Suiça para o que conseguia aqui era enorme, talvez na ordem de dez vezes para menos em terras tupiniquins. Depois de algum tempo resolveram se mudar para a Suiça – de mala e cuia. Minha paciente até hoje trabalha como fisioterapeuta, falam suiço-alemão, tiveram uma outra filha e estão lá felizes há mais de 20 anos. Meu amigo grego trabalha numa gigantesca instituição bancária suiça. Há alguns anos vieram visitar familiares em Porto Alegre na época das férias e nos ligaram para encontrá-los em um restaurante – eu e Zeza. Passamos uma noite maravilhosa contando histórias de cá e de lá, falando de filhos, adaptação primeiro mundo, confortos, saudades, etc. Num determinado momento, meu amigo me disse:

– Ricardo, vocês nem imaginam o quanto eu invejo vocês e o trabalho que fazem atendendo partos. É realmente sensacional. Eu adoraria ter esse privilégio.

Isso me pareceu super bizarro. Aquele sujeito deveria ganhar – muito por baixo – umas dez vezes mais do que eu poderia ganhar aqui acordando de madrugada, perdendo aniversário de filho, dormindo mal, sendo atacado pela máfia da cesariana, tendo férias cortadas ao meio etc. Disse isso do alto de um emprego espetacular, atendendo numa sala com ar condicionado, 6 horas por dia, férias remuneradas, cafezinho, benefícios de primeiro mundo, chocolate suiço (que lá se chama só “chocolate”), estabilidade, e tudo mais que a centralidade do capitalismo é capaz de oferecer a estas profissões mais sofisticadas.

– Mas por que dizes isso? Que te faz pensar assim? Não consigo entender a razão para isso…

Ele sorriu e respondeu, como se estivesse me falando de algo muito óbvio:

– Ora, Ricardo: a materialidade do trabalho de vocês!!! Vocês atendem as gestantes, enxergam a barriga crescendo, avaliam a qualidade dos exames, enxergam o bebê se mexendo e escutam o coração dele batendo pela primeira vez. Estão presentes quando o bebê nasce e acompanham por vários meses a adaptação da mãe ao novo mundo da maternidade. Podem testemunhar a alegria da família ao receber um novo bebê. Estão presentes desde o início do processo, acompanhando todas as etapas. São responsáveis por cada detalhe e pelo sucesso do projeto. Agora compare com o que eu faço: sou um operário de uma longa esteira de montagem de uma instituição. Trabalho com uma parte – a informática – e não vejo de forma palpável o resultado final do meu trabalho. Não posso chegar em casa e contar para as minhas filhas uma história maravilhosa que aconteceu comigo no meu emprego, quando “salvei uma rede” que estava encalhada, ou coloquei vários “sistemas em série”, ou consegui fazer o “roteador central” voltar a funcionar. Sou uma minúscula peça, mesmo que importante e até essencial, porém não tenho a oportunidade de ver de forma clara à minha frente a materialidade do que fiz, o resultado prático da minha dedicação, o objeto construído por mim para que possa ser mostrado orgulhosamente aos outros. Vocês, por outro lado, enxergam isso todos os dias, em todos os trabalhos que fazem.

Respirou mais um pouco e continuou:

– Pode não parecer, mas quando vi o nascimento da minha filha, no qual vocês estiveram presentes, pude sentir o quanto é importante essa sensação de poder ver o resultado objetivo do que se faz. O sistema de produção em série, o fordismo no qual estamos todos inseridos, nos impede de ter essa noção ampla da participação no resultado final de qualquer tarefa humana. Vocês, por terem a oportunidade de enxergar isso, são abençoados. Acredite, é o que sinto.

Sua explicação foi contundente e muito clara. Pude, pela primeira vez, ter noção do significado mais amplo do trabalho que fazíamos e do privilégio de participar efetivamente no resultado final daquilo que trazíamos como ofício. Neste mundo de funções fragmentadas eu fico impressionado com o trabalho de eletricistas, encanadores, pedreiros, marceneiros e gente que trabalha com a terra pois ele podem ver o resultado objetivo do seu trabalho em uma parede, uma cadeira, uma água escorrendo num tubo, uma fruta que nasce e uma lâmpada que se acende. Isso é capaz de oferecer uma satisfação enorme para o profissional envolvido.

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Road Story

Nos anos 90 eu estava em Camboriú – antes de se tornar a cidade cafona e cheia de novos ricos de agora – com a minha família. Na época meus filhos tinham 8 e 5 anos. Resolvemos voltar para casa depois do almoço, no final das férias de 1 semana no litoral catarinense. Aproveitamos a manhã para tomar o último banho de mar, depois almoçamos e tomei um banho para começar a viagem.

Bem, este foi o problema. Como na época eu tinha um cabelo farto e rebelde, percebi que se saísse para dirigir com o cabelo molhado ele se tornaria um emaranhado obsceno de cabelos, com cada fio apontando para uma localidade distinta do universo. Para evitar isso, resolvi colocar uma touca cirúrgica que guardava comigo para secar o cabelo. Dito e feito: coloquei as malas no carro, ajeitei as crianças e saímos para a estrada, usando minha touca cirúrgia para secar o cabelo.

Alguns quilômetros adiante, já próximo de Florianópolis, percebi ao longe um acidente na estrada. Era possível ver uma fumaça saindo dos veículos envolvidos no acidente enquanto uma fila de carros se formava, diminuindo a velocidade para assistir a cena. Quando me aproximei, percebi que só havia policiais no local e nenhuma ambulância. Fiquei preocupado que houvesse feridos que estariam aguardando a chegada de auxílio e resolvi me apresentar para ajudar. Imediatamente parei ao lado do policial que coordenava o trânsito e gritei:

– Hei, policial!! Eu sou médico. Vocês precisam de alguma ajuda?

O patrulheiro se aproximou do vidro do carro e ficou me olhando por alguns instantes. Depois de um tempo respondeu laconicamente:

– Não precisamos de ajuda. Não houve feridos, apenas danos materiais. Obrigado.

Só me dei conta quando Zeza começou a rir. Ela disse: “O guarda deve ter pensado que tu és um maluco que pensa ser uma mistura de médico com Batman”. Foi então que me dei conta que estava usando aquele bizarro gorro cirúrgico e que o policial teria todo o direito de imaginar que eu era um psicótico que sai de carro pelas ruas procurando avidamente casos para atender.

Talvez minha calvície tenha sido uma forma que Deus criou para eu não pagar mais estes micos

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Propaganda de Margarina

Meu pai era um autodidata, um sujeito muito culto, mas nunca teve a oportunidade de fazer um curso superior. Na sua juventude, esta formação era reservada às classes abastadas da sociedade. Durante toda sua vida foi funcionário de nível médio da CEEE, as centrais elétricas do estado, e quando tinha 35 anos comprou sua casa própria. Quem tem condições de fazer isso hoje em dia? Minha mãe atingiu seus mais altos objetivos na vida através da maternidade e da criação de seus quatro filhos. Formavam um casal típico dos anos 60, quando o mundo respirava um pouco de liberdade depois de um início de século cheio de guerras.

Quando eu tinha 6 anos nos mudamos para a casa nova, um apartamento no bairro Menino Deus que tinha à frente da janela do meu quarto uma praça de 10 mil metros quadrados ao lado de uma escola pública. Se alguém pudesse criar mentalmente um cenário ideal para criar uma família de 4 filhos pequenos, não conseguiria algo tão perfeito como isso. Naquela época as famílias todas ao nosso redor tinham no mínimo 3 filhos, o que nos garantia uma turma gigantesca de crianças com quem brincar. Na escola pública havia a mistura altamente criativa de crianças pobres com jovens da classe média crescente, o que nos oportunizava conhecer um Brasil com maiores dificuldades do que a vida de propaganda de margarina que tínhamos.

Logo meu pai comprou um carro, um DKW azul de teto branco e estofamento vermelho, uma joia da indústria automobilística, com seu motor dois tempos que qualquer um reconhece a quadras de distância. Depois disso veio um marco essencial da modernidade: uma linha de telefone da antiga CRT instalada em casa. No inicio dos anos 70 o supremo luxo: uma televisão colorida, para poder assistir “O Bem-Amado” com todas as cores da obra de Dias Gomes. Nossa infância – e, por certo, falo pelos meus irmãos – é o quadro mais acabado de perfeição, o sonho mais acabado para as famílias da minha geração.

Todavia, como em todo sonho, um dia a gente é forçado a acordar. O meu despertar se deu ao reconhecer a bolha em que nossa vida infantil floresceu. Enquanto vivíamos uma vida de segurança e harmonia havia uma brutal ditadura no Brasil, além de uma crescente disparidade na riqueza do país. O ministro Delfim Neto afirmava que primeiro faríamos o bolo crescer, para só depois dividi-lo, mas esta divisão sempre funcionou como um contínuo “na volta a gente compra” em nível nacional. O que eu passei a reparar foi o número enorme de pessoas pobres ao meu redor, e como o sofrimento delas era visível quando havia disposição para ver. E, naturalmente, eu passei a perceber suas carências, não apenas de caráter econômico e material, mas deficiências de ordem afetiva e simbólica.

Com o tempo percebi que, por mais que houvesse uma tendência em valorizar minhas pequenas conquistas, elas eram fruto direto de uma criação especial, o somatório de inúmeras condições, como uma criação cheia de facilidades, com pais estudiosos, livros nas estantes de casa, escola gratuita, comida na mesa, irmãos para nos ensinar limites, harmonia psíquica e até alguns luxos de classe média. Muito pouco, ou quase nada, é possível encontrar em mim que não seja efeito direto das facilidades que a vida me ofereceu, enquanto sonegava a tantos ao meu redor. Assim, desde muito cedo ficou claro que não há nada de realmente especial em mim, e sou apenas o produto de uma sociedade que me ofereceu inúmeras facilidades, enquanto estas eram negadas à maior parte do país.

Reconhecer o quanto somos o reflexo do nosso entorno e das condições materiais e emocionais que recebemos – ou não – é essencial para reconhecer a necessidade de justiça social e equidade. Quando percebemos o quanto fomos felizes na primeira fase de nossas vidas fica mais fácil entender o quanto essa felicidade deveria ser um direito de todos.

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Travesseiros

Sou de uma família de imigrantes ingleses que vieram para o Brasil no fim do século XIX para auxiliar na construção de ferrovias, em especial no nordeste brasileiro. Meu pai nasceu em Gravatá, em Pernambuco, e veio para o Rio Grande do Sul de navio, aos 6 anos de idade. Claro, Deus é um cara gozador e adora brincadeiras, e achou muito engraçado me botar cabreiro e só por isso acabei nascendo gaúcho. Mas esse é o lado paterno. Do lado materno sou alemão, de uma mistura das famílias Wagner, Aurich e Blumm.

Disse meu pai que os tios da minha mãe eram muito simpáticos a Adolf Hitler. Verdade seja dita, na minha cidade muitos eram, pois nossa colonização foi marcadamente alemã. Era tão forte a influência que na casa da minha avó só se falava alemão, a única língua que minha mãe falou até entrar na escola aos 6 anos. Não seria nada estranho a alemoada daqui se apaixonar pelas ideias de extrema direita do grande líder do Partido Nazista. Em verdade, o Brasil teve maior partido nazista fora da Alemanha, e o próprio presidente Getúlio Vargas, em várias ocasiões, demonstrou simpatia pela implantação do nazismo neste país, por seu forte nacionalismo e seu anticomunismo ferrenho. Não por outra razão tivemos uma carta constitucional outorgada em 1937, no auge do fervor nazista na Europa. Esta foi a 4ª Constituição brasileira e a 3ª do período republicano e ficou conhecida como a Constituição “Polaca” por ter leis de inspiração fascista, tal qual a Carta Magna polonesa de 1935. O texto foi elaborado pelo jurista Francisco Campos e outorgada em 10 de novembro de 1937.

A verdade é que, por seu amor ao mandatário alemão de triste memória, muitos destes tios da minha mãe se tornaram membros da Ação Integralista. Esse movimento, cujos grandes nomes foram Plínio Salgado e Gustavo Barroso (este último um famoso antissemita) era de caráter nacionalista e defendia “a luta contra o materialismo proveniente tanto do capitalismo quanto do comunismo, além da necessidade de uma reforma espiritual do homem brasileiro”. Os integralistas afirmavam que o grande capital internacional é uma faceta tanto do capitalismo quanto do comunismo, baseados na mesma estrutura, que controla os países do Ocidente desde a Revolução Francesa usando o poder do dinheiro, a “Internacional Dourada” ou a “Internacional Vermelha” devido às revoluções proletárias. Ao mesmo tempo, a tríade “Deus, pátria e família” continua a ser a base da doutrina integralista. Possui algumas semelhanças com o Bolsonarismo, mas esta corrente fascista contemporânea é predominantemente imperialista, ligada ao poder americano.

A verdade é que por uma série de pressões Getúlio Vargas, a despeito de sua admiração pessoal pelo Führer, entrou para o grupo de países que combateriam a Alemanha na segunda guerra. Este fato levou muito medo à comunidade alemã do Rio Grande do Sul. Meu avô Olinto, pai de minha mãe, chegou a ser preso por suspeitas – que se mostraram infundadas – de colaboração com os alemães. Por esta razão, os integralistas entraram em descrédito, a ponto de serem perseguidos por estarem ligados ao fascismo europeu. Com isso, os tios da minha mãe se livraram do uniformes integralistas e jamais voltaram a tocar no assunto. Entretanto, essa era um história que se manteve viva pelas conversas que corriam à “boca pequena” na família, mas foi sempre tratada como algo para ser esquecido, um erro cometido no passado.

Quando meu pai se casou, levou para nossa casa uns travesseiros que estavam na casa da minha mãe, e que foram usados por algum tempo pela sua família. Muitos anos depois, quando já estavam muito velhos, um deles se rasgou, rompido pela gastura do tecido, frágil e puído. Foi então que meu pai encontrou, entre as espumas do travesseiro, pedaços cortados dos uniformes verdes dos integralistas, transformados em retalhos de pano, enchimentos para esconder a velha vinculação de seus antigos usuários com o fascismo “made in Brasil”.

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Extrema unção

Entre as atividades dos estudantes de Medicina estava fazer a constatação de morte quando algum velhinho partia para o mundo espiritual no meio da madrugada. É claro que a maioria dessas atividades seriam vistas com outros olhos hoje em dia, mas esta é uma história do início dos anos 80, com várias décadas a nos separar.

Em uma oportunidade fui chamado no meio da madrugada para fazer a constatação de óbito de uma senhora de quase 100 anos que estava no hospital só para fazer esta passagem. Acordei assustado com o telefone do quarto e saí caminhando ainda com os olhos fechados. Não havia tempo para dormir, e no dia seguinte ainda teria que pegar um ônibus intermunicipal para chegar à minha cidade e voltar às aulas. Caminhei a passos trôpegos até o andar de cima, onde ficava a enfermaria de clínica médica. Atravessei o corredor às escuras e me deparei com três enfermeiras postadas à porta do único quarto com as luzes acesas. Elas apontaram para dentro do aposento e eu adentrei nele com uma certa solenidade, mas ainda incomodado pela iluminação do ambiente.

Reinava o silêncio. Entrei no recinto e pude ver as 5 ou 6 camas ocupadas com senhoras muito velhas que dormiam em sono profundo. Na minha frente, na primeira cama à esquerda, uma senhora tinhas os olhos fundos e a boca aberta. O rosto pálido denunciava emagrecimento pronunciado e a degenerescência do corpo. Ainda no umbral da consciência, tentando me desvencilhar do sono mórbido, segurei sua mão e resolvi cumprir o ritual que me acostumei a realizar nestas situações. A morte é uma passagem, penso eu. Mais do que o abandono da carne, o espírito que dela se desprende passa por um rito, um fenômeno energético a conduzir o desligamento do invólucro material. Tinha eu, na época, a ideia de que este momento deveria ser ritualizado para que pudesse ser marcado, não apenas para o benefício da alma que partia, mas também para as almas que ficam, nós mesmos. Para entender a vida, sempre repetia Max, é necessário buscar compreender a morte.

Segurei sua mão e disse algumas poucas palavras, que se perdem na brisa gelada das memórias distantes, mas que certamente seriam algo como “Espero que neste momento em que sua alma se separa do corpo estejam contigo os amores que cultivou por sua passagem terrena, e que seja recebida como uma filha que volta ao convívio dos seus. Espero que, do lado de lá, a recepção seja calorosa e afetiva, para que os que aqui ficam não se sintam tão tristes ao saberem do reencontro feliz com as pessoas amadas que te esperam”.

É possível que fossem estas as palavras que eu diria, mas a verdade é que não pude dize-las como desejava. Segurei a mão da pálida paciente e, mal terminando de dizer a primeira frase, a “defunta” abriu os olhos e gritou, um grito estridente, que me deixou em pânico absoluto. Ainda com os olhos arregalados ela me olha fixamente e pergunta:

– Doutor, o que o senhor faz aqui? O que houve comigo? Alguém me ajude!!

Sem entender nada olho para a porta e encontro três enfermeiras dobrando-se em gargalhadas silenciosas. Seguravam as panças tentando se conter e uma delas, acocorada ao solo, ria e se contorcia sem parar. Uma outra, mais caridosa, apontou o dedo para outra cama, onde a verdadeira falecida se encontrava deitada, já fria pela morte que havia ocorrido alguns minutos antes da minha chegada.

Sem saber o que dizer, e tentando tranquilizar a paciente, eu apenas continuei falando como se estivesse ali para uma “ronda de bem aventuranças” na madrugada. Permaneci segurando sua mão e disse que minha presença ali era apenas para me assegurar que as “mocinhas” estavam bem e dormiam tranquilas. Sua boca repleta de vazios sorriu para mim, fechou os olhos e voltou a dormir, enquanto eu me dirigia à verdadeira paciente para constatar o óbito.

Enfermeiras sacanas. Elas me pagam, nesta ou em outra vida…

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Mediocridade

Meu pai certa vez me contou que estava numa fila de banco e pode observar uma cena curiosa. Claro, isso ocorreu na época em que as pessoas frequentavam agências bancárias para sacar dinheiro vivo, pagar suas contas, falar com o gerente, etc. Enquanto esperava sua vez de ser atendido, ficou por alguns minutos observando as expressões faciais da moça que atendia no balcão. Claro, isso aconteceu algumas décadas antes da criação do celular. As expressões da jovem bancária variavam da quase absoluta inexpressividade até o sorriso aberto e incontido. Ele, então, se deu conta que a reação da moça era modulada pela pessoa a quem atendia: quando era um homem feio ela se mantinha sisuda, mas diante de um homem muito bonito e jovem, ela se tornava a “moça dos sorrisos”, e se tornava solícita e afável.

Por certo que sua reação era instintiva e automática. Não haveria como – e nem porquê – ser mais atenciosa ao entregar um envelope de dinheiro para um cliente esperando algo em troca. Não, sua ação não tinha interesses objetivos, era tão somente sua resposta natural a um estímulo. O estímulo, para ela, era a beleza das pessoas com quem interagia, em especial os rapazes. Meu pai repetiu a observação pelo tempo em que ficou na fila e viu o quanto era evidente essa conexão.

Diante disso discorreu sobre o quanto era vantajoso para um sujeito ser bonito. Por certo que tal valor ainda era mais importante para as mulheres, pela estrutura patriarcal que sustenta nossas sociedades. Fosse um jovem bancário e talvez a reação à beleza das clientes seria ainda mais evidente. De qualquer forma, muitas portas se abrem à beleza, e não há como duvidar disso. Num mundo visual e guiado pelo desejo, a atração sexual cumpre uma função primordial na relação que estabelecemos com os outros, mesmo que estes sentimentos corram por trás da cortina do meramente manifesto ao olhar.

Por outro lado, a beleza e muitos outros talentos – e mesmo a riqueza – também fecham portas. Lembro de uma vez que fui ao casamento de uma paciente e houve um recital, onde um tenor, com raro brilhantismo, cantou uma ária de ópera. Fiquei encantado com a apresentação e sussurrei para Zeza “Queria poder cantar assim”, ao que ela respondeu: “Se você cantasse assim, teria que deixar de lado muitas outras coisas na sua vida. Estaria preparado?”. Ela insinuava que um talento assim teria a possibilidade de eclipsar outras virtudes que porventura pudessem existir. O mesmo ocorrem com aqueles cuja fortuna, beleza e charme hipnotizam e magnetizam todos à sua volta: para que investir na cultura, no conhecimento e na sua formação pessoal se o mundo já está aos seus pés pelo seu dinheiro, sua formosura, seu charme e sensualidade?

Essas conversas do passado me tornaram um apologista da mediocridade. Hoje eu valorizo sobremaneira o sujeito mediano, porque ele não se ocupa em investir em um talento isolado. Sua condição média o faz se esforçar tanto em ajeitar seu pouco cabelo e fazer uma dieta quanto ter algum conhecimento, leitura e formação para não dizer tolices. O sujeito mediano é totipotencial; o superdotado ou milionário é manco, pois seu talento especial, via de regra, atrofia suas outras possibilidades de expressão. Por isso vemos tantos milionários arrogantes, tantas modelos incultas e esnobes e tantos homens bonitos e vazios.

O sujeito que mais aproveita a vida é o que se equilibra entre suas faltas e suas habilidades. Talvez não seja o mais útil, pois crescemos através da beleza das formas e da genialidade de alguns, mas certamente é o mais equilibrado. Se me fosse permitido escolher um perfil para uma próxima vida seria bem claro: me livrem da exuberância das formas, da beleza estonteante, da abundância obscena de riqueza, do conhecimento de uma única especialidade na infinidade dos saberes ou do carisma arrebatador. Por mais que sejam chamativos e sedutores, eles são verdadeiros fardos a carregar pela vida.

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Os idosos

A maioria das pessoas da minha idade são conservadoras na política e nos costumes; isso é um fato que não é difícil de constatar. “Eu gosto desse político porque ele não é radical”, dizem. Ou, em contrapartida, “não gosto do fulano; ele é um radical, e os extremos são sempre ruins”. Quando elogiam uma personalidade pública fica nítido que se deixam ofuscar pela imagem de mídia que é produzida sobre ela, na maioria das vezes fantasiosa, produzida nos laboratórios de imagem das empresas que se ocupam da vida de celebridades. “Ahh, o fulaninho é uma pessoa super simples. Sabe que ele doou 1 milhão para os flagelados?”. Nessa fase da vida é muito comum que os “maduros” comecem a se interessar pela religião, pela morte, pelo cristianismo e coisas afins. Também os coroas se tornam céticos em sua visão política, alguns no nível do negacionismo; tornam-se ranzinzas, rabugentos e não acreditam haver possibilidade de que suas utopias da juventude possam se materializar.

“É sempre a mesma coisa, os políticos são todos iguais, é a roubalheira de sempre”. Via de regra, colocam os problemas políticos como afecções de caráter, máculas morais, não estruturais. Muitos acreditam na ideia de um “messias” no governo, no “bom ditador”, na “censura do bem”, “na ação enérgica da polícia”. Para estes, as pessoas que chegam ao poder político são corruptas, egoístas, espertas e desonestas. Curiosamente, não dizem o mesmo dos banqueiros, dos mega empresários, dos herdeiros, dos rentistas e nem sequer do próprio empresário que corrompeu o político. “Ahh, mas ele só fez isso para sobreviver e manter o emprego dos seus empregados”. Os políticos são sempre os que mais apanham: “Não sobra um, é preciso acabar com tudo isso que está aí, e colocar pessoas técnicas em posição de comando”. Assim, o Ministério da Indústria seria de…. um industrial, o da saúde deveria estar na mão de um médico, o ministério da agricultura, controlado por um latifundiário, etc., mas os coroas não pensam que estas posições sejam ocupadas por um operário, uma técnica de enfermagem ou um agricultor familiar, por certo. Seria radical demais.

Na maturidade o vigor das utopias e o colorido dos sonhos de uma sociedade mais igualitária vão desbotando paulatinamente. Não passa um dia sequer que eu não veja um colega de escola ou faculdade fazendo coro às manifestações mais reacionárias do momento, agindo de uma forma absolutamente individualista, falando de seus interesses próprios e sem qualquer perspectiva para a sociedade. Seu pensamento parece ser “Bem, já que meus sonhos de igualdade não vão acontecer, melhor que eu garanta um pouco de conforto na minha velhice; afinal, quem mais do que eu merece um descanso digno?”

Os antigos já diziam que o grande avaliador da honestidade é ter em mãos a possibilidade de efetuar o delito e mesmo assim recusar (ou recuar), o que me parece justo. Afinal, denunciar o suborno de alguém quando nunca teve sua honestidade realmente colocada à prova é sempre tarefa muito fácil. Da mesma forma eu digo que a grande prova do idealista e do sonhador é envelhecer mantendo jovens e vibrantes os seus ideais, sem deixar-se sucumbir pelo negativismo, pelo derrotismo e pelo cinismo. Manter suas ideias joviais, nutridas pela esperança e pela visão positiva do mundo é o que nos mantém jovens, mesmo quando a carroceria já não tem mais o vigor dos anos dourados. Por isso eu aceito ser comunista, espirita laico, internacionalista, anti-imperialista e ativista pelo parto normal, mesmo tendo plena consciência de que não estarei aqui para ver nenhum dos meus sonhos de adolescência se tornarem realidade.

Tomem aí, meus netos, a semente que vos deixo…

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Sonho

Hoje eu tive um dos melhores sonhos com o meu pai; pelo menos posso afirmar que foi o mais vívido de todos. É possível que esse sonho seja o reflexo de um pedido mental que fiz a alguns dias, para que ele mandasse o sinal que havia me prometido. No sonho, encontrei-o na sala pequena de uma escola que tinha uma janela de frente para um parque gramado muito grande. Cumprimentei-o efusivamente e começamos a conversar. Perguntei como estavam as coisas e disse que ele estava muito bem. Passei a mão no seu rosto e me dei conta que ele era mais jovem do que eu. Seus cabelos estavam negros, como lembro pelas fotos, e parecia muito jovial. Perguntei o que ele estava fazendo naquela escola, e ele respondeu “Ora, eu trabalho aqui”. Isso seria coerente com sua vida, já que a melhor maneira de definir o meu pai seria como um pedagogo.

“Que bom que trabalhas aqui!!”, disse eu. Pedi a ele que me dissesse algumas coisas sobre o funcionamento do plano espiritual, ao que ele me respondeu de forma jocosa, como que a dizer “Se eu te dissesse tu não entenderias”. Eu traduzi isso como a resposta dada a uma criança de 5 anos que ousasse perguntar aos adultos porque as pessoas fazem sexo. Não faria muito sentido, pois este fato da vida está além da experiência sensorial de uma criança. Logo depois, perguntei pela minha mãe, e alguns amigos que nos deixaram nos últimos anos.

– Sua mãe está ótima. Vamos nos casar em maio.

Também faz sentido. Antes de morrer ele me confessou que pretendia casar com a minha mãe muitas outras encarnações, pois não conseguia imaginar uma companheira melhor. Por fim eu perguntei se aquela cara dele foi escolhida por ele mesmo ou algum mecanismo automático fez com que a conformação corporal adotasse sua “melhor versão”. Ele apenas sorriu….

E eu acordei…

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