Arquivo do mês: junho 2018

Bolhas

Então ela me pergunta, mantendo uma ruga questionadora na testa: “Mas por que isso? Qual o sentido das bolhas, da dor, das noites mal dormidas, das tendinites, do frio e da chuva? Em nome de quê?

Parei por alguns instantes e lhe perguntei: “Você tem filhos?” e ela me respondeu “Sim, dois. Partos normais”, e sorriu com orgulho.

Olhei em seus olhos e repeti sua própria pergunta: “Em nome de quê?”

Sim…. O que te leva a caminhar por 800 km no frio e na chuva é diferente do que te leva a ter filhos, mas ambos compartilham algo em comum: são ações que agridem seu conforto pessoal e te obrigam a encarar uma dimensão pouco conhecida: a transcendência.

Só a possibilidade de transcender os sentidos comuns na vida nos permite aceitar tais desafios. É mais fácil terminar a vida sem jamais perder o sono por um filho que chora ou que ainda não chegou da festa, assim como passar seus períodos de férias em uma praia ou numa viagem cultural por um país desconhecido. Somente a sensação incômoda de que há algo dentro de si mesmo que pode ser descoberto é que te impele a tomar atitudes que parecem estranhas e desafiantes.

Para uma sociedade que perde a noção de sagrado e transcendente, que sequer consegue nominar o que está além de sua compreensão, tudo parece ter preço.

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Emoção no Caminho

Em Carrion de los Condes fica o albergue de Santa Maria, controlado por freiras que se vestem com hábitos tradicionais, parecidos com a roupa de Sally Fields em “A Noviça Voadora” (The Flying Nun). Quando chegamos era possível sentir no ar como doçura e a simpatia destas senhoras é contagiante. Estávamos – obviamente – cansados e doloridos pela caminhada do dia e fomos recebidos com o mais caloroso dos sorrisos. Nos informaram as camas que ficaríamos, explicaram as regras gerais (horários, banhos, roupa por lavar, luzes, etc) e nos avisaram que as 17h haveria um “momento musical” ao qual estávamos convidados a participar.

Encontramos nossos amigos no Jardim dos fundos e ficamos por umas duas horas conversando com Alessandro, da Itália e Brian da Irlanda, contando as curiosidades e peculiaridades de nossos países.

Quando se aproximou das 17h Bebel e Juliana começaram a preparar nosso jantar. Depois de vários dias no “lanchinho” decidimos comer comida de verdade. Arroz, molho, vinho, queijo, legumes. Enquanto elas se ocupavam na cozinha resolvi entrar na sala onde haveria a apresentação.

Quando entrei já havia se iniciado e pude voltar no tempo ao ver as freirinhas tocando violão e cantando com a voz afinadinha canções adaptadas e hinos religiosos. A cena tocou fundo na minha memória mais infantil, quando isso acontecia nas igrejas da minha cidade.

Terminadas as canções ofereceram o violão a um grupo de brasileiros que recém haviam chegado. Estes não se fizeram de rogados e cantaram “Meu Erro” dos Paralamas. Foram muito aplaudidos.

No final fizeram uma bênção a cada um dos peregrinos presentes, fazendo uma imposição de mãos sobre a cabeça e nos deram de regalo uma estrela colorida que simbolizava o coração delas que nos acompanharia por todo o caminho. Eu me debulhei em lágrimas pensando em Zeza, Lucas, meus pais, irmãos, nora e netos e por um instante senti que muito da negatividade que carregava no coração pela dor diante das injustiças saíram naquelas lágrimas.

O Caminho traz surpresas inesperadas. Em verdade estas pérolas de carinho e cuidado nos trazem de volta para o otimismo e a positividade que a vida muitas vezes nos sonega. Às irmãs do Albergue Santa Maria um agradecimento especial pela delicadeza e a amorosidade que acolheram este coração ferido.

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Certezas

“Perigoso é o sujeito que cultua certezas. Mal sabe que por trás de cada uma delas se esconde uma criança encolhida com medo do escuro.”

Guillermo de Montijos, “La Piedra en el Camino”, ed Ortega, pág 135

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Xamãs

Quando planejei meu transcurso pelo Caminho escolhi a dedo meus parceiros de viagem. Além de Bebel e Juliana, minhas lindas parceiras físicas, convidei parceiros virtuais para me acompanharem nas longas marchas solitárias pelas paisagens estonteantes do País Vasco, La Rioja, Navarra, León y Castilla etc. Assim, trouxe comigo Illan Pappé, Max Blumenthal, Chris Hedges, Ruppert Sheldrake, David Harvey, Yanis Varoufakis e outros. Entre tantos personagens também trouxe uma palestra do psicanalista Christian Dunker, a qual me chamou a atenção pela sua definição de “Xamã”.

Nesta palestra Christian Dunker cita Viveiros de Castro, que por sua vez se refere aos estudos do antropólogo Claude Levy-Strauss, para falar dos Xamãs e com isso traçar uma interessante analogia com os psicanalistas. Eu peço licença ao Chistian para, pegando carona em sua análise, tentar entender a dinâmica dos obstetras humanistas através dessa mesma perspectiva.

Dizia ele que os Xamãs são muito mais do que uma profissão, uma arte ou um conjunto de técnicas. Eles se expressam como “função”, na mesma linha das funções maternas e paternas, que não necessariamente são exercidas pelos sujeitos mãe e pai. Xamãs são, basicamente, funções sociais. Também nos afirma que existem basicamente dois tipos de Xamãs: os “horizontais” e os “verticais”.

Os primeiros são os guerreiros; descobrem o “mal” no outro grupo e os atacam para assim reforçar a sua própria identidade. Entre os parteiros, são aqueles que acusam os hospitais, o sistema, os “cesaristas”, os “enganadores”, os “oportunistas”, os “fofinhos”, os “tipo humanizados”, os “Dr Frotinha” e os claramente “pilantras”. Agem mais à sombra, na escuridão, na belicosidade, com o dedo em riste, corroídos pela (justa) indignação. “Esse cesaristas estão acabando com a arte da parteria”

O segundo tipo é o Xamã vertical. Estes, ao invés de atacarem um inimigo externo, cultuam saberes que os definem em sua singularidade. São os parteiros que devoram protocolos e normas, que estudam a fundo a Medicina Baseada em Evidências, que estabelecem para si e seus iguais marcas de excelência (baixas taxas de episiotomia, taxas de cesarianas dignas, utilização de doulas, técnicas humanizadas, etc). São os guardiães de uma especificidade que só pode ser alcançada por aqueles que carregam seus valores e sua prática. “Não, fulano não pode ser humanizado fazendo tanta episiotomia”.

Estes são os Xamãs clássicos, mas Viveiros de Castro propõe um terceiro Xamã que agora se expressa; nem horizontal, nem vertical: o Xamã “transversal”.

Esta nova função vai se manifestar pela superação das demais. Para além dos ataques aos inimigos em busca de uma identidade ou o reforço das peculiaridades de sua arte – com o mesmo fim – o “parteiro transversal” se dedicará a uma interlocução com os demais saberes para construir uma síntese a partir das teses digladiantes. Para ele não será mais necessário atacar inimigos pois lhe parece muito mais importante entendê-los para posteriormente cooptá-los ao novo paradigma. Ao invés de limites rígidos em práticas específicas vai propor uma mente mais aberta e abrangente, muito mais centrada na ATITUDE humanista do profissional do que na expressão crua de alguns procedimentos e técnicas.

A emergência do parteiro transversal é um sinalizador do enriquecimento do modelo e não de uma fragilização dos princípios norteadores, quais sejam: o protagonismo garantido, a visão interdisciplinar e a postura de respeito às evidências científicas. Seu aparecimento no cenário da humanização denúncia a maturidade conquistada pelos seus antecessores e a disseminação do ideário do parto humanizado a outras distâncias.

Sejamos, pois, transversais.

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Falsos brilhantes

Eu não sou brilhante, por certo, e jamais chegarei perto disso. Entretanto, nunca encontrei um professor ou um colega de faculdade que merecesse esse nome. Em minha vida fui cercado de medíocres, alguns bem-intencionados e dedicados.

Mas vejam; não falei em excelentes ou bons; falei em brilhantes. Meu conceito de brilhante é muito diferente do que trabalhar no exterior ou entrar nas melhores universidades. Nem mesmo ser culto ou inventivo. Meu conceito de “brilhante” está bem fora desse espectro. Muitos que nós descrevemos como “gênios”, “especiais” ou “fora de série” são basicamente sujeitos que fizeram o que se espera de um profissional normal usando os inúmeros privilégios que recebeu da vida.

Aliás, o brilhante, via de regra, passa despercebido. Ninguém o reconhece como tal; quando se faz notar é para ser perseguido, porque via de regra está fazendo ou dizendo algo que seus iguais não querem fazer ou ouvir. Ignaz Phillip Semmelweis, Nietzsche, Freud, Darwin e Marx jamais foram agraciados com prêmios e condecorações pelo trabalho inovador que realizaram, o qual produziu profundo impulso na ciência; pelo contrário, foram todos – sem exceção – vítimas do preconceito.

Ignaz Phillip foi expulso de Viena pelo crime de estar certo sobre as mortes puerperais; Marx passou fome enquanto mudava o mundo ao seu redor, Darwin foi excomungado e passou anos trancado em seu quarto (como Galileu e Espinoza); Freud foi renegado e humilhado pelos idiotas da corporação de Viena enquanto Nietzsche era expulso de Heidelberg pelas suas ideias inovadoras.

Todos foram verdadeiramente brilhantes, e a prova disso é o fato de ainda os citarmos, mesmo depois de mais de um século ter se passado desde que aqui chegaram. Todavia, nenhum dos seus contemporâneos a quem muitos chamaram de “geniais” – mesmo sendo medíocres – deixaram seus nomes na história. Ninguém conhece o bispo “genial” que perseguia Darwin, o reitor que expulsou Nietzsche, o médico que cuspiu em Freud, o capitalista que escarnecia de Marx ou o diretor (Dr Klein) que mandou Semmelweis de volta para Budapeste para lá sucumbir à loucura.

E a razão para isso é simples: o verdadeiro gênio passa incólume pelo nosso olhar. Só as falsas luzes brilham para aqueles que, como nós, só enxergam o que lhes seduz. O ser verdadeiramente brilhante só tem seu brilho reconhecido muito depois de nos deixar.

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Olhos emprestados

Olhos emprestados

“Não, acho que estás te fazendo de tonta, te dei meus olhos prá tomares conta, agora conta como hei de partir”.

(Chico Buarque)

A coisa mais mágica – e mais preciosa – que se recebe de um amor é a oportunidade de olhar o mundo pelos seus olhos. Eu sempre fui um menino de classe média baixa. Nunca tive os brinquedos mais caros, nem meu pai – um funcionário de nível médio de uma estatal – comprava carros novos, nem casa na praia, viagens caras, roupas de grife, etc. Era kichute, camiseta Hering e busāo para todos. Coca-Cola litrão no fim de semana.

Aos 17 anos namorava uma menina também da classe operária. Uma jovem garota com 6 irmãos, filha de um bancário e uma dona de casa. Classe média, um pouco mais baixa que a minha. Logo após começarmos a namorar eu entrei para a faculdade de medicina e ela foi cursar enfermagem. A faculdade abre nossos horizontes. O mundo se expande de forma avassaladora. O pequeno universo da família e do bairro se torna da cidade e do mundo (urbe et orbi, dizia o omni-bus que eu tomava). Meus colegas de aula tinham sobrenome de ruas da cidade e de instituições financeiras. Entre eles, os novos herdeiros de feudos médicos tradicionais. Chegavam à escola médica de carro próprio aos 18 anos e alguns se recusavam a comer no bandejão da universidade porque não gostavam do “tempero”. Eu era um alienígena em um ambiente feito para eles, não para mim.

Mas tudo poderia ser diferente. Eu poderia ter deixado minha namorada de escola por Jennifer. Filha de um oftalmologista – que dividia seu tempo entre a clínica na Padre Chagas e a criação de gado em Lavras do Sul – e uma juíza do trabalho, ela era o sonho de consumo de qualquer sujeito que almejasse um “upgrade” na escala social. Linda, loira, coqueta, vaidosa e estudiosa. Herdaria a clínica do pai e desde o início da faculdade seu mundo se resumia a um “olho”, cuja anatomia devorara rapidamente dos livros, com suas câmaras, íris, pálpebras e dutos lacrimais. Um futuro róseo e feliz planava altivo por sobre suas sobrancelhas grossas e morenas. Quis o destino que Jennifer nunca tenha tomado conhecimento da minha existência e que minha namorada de escola tenha me oferecido seus olhos para que eu tomasse conta. Ao invés de ver o mundo através da alta classe, fiquei com os olhos verdes de uma proletária.

Acreditem, para mim isso fez toda a diferença. Minha vida se manteve fiel às suas origens sem que as promessas de um mundo charmoso e sofisticado daquela profissão, crivada de privilégios, me deixasse esquecer de onde vim. Tive a oportunidade especial de olhar o mundo que se abriu à minha frente pelos olhos emprestados de uma enfermeira e isso me proporcionou uma brecha de autocrítica extremamente rara no mundo médico. A ela devo tudo que sei, tudo que aprendi e o pouco que pude ensinar. Se há algo de valioso nas parcerias que fazemos, em especial aquelas cujo amor é o elo essencial, esta é a chance de ver o mundo com os olhos do outro. Agradeço a oportunidade única de ter recebido de uma enfermeira a possibilidade de enxergar os dilemas do nascimento através do seu doce olhar.

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Violência e preconceito

O fato de um representante da corporação médica se comportar de maneira tão deselegante e agressiva em um debate em que se encontrava uma doula é um claro sinalizador do seu desconforto. Por isso que ao dizer que “os médicos não se importam com essas insignificâncias” referindo-se às doulas, estava mentindo. Ele se importa, e MUITO, por isso seu destempero e descontrole. Por isso o ódio e o desprezo. Só há agressão quando o outro lhe afeta e tais atitudes comprovam que as doulas estão incomodando e remexendo nos velhos papéis.

Esse representante dos médicos sabe que a doula, por ser testemunha das múltiplas violências (morais, emocionais e inclusive físicas) a que as gestantes são submetidas, enfraquecem o poder soberano e absoluto exercido sobre seus corpos pelos obstetras. Estes médicos temem que seu poder seja ameaçado por qualquer forma de “intromissão”. É compreensível o pânico do doutor.

O mesmo tipo de deboche, escárnio e acusações descabidas eram usados contra as enfermeiras há 30 anos, exatamente pelas mesmas razões: a presença de um personagem alheio ao meio médico capaz de denunciar os engodos, as violências e inclusive as artimanhas para induzir cesarianas. O tempo provou a validade e a qualidade superior do trabalho das parteiras profissionais, e ele também fará com que as doulas sejam lentamente incorporadas pelo sistema. Médicos terão que se adaptar a estes novos atores porque sua presença é comprovadamente (Cochrane, OMS, etc) um fator de qualidade na atenção ao parto.

PS: não se espantem com a grosseria e a violência. Elas surgem do desespero e da falta de argumentos. Quando se está com a razão a serenidade aparece naturalmente; sem ela o desespero toma conta e as ofensas e gritos são via de regra a trágica consequência.

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Parto Domiciliar

Texto de Erica de Paula:

Vamos falar sobre Parto Domiciliar?

Ao contrário do imaginário popular, o parto domiciliar não ocorre apenas com um maço de ervas, uma toalha e uma bacia de água quente. Ainda tabu no Brasil (embora comum em diversos outros países, como Inglaterra, Nova Zelândia e Holanda, sendo inclusive incentivado pelos próprios órgãos de saúde e o governo local, vide reportagens abaixo:

http://www.unasus.gov.br/…/orgao-de-saude-britanico-endossa…

http://www.ebc.com.br/…/reino-unido-recomenda-que-gravidas-…

http://g1.globo.com/…/medicos-ingleses-dizem-que-mulheres-p…

http://mulher.uol.com.br/…/estudo-holandes-diz-que-parto-ca…),

O Parto Domiciliar Planejado é considerado tão seguro quanto o Parto Hospitalar, desde que siga 3 premissas básicas:

1) Um pré natal bem feito e uma gestação de risco habitual (baixo risco). Feto único, bebê cefálico, gestação a termo (a partir de 37 semanas), ausência de qualquer patologia associada (como diabetes gestacional, pressão alta, etc) e início espontâneo do trabalho de parto.

2) Uma equipe qualificada, com profissionais bem treinados e com materiais adequados tanto para situações normais do parto (doppler/sonar, luva, compressa, gaze, clamp umbilical, material de sutura, campo estéril, antissépticos, vitamina k, balança, estetoscópio, etc) quanto para situações de emergência (medicamentos diversos inclusive para conter hemorragia, ergotrate, seringas e agulhas, soro, cilindro de oxigênio, ambu adulto e neonatal, CFR, aspirador, oximetro, etc). No caso da equipe qualificada, esta pode ser composta por: enfermeiras obstetras, obstetrizes, médicos obstetras, médicos da família e médicos pediatras, podendo ser também (e de preferência) uma equipe multiprofissional. Obviamente, os partos domiciliares que ocorrem com parteiras leigas ou partos desassistidos estão associados a uma maior chance óbitos e complicações.

3) Um bom plano de contingência: definir com antecedência o plano B em caso de necessidade de remoção hospitalar, de forma que tudo ocorra dentro de um espaço/tempo adequado. Durante o trabalho de parto, mãe e bebê são continuamente monitorados pela equipe e a qualquer sinal de uma possível intercorrência esse parto passa a ser hospitalar.

Mas vamos às evidências científicas, com 8 estudos bastante interessantes sobre o tema:

– Estudo inglês analisou a morbi-mortalidade perinatal em 529.688 partos domiciliares e hospitalares planejados em gestantes de baixo risco. O estudo conclui que um parto domiciliar planejado não aumenta os riscos de mortalidade perinatal e morbidade perinatal grave entre mulheres de baixo risco.

http://onlinelibrary.wiley.com/…/j.1471-0528.2009.…/abstract

– Estudo holandês com mais de 679.000 partos analisados evidenciou uma taxa de 0,15% de morte perinatal no parto domiciliar e 0,18% no parto hospitalar, concluindo assim que o parto domiciliar, sob condições adequadas, não é associado com um aumento de morte neonatal.

http://journals.lww.com/…/Planned_Home_Compared_With_Planne…

– Estudo inglês com quase 65.000 partos analisados conclui que mulheres saudáveis com gravidez de baixo risco devem escolher o local de nascimento, sendo que mulheres que dão à luz em domicílio vivenciam menos intervenções, sem impacto nos resultados perinatais.

http://www.bmj.com/content/343/bmj.d7400

– Estudo canadense comparou todos os partos domiciliares planejados com todos os partos hospitalares planejados de mulheres que possuíssem idênticas boas condições de saúde e idêntico baixo risco de gravidez, num período de 5 anos, concluindo que o parto domiciliar planejado esteve associado a taxas muito baixas e comparáveis de morte perinatal, e taxas reduzidas de intervenções obstétricas e outros eventos perinatais adversos, em comparação ao parto hospitalar.

http://www.cmaj.ca/content/181/6-7/377.full

– Estudo inglês com quase 147 mil mulheres de baixo risco conclui que as mulheres que tiveram parto domiciliar planejado tiveram menores taxas de morbidade materna, hemorragia pós parto e remoção manual da placenta do que as mulheres que tiveram parto hospitalar.

http://www.bmj.com/content/346/bmj.f3263

– Estudo americano analisou os partos domiciliares planejados ocorridos nos EUA entre 2004 e 2009, concluindo que houveram altas taxas de nascimentos fisiológicos, baixas taxas de intervenção sem aumento dos resultados adversos em relação aos partos hospitalares:

http://onlinelibrary.wiley.com/…/10.1111/jmwh.12172/abstract

– Estudo norueguês que analisou 1631 partos e concluiu que os partos domiciliares planejados estavam associados a um risco reduzido de intervenções e complicações.

http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/23182447

– Estudo brasileiro realizado em Florianópolis de partos assistidos entre 2005 e 2009 que indicam que o parto domiciliar é seguro.

http://www.scielo.br/scielo.php…

Cabe lembrar que, embora os conselhos brasileiros regionais de medicina desaconselhem o parto domiciliar, órgãos como a Organização Mundial de Saúde (OMS), a Federação Internacional de Obstetras (FIGO), o American College of Nurse Midwives, a American Public Health Association, o Royal College of Midwives (RCM) e o Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (RCOG) apoiam a esolha pelo parto domiciliar para mulheres com gestações saudáveis.

Ou seja, o parto domiciliar é uma opção aceitável e segura para gestantes de baixo risco, desde que realizado de maneira adequada. No entanto, assim como no parto hospitalar e na cesariana, a paciente deve estar devidamente orientada quanto aos riscos (que são baixos, mas não são inexistentes) e a possibilidade de desfechos negativos e inesperados, compartilhando com a equipe a responsabilidade sobre essa escolha. Por exemplo: mesmo nos países com a menor taxa de mortalidade do mundo, cerca de 1 a cada 500 bebês não vai sobreviver, independente do local e da via de parto.

E para quem diz que as mulheres que optam por parto domiciliar são leigas e não estão devidamente informadas sobre os riscos, finalizo com uma matéria sobre médicas que optaram por parto em casa:

http://maternar.blogfolha.uol.com.br/…/medicas-tambem-opta…/

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Opressões

Por mais estranho que pareça, diante da imagem idealizada que deles fazemos, os médicos têm o DIREITO de se negar a fazer algo que implica em dano ao seu paciente, por razões éticas. Não há como um paciente fazer este nível de imposição a um profissional que tem o dever profissional de não causar dano. Como já dito, o protagonismo feminino não pode transformar os profissionais em escravos do desejo materno.

Pacientes oprimem médicos também. As taxas de mortalidade de médicos recentemente divulgadas mostram que a condição de médico é uma doença insidiosa que leva à morte prematura. Médicos tem uma vida muito mais curta do que os pacientes que eles atendem. Médicas tem taxas de tumores maiores do que a população em geral, com uma expectativa de vida de 57 anos nessa pesquisa.

A opressão dos pacientes sobre os médicos se expressa de uma forma mais sutil e subliminar, mas não menos danosa e dolorosa. A execração pública e os ataques à honra são os mais comuns. As fofocas, a maledicência e a destruição de reputações por erros presumidos ou simplesmente por não se adaptarem à imagem construída se tornaram banais no universo das redes sociais. Basta a palavra de uma paciente insatisfeita e a credibilidade do profissional se despedaça.

Dr Fulano não é humanizado coisa nenhuma, ele operou uma amiga minha“, ou “Ele não passa de um mercenário” ou então “Cobra uma fortuna porque só pensa em dinheiro“, são as acusações mais corriqueiras. Isso destrói a paixão de qualquer pessoa normal. Muitos dizem “Quer saber? Passei 20h de TP ao lado dessa paciente, e outros tantos dias angustiado com o caso dela sempre na minha cabeça para agora ser acusado de ter feito uma cesariana quando joguei a toalha diante de tantos problemas que surgiram. Eu podia ter feito como todos: contado uma mentira, feito a cesariana há 1 semana, e ninguém me acusaria. Só tolos se imolam publicamente em nome dos seus ideais. Ou kamikazes“.

Sim, os médicos também se sentem oprimidos, em especial os que enfrentam o sistema e sentem na pele o ostracismo e a violência de seus pares.

Criar modelos estanques e simplórios de “oprimidos e opressores” é um excelente método para esconder a verdade. Esta é sempre muito mais complexa e contraditória do que as novelas mexicanas onde o Bem e o Mal se confrontam estereotipados e sem matizes. No mundo real o oprimido também desvela o gozo com sua condição – o vitimismo – e dele tira vantagens, enquanto o opressor sofre na carne o peso de sua posição, pela culpa e pela responsabilidade que lhe recai.

O mundo é menos simples do que parece a realidade é mais complexa e paradoxal do que desejamos.

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Gênios

Todos os grandes gênios da humanidade mostraram a pequenez do ser humano, e por isso não podiam ser perdoados. Atacar nossa autoestima é um crime grave. Copérnico o fez ao mostrar que não somos o centro do universo, Darwin por provar que não somos o centro da natureza e Freud por mostrar que não somos guiados pela razão, mas por uma constituição psíquica tripartite, onde os motores principais de nossas ações se encontram nos calabouços do inconsciente. Já Marx mostrou que somos governados pela história e pelas forças de choque entre as classes, as quais produzem mais efeitos na sociedade e na cultura do que os avanços científicos.

Os grandes gênios são necessariamente incompreendidos, atacados, segregados e difamados. Portanto, como regra geral, se as suas ideias fazem muito sucesso é apenas porque suprem necessidades momentâneas. Como diria Nietzsche, “um gênio verdadeiro só é compreendido após a passagem de um século”, e não há como fugir muito dessa regra”.

Rudolph Schlitzer, “The Quantum of Transformation”, Ed. Borromeo, pag. 135

Rudolph Schlitzer é um físico, professor universitário e escritor austríaco, nascido em Viena em 1932.

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