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Caritas

A prática da caridade só é necessária pela existência injustiça social. Sem esse desequilíbrio na distribuição da riqueza a caridade seria desnecessária e inútil. Em um mundo justo e equilibrado onde cada um receberia de acordo com seu trabalho, para que serviria a caridade? Portanto, antes de ser caridoso seja ativista. É mais importante tratar a causa do que dedicar-se a amainar as dores que lhe seguem por consequência.

Madre Calcutá de Santa Teresa, Aforismos

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Empatia e Bondade

Diz-se que a forma mais rebuscada de empatia é fingir não ter visto algo para não constranger a pessoa. Muito fiz isso, mas acho que esse sentimento merece uma análise mais fria.

Eu questiono que a motivação para essa atitude seja simplesmente a empatia. Muitas vezes fingimos não ver um malfeito apenas para nos livrarmos do enorme constrangimento de compartilhar com alguém algo condenável ou embaraçoso. Ao fingir não ver, você está livrando a ambos da necessidade de reconhecer e debater sobre o que ocorreu. Desta forma, quando fazemos isso é mais para nos livrar da situação embaraçosa do que por empatia ou caridade. Ou seja, há bastante de egoísmo nesta ação, talvez até mais do que bondade.

O mesmo ocorre quando damos um presente. Acredito que há mais desejo de satisfação pelo agradecimento que se segue do que a legítima e desinteressada alegria de presentear. Por isso é que quando damos a alguém um “mimo” e esta pessoa não agradece na medida que esperamos, o chamamos de “ingrato” ou “mal-agradecido”, porque o agradecimento (efusivo e explícito) fazia parte da negociação desde o princípio.

Minha análise se debruça sobre a observação crua e sem condescendência sobre as motivações inconscientes que nos levam a praticar atos de caridade, seja uma ajuda humanitária ou um simples presente oferecido à uma criança. À luz das evidências, sobre estes fatos simples se inserem outras razões, mais profundas e inconscientes. Existe um componente egoístico inerente a todas estas atitudes e comportamentos, mas a vaidade nos impede de enxergar e reconhecer tais motivações.

Entretanto, a senda de crescimento pessoal passa pela necessidade de reconhecer nossas facetas menos nobres, ao mesmo tempo que nos oferece a sabedoria para depurar o quanto de auto exaltação buscamos nestas ofertas.

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Caritas

Tenho uma clara discordância com a famosa frase de Alan Kardec sobre a “salvação” através da caridade. Por certo que posso entender a importância da empatia e a necessidade de auxiliar os pobres, mas vejo nessa prática a manutenção de erros na política de distribuição das riquezas produzidas pelon ser humano. Em verdade, penso exatamente o contrário: a prática da caridade – mesmo que meritória – sinaliza degeneração social. Minha versão é esta:

“Enquanto houver caridade, não haverá salvação.”

A caridade é o subproduto da perversidade social. A caridade é a face sorridente da iniquidade e da injustiça social. A caridade é a estratégia que os ricos usam para aplacar suas culpas. O “caridoso” e o filantropo são, via de regra, sujeitos culposos que acumularam riqueza através da exploração do trabalho alheio. A caridade é sempre vexatória e humilhante para quem a recebe. Ninguém deveria receber pela caridade o que deveria ser o justo pagamento pelo seu trabalho. E mais: a caridade floresce onde existe miséria, escassez e concentração obscena de riquezas. A caridade, desta forma, é a medida mais adequada para o fracasso civilizatório.

Não estou me referindo, por certo, à caridade que pode ser traduzida por amor ao próximo ou fraternidade (de frater, irmãos, portanto iguais). A caridade que me refiro – e o cristianismo também – é aquela que nos estimula a oferecer o que se tem aos necessitados. Essa é, sem dúvida, um sinal inequívoco de injustiça social. Ao invés de construir uma sociedade com equilíbrio, onde inexista a disparidade obscena de riquezas e poder, estimulamos àqueles privilegiados a doar algumas migalhas de suas fortunas – normalmente conquistadas pelo trabalho árduo dos outros, muitos deles os próprios pobres a quem ajudam.

A caridade cristã é “…é difundida como um dever cristão, uma ação que se expressa na experiência da solidariedade em relação ao outro que se encontra em situação que lhe impossibilita garantir sua condição mínima de sobrevivência”. Segundo a igreja católica, a caridade pode ser entendida como:

1) Dar de comer a quem tem fome;
2) Dar de beber a quem tem sede;
3) Vestir os nus;
4) Dar pousada aos peregrinos;
5) Visitar os enfermos;
6) Visitar os presos;
7) Enterrar os mortos.

Nada disso seria necessário em uma sociedade justa. Essa caridade apenas existe pela nossa ganância e pela incapacidade de elaborar uma estrutura social em que ela seja dispensável.

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Caritas

A palavra “caridade” tem origem no latim, “caritas” – significando um tipo de amor incondicional, que por seu turno deriva do grego “cháris”, que significa graça, a mesma origem de “caro”, ou seja, aquilo que possui valor.

Como tive uma formação espírita escutei muitas vezes a frase de Kardec que exaltava assim a caridade: “Fora da caridade não há salvação“. Esta é uma das frases mais icônicas do espiritismo, mas acredito ser importante entendê-la em seu contexto; é preciso colocar a sentença do pedagogo francês em seu tempo e sua circunstância histórica.

Um dos axiomas mais celebrados pelos estudiosos da Igreja é “fora da Igreja não há salvação”, ou seja, “extra Ecclesiam nulla salus“, que se pode encontrar nas manifestações de vários Padres e teólogos medievais, modernos e contemporâneos. O próprio magistério da Igreja já a usou inúmeras vezes e em contextos distintos.

Desta forma, a expressão usada por Kardec pretendia fazer um contraponto à expressão “Fora da Igreja não há salvação”, a qual estabelece que a condição precípua e inescapável para a salvação do espírito após a morte seria a crença em Jesus como seu salvador e sua fidelidade à Igreja fundada por Pedro. Para salvar-se do Inferno era fundamental aderir a Cristo. Assim, Kardec tão somente retirou a primazia da fé e colocou na prática da fraternidade o caminho indispensável para a evolução – já que “salvação” é um conceito desprezado pelo espiritismo. Nesse contexto, Kardec se contrapunha à Igreja e sua exclusividade salvacionista.

Também se faz necessário compreender que a “caridade” como nós a concebemos hoje é a ajuda aos mais necessitados, aos famintos, aos descamisados e destituídos, aos pobres, miseráveis e marginais, todos aqueles que surgem como resultado da aplicação dos modelos econômicos excludentes que se baseiam na estrutura das classes sociais, desde o feudalismo, passando pela aristocracia e desembocando no capitalismo, todos eles sistemas econômico-sociais que se sustentam na exploração do trabalho, criando classes distintas de oprimidos e proprietários, onde a miséria e o desemprego são peças essenciais para o funcionamento da máquina.

A caridade seria a válvula de escape das tensões sociais, uma forma sutil de apaziguamento das culpas derivadas da pobreza instituída pelo modelo de divisão das riquezas do planeta. Quando a simples caridade realizada como propaganda – a entrega de pequenas quantidades de valor para os despossuídos – não é suficiente, a ação das forças de repressão se faz necessária. Assim, a caridade é o espelho da desigualdade social; onde existe caridade prolifera a injustiça, a exploração e a opressão sobre enormes contingentes da população. Caridade é a humilhação que o pobre aceita em nome da sobrevivência – própria e dos seus.

Sociedades desenvolvidas não admitem a caridade, já que ela sempre sinaliza desequilíbrio. “A suprema caridade é o desaparecimento de toda e qualquer ação caridosa“. Todavia, se quisermos entender a caridade como “expressão da fraternidade”, poderemos incorporá-la, já que a fraternidade nada mais é do que a forma mais elevada e desenvolvida de relação entre os homens.

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Pensamentos mal humorados

Insistir na proposta neoliberal, o mesmo modelo fracassado que falhou em todos os lugares nos quais foi implantado (vide Chile), é aceitar a opressão de milhões em nome de uma fantasia.

É curioso como os espíritas têm – quase sempre – uma postura reformista relacionada ao capitalismo. Quase todos acreditam que a “evolução espiritual fará o sujeito menos egoísta e mais caridoso”. Ou como me diziam muitos, “Não importa o sistema; qualquer um será bom ou ruim, dependendo da pureza da alma das pessoas”. Segundo me dizia um ex-amigo “No futuro os empresários se negarão a explorar as pessoas porque terão Jesus no coração”. A ideia que perpassa é a de que o capitalismo, quando bem administrado, subverteria sua própria essência – o capital – e se tornaria humanista.

Nada pode ser mais ingênuo do que isso. Aguardar que a justiça social seja oferecida graciosamente pelos opressores é um absurdo tão gigantesco quando imaginar que na história do mundo alguma liberdade foi alcançada por “dádiva” – e não for luta e sacrifício. Já a caridade, para os espíritas, significa distribuição de rancho e roupinha para pobre; sopão e festa de Natal para criança. Em outras palavras, alívio das culpas acumuladas pela vida burguesa”, exatamente a mesma prática dos empresários picaretas e selvagens, ou das senhoras da alta sociedade que fazem chazinho beneficente para auxiliar a enfermaria de pediatria da Santa Casa.”

A caridade espírita é cristã: ou seja, visa manter a pobreza para que a caridade e os caridosos continuem necessários e exaltados. Nossa caridade é um dos braços mais poderosos para a manutenção da miséria. Por isso as instituições internacionais ajudam tanto os identitários: para manter a sociedade dividida e manipulada, ávida por ajuda que caia do céu.

Estou farto dessa caridade dos caridosos. O mundo não precisa dessa esmola, dessas migalhas. Precisamos de justiça social, equidade, respeito à natureza e o fim do capitalismo. Ou como diria HOJE Alan Kardec “Fora da justiça social não há salvação”. Não é?

O Terceiro setor – as ONGs e similares – são a representação inequívoca da falência do Estado. Tapadores de buracos. Participei de várias a vida inteira, e com orgulho – especialmente da ReHuNa – mas sempre soube que nossa existência era a imagem perfeita da incompetência do Estado para realizar estas funções. Eu gostaria que a ReHuNa deixasse de existir, por ser desnecessária. Os colegas que ainda estão lá, entretanto, serão necessários ainda por um bom tempo.

Quando ouço falar de “Hospital de Caridade” me dá calafrios. O mesmo mal-estar que eu sentia ao ouvir o nome completo da Santa Casa: “Santa Casa de Misericórdia” que deixava claro que você só estava sendo atendido lá porque alguém teve pena de você, e não por ser seu direito constitucional à saúde. Eu pergunto: desde quando cidadão precisa “caridade”??? Saúde não se ganha, se conquista através de políticas públicas. Filantropia é um remédio amargo e indigesto, cuja finalidade é manter um sistema injusto e cruel através da dominação e dependência. Qualquer país minimamente decente acabaria com todos os sistemas de filantropia interna.

Quem assumir em 2022 receberá um país dividido, em frangalhos, com a infraestrutura destruída por Moro e depois complementada por Bolsonaro/Guedes, sem emprego, sem estatais para alavancar o desenvolvimento, com teto de gastos e ainda controlado por uma elite financeira exploradora e uma burguesia de rapina, as mesmas que escondem dinheiro no exterior.

Nunca houve ‘taxação justa’ do setor produtivo, muito menos agora onde a sonegação bate recordes.

É preciso subjugar as forças armadas golpistas, exterminando o padrão reacionário que existe em seu seio tal como bem conhecemos. É preciso punir os militares assassinos e corruptos, como o comandante dos massacres do Haiti. Sem o fim do “partido militar” e de seus militantes nunca avançaremos. Precisamos fazer o resgate da história, corrigindo o erro da “transição pós 64”. Sem isso teremos nova crise militar em poucos anos.

É preciso acabar com a classe burguesa no poder. Esse é um projeto de décadas, mas o único onde é possível vislumbrar um futuro possível. O fim do capitalismo é a única esperança de continuidade da espécie humana. As pandemias em sequência e o colapso do sistema capitalista são avisos claros de que esse sistema de dominação e opressão não tem mais força para manter este planeta.

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Igualdades

Finalmente alguém consertou aquele famoso cartaz reaça, que discutia e problematizava as caixas mas jamais colocava a maldita cerca como a origem das disparidades. Parabéns…

Minha interpretação é de que esta cerca é constituída pelos dois pilares de sustentação das sociedades ocidentais: o capitalismo e o patriarcado. As caixas colocadas posteriormente representam o “punch 2” da teoria de Peter Reynolds: tudo o que a sociedade faz no sentido de consertar a intervenção inicial (capitalismo e organização patriarcal) para diminuir seus efeitos deletérios, porém SEM MEXER nas estruturas viciosas e que estão na origem dos problemas (no caso da gravura, a possibilidade de assistir o jogo, em nossas sociedades a exploração, a miséria e a iniquidade).

As caixas são o “Criança Esperança”, as loterias alienantes, a competitividade violenta, os filantropos, as inúmeras doações feitas pela Coca Cola e – em última análise – a própria caridade, entendida aqui como a ação pessoal ou coletiva para ajudar os oprimidos pelo capitalismo ou pelo patriarcado…. que NÓS MESMOS criamos.

Assim, primeiro nós criamos as cercas e depois inventamos múltiplas caixas para ajudar os “desafortunados” apenas porque não temos coragem de questionar a simples existência da cerca!!!

Não tenha dúvida que retirar uma cerca é algo que demanda um tremendo esforço. Portanto, ela só pode ser retirada por uma interferência muito forte na cultura. Pode ter certeza que arrancar cercas é uma tarefa profundamente penosa. Tanto metaforicamente ao mudar estruturas sedimentadas na cultura quanto na lida do campo. Romper a cerca do capitalismo e do patriarcado será a grande tarefa do século XXI em todo o planeta.

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Caridade

“…. e digo mais ainda, a essência da caridade é exterminar a si mesma, de forma que sua existência seja vista como a imagem acabada da incapacidade ou da indecência”.

Dinesh Gupta, “The rising sun – from misery to splendor”, Ed. Kashir, pag 135.

Dinesh Gupta é um jornalista e escritor indiano, nascido em New Delhi e educado na Califórnia. Escreveu três livros: “Um mundo para Raja”, “Crônicas de Paharganj” e “The Rising Sun – from Mistery to Splendor”. Recebeu o prêmio Young Mumbai como escritor revelação em 2008.

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Moedinhas

Reflita: quando artistas e empresários doam remédios, cilindros de oxigênio, roupas e brinquedos para os necessitados durante calamidades como a que hoje estamos atravessando, eles apresentam sua caridade no Instagram e a chamam de “solidariedade”. Ainda nos fazem reclamar de outros empresários ou jogadores de futebol que nada fizeram para diminuir a dor dos desvalidos. Surge uma competição estúpida entre aqueles que são os “bons” e os “maus” milionários.

Estas doações são, via de regra, grandes ações de marketing para alavancar a imagem dos milionários. Nada de novo na história do capitalismo. Doam uma fração minúscula de seus ganhos diários para servir de alimento ao noticiário sensacionalista. Infelizmente, continuamos a nos ajoelhar diante das moedinhas jogadas por Rockefeller.

Todavia, essa máscara de benevolência não é o pior resultado deste tipo de exaltação midiática dos “benfeitores”. Com este tipo de manipulação reforçamos a ilusão de que a solução para as graves e insolúveis contradições do capitalismo se encontra na boa vontade dos ricos capitalistas em distribuir algumas migalhas e não na luta de classes e na justa distribuição das riquezas produzidas pelos trabalhadores de todo o mundo.

A caridade mantém intacta a injustiça, mas lhe oferece uma máscara reluzente – e falsa – de virtude. Em uma sociedade equilibrada, fraterna e igualitária nenhum ato caridoso seria necessário, pois a justiça social e a distribuição correta da riqueza já nos teria tornado – de fato – irmãos.

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Valão

Há exatos 13 anos eu trabalhava em uma creche popular da capital fazendo trabalho voluntário. Essa instituição estava em uma vila extremamente pobre da cidade, uma zona de proliferação de doenças endêmicas, subnutrição e violência doméstica, cortada por um valão imundo e malcheiroso e controlada por uma facção poderosa do mundo das drogas. Uma vez uma equipe do Canadá veio me visitar para uma entrevista sobre humanização do nascimento no Brasil, e foi lá – no meio da miséria exposta de uma cidade grande – que resolveram gravar a matéria. Mas este é outro assunto…

Esta creche era controlada por uma freira extremamente carismática e poderosa. Próxima dos 70 anos, era extremamente respeitada na comunidade, inclusive pelos chefões das “bocas de fumo”, a quem recebia em sua salinha acanhada como uma verdadeira líder. Era também respeitada nos círculos da prefeitura e da Assistência Social do município, por ter uma personalidade forte, altiva e trabalhadora.

Um belo dia ela abre a minha sala de consultas com ar extremamente preocupado. Veio me dar uma notícia que considerava extremamente grave.

– Ele vai entrar com caminhões e retroescavadeiras, Ric. Vão invadir tudo aqui. Ele não tem respeito algum por nós, vai botar tudo abaixo!!”

Pedi que ela respirasse fundo e me contasse vagarosamente. “Ele”, era o prefeito, a ameaça atual. Prometera em uma reunião na qual ela esteve presente que um dos próximos projetos da prefeitura seria fechar o córrego imundo, o esgoto a céu aberto que dividia a comunidade, saneando a vila, acabando assim com as doenças surgidas da sujeira. Para isso precisaria derrubar e realocar os casebres que teimavam cair para dentro do valão.

– Mas irmã, ponderei, não é uma boa notícia? Não deveríamos estar felizes que a municipalidade resolveu finalmente olhar para essa parte esquecida da cidade? Não lhe parece uma bênção que um prefeito tenha finalmente prestado atenção em nossa existência?

Minhas palavras pareciam não fazer sentido para ela. Ela continuava ansiosa e agitada, e me descrevia a promessa como uma invasão, a destruição do seu lugar, da sua vila, da sua comunidade.

– Não confio nesse prefeito. Ele não tem boas intenções. Tudo o que ele quer é desmanchar nossa comunidade, botar tudo abaixo, fazer uma avenida cheia de carros cruzando aqui pelo meio, disse ela apontando para a margem do córrego.

Tentei mais uma vez argumentar, mas sem sucesso.

– Não me parece nada disso, irmã. Prefiro acreditar que essas coisas inevitavelmente aconteceriam. Um dia alguém daria um basta a esta vergonha, esta pobreza, esse descaso. Talvez, no futuro sequer será necessária a existência desta…

Parei. Foi nesse momento que olhei nos seus pequenos olhos azuis e percebi onde residia a sua angústia. Envergonhado, parei de falar sem terminar a frase. Ela, por caridade, fingiu não perceber que eu havia encontrado o âmago do seu desespero.

Uma vida toda ligada a curar feridas, oferecer comida aos famintos, ensinar meninos na arte da confeitaria, aulas de dança, creche e berçário para mulheres imersas na pobreza, acolhendo os viciados que a ela recorriam e se tornando a grande referência na comunidade, mais conhecida até que o próprio Papa, a quem devotava suas preces diárias. E agora, um prefeito janotinha pretendia acabar com a sua clientela. Os outrora famintos, desnutridos e ávidos de caridade poderiam receber pelas mãos do governo o que ela sempre ofereceu por caridade e amor. O progresso poderia acabar com sua importância, seu trabalho, sua missão de vida e até com sua identidade.

Pela primeira vez tive contato com esse sentimento paradoxal: a aceitação da dor alheia pelo gozo de ser o remédio. A irmã tratava os moradores da vila como seus próprios filhos e agora sofria as dores do abandono que se anunciava. Como toda mulher que vê os filhos saindo de casa, ela também sofria pela perda de sua família e sua função.

Em seus olhos pude ler, escrito com as tintas de suas lágrimas: “e se todos forem, o que será de mim?”, e pude entender sua dor e sua angústia.

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Benemerência

Cara… não posso aceitar gente cobrando caridade dos ricos deste país, como se os milionários tivessem que fazer aparições públicas de distribuição de presentinhos ou cestas básicas…

Silvio Santos sequer deveria ajudar. Não é função dos ricos fazer isso. Não é obrigação de nenhum rico fazer a caridade que ELES querem para quem ELES querem. Isso é caridade e caridade é HUMILHANTE. O Brasil não precisa da bondade do Silvio Santos, do Neymar, do Huck, do dono da Ambev ou do Gerdau. Não é certo esperar que eles sejam bonzinhos ou caridosos. Ponto.

O que a gente precisa é de uma LEI para cobrar IMPOSTOS DURÍSSIMOS dos ricos, para que NÓS utilizemos esse dinheiro onde NÓS acreditamos ser o melhor para o país, e não mais admitir estas propagandas onde os capitalistas abonados usam as migalhas que dão como publicidade.

O Sílvio Santos NÃO DEVE DAR NADA como benemerência, mas tem que ter sua fortuna TRIBUTADA DURAMENTE. Não quero favor dessas pessoas, quero que o seu dinheiro (que em última análise foi retirado de nós) reverta para o bem do povo, e não para falcatruas ou para essa publicidade barata que os ricos fazem.

Desconstruam essa ideia de que ricos devem distribuir dinheiro do jeito que desejam. Eles devem PAGAR IMPOSTO PESADO!!

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