Arquivo do mês: setembro 2020

Almas gêmeas

Li esta resposta a um questionamento sobre o sexo objetificado na cultura contemporânea:

“O sexo objetificado e coisificado pela padronização do erotismo, tratado como mercadoria, é vendido como estereótipo, camuflando qualquer *relação verdadeira de afeto*. Os encontros resumem-se ao desejo de adquirir um produto, algo distante do sentimento de pertencimento mútuo.”

Hoje em dia, com as relações mais livres e frouxas, derivadas – entre outras coisas – das conquistas do feminismo, achamos que as relações são “objetuais”, ‘interesseiras” e “superficiais”. Em verdade, a sexualidade sempre foi um acerto entre interesses, as vezes explícitos mas quase sempre inconscientes.

Por seu turno, “relações verdadeiras de afeto” são criações contemporâneas e nada tem a ver com sexo, que serve basicamente à reprodução e – exatamente por isso – é prazeroso. Unir afeto com sexo é um artificialismo criado pela cultura há pouco tempo, com o surgimento do amor romântico. Dizer que amor e afeto “deveriam estar unidos” é um ideia bonita, mas não tem nada a ver com a nossa programação.

Em verdade, “se amor existe, é o sentimento de uma mãe por seu filho, e todos os outros amores são dele derivados”, como diria Freud. O amor é, por certo, a fissura bizarra da estrutura cósmica, o inesperado e não programado sentimento que surge pela debilidade do feto humano ao ser expulso do ventre materno antes do devido tempo de maturação. Sua “altricialidade” – a dependência do cuidado alheio – produz reciprocamente os sentimentos maternos de afeto que constituem a base da nossa estrutura psíquica, e o que nos joga inexoravelmente no universo do desejo.

Imaginar que a novidade da estrutura de sexo conectado com amor seja o fim último de ambos sentimentos é uma crença arriscada. Determinar o fim do “projeto sexual da humanidade” – o pertencimento de um pelo outro – é tão apressado quanto decretar, na economia, o “fim da história”. Se deu errado com Fukuyama, porque daria certo com as uniões afetivas humanas?

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Dinheiro

Dinheiro não traz mesmo felicidade, mas por certo pode apaziguar angústias, desde que sejam do tipo que podem ser pagas ou compradas. E, realmente, não cabe romantizar a miséria, pois que não deve ser positivo viver seu cotidiano lutando pela mera sobrevivência.

Da mesma forma também não cabe romantizar o dinheiro e a abundância, pois não há pessoa mais miserável que um sujeito tão pobre que nada possui além de dinheiro.

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Desejos

Há muitos anos, depois da aposentadoria, meu pai se deu de presente um carro importado. Bonito e vistoso, mas claramente exagerado para um sujeito de classe média.

Passado um ano da compra meu irmão viu estacionado perto de sua casa o recém lançado novíssimo modelo desse mesmo carro que meu pai tinha comprado no ano anterior. Como sempre, as mudanças eram pequenas. Faróis mais redondos, linhas levemente alteradas, alguma inovação tecnológica no painel com desenho diferente, mais “arrojado”. O que conta mesmo – motor, chassis e lataria – ficam iguais de um ano para outro, mas, o que importa é o impacto da aparência gritando na cara dos outros.

Quando viu o carro ficou impressionado com o luxo e a sofisticação. A frase que me disse, entretanto, é que foi curiosa:

– Vi o novo modelo do carro que o pai comprou. Cheguei a ficar com pena dele dirigindo aquele carro velho.

Sim, como dizia Sêneca, “a pobreza não vem da escassez de recursos, mas da proliferação dos desejos”. Toda a riqueza acima do limite das necessidades é governada pelos desejos, e estes são infinitos e incontroláveis. Um carro importado, lindo e sofisticado, pode virar pó diante da comparação com uma variedade mais nova e mais moderna. Não é a falta de recursos que o torna velho, mas o desejo despertado pela novidade.

Meu irmão nada disse para o meu pai, mas também acho que ele não cairia no truque. Apesar de ser admirador de carros charmosos ele não sucumbiria tão facilmente à armadilha da comparação. Curiosamente, esse carro cheio de símbolos de opulência só lhe ofereceu problemas e dores de cabeça, inclusive o desastre de ter o carro roubado em um assalto à mão armada. Eu havia lhe avisado que seu carro era um “chama-ladrão“, mas parece que o desejo de realizar um sonho infantil foi maior que o bom senso.

Depois desse episódio traumático resolveu refrear seus desejos e voltou a ter carros mais simples, como fazem as pessoas de juízo.

(Imagem meramente ilustrativa. Afinal, esse modelo aí já é velho e tem mais de 3 anos)

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Penas Violentas

Ao meu ver a pena de morte, castração química, encarceramento são sintomas da falência de um Estado no seu projeto de ser justo, equânime, distributivo e fraterno.

Sociedades apostam no punitivismo na crença tola de que matando, torturando ou encarcerando indefinidamente os criminosos farão decrescer os níveis de criminalidade. Pura tolice. Se isso fosse verdade a pena de morte entre facções criminosas levaria à diminuição dos crimes contra a vida, mas nunca houve qualquer sinal de que isso pudesse acontecer. Castração química parte da ideia cientificamente ERRADA de que o abusador ataca na busca por sexo, quando em verdade seu “leit motif” é o exercício da violência, que pode ser aplicada de outras formas.

Não há como exigir paz em uma sociedade estruturalmente desigual, injusta e violenta. Enquanto houver desigualdade haverá choque e luta. Enquanto o desequilíbrio social for a norma o crime vai vicejar.

Aplicar penas violentas como a pena capital, prisão perpétua ou castração química não produzem solução alguma para a sociedade. Funcionam apenas como vetores de sentimentos inferiores como vingança e ódio contra os criminosos. O primitivismo é um fracasso inquestionável como sistema de regulação social, e só alimenta um ciclo vicioso retroalimentado de crime, penalização e ressentimento.

Abolicionismo penal já!!!

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Humanização de direita

É possível ser a favor da Humanização do Nascimento e ser “fascista”?

Acho que não, mas é melhor só usar a palavra “fascista” com respeito adequado ao seu conceito. Talvez melhor seria perguntar se é possível ser a favor da Humanização e ser de direita. Existem milhões de matizes que exigem avaliação bem minuciosa. Não se trata de uma postura do “Bem contra o Mal”. A realidade é bem mais complicada do que qualquer limite estabelecido pelas simplificações maniqueístas. Por exemplo, nos Estados Unidos a situação dos humanistas no espectro político é bem interessante no que diz respeito às suas origens no início dos anos 70, onde seu aparecimento esteve ligado aos movimentos “new age” e “espiritualista”. Por esta origem atraiu muitas parteiras “espirituais”, ou “spiritual midwives”. Isso lembra alguma coisa? Pois é…

Além disso, essa fonte atraiu parteiras cristãs, que se opõem ao aborto de forma muito intensa. Algumas criaram o mais importante jornal de humanização do nascimento nos EUA. Outra curiosidade: muitas parteiras espirituais, oriundas dos movimentos “beatnik” e “hippie” são brancas, e foram recentemente atacadas pelas parteiras e doulas negras, que se sentem agredidas pelo seu “racismo estrutural”.

Com isso houve uma cisão entre os movimentos de humanização liderados pela MANA e os fortes grupos identitários de parteria negra. Como é bem sabido, os movimentos contrários ao identitarismo nos Estados Unidos se situam à direita do espectro político.

Conheço mulheres que são favoráveis à humanização do nascimento exatamente porque desejam garantir seu direito de parir em casa, um direito individual mais afeito aos propósitos da direita, já dentro do espectro liberal. O mesmo com o desejo de “homeschooling” ou contra a “obrigatoriedade de vacinas”. Nos meus grupos da Internet existe muito desse discurso que se poderia chamar “libertário”. O mais chamativo dessas comunidades é “Separation of Birth and State”.

Sim, humanização e de direita, contra a ação do Estado nos nascimentos. Assim, é razoável imaginar que pessoas que enxergam o mundo pela perspectiva da liberdade, da autonomia e da livre determinação estejam à direita, contra o reforço do controle estatal e à favor da desregulamentação.

Humanização conservadora. Por quê não??

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Coisa pior

Acredite, mano… tem coisa pior.

Ai você arruma alguém legal, brota uma química maravilhosa, o sexo é sensacional, as perspectivas de vida são semelhantes, os gostos estão próximos, as idades combinam e a paixão é madura e intensa. “Duas almas gêmeas que se encontram“, você pensa.

Pensou errado, otário.

Então você descobre que ela vive praticamente na miséria, tem dificuldades financeiras graves, tem um passado cheio de traumas, o pai é alcoolista e um irmão é viciado em crack. Além disso, ela está desempregada e atolada em dívidas impagáveis. Sustenta a família fazendo bicos.

Diante da impossibilidade de vislumbrar qualquer chance desse amor florescer ela resolve terminar tudo. Para isso deixa por baixo de porta da sua casa um bilhete de despedida, evitando assim olhar no seu rosto para dizer adeus.

Nesse bilhete está escrito, com letra miúda e cercada pelos borrões causados pelas lágrimas que teimaram em cair: “Por que Queiroz depositou 89 mil na conta da Michelle?”

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O Cristal Trincado

Uma amiga minha me disse, há mais de 30 anos, que o amor é um cristal de delicada estrutura; uma vez trincado não há forma de consertá-lo. Ela me contou que teve seu primeiro filho na sua cidade natal, 200 km da capital onde morava, quando sozinha foi visitar sua família no interior. Tão logo a criança nasceu, conseguiu contatar seu marido por telefone (não havia celulares na época) e lhe contou a novidade, pedindo que ele viesse imediatamente conhecer o bebê. Ele respondeu que estava “atolado de serviço” mas que no fim de semana, “sem falta”, iria até o interior conhecer seu filho. Veio a conhecê-lo com 5 dias de vida.

Segundo ela, naquele exato instante, ao desligar o telefone e fechar os olhos pôde escutar a rachadura percorrendo a pele transparente do cristal, e os anos que se seguiram foram gastos na vã tentativa de remendar o que não tinha mais conserto. Entre os professores da obstetrícia havia um que se destacava dos demais por sua juventude e seu interesse na medicina baseada em evidências. Fazia contraste com a velharia da faculdade, que agia e pensava na base do “assim que eu faço há mais de 30 anos”, sem se preocupar com evidências bem embasadas. Este jovem catedrático era o que Marsden Wagner chamava de “liberal”, e avisava ser um dos profissionais mais perigosos. Parece ser aberto às novidades, mas apenas para aquelas que não ameacem sua autoridade e seu poder.

Durante uma aula eu fui, por certo, o único estudante que se deixou impressionar com um fragmento de frase que ele proferiu, dita de passagem entre uma e outra explicação. O resto da turma apenas concordou como se fosse algo tão somente óbvio. Disse ele: “Quando nós determinamos a via de parto para a paciente, ela deve ser preparada para….“. Para mim ficou claro, como nunca até então, que a forma como um bebê vai nascer é algo determinado por uma autoridade alheia ao binômio mãebebê. Algo de fora, um saber externo que transforma gestantes em objetos inertes e silenciosos, à mercê das ordens e comandos dos médicos. Por isso era possível determinar a forma como seu bebê seria trazido à luz. Foi nesse instante que percebi que as mulheres eram alijadas das decisões sobre o parto. Também ficou claro, a partir desse momento, que qualquer mudança na atenção ao parto seria bem vinda, desde que jamais atingisse o centro nevrálgico do paradigma médico: a posição objetual da gestante como condição essencial para a prática de sua arte.

Quando ouvi múltiplas vezes o eco de suas palavras reverberando pelos anos seguintes percebi que um projeto de reforma profunda na atenção ao nascimento só poderia emergir se subvertesse essa lógica. Por isso a frase “Humanização do nascimento é garantir o protagonismo à mulher”, pois enquanto não houver a mudança dessa narrativa – e o médico continuar “determinando” vias de parto a despeito do desejo das mulheres – manteremos a mesma tutela secular do patriarcado sobre o corpo e o desejo de gestantes. Essa aula foi o meu “trincar do cristal”, e depois dela eu nunca mais pude olhar a atenção ao parto se não fosse por uma perspectiva libertária.

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Limites

Passados exatos 100 anos os fascistas na Itália já eram responsáveis pelo assassinato de cerca de 600 italianos, uma mostra da total impunidade dessas milícias que, por princípio, preferiam usar pedaços de pau e não armas contra seus inimigos – sindicalistas, socialistas, comunistas – pois seu objetivo essencial era humilhá-los, e não dar cabo de suas vidas.

Um médico na Itália, de sólida reputação e posição social, foi vítima dessas brigadas fascistas. Por sorte não morreu, mas recebeu seu quinhão de tortura e humilhação. Seu filho, ainda pequeno, a isso presenciou com terror, amargura e indignação.

Nesta época era comum na Itália que estas facções criminosas, os “camisas negras”, emboscassem líderes sindicais e atirassem nos joelhos, para que eles nunca mais pudessem andar; essa ação se chamava gambizzare. Outra prática era a purga: constranger o sujeito a beber litros de óleo de rícino para provocar tormentos na barriga e no intestino. Também havia ataques aos sindicalistas e líderes operários com correntes; esses eram os castigos determinados para o “crime” de liderar as reivindicações dos trabalhadores.

Assim era o pânico desse menino, que o aterrorizava todos os dias: receber à noite seu pai alvejado e tornado inválido pelos camisas negras fascistas. A guerra acabou. Mussolini foi executado e sua família foi exposta ao ódio que ele tanto semeou. O fascismo esmaecia na Itália e os camisas negras tornaram-se a triste memória da crueldade e do horror. Esse menino, filho do médico, já adulto volta à Itália já graduado depois de ter estudado com a nata do pensamento freudiano na França, tornando-se psicanalista. Abre uma consultório e começa a atender seus pacientes.

Certo dia encontra em sua sala um cliente novo, homem maduro à procura de atendimento. Trata de assuntos domésticos, angústias, dores do passado. Relata minuciosamente suas neuroses, suas dúvidas e suas feridas abertas. O atendimento continua sem novidades por algumas semanas até o dia em que ele conta de seu passado na Itália fascista, e revela que pertenceu a um grupo de agitadores cuja missão era atirar no joelho dos sindicalistas. Ele havia participado das gangues de “gambizzare”.

Nesse momento de revelação o coração do jovem psicanalista congelou. Por seus olhos passaram as cenas de terror e medo de sua infância, na iminência de ver seu pai voltando para casa baleado, aleijado ou morto, seu ativismo castigado pelos porretes e tiros dos camisas negras. Diante dessa confissão, nada falou, mas percebeu que uma lembrança muito sensível de sua alma foi atingida.

Na consulta seguinte pediu ao paciente que procurasse um colega. Criou uma desculpa qualquer e se despediu. Sentiu que havia sido atingido em um local por demais delicado de sua constituição emocional, ferindo mortalmente a relação que recém se havia iniciado.

Mas e quanto à isenção do profissional? E o que dizer da escuta sem preconceitos e julgamentos?“, perguntou o aluno, ao escutar a história contada pelo mestre.

Ora, não existe escuta isenta. Não há ouvidos que não transformem e metabolizem histórias no curto trajeto entre o tímpano e os sentimentos mais profundos. Exigir de um terapeuta que não seja tocado pelas narrativas que encontra em sua escuta cotidiana é pedir que negue o que há de mais humano em si. Se é justo pedir que as emoções e a perspectiva de mundo de um analista não conduzam um tratamento, também é correto aceitar que a carne que o constitui é suscetível às palavras e seus significados.

“Cada um sabe de seus limites”, respondeu ele com simplicidade. Da mesma forma, quando médicos invocam a “objeção de consciência” para recusar uma demanda podem estar falando de suas limitações diante da dramaticidade das escolhas que são obrigados a tomar. Não é justo tratá-los como se habitassem corpos ausentes de alma.

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Amizade

Sobre ser amigo de uma mulher… É Sempre mais fácil percorrer seu caminho em terreno conhecido, mas só as trilhas misteriosas, escuras e ignoradas nos levam a descobertas novas e para lugares diferentes. Agradeço às minhas amizades femininas o prazer e a honra de descobrir, através delas, um mundo tão diferente, mágico, desafiante e rico.

Scott Dempsey, “Betrayed by the Moon”, ed. Jasper Editing, pag. 135

Scott Dempsey é um jornalista canadense, nascido em Winnipeg em 1975. Escreveu algumas biografias de esportistas – como a biografia de Gerald Fitzbaun, esquiador canadense multicampeão – e artigos para jornais esportivos. Escreveu “Betrayed by the Moon” como um relato jornalístico sobre as olimpíadas de inverno de 2014 em Sochi, com enfoque especial para o problema de doping na delegação da Rússia.

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Distopia

(Uma manifestação de contrariedade com o texto que escrevi sobre o parto normal e a humanização do nascimento – feita por uma mulher).

“…mulher nenhuma deveria ter parto normal na atualidade, para que serve a medicina? Para evitar dores e mutilação no corpo das pacientes. Hoje parto normal só para animais, e olha que os domesticados já estão passando por cesárea para não sofrer. Mas enfim, vá ter um filho em parto normal, depois a gente se fala, ok?”

Diante dessa manifestação fica muito difícil responder. Estou estupefato. Inquieto e atônito, mas com uma clareza súbita sobre estes temas. Sua mensagem me deixou perturbado a ponto de abrir um portal de iluminação sobre minha cabeça. Na luz que se produziu eu percebi a verdade de suas palavras e, mais ainda, o fato de que não só o parto normal poderia ser considerado obsoleto, mas que o próprio sexo deveria ser, com o tempo, descartado como desiderato máximo do prazer humano. Como você disse, depois do acesso aos recursos tecnológicos, o mundo “natural” deveria ser reservado apenas aos animais. Afinal, se já é possível fazer fertilização “in vitro” por que ainda insistimos nesse modelo ultrapassado de reprodução?

E veja bem…. além de ser cansativa e desagradável essa “troca de odores e fluidos”, o que dizer dos riscos? Doenças sexualmente transmitidas, infarto agudo, torcicolo, arritmias, hemorragias e gravidezes não planejadas, entre outros dissabores, poderiam ser evitados. Sexo é cansativo e pode ser dolorido, enquanto uma inseminação pode ser feita num laboratório de qualidade com toda a segurança e limpeza, enquanto o casal poderá estar viajando para a praia ou desfrutando dos verdadeiros prazeres da vida: pedir comida pelo IFood e ver séries da Netflix.

Não há como deixar de reconhecer seu acerto em decretar o fim do parto normal diante de tantas evidências científicas de sua obsolescência. Todavia, eu reconheço que, sendo o parto uma parte da vida sexual da mulher, melhor seria que todos os aspectos da sua sexualidade – e não apenas o parto – fossem relegados ao esquecimento e trocados pelas suas variantes tecnológicas. Assim, por que não banco de esperma no lugar de marido, fecundação artificial no lugar de sexo, cesariana no lugar do parto, fórmula láctea no lugar da amamentação, babás e creches no lugar da maternagem? Por que ainda insistimos nesses anacronismos que só atrapalham nosso conforto e nossa alegria?

Certamente que este futuro utópico que você imagina para todos será, por certo, mais seguro, mais feliz e indolor. Haldous Huxley e Margaret Atwood ficariam corados de vergonha de não terem pensado em todos estes detalhes.

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