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Mudanças

Fiquei sabendo da entrevista de um economista brasileiro que, num determinado momento de sua vida, abandonou as teses neoliberais que sempre o guiaram e passou a enxergar a sociedade por uma perspectiva mais humanista, valorizando as relações pessoais, a simplicidade e a necessidade de um mundo mais justo e equilibrado. Movido pela curiosidade, fui assistir.

O título era chamativo: Me arrependi, e o entrevistado era o economista José Kobori. Na entrevista, ele conta como passou de um profissional conectado ao catecismo financeiro tradicional para se tornar um crítico do modelo econômico surgido após a era Reagan. Minha curiosidade era pelo caminho que ele teria percorrido para alcançar o extremo oposto de seu antigo pensamento. Que tipo de leitura o convenceu? Teria conhecido Marx, quiçá foi tocado pela leitura de Lenin, Trotsky ou algum socialista contemporâneo, como Harvey?

A resposta não me surpreendeu, pois que eu já intuía que tais mudanças raramente ocorrem mediante epifanias de ordem intelectiva. Quando Nia Georges e Robbie Davis-Floyd estiveram pesquisando profissionais da humanização do nascimento no Brasil, para saber as razões de sua mudança paradigmática na direção de um modelo contra-hegemônico e humanista, as respostas oferecidas por inúmeros profissionais deixaram as suas motivações expostas: todos haviam passado por dramas pessoais, afetivos, emocionais, que os fizeram enxergar a realidade de forma distinta daquela que tinham até então. Não foi a leitura de um livro, ou uma aula na faculdade; foram fatos, quedas, solavancos emocionais, muitos deles doloridos e até vexatórios, que os levaram à mudança.

José Kobori, o economista até então liberal, foi preso na onda de justiçamentos da Lava Jato. Pela descrição que li do seu caso, tratou-se de uma prisão abusiva, absurda, autoritária, sem provas e baseada em vingança. Ele sofreu várias ameaças de morte e foi perseguido por organizações criminosas envolvidas em propinas com governos estaduais. Entretanto, naquela época ninguém ousava questionar os métodos medievais e abusivos da República de Curitiba, tanto a imprensa – apaixonada por figuras nefastas como Moro & Dalanhol – quanto as instâncias superiores do judiciário. Ele foi mais uma vítima dos linchamentos judiciais que mancharam a lisura da justiça brasileira.

E foi esse drama pessoal, e os quase três meses em que esteve injustamente preso, que o fizeram rever seus valores. Quando foi finalmente solto, havia perdido tudo que havia conquistado em termos materiais e foi obrigado a começar do zero. Como tinha experiência como professor, começou a dar aulas pela internet, desta vez mostrando os equívocos do modelo neoliberal. Todavia, foi sua experiência na prisão que abriu as portas para uma visão mais abrangente da sociedade. Lá encontrou assassinos e criminosos comuns, conheceu os sistemas de poder da prisão e teve de se adaptar a essa nova realidade. Entretanto, o que mais lhe chamou a atenção foi que na prisão havia pessoas, como quaisquer um de nós. Boas pessoas, pessoas ruins, egoístas, fraternas, inteligentes e limitadas, culpadas e inocentes; todo o tipo de ser humano, exatamente como havia conhecido fora de lá. Foi então que começou a questionar a justiça social, a fraternidade, a equidade e até a meritocracia, um mito por tanto tempo acalentado que agora desmoronava diante dos seus olhos. Depois dessa vivência traumática, sua vida se transformou.

A mesma experiência teve Miko Peled, filho de um general israelense que foi herói na guerra de 1967. Já entrando na idade madura, teve a oportunidade de debater a questão da Palestina com amigos palestinos que encontrou fora de Israel, o que lhe permitiu abrir os olhos e enxergar o mundo sem a viseira do sionismo. Foi do sofrimento originado da confrontação de suas antigas crenças com as aspirações de liberdade do povo palestino que conseguiu enxergar uma realidade alternativa. Foi sentindo em si a dor da ocupação, recebida pela voz embargada de seus amigos palestinos que descreviam os horrores do apartheid, que a mudança se tornou possível. A partir desse encontro, ele transformou sua vida e assumiu como missão pessoal a luta pela Palestina Livre e pelo fim do regime sionista.

Nesses exemplos fica evidente a veracidade de um antigo axioma: “Não há como mudar racionalmente uma crença surgida da irracionalidade”. A única maneira de mudar posturas recalcitrantes é por meio da abordagem emocional, afetiva e pessoal. Mais do que entender o problema, é preciso senti-lo, e só assim será possível conhecer uma verdade superior. Essas experiências, muitas vezes difíceis e dolorosas, como a prisão no caso de Kobori, ou a morte de uma sobrinha num ato de terrorismo, no caso de Miko, são preciosas por serem fantásticas alavancas de transformação pessoal, desde que possam ser absorvidas de forma construtiva e criativa. O mesmo se pode dizer dos abusos da Lava Jato. A dor que o país ainda experimenta pelos desmandos jurídicos deveria servir como uma lição cívica para que nunca mais se repitam. Esperamos que assim seja.

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Imprensa

“Jornalismo é publicar algo que alguém não quer que se publique; o resto é publicidade”.

A frase acima foi erroneamente atribuída a Orwell e até Hearst, mas é mais antiga que ambos. Ela encerra uma grande verdade: o jornalismo serve para expor as entranhas do mundo, mostrar o que não querem que seja mostrado, trazer a luz o que está escondido. Serve para criar desconforto, trazendo à nossa frente o espelho do mundo para que possamos nos angustiar com a imagem refletida. Só a dor de ver nosso reflexo pavoroso pode nos mobilizar em direção à necessária transformação. Já a outra frase, criada pelo jornalista Joseph Pulitzer, que dá nome ao maior prêmio de jornalismo dos Estados Unidos, nos anunciava que o poder de manipular as massas através do controle da informação poderia tornar o cidadão comum em um mísero joguete na mão dos poderosos.

Israel lançou neste domingo (26/maio/2024) mais um ataque violento a Rafah causando a morte de pelo menos 45 pessoas – crianças e mulheres em sua maioria – instantaneamente incineradas; foram queimados vivos pelos chacais de Israel. Ao invés de “câmaras de gás” agora as vítimas do fascismo são torradas a céu aberto. Nenhuma palavra foi escrita sobre sobre esse ataque monstruoso nos jornais do “mainstream”. A grande imprensa, controlada pelo sionismo, silencia diante da barbárie racista e imperialista, e isso deixa claro que as grandes instituições de imprensa não retratam os fatos, mas se ocupam na montagem de uma “narrativa”. O jornalismo imperialista produz uma ficção criada sobre a visão ocidental, imperialista, opressiva, a qual controla a mente de grandes parcelas da população através dos seus inúmeros meios de comunicação.

Isso nos ensina como as gerações do passado foram manipuladas para fazer do nazismo uma proposta sedutora e de Adolf um grande líder. Por isso ele mereceu ser capa da Revista Time, exaltado por multidões, admirado até pela coroa inglesa e imitado até hoje. Essa avalanche de propaganda e lavagem cerebral também mostra como pudemos aceitar Collor, Temer, Deltan, Sérgio Moro e até Bolsonaro como figuras públicas de sucesso – até que seus malfeitos se tornaram deletérios para o próprio sistema.

A imprensa, como nós a concebemos ainda hoje, é uma máquina de conformismo, uma das mais eficientes ferramentas de manipulação da realidade. Seus donos sequer se importam com os balanços negativos do seu negócio, pois que estas instituições funcionam como fantásticas peças de pressão política, escondendo o que não convém mostrar (como o holocausto palestino), criticando banalidades dos inimigos (como o casaco vermelho do Ministro Pimenta) e tratando toda e qualquer nação como “ditadura” ou grupos como “terroristas”, bastando para isso que este país se rebele contra os desmandos do império ou que se organize para combatê-lo.

A democratização imposta pela Internet ameaçou a hegemonia e o monopólio de informação imperialistas. Não fosse pelas redes sociais jamais saberíamos dos crimes contra a humanidade cometidos agora por sionistas na Palestina. Mesmo a Al Jazeera seria boicotada nas redes de TV do Brasil e do mundo, como já ocorreu no passado e como acontece ainda hoje com as redes russas. Teríamos a mesma cobertura hoje que o Nakba teve em 1948: uma rede infinita de mentiras, falsos heróis, apagamento dos massacres, exaltação dos terroristas sionistas e o tratamento acusatório contra as próprias vítimas da limpeza étnica. O fato de ser possível hoje – pelo menos – contrapor-se às fraudes sionistas é um sopro de esperança para quem sonha com a disseminação plural e irrestrita da verdade, mesmo que ela possa, de alguma forma, nos desagradar.

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Teias

No século XV, um padre no norte de Portugal chamado Francisco da Costa, teve 299 filhos de 53 mulheres diferentes, entre elas várias parentes diretas. Por causa dessa vida pecaminosa e recheada de escândalos, ele foi condenado pela igreja de forma exemplar. Sua sentença foi “Francisco da Costa será degredado de suas ordens e arrastado pelas ruas públicas nos rabos dos cavalos, esquartejado o seu corpo e postos os quartos, cabeça e mãos em diferentes distritos, pelo crime que foi arguido e que ele mesmo não contrariou”.

Entretanto, não foi tão ruim o final de vida do padre devasso. “El-Rei D. João II lhe perdoou a morte e o mandou pôr em liberdade aos 17 dias do mês de março de 1487 com o fundamento de ajudar a povoar aquela região da Beira Alta, tão despovoada ao tempo”. Ou seja, os mesmos atos de devassidão poderiam ser vistos como criminosos, indecentes, brutais e inconsequentes, ou como acões positivas para um bem maior, ou seja, o povoamento da região desértica daquela parte do reino de Portugal.

É dito que Napoleão Bonaparte falava que “são tantas as leis que qualquer cidadão corre o risco de ser guilhotinado”. Ou seja, dependendo da interpretação de um magistrado, sua cabeça poderia não valer nada, bastando para isso variar o humor com o qual ele lhe julgaria. Se ele tivesse acordado com constipação pela manhã, sua cabeça poderia estar numa cesta, à noite. Uma ação comezinha e banal poderia ser interpretada como grave, bastando para isso os interesses envolvidos.

Balzac dizia que a lei é uma “teia de aranhas curiosa, que deixa passar os grandes insetos e aprisiona os pequenos”. A sentenças que inocentam figuras nefastas da política brasileira servem para mostrar que a boa vontade dos que julgam é muito mais importante e determinante do que os fatos concretos e a própria lei. Para quem é um inseto minúsculo – o cidadão comum – é forçoso aceitar que uma justiça dos poderosos jamais vai produzir equidade. A devassidão e a imoralidade das práticas de um juiz corrompido pela vaidade e pelo poder não receberam – e não acredito que venham a receber algum dia – qualquer punição ou mesmo reprimenda. Para estes insetos gordos, as teias da lei são frágeis e inoperantes.

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Geni

Sim, é verdade que encontraram a minuta do golpe no gabinete de Bolsonaro, com as explicações para a tomada violenta do poder por parte da direita raivosa e ligada aos interesses imperialistas. Isso parece ser suficientemente grave para reconhecer que Bolsonaro tinha interesse em golpear a frágil democracia brasileira ao lado de seus comparsas da caserna. E não apenas isso: as provas materiais contra Bolsonaro se avolumam, não deixando qualquer dúvida de que ele planejava se manter no poder por meios obscuros e até violentos. Entretanto, não resta dúvida que as redes de comunicação do Brasil – Globo, Record, SBT e Band – também já tinham preparados, nas gavetas de seus executivos, os seus editoriais para divulgar em rede nacional no dia posterior ao golpe. Neles veríamos as explicações para a adesão ao ataque contra a democracia e, mais uma vez, a justificativa seria a “defesa da democracia” contra os interesses “comunistas”, para combater a “ditadura do judiciário” e o “mar de lama” da corrupção do PT. Seriam implacáveis com o Partido dos Trabalhadores e a esquerda, colocariam Lula e Alexandre de Morais na prisão e criariam do ar um apartamento, um barquinho de lata ou uma ligação com o PCC para jogar o povo contra seu líder.

Portanto, o combate ao bolsonarismo, como se ele fosse a origem do mal e o grande risco à democracia, é de uma ingenuidade inaceitável. Antes mesmo de Bolsonaro, o STF deu mostras de ser um órgão corrompido e politicamente orientado, legislando (sim, criando leis em estilo livre) sempre que os seus interesses foram ameaçados. Foi assim no golpe de 64, no mensalão, no golpe contra Dilma e na prisão criminosa de Lula, bastando lembrar o voto de Rosa Weber pela prisão do ex-presidente, uma das maiores vergonhas do judiciário brasileiro de todos os tempos, que rivaliza com a frase da mesma ministra no seu voto no julgamento do Mensalão: “Não tenho prova cabal contra Dirceu – mas vou condená-lo porque a literatura jurídica me permite”.

Já Bolsonaro não passa de um idiota útil para a direita. Não existe nenhum intelectual conservador ou liberal que tenha respeito pelas suas capacidades de liderança ou pelas suas inexistentes qualidades morais ou intelectuais. Bolsonaro é a Geni da direita: desprezado, mal visto, desconsiderado, mas ao mesmo tempo popular e sedutor para uma parcela considerável da população, aquela que cai facilmente no discurso de força e de autoridade que viceja nas democracias liberais decadentes – vide França, Itália, Inglaterra, Polônia, Hungria. Isso atrai as massas deserdadas pelo capitalismo que adoram um ditador “mão forte”, vingativo, que represente o poder fálico do qual se ressentem, basta lembrar de Adolf e Benito. Mas bem o sabemos que Geni, da obra de Chico Buarque, não tinha poderes, apesar de ter sido incensada pelos poderosos e tratada como rainha quando foi necessária ao sistema. Na verdade ela era apenas o marionete de decote avantajado, manipulada pelos poderosos que estavam por trás de suas ações, os burgueses da cidade.

A cidade em romaria
Foi beijar a sua mão
O prefeito de joelhos
O bispo de olhos vermelhos
E o banqueiro com um milhão
Vai com ele, vai Geni…

Portanto, à esquerda não cabe a tarefa de se postar como mero contraponto ao bolsonarismo. Quando este personagem for finalmente soterrado, outro pateta útil será colocado em seu lugar, e aqueles que outrora o aplaudiam, que o exaltavam e se acercavam dele, vão tratá-lo como um lixo, uma excrescência, algo a ser esquecido e até amaldiçoado.

Mas logo raiou o dia
E a cidade em cantoria
Não deixou ela dormir
Joga pedra na Geni
Joga bosta na Geni

Já tivemos Joaquim Barbosa, Dalanhol e Moro ocupando esta posição, os quais, sejamos francos, seriam muito mais danosos ao povo brasileiro do que o ex-militar bunda suja. Eles têm a mesma vinculação com o imperialismo e com a burguesia brasileira, mas não possuem o carisma dos ídolos da direita como Orbán, Netanyahu, Trump, Bukelele, e o próprio Bolsonaro. E ao lado destes ícones do neofascismo sempre esteve a imprensa corporativa, do Brasil e do mundo, sem exceção, apoiando ações golpistas em nome de seus interesses. Aqui na aldeia ela esteve ao lado de Bolsonaro, pelo menos enquanto a tragédia do seu governo ainda podia ser sustentada. Como esquecer a “escolha difícil” do Estadão?

A solução para o Brasil é resistir à tentação de atacar Bolsonaro como se fosse a “origem de todo o mal”, mas educar o povo, mostrando que a solução será pela luta de classes, inobstante o espantalho que seja colocado pela burguesia para manter intocados seus poderes.

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Plágio

A presidente de Harvard Claudine Gay foi acusada de “plágio” em sua produção científica, sendo levada a renunciar sua posição na instituição. Primeira mulher negra a assumir a presidência da Universidade mais prestigiosa do mundo, sua retirada ocorreu logo após ter abraçado a defesa da Palestina contra os ataques genocidas de Israel na Faixa de Gaza. É claro que o fato de ser uma mulher negra e apoiar a Palestina não influenciou na investigação que foi feita contra ela. Imagina…

Por outro lado, se você quiser ferrar com alguém do mundo acadêmico, basta investigar sua produção científica. Eu garanto: é impossível não que não encontrem arestas deste tipo na história e na produção pessoal de qualquer um. Acusações de plágio são muito comuns no meio acadêmico, e são coisas fáceis de usar contra desafetos. Nós vimos este tipo de ataque sendo feito há alguns anos aqui mesmo no Brasil em relação ao ex-juiz Moro e sua tese de doutoramento, e até mesmo com o Alexandre de Moraes. Isso porque, se você analisar trabalhos acadêmicos (teses e dissertações) com uma lupa, analisando todos os detalhes e as “letras miúdas” em meio a centenas ou milhares de páginas, poderá encontrar uma falha – intencional ou não – sobre a citação adequada de um autor ou a falta dela nos créditos. Mesmo aqui no Facebook, quem pode garantir que nunca escreveu algo que já havia sido escrito, quase da mesma forma, por outra pessoa?

Assim, com este tipo de acusação sendo utilizada ao sabor dos ventos, qualquer um pode ser vítima de vinganças e ataques violentos. Esses trabalhos são o calcanhar de Aquiles de muita gente no mundo universitário. Como dizia Napoleão Bonaparte, “São tantas as leis que nenhum cidadão está livre de ser enforcado”. Ou seja, são tantas as fissuras inevitáveis na criação do pensamento e da escrita que ninguém pode estar seguro de que não será atacado por alguma falha, dependendo dos interesses que existam para destruir a carreira de um pensador inconveniente. O plágio de Claudine Gay muito provavelmente é o apartamento triplex de Lula no Guarujá; da mesma forma, é possível que em alguns anos ela seja inocentada, mas aí o estrago já terá sido feito.

Moro e Alexandre jamais tiveram suas carreiras prejudicadas pelas acusações que surgiram contra seus trabalhos acadêmicos, exatamente porque serviam – com louvor – ao sistema. Por um minuto apenas, pensem como seria tratado um petista com estas mesmas acusações. Já a presidente de Harvard foi defenestrada porque passou a ser vista como alguém que atrapalhava a tirania sionista da sociedade americana. O que causa escândalo (mas não surpresa) é ver que o mito da “liberdade de expressão” tão celebrada pelos americanos e seus admiradores, está ruindo aos olhos de todos, mostrando que a democracia liberal americana é uma farsa sustentada apenas por propaganda e força bruta. Ou seja: qualquer um que ouse chamar os Estados Unidos de uma democracia onde imperam a liberdade de expressão e o estado democrático de direito está condenado ao ridículo e à humilhação pública.

A direita e a “esquerda” americanas agora se debatem sobre o fato e trocam acusações sobre as “reais razões” para a demissão de Claudine Gay. De um lado os conservadores celebram sua demissão por ser uma mulher representativa da “teoria racial crítica” e, do outro, os identitários acusam a manobra como sendo racista, já que Claudine foi a primeira mulher negra a presidir a mais rica universidade americana. Por trás desse debate, os sionistas – que estão presentes tanto entre os liberais quanto entre os trumpistas – estão dando gargalhadas e comemorando o combate, porque esta é uma vitória do poder econômico para silenciar qualquer crítica ao estado terrorista de Israel.

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Velhos

Muitos dos meus conterrâneos e contemporâneos, nascidos – ou que viveram a infância – durante a ditadura militar brutal que nos acometeu, se tornaram reacionários patéticos e subservientes ao imperialismo. Uma boa parte ainda exalta o autoritarismo da direita e os golpes contra a democracia que ocorreram em um passado não muito distante. Alguns deles hoje são auto exilados no exterior, e justificam o abandono do Brasil dizendo que viver fora do país sempre foi “o sonho dourado da sua juventude”.

Em verdade, esta fuga ocorreu porque não suportam o cheiro da brasilidade e o jeito do nosso povo. Doentes de xenofilia, amam tudo que não é Brasil, veneram a cultura branca europeia e amam sua história repleta de violência colonizadora. Mais ainda, desprezam tudo o que representa nosso povo e nossa cultura e odeiam tudo que é nosso: a música, as peles escuras, o samba, as artes, os livros. Afinal, para tudo isso existe uma versão melhor, mais limpa, mais sofisticada e mais nobre na América do Norte ou no velho mundo.

Tamanho é o nojo que sentem do que aqui deixaram que a eles mais vale serem cidadãos de segunda classe no exterior do que se olhar no espelho e enxergar um brasileiro na terra em que nasceram. Distantes daqui, aplaudem a Lava Jato e debocham do pleito justo da Venezuela sobre seu território histórico. Por certo fariam o mesmo para proteger as “Falklands” das reivindicações abusivas dos argentinos sobre a soberania das ilhas já que, como nós, estes não passam de sul-americanos grotescos e ignorantes.

Exaltam figuras execráveis como Bolsonaro, Moro e Dalanhol, três notórios meliantes despudorados, que por pouco não destruíram por completo a soberania deste país, vendendo nossa dignidade e nossas riquezas à sanha colonialista dos emissários do Império. Tratam Lula com epítetos maldosos, injustos e covardes, insistindo em fake news há muito derrubadas, mas vomitando a cada frase o preconceito de classe que jamais lhes permitiu aceitar um nordestino oriundo da classe operária como supremo mandatário do seu país. “Burro”, “nove dedos”, “cachaceiro” é como expressam seu despeito, revelando que as justificativas para odiar o presidente descrevem muito mais a si mesmos do que ao próprio Lula.

Minha geração é composta por velhacos ranzinzas, ressentidos, egoístas e conservadores. Falsos puritanos, defensores das ditaduras, apoiadores de Israel, violentos e antidemocráticos. Os anos de chumbo não marcaram em suas almas qualquer lição duradoura de valor, e sequer a velhice os ensinou a esconder seus preconceitos mais infames. Por fim, não me venham dizer que “no meu tempo é que era bom“, pois se a minha época juvenil produziu tantos velhos de camisa da CBF e tantas senhoras de laquê com palavras de ordem racistas ela não pode ter sido boa.

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E aí, espíritas?

Prefiro não exagerar nos adjetivos, mas creio que os espíritas do Brasil deveriam se preocupar com as diretrizes políticas que o movimento tem tomado, em especial após as declarações de alguns de seus expoentes. Acho difícil encontrar uma palavra branda para definir médiuns que, usando de sua influência no universo espírita, promoveram delinquentes como Moro, chamando-o de “Espírito de luz”. Essa afirmação, vindo de onde veio, nos coloca diante de um claro dilema: uma possibilidade seria que o referido médium emitiu sua opinião política pessoal a um público espírita para emprestar seu prestígio a um grupo criminoso de juízes e promotores da Lava Jato, o que por si só seria uma usurpação de suas funções como divulgador do espiritismo e um erro histórico. Lembrem que Deltan e Moro, os líderes dessa facção, estão sendo processados pelos crimes cometidos.

A segunda possibilidade é de que sua manifestação foi inspirada pelos espíritos “de luz” que o acompanham, mas isso coloca a clarividência desse grupo de “espíritos assessores” em cheque. Agora que sabemos todas as ligações da turma da Lava Jato com interesses imperialistas – o DOJ e a própria CIA – é provável então que estes “conselheiros” sejam apenas palpiteiros do plano espiritual, imbuídos do mesmo caráter reacionário, punitivista e individualista de tantos iguais a eles que habitam o plano terreno. Ou seja: para que serviriam as mensagens mediúnicas se os espíritos que as manifestam têm os mesmos vícios e a mesma carência de consciência de classe que os encarnados? Qual a sua utilidade se sucumbem ao mesmo punitivismo que desreconhece a dinâmica social na gênese da iniquidade e da injustiça?

Assim sendo, prefiro ficar com as manifestações das personalidades vivas, pois que estas, no mínimo, são obrigadas a suportar o contraditório, podem ser pressionadas a comprovar suas teses e mostrar suas fontes. Mais ainda, deveríamos derrubar essa aura falsa de infalibilidade que surge quando a opinião vem de “espíritos superiores”, o que nos faria testemunhar a debacle de suas teses quando as evidências despontam no horizonte. Onde estão os espíritos que exaltavam a “coragem” do “conje” e sua postura magnânima e viril na luta pela justiça? Provavelmente estão encolhidos com vergonha de se manifestar.

É curioso como os espíritas de direita criticam o apoio da esquerda à Cuba e a ligação com nosso maior parceiro comercial, a China, mas nada falam das visitas dos governos anteriores às ditaduras declaradas da Arábia Saudita ou de Israel, que comanda um sistema racista de Apartheid na Palestina. Onde está o “fora da caridade não há salvação” quando dão suporte a países racistas? Afinal… os espíritas também vão embarcar nesse apoio à Israel? Vamos fechar os olhos para os massacres que se iniciaram há 75 anos? Vamos nos associar na sustentação desses crimes através do “sionismo evangélico”?

O movimento espírita, que deveria estar à frente das manifestações pela paz, deveria se manifestar em nome das crianças palestinas que estão morrendo em nome da ganância imperialista.

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Suprema corte

Tenho, há muitos anos, uma curiosidade: ao mesmo tempo em que Gilmar Mendes questiona a formação do juiz que fala “conje“, e desconfia do concurso público que o admitiu na magistratura, lembramos que este mesmo juiz, ainda muito jovem, foi convidado a ser assessor da ministra Rosa Weber no STF. Esta ministra foi a mesma que protagonizou o monstrengo jurídico do “não tenho provas, mas a literatura me permite”, um contorcionismo usado uma única vez e apenas para condenar um político que era o “Ficha 1” para suceder Lula na presidência do país. Por que um sujeito nitidamente desqualificado atingiu postos tão altos em tão pouco tempo? Quem está por trás desse personagem?

Mas minha pergunta não deve fazer pensar que tenho simpatias pela Suprema Corte. Até um relógio parado acerta duas vezes por dia. Por isso não aceito a moda atual da esquerda gratiluz identitária que se expressa pela exaltação de ministros da Suprema Corte. “Te amo STF”, dizem eles para qualquer atitude violenta do Xandão. Só pode ser piada. Até o Dudu Bananinha alertou: “As esquerdas ainda não notaram que é da esquerda que virão as próximas vítimas?”.

Então o autoritarismo do STF agora pode ser aplaudido porque a decisão aparentemente está em sintonia com nossos sentimentos de vingança? Esquecemos o silêncio do STF para o impeachment ilegal de Dilma? Vamos passar pano para as ilegalidades inconstitucionais cometidas nos julgamentos de Lula, que só não destruíram o Brasil pela sorte de termos uma VazaJato? Por acaso seria justo ter um “Serjomoro Vermelho” para nos vingar, burlando as regras do judiciário para nos beneficiar? Ou será que ainda acreditamos na ideia de que a justiça burguesa poderá nos salvar?

Será que não percebem que a mão que (agora) afaga é a mesma que (logo em breve) apedreja?

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O Arrependimento de Palocci

Eu estava em um restaurante com a TV ligada na Globo durante o Jornal Nacional quando aquele bunda mole do Bonner anunciou que o juiz Moro havia liberado a delação de Palocci, exatamente uma semana antes das eleições. O mesmo Moro que suspendeu uma audiência de Lula antes do pleito para evitar “interferência eleitoral”. Sim a mesma delação que havia sido rejeitada pelos procuradores por não conter nenhuma informação importante e respaldada por provas materiais. Muitos bolsonaristas comemoraram esta delação, achando que ela seria a “pá de cal” na vida pública de Lula.

Na época eu – e muitos da esquerda – desconfiamos de imediato. Por que Palocci? Por que agora? Parecia uma jogada eleitoreira de um juiz corrupto e imoral, com o interesse de mudar os rumos de uma eleição que mostrava a (tímida, mas consistente) reação de Haddad na luta contra Bolsonaro, mas o clima já era muito desfavorável. O povo estava contaminado pelo discurso punitivista, “Lula ladrão”, cano de esgoto na Globo, mentiras infundadas, fake news, disparos de WhatsApp, Cambridge Analytica, depoimentos fajutos, acusações infundadas, o powerpoint criminoso de Dalanhol, e as ações abusivas e fascistas da Lava Jato. A população, movida por intensa propaganda e financiamento externo, estava apoiando um nazista como Bolsonaro da mesma forma como as massas no passado gritaram Barrabás ou H*tler. Erguer-se contra essa flagrante desrespeito às leis era pregar no deserto. Parece que as linhas da história já estavam escritas, e era necessário que Lula subisse ao Calvário para poder ressurgir depois, nos braços do povo. Bolsonaro – e o desastre de sua administração – pareciam ser inevitáveis para que o país tivesse a maturidade para entender a tragédia que se anunciava através de suas palavras.

Palocci foi constrangido, torturado, ameaçado pelos procuradores corruptos e pelo juiz que chefiava a quadrilha. Agora, passados mais de 4 anos, ele deseja rever sua posição, afirmando que sua delação foi forçada. Sabemos agora o quanto isso foi prejudicial ao país, mas ainda é preciso que os responsáveis sejam punidos, sob pena de sermos condenados a repetir os erros que tanto mal fizeram ao Brasil. É importante que Palocci diga a verdade, pois esta é a última chance de limpar sua biografia, inexoravelmente manchada por sua covardia.

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Heróis do Futebol

Ronaldinho Gaúcho, Neymar Jr e Ronaldo Fenômeno

Os heróis culturais do esporte mais popular do planeta, expoentes em seus campos de atuação, são a consequência do sistema que controla o mundo e também esse espetáculo. Desta forma, Neymar jamais teria esse comportamento e essa fortuna se não fosse nutrido por esse maquinaria econômica. Apesar de reconhecer sua importância é forçoso entender que o mundo cria estes heróis com a mesma voracidade que os expurga. E não só no futebol, mas em qualquer área do entretenimento, da vida social e da política. Citando apenas a aldeia, onde estão agora os heróis do golpe midiático antipetista como Moro, Alexandre Cunha, Joaquim Barbosa senão em um merecido ostracismo, após terem sido alçados à condição de personalidades inatacáveis da cultura? Inúteis figuras, agora estão curtindo seus milhões, esquecidos e apagados.

Voltando ao futebol, Neymares, Cristianos, Ronaldos e tantos outros são o resultado da nossa neurose, o produto de uma complexa engenharia de mídia e poder econômico, trabalho de elaborada manipulação dos corações e mentes do mundo inteiro, controlada por gigantescos interesses econômicos e geopolíticos.

Por certo que os jogadores alimentam a cultura do “futebol moderno” – individualista, hipercapitalista, elitista – de forma dialética, mas não são seus causadores, sendo apenas o reflexo de uma estrutura social construída para valorizá-los. Criticar os ídolos é como criticar o policial que usa de sua autoridade delegada para bater em trabalhadores e professores quando, em verdade, eles são apenas os instrumentos de uma política estatal de punição das classes sociais exploradas e oprimidas. Olhar para personalidades fulanizando suas ações é perder deliberadamente a compreensão do todo e deixar de lado a ultraestrutura que os governa.

A figura do policial, do Neymar, da Anitta ou do Bolsonaro, apesar se serem importantes nessa equação, são descartáveis. Ronaldinhos e Pelés se aposentaram e foram trocados por outros, assim como músicos e políticos o são. A estrutura subjacente utiliza esses personagens para que se mantenha como fonte de lucros e poder para a elite invisível que a controla.

Atacar os heróis populares é atacar apenas a pequena parcela visível do iceberg, sem colocar a devida importância no gelo que se esconde abaixo da superfície e que, em verdade, é quem produz a pequena fração que se expõe para fora da água. Neymar é um excelente exemplo de um sujeito inserido nesse contexto, pois seu personagem foi manufaturado pela indústria bilionária do futebol. Os jogadores são proletários – apesar de uma diminuta franja ser muito bem paga – dessa gigantesca fábrica,e não são os responsáveis pela sua criação; apenas colaboram em sua mitologia e na manutenção desse empreendimento.

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