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Utopias e Zumbis

Muitos se assombram que Geraldo Vandré tenha se tornado um reacionário na maturidade depois de ter embalado nossos sonhos de justiça e equidade com a trilha sonora da nossa adolescência ao compor “Prá não dizer que não falei das flores”. Essa música era cantada em onze de cada dez acampamentos onde houvesse um violão e a luz flamejante das utopias. Sim, e também garotas…

Eu não me assombro. Vandré tinha 30 anos quando sobreveio a ditadura e 33 anos quando sua música ficou em segundo lugar no Festival Internacional da Canção em 1968. Era, na minha perspectiva de terceira idade, um garoto. Quando penso nele lembro muito bem dos amigos de juventude que hoje são reacionários – e muitos deles fanáticos bolsonaristas – mas que na juventude compartilhavam comigo sonhos à esquerda. As idéias dessas pessoas mudaram, ou sua postura revolucionária era tão somente uma máscara a esconder seus medos e angústias?

Fico com a segunda opção; jamais foram de esquerda ou socialistas. Eram inconformados, amedrontados, queriam derrubar “isso tudo que está aí” (como repetiram à exaustão os bolsonaristas também), mas não se conectavam com as bases que estruturam o socialismo. Eram rebeldes, mas não tinham a dureza da luta pela sobrevivência no seu horizonte próximo.

Há uma velha piada da direita que diz que “quem não foi comunista na juventude não tem coração; quem continua da maturidade não tem cérebro”. A piada serve para tentar explicar esse fenômeno: por que tantos abandonam seus sonhos, deixam a esquerda, atiram-se nos braços do conservadorismo e assumem uma posição cínica, utilitarista e desprovida de paixão?

Eu tenho uma perspectiva freudiana sobre o tema. Primeiro, a piada do “coração e o cérebro” é apenas isso: um chiste, uma troça, um gracejo que tenta explicar um fato através do humor – e o humor, ao meu ver, é sagrado. Todavia, essa piada não tem nenhum fundamento na realidade, e expressa o oposto do que se pode constatar cotidianamente. Quanto mais se estuda o capitalismo e suas contradições mais percebemos que a solução é “socialismo ou barbárie“, já que as promessas da Revolução Burguesa jamais foram cumpridas, liberando a classe proletária da exploração e oferecendo dignidade aos trabalhadores. Portanto, a presença do cérebro pode ser mais facilmente constatada naqueles que abraçam posições à esquerda do espectro político, e nunca o contrário.

Aliás, é daí que vem o mito de que as universidades são uma ameaça ao sistema, por serem “antros de esquerdistas”, exatamente porque onde se dissemina a luz do conhecimento, em especial das ciências sociais, mais se descortinam as realidades perversas do liberalismo e do Imperialismo, produzindo naturalmente um contraponto ao modelo social e econômico corrente. Ou seja: o cérebro nos leva à esquerda, não à direita.

Entretanto, o que cede insidiosamente durante a vida é o furor sexual da adolescência e da juventude. Assim como nossas juntas, também nossas paixões enferrujam, tornam-se rígidas, perdem movimento e amplitude. Somos, com o tempo, cooptados pelo sistema e pela necessidade de sobreviver – ou pela garantia de ilusórios privilégios – o que nos dificulta sonhar pelo bem comum. Acabamos nos tornando velhos ranzinzas, que jogam a culpa das mazelas do mundo nos políticos, na corrupção, no “comunismo”, nos vagabundos, etc, esquecendo a importância que o sistema injusto e opressivo ocupa na produção da realidade cotidiana.

Vandré e muitos dos meus amigos de infância, ex-esquerdistas, sofrem da fadiga dos metais, do abandono das utopias, do cansaço do desejo, da fraqueza das convicções e da senilidade de seus ideais juvenis. Mesmo entendendo a maturação de nossas propostas, vejo na desistência dessas motivações uma espécie de “morte ainda em vida”, algo que deve ter inspirado os cineastas a fazer tantos filmes sobre zumbis. Todavia, as utopias jamais morrem; como ervas daninhas elas se recolhem e retornam em solos mais jovens, cujo viço da paixão aduba as propostas de mudança.

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Jornadas, uma década depois

Estive com a minha família nas jornadas de junho em 2013, mais por curiosidade do que por interesse em participar de algum ato político. Eu já tinha iniciado meu rompimento definitivo com o reformismo e com a esquerda liberal, portanto não trazia comigo muita fé nas manifestações limpinhas da classe média. Chegando ao lado do Palácio do Governo a população se aglomerava enquanto se ouviam os gritos de “chega”, “abaixo a corrupção”, “não é pelos 20 centavos” entre outros bordões, que se tornaram famosos à época. Havia um nítido entusiasmo juvenil, parecido com o movimento surgido poucos anos depois que defendia o uso de shorts curtos pelas meninas de uma escola burguesa da capital do Estado. Confundíamos a puerilidade das liberdades burguesas com exercício da cidadania.

Na rua estava a classe média. Não havia operários serventes, trabalhadores, empregadas ou faxineiras. Claro, havia pobres, mas estes aproveitavam para vender refrigerante e cachorro quente para os jovens da pequena burguesia. Entrementes, algo me chamou a atenção logo que cheguei ao evento: percebi uma estrutura organizada para receber os inflamados discursos, o que deixava claro a existência de uma fonte de recursos que promovia o evento. “Quem paga?” perguntei retoricamente, recebendo de todos o silêncio como resposta.

Subindo pela rua que fica ao lado do fórum em direção à praça da Matriz, eu vi um pequeno grupo de não mais do que meia dizia de jovens tentar desenrolar uma grande bandeira vermelha com duas ferramentas pintadas de amarelo cruzadas ao centro. Foram imediatamente impedidos de fazê-lo por um grupo bem maior de transeuntes que seguiam na mesma direção. O grito deles ecoa até hoje: “Sem partido, sem partido”, gritavam. Para minha surpresa o grito percorria como eco pelas redondezas, chocando-se com as paredes externas da catedral e atingindo com força o Palácio do Governo onde, à frente, erguia-se o palanque. Como assim “sem partido”? Por que haveria a necessidade de bloquear a paixão partidária, a perspectiva política que unia os sonhos de grupos de cidadãos? E por qual razão estávamos todos juntos em manifestação? Contra o quê? Contra quem? Por qual ideal?

Para um bom observador seria fácil entender que a luta era contra a própria política. Foi nessas manifestações que surgiu o MBL, um movimento de direita, que surgiu à margem dos partidos, cuja intenção era expurgar a esquerda do cenário nacional através das redes sociais, das mentiras repetidas “ad nauseam”, das “fake news”, do deboche, do ataque ao feminismo, às liberdades civis e com uma paixão explícita ao neoliberalismo. Apesar de ter surgido fora das organizações partidárias, logo depois seus representantes se uniram aos partidos tradicionais da direita brasileira. “Sem partido, se for de esquerda e popular; se for partido burguês está liberado“. Não só isso; eles foram partícipes diretos do golpe de 2016 emprestando apoio a Eduardo Cunha e aos atos a favor do impeachment fraudulento. O cerne das reivindicações era destruir a própria política, transformando-a em uma prática tecnocrática bem afeita ao “fim da história”.

Os avanços da esquerda com os governos de Lula e Dilma se tornaram insuportáveis à burguesia. Não havia como aceitar o risco de que, findo o governo Dilma, o PT lançasse uma nova candidatura e completasse duas décadas de poder. Havia que se criar um ataque moral à esquerda, pois que era difícil criticar governos que haviam produzido uma melhora significativa em todos os parâmetros da vida nacional. Assim como os ataques à Getúlio, Juscelino e Jango o foco seria a moralidade, o “mar de lama”, a roubalheira, a sujeira ética. Não foi possível com o mensalão, mas seguiria com as “pedaladas” e depois com o Triplex e o sítio de Atibaia. O sucesso dos seguidos ataques nos levou a seis anos de retrocessos com Temer e Bolsonaro, e a destruição de inúmeras conquistas populares.

Existem duas vertentes na esquerda para explicar as jornadas. A primeira diz que as manifestações foram orgânicas, fruto da insatisfação popular, mas que saíram do controle e foram sequestradas pela direita, pelos agentes da burguesia e pelo mercado financeiro. A outra vertente é que as “jornadas” foram desde o início pontas de lança para o golpe, organizadas desde o princípio para tal, assim como as primaveras coloridas, as manifestações na Praça da Paz, o Euromaidan e todas as outras iniciativas imperialistas pelo mundo afora. Ou seja, havia um dedo da CIA nas manifestações, da concepção estratégica à execução.

Eu não tenho mais nenhuma ilusão quanto à capacidade do Império de financiar golpes, por isso acredito que eles estiveram por trás dessas iniciativas desde o seu surgimento. Escolha você em qual perspectiva prefere acreditar. Eu creio, como Lula, que por pior que possa parecer à vista desarmada, não há solução melhor para um país que não passe pela política. Suprimi-la, por seus inquestionáveis defeitos, significa abdicar da própria vida democrática.

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Viradas

Muito ainda vai se falar sobre a derrota do trumpismo nas eleições de “mid terms” e, por consequência, da extrema direita de inspiração fascista na América. As derrotas de Bolsonaro e de Trump podem estar anunciando a decadência inequívoca do modelo extremista de direita no mundo, e tal ocorreu pela falência deste paradigma em oferecer o progresso, a justiça social e o desenvolvimento que prometiam. O mundo volta-se lentamente à esquerda – apesar da força das direitas no mundo todo – e se afasta do fundamentalismo religioso que caracterizou os governos de Trump e seu fac-símile tupiniquim. Oxalá não seja apenas o balançar do pêndulo político, mas uma real tendência de maior consciência de classe a inspirar as pessoas no mundo inteiro, cada vez mais alertas para a decadência inexorável do capitalismo.

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A esquerda que não aprende

Ontem (11/08) ocorreu a leitura da “carta pela democracia“, que foi lida em mais de 20 capitais do país, numa festa pelas liberdades democráticas. Entretanto cabe a pergunta: que democracia é esta que os participantes desejam? Que tipo de manifestação recebe apoio da USP, através do seu Reitor Carlos Alberto Carlotti, Telma Andrade, a secretária da CUT, a representante das lutas antirracistas Beatriz Lourenço Nascimento e muitos militantes de esquerda, mas também Blairo Maggi (homem forte do agronegócio), Guilherme Peirão Leal (o presidente da Natura), Eduardo Vassimon (banqueiro ligado ao BBA), Horácio Piva (da Klabin), Walter Schalka (da Suzano), Roberto Setúbal (do Itaú), Pedro Moreira Salles (da Febraban) e muitos outros bilionários que abrilhantaram com suas fortunas o manifesto lido ontem em nome da democracia e das liberdades constitucionais.

Com esta pluralidade de integrantes cabe a pergunta, que nos parece mais do que natural, mas necessária: a que tipo de “democracia” se referem estas personalidades? Como podemos imaginar que a mesma democracia seja defendida pelos trabalhadores, antirracistas, representantes da universidade e ao mesmo tempo por banqueiros e industriais bilionários que controlam o país e o mantém como eterna esperança de “nação do futuro”?

A resposta triste é que sobra um ilusório fervor patriótico onde falta consciência de classe. A democracia que serve aos banqueiros e industriais não pode ser a mesma que anima a militância de esquerda, pois para aqueles a democracia é o respeito aos seus privilégios intocáveis, enquanto para esta existe o desejo de que as riquezas imensas desse país sirvam para melhoria de vida de sua população. Esta democracia liberal, que interessa à classe burguesa e que acredita nos mecanismos eleitorais para a solução dos grandes dilemas nacionais, não pode ser a motivação da classe trabalhadora. A realidade não nos permite ter dúvidas quanto à potencialidade limitada dos mecanismos eleitorais e representativos para suplantar o capitalismo no Brasil. Mesmo os governos progressistas do Partido dos Trabalhadores, que operaram transformações mínimas na questão da distribuição de renda, se mostraram insuficientes para debelar a tragédia da exclusão, e bastou a chegada de um maníaco à presidência – através de um claro golpe institucional e midiático – para que as conquistas tímidas da esquerda fossem jogadas no ralo.

É necessário que as esquerdas percebam o quanto estas “cartas”, “abaixo-assinados”, “marchas pela paz” e “manifestos” são inócuos para os donos do poder. Tais manifestações servem como “cortina de fumaça”, uma fantasia de democracia para esconder o corpo disforme da tirania. Funcionam como a representatividade negra na cultura, que exalta personalidades e exibe uma “face de diversidade”, mas que jamais desafia o modelo de exclusão que nos atinge através de um rígido sistema de classes que serve se presta à acumulação de dinheiro e poder.

As armadilhas e arapucas da democracia liberal precisam ser expostas e denunciadas. Não há como compor com banqueiros e industriais, pois que os seus interesses são antagônicos àqueles das classes operárias e da imensa maioria da população brasileira. Abandonar a ilusão de uma “frente ampla” com a burguesia é um passo à frente na plena consciência de classe, elemento importante e essencial para as lutas de libertação.

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Exijam o impossível

Uma verdade difícil de aceitar, mas extremamente importante para as esquerdas, é que Bolsonaro conquistou seu eleitorado com a promessa do antissistema. Os pobres do Brasil não votaram em Bolsonaro porque ele prometia a venda da Petrobrás ou de qualquer estatal; também não votaram para desinchar o executivo ou azeitar a máquina. As pessoas votaram porque Bolsonaro representava a revolta contra uma política que parecia não afetar em nada as suas vidas. Os escândalos, os roubos, a falta de leitos hospitalares e as escolas sem material continuavam acontecendo, e parecia uma boa ideia votar em alguém que prometia acabar com “tudissdaê“.

Enquanto a direita assumia uma postura proativa e de enfrentamento ao status quo, a esquerda perdia seu espírito revolucionário, acostumando-se com o exercício do poder. Perdemos as ruas, e compramos com facilidade – e docilmente – o discurso dos leftists americanos, que nada mais são do que que a direita domesticada pelo mercado. Os partidos de esquerda no Brasil aceitaram o palanque identitário que contaminou e destruiu o discurso de enfrentamento que sempre foi sua marca de ação social. Começamos a discutir pronomes e aceitar a censura como nossas bandeiras. O discurso dos “sentimentos ofendidos” começou a tomar conta do que antes era uma defesa aberta contra qualquer tipo de obstrução à livre expressão.

Ao invés de lutarmos pela melhoria da vida do trabalhador aceitamos de forma passiva a divisão do proletariado em identidades, que nada mais fizeram que tornar inimigos sujeitos igualmente precarizados, que deveriam estar unidos em uma mesma luta de libertação.

A mensagem revolucionária, antissistema, libertária e socialista precisa ser a voz do novo governo. Sem que a esquerda retorne para o caminho da confrontação, sem reativar a luta anticapitalista e sem depurar o identitarismo de suas fileiras será muito difícil sustentar um governo de esquerda eternamente prisioneiro da direita.

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À Esquerda?

Alexandria Ocasio-Cortez e sua amiga estilista Aurora James.

Para mim AOC – Alexandria Ocasio-Cortez – a congressista americana nascida no Bronx que já foi garçonete e bartender, é o maior exemplo do desastre das esquerdas da América. Há poucos dias ela foi para um baile de gala do Metropolitan usando um vestido onde se lia “Tax the Rich”, em letras vermelhas sobre o vestido branco. O caso gerou manchetes no mundo inteiro e debates acalorados se seguiram.

A questão é que, antes de se tornar congressista, AOC participou de vários protestos, tomando borracha da polícia no lombo e levando adiante sua palavra contra as elites e a plutocracia americana. Já no baile, encontrou-se e confraternizou amistosamente com elementos do “deep state”, que é formado pelas indústrias de armas, drogas, petróleo, tecnologia e por Wall Street, os mesmos que há pouco xingava e combatia. Por certo que os poderosos riram dela, mas é claro que fingiram respeitar seu “protesto”.

O ingresso para a festa custava a bagatela de 30 mil dólares (tipo, 150 mil bolsonetas) e por certo que, para aqueles que lá estavam, esse valor cai na rubrica “investimentos” de suas empresas. Por outro lado, fora do Metropolitan uma multidão protestava enquanto levava porrada da polícia, os mesmos que há alguns anos eram seus parceiros de luta. O poder a fez mudar de lado. AOC agora se juntou às corporações e depois disso não votou mais nas leis importantes para a esquerda como “saúde universal”, “defund the police”, “stop fracking”, “climate change”, “minimum wage”, etc. Em outras palavras, uma Tábata “with steroids”.

Mas isso não é o mais chocante. O que me deixou estupefato é a história do vestido, que é especialmente pedagógica. Ela descreveu sua amiga estilista, Aurora James (foto acima, com Alexandria), como “uma mulher negra, da classe trabalhadora e imigrante, que chutou a porta do Metropolitan para viver o seu sonho”. Isto é…. nada de creches, moradia para todos, saúde universal… mas uma mulher negra e trabalhadora conseguiu chegar ao topo. Uau, que vitória!!!.

Essa é a essência do individualismo identitário. Cada um por si, lute por você. Não desista. Chegue ao topo. O resto que se vire. Mais ou menos o discurso que me acostumei a escutar por aqui também.

A parte engraçada da história é que a “estilista negra imigrante” Aurora James veio de… Toronto, no Canadá. Faz tanto sentido quanto chamar John Lennon em Nova York de “imigrante de uma ilha da Europa”. Além disso ela é namorada de um sujeito da família dos Lehman Brothers que tem uma fortuna estimada de 100 milhões de dólares. Fica difícil imaginar essa moça como representante das milhões de imigrantes latinas, negras, pobres, operárias sem creche e sem saúde universal que fazem parte da franja mais pobre e necessitada dos Estados Unidos.

Com este tipo de esquerda (o partido democrata americano é o melhor exemplo), que tem milhares de representantes tanto lá quanto aqui no Brasil, quem precisa de direita?

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Felipe Neto

Vejo as reações ao Felipe “Repaginado” Neto situando-se entre o entusiasmo – afinal ele coloca Bolsonaro e Malafaia no mesmo caldeirão diabólico do fascismo – e o ressentimento – a mesma prateleira onde colocamos Lobão, Joice, Moro, Janaína, etc., aquelas figuras patéticas da história recente que montaram a festa do golpe e agora choram porque o vizinho chamou a polícia.

Sem querer inventar a roda, creio que é possível situar-se com equidistância destas posições. Sim, é verdade que é muito bom que ele cerre fileiras contra o fascismo e o atraso representados por Bolsonaro e Malafaia. Sim é bom que esteja do nosso lado, reconheça seu erro e queira ajudar. Entretanto, de bons moços já estamos saturados. Collor já fez este papel; Huck está tentando ocupar este espaço. Representantes limpinhos da burguesia sempre jogam desta forma: colocam-se como “novidade”, impolutos, sinceros, apolíticos, enojados com o “mar de lama”, etc.

Todavia, alguém que se situa entre “Amoedo e Ciro” não parece ter condições para falar em nome da esquerda, ou mesmo das forças progressistas do país. Ele parece bem sincero, mas está longe de ser um personagem inédito.

Por outro lado, um cara com quase 40 milhões de seguidores não deve ser desprezado, e fico muito feliz que um sujeito com a sua influência no mundo cibernético tenha acordado para o risco que Bolsonaro representa para o país e a nossa democracia.

Gosto dessa atitude, mas não acho ser possível nutrir muitas esperanças por um “nouveau riche” com crise de consciência.

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Fofocas e tiros no pé

Começo com uma conversa hipotética com um lesado de esquerda…

– Para uma parte da esquerda os ataques misóginos, as mentiras, as fake news, o racismo, a lgbtfobia, as fraudes, a falsa religiosidade e até a ligação com as milícias se tornarão justas e corretas desde que sejam usadas por nós contra os nossos inimigos fascistas, certo?

Exatamente

– E por que são eles nossos inimigos?

– Ora, porque são canalhas!!

– E por que são canalhas?

– Simples, porque são misóginos, racistas, milicianos, preconceituosos, homofóbicos e corruptos. Entendeu?

– Sim, entendi… Na sua guerra vale tudo. Por essa perspectiva, porque não usar inclusive uma mamadeira de piroca e um “kit gay” inventado para atacar Bolsonaro?

– Ora, não precisa. Basta atacar a honra da mulher dele e chamá-lo de “corno” sem qualquer prova ou evidencia….

– Uau, genial!!!

Essa fofoca sobre a mulher do presidente é de caráter misógino, difamatório, grosseiro, absurdo e machista. Infelizmente um presidente dessa categoria arranca o que existe de pior em todos nós. Só acho curioso ver tantas mulheres se juntarem ao coro dos acusadores. Os ataque atingem a todas, não apenas à “primeira dama”. Colocar a mulher nessa posição é cruel; obrigá-la a fazer declarações públicas para assegurar sua honestidade, abalada por fofocas maldosas, é injusto e humilhante.

“Ahn, mas olha só o quanto de difamação eles mesmos fizeram toda a vida. Olhe os tuítes da imprensa corporativa acusando Dilma e Marisa. Olhe a atitude desrespeitosa da família contra as mulheres. Olhe como se comportou a imprensa miserável desse país com as mulheres da esquerda”.

Olho, sim, exatamente para dizer que são atitudes inaceitáveis. Estas manifestações preconceituosas servem para provar que a arena moralista pertence àqueles vazios de conteúdo e propostas e que esse assunto serve apenas como isca para a porção da esquerda – felizmente minoritária – mais retrógrada e vingativa. Essas acusações são um tiro no pé da esquerda. Se eu não achasse nosso presidente tão burro e despreparado eu pensaria que foi uma ideia genial para colocá-lo como vítima (seja de adultério ou de maledicências) e expor a parte mais machista e retrógrada da esquerda.

Deixem essa mulher em paz. Aliás, parem de tratar a sexualidade das mulheres como um assunto coletivo e público. “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Parem de apontar dedos.

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Sem Lula é Fraude

A prisão do Lula numa perseguição escandalosa promovida pelos setores mais reacionários de uma sociedade escravocrata não passará em branco. Se Lula não concorrer NENHUM presidente terá legitimidade (como este usurpador de agora). A greves vão acontecer por todo lado, o “Fora XXX” vai aparecer em todos os muros, a pressão da comunidade internacional vai se fortalecer, o clima político no Brasil ficará ainda mais belicoso e tenso. O Brasil se tornará um péssimo lugar para viver. Talvez a solução apresentada pelas elites será o golpe militar ao estilo anos 60-70, mas aí teremos a suprema humilhação internacional.

Claro que os Estados Unidos imediatamente reconhecerão o novo governo militar (de novo), mas o mesmo não vai acontecer com os países civilizados e democráticos da Europa. Lula preso desta forma – sem provas, com lawfare, com desprezo pelas leis – fará o Brasil virar um caos. Uma das razões importantes para a situação conflituosa é que o juiz de Curitiba fez um cálculo errado. Achou – junto com a Globo e os golpistas – que o povo estaria junto com ele no “combate ao PT”, travestido de luta contra a corrupção. Acharam que todos íamos acreditar na narrativa criada para desmoralizar o PT, o único partido na história de República que ousou mudar a pirâmide de classes do Brasil. Também acreditaram que Moro seria colocado no patamar de “heroi nacional” e os promotores fanáticos gospel de Curitiba seriam vistos como “Os Intocáveis” tupiniquins, sendo o Dalanhol um Eliott Ness longilíneo e de bochechas rosadas. Hoje em dia a crítica à atuação dos promotores na Lava Jato varia de “concurseiros arrogantes” até “fascistas”, como cita constantemente o candidato Ciro Gomes.

As “dez medidas” propagandeadas por este grupo entrarão para a história como a peça mais agressiva e violenta contra as garantias individuais e a proteção do cidadão. Esta narrativa planejada não se concretizou. O juiz da República de Curitiba despenca na aprovação nacional, ao mesmo tempo em que Lula – apesar do massacre midiático – supera de longe todos os seus concorrentes à disputa presidencial – e continua crescendo. Por essas questões – a impossibilidade de fazer valer uma narrativa que inviabilize politicamente o ex-presidente Lula – a situação se deteriora para o governo a partir de 2018. Qualquer solução será dramática, mas se o judiciário continuar nessa espiral descendente de credibilidade (ainda estou escrevendo sob o impacto do suicídio do reitor da UFSC) ninguém sabe o que poderá ocorrer.

Por outro lado eu diagnostiquei uma atitude preponderante entre as pessoas de esquerda que é assim: “Enquanto Lula for covardemente perseguido votarei nele para que não se mantenha essa injustiça.” Não estão votando num projeto de Brasil, estão votando para proteger Lula como o grande símbolo da esquerda. Sabem que, se os poderosos podem fazer isso com Lula, podem facilmente destruir qualquer um que se coloque de peito aberto contra o avanço neoliberal. Porém, se Lula for inocentado e não correr mais risco de ser massacrado por um juiz corrupto, poderão votar de acordo com suas preferências, suas ideias e suas emoções. Esse é o meu sentimento: se o grande símbolo da resistência popular continuar sendo ameaçado por um judiciário que tem lado, então meu voto será de Lula

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Equívocos

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Não faz sentido comparar os equívocos cometidos pelos governos militares com os de agora. Os erros do governo militar são comprovados: sequestros, mortes, torturas, perseguições, falta de liberdade, mordaças, maquiagens econômicas, endividamento externo e interno, etc. Também não faz sentido achar que a liberdade oferecida por este governo às instituições que combatem a corrupção foram “concessões pela governabilidade”. Não se trata disso: é um projeto claro de cortar a pele a abrir o abscesso da corrupção.

Contra o governo de Lula e Dilma, por enquanto apenas apareceram boatos (no que diz respeito à corrupção). Os erros na questão econômica poderão ser julgados no futuro, quando forem avaliados dentro dos contextos a que pertenceram. O que Dilma fez não foi algo “ao apagar das luzes do seu governo“. NÃO: foi um política clara desde o primeiro dia do seu primeiro mandato de oferecer garantias à Policia Federal e ao Ministério Público para investigarem tudo e a todos. NÃO FOI uma atitude desesperada, e nem uma “saída honrosa”; foi uma atitude do governo de curar a ferida da corrupção acabando com seu principal agente: a IMPUNIDADE. Por esta razão até mesmo José Dirceu foi condenado de forma irregular e SEM PROVAS, num escândalo jurídico (e que ainda não acabou, posto que irá para as cortes superiores da OEA). Mesmo cortando na própria carne este governo GARANTIU a continuidade do projeto de combate incessante à corrupção, e por esta razão, apesar das mentiras e das falsidades de inimigos ideológicos, é o governo mais HONESTO que tivemos neste país.

Que ainda há muito a fazer, não resta dúvida. Mas olhe bem para os partidos que são acusados de corrupção: o PT é o NONO (9º colocado). Tudo isso nos deixa claro que existe uma manipulação extensiva para culpabilizar o PT naquilo que ele faz de BOM, como o combate à corrupção. As críticas falsas, daninhas, sem provas, sem embasamento são usadas pelos mesmos grupos poderosos que agem desde 1954 para que as reformas (como o combate à corrupção hoje, ou a reforma agrária em 64) sejam interrompidas em nome da “moralidade”, ou para punir os “ladrões”.

O que me dói é ver gente pobre ou da classe média trabalhadora servir de massa de manobra para estes mesmos grupos que há séculos comandam os fios invisíveis de onde pendem nossos corpos. Não se trata de obstruir a crítica SEVERA aos erros MÚLTIPLOS que este governo cometeu e ainda vai cometer, mas de perceber que as críticas à HONRA só proliferam quando existe algo mais do que elementos de macroeconomia e políticas estruturais a combater. Nesse caso, o interesse é barrar as investigações, impedir que se chegue ao Cunha, ao Aécio, ao Nardes, à RBS, à cúpula do PP, ao PMDB (o mais corrupto de todos). É essa a luta para derrubar Dilma, que acaba sendo orquestrada pelos tolos da vez, pessoas que acham que atacando o bisturi poderão melhorar o abscesso.

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