Vamos deixar algo bem claro: é nítido o desconforto de muitos com a figura de Janja no cenário da política nacional. Vários são os fatores, e o mais importante é que Janja é uma mulher querendo exercer protagonismo sem ter recebido votos para isso. Ou seja: ela estaria agindo na sombra do Lula. Mesmo entre os analistas identificados com a esquerda, existem pessoas que a criticam por falar quando não devia e se intrometer em assuntos de “gente grande”. Além disso, suas posições são francamente liberais, à direita do espectro político e identitárias. Para a esquerda raiz, uma pedra no sapato apertado do governo Lula.
Ainda assim, creio mesmo que os narizes torcidos para Janja que surgem na esquerda são devidos à ligação que muitos carregam na memória com dona Marisa, o que eu acho compreensível pela importância da ex-esposa de Lula na criação deste personagem político e para o próprio surgimento do PT. É possível entender esse sentimento, mas é certo que não se pode justificá-lo. Janja, para estes, seria a madrasta a tomar o lugar de nossa mãe. Entretanto, é inegável que a essência de muitas das críticas revela um evidente pendor misógino, algo que conhecemos muito bem. Quem poderia esquecer os adesivos de Dilma nos automóveis, o massacre midiático sobre qualquer deslize em seu discurso, as perguntas invasivas e indiscretas e as acusações falsas que acabaram por retirá-la do governo? Nada disso teria acontecido se, dos porões do inconsciente social, não brotasse uma frase, que continuamente era sussurrada: “este não é o seu lugar”. Mesmo entre aqueles que se diziam a favor da equidade, da diversidade e reconheciam os méritos de Dilma se incomodavam com ela, em especial com o seu sucesso.
Agora, mais uma vez, a esquerda caiu com extrema facilidade no discurso orquestrado pela mídia burguesa. A “víbora” da vez é Janja, que teria saído do seu lugar de “sombra” e tomado a palavra em um jantar durante a visita de Lula à China. Sem pedir licença ao marido, acabou por constranger o presidente Xi Jinping com perguntas indevidas sobre o TikTok. A direita se deleitou com o relato, apresentou a cena como um acidente diplomático e descreveu Janja como uma personagem falastrona, indiscreta, boquirrota e deselegante. Parte da esquerda uniu-se aos ataques dizendo que ela prejudica os esforços de Lula em construir pontes com a China, e que faria melhor caso se mantivesse calada. “Janja calada é uma poetisa”, diriam alguns.
A verdade veio no dia seguinte por intermédio do presidente Lula em entrevista coletiva: não foi Janja quem questionou o presidente Xi; a pergunta partiu do próprio Lula. Além disso, não foi sobre TikTok especificamente, mas o incluiu. Janja apenas pediu a palavra para endossar a posição expressa de Lula sobre o entendimento de boa parcela da esquerda de regulamentar as redes sociais e deu sua opinião sobre o domínio do TikTok pela extrema-direita. Ou seja: não houve “quebra de protocolo”, ela não foi indelicada, não causou constrangimento e o presidente Xi concordou com a ideia de mandar um representante ao Brasil para debater o tema das redes sociais sequestradas pelo fascismo.
Sobra uma verdade nesse caso: é preciso mudar a forma de pensar sobre a manifestação das mulheres e o seu direito de expressar livremente suas opiniões e suas perspectivas de mundo. Mesmo quando discordamos – e deixo claro que rejeito a ideia de cercear a livre expressão de ideias – é forçoso reconhecer que o fato de ser uma mulher a falar incomoda, irrita e nos faz desvalorizar seu ponto de vista. Isso precisa mudar, pois é injusto com as mulheres que chegam ao poder. Não é mais admissível tratar metade da população do mundo como se fossem cidadãs de segunda categoria. E deixo claro: não é blindagem aos erros que Janja possa porventura cometer; eu mesmo sou crítico contumaz de suas posições. Entretanto, é necessário aceitar que, entre os seus possíveis equívocos, não podemos incluir a “falha imperdoável” de ser mulher.
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A concubina e a madrasta
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Ditadores
A imprensa burguesa nacional insiste em chamar em seus telejornais o presidente Putin de ditador. Eu pergunto: baseada em quê? Putin foi eleito com mais de 80% de aprovação. Democraticamente, nas urnas, seguindo as regras da decadente democracia liberal representativa. Hoje deve ter mais de 90% de apoio popular, conquistado pela sua excelente condução da economia bloqueada da Rússia e suas vitórias na guerra com o vizinho. É sempre bom lembrar que ele invadiu a Ucrânia depois de 8 anos de agressões incessantes contra a população russa étnica do Dombas, impiedosamente atacada e massacrada. A invasão ocorreu logo após trabalhadores serem queimados vivos na Ucrânia por sua conexão com a Rússia. Os ataques da Ucrânia já haviam causado mais de 14 mil mortes. Há consenso nas esquerdas de que Putin foi paciente até demais com as ameaças nazistas de Kiev.
Hitler invadiu a Polônia e a França sem ser agredido. Suas intenções eram outras. Putin invadiu Donetsk e Lugansk para salvar os russos de serem chacinados pelas milícias nazistas da Ucrânia. A diferença é gritante. O projeto russo é – de novo!!! – a desnazificação do seu vizinho, que planejava ser um entreposto da OTAN apontando canhões para Moscou – aqui, sim, na cara dura. Por favor, mostre onde estão as evidências de que na China Popular, na Venezuela e na Rússia não existe a distinção entre os poderes. Eu posso, entretanto, provar que No Brasil o STF trabalha em sintonia com os interesses da burguesia e mesmo aqueles interesses mais obscuros do imperialismo. As provas estão em toda a parte, em especial no apoio do STF para todos os golpes contra a democracia brasileira. Seremos, por isso, uma ditadura? Na Rússia matam opositores? Quem? Na Venezuela? Qual? Na Rússia? Qual a evidência disso? Já no Brasil um candidato à presidência foi morto num acidente de avião, isso sem falar de Getúlio, de Jango e de Juscelino, assassinados (Getúlio foi levado a se matar) por serem ameaças ao poder das ditaduras. Podemos ser considerados, por estas mortes, uma ditadura?
Um exemplo de separação dos sistemas judiciário e executivo é o da China. “O sistema judicial da China compreende não apenas os Tribunais Populares, mas também a Procuradoria Popular (Ministério Público) e a Segurança Pública. O Governo Central respeita a tradição dos sistemas judiciários das regiões autônomas especiais, Hong Kong e Macau, colonizadas pelos ingleses e portugueses. Os Tribunais Populares são criados pelo Congresso e a ele prestam contas. O sistema chinês possui um Tribunal Popular Supremo, Tribunais Populares locais e especiais. O Tribunal Popular Supremo, órgão máximo na hierarquia judiciária, tem três seções: civil, econômica e penal. Seu presidente é nomeado pela Assembleia Nacional para um mandato de cinco anos, que pode ser renovado duas vezes. O Tribunal Popular Supremo pode reexaminar sentenças das instâncias inferiores quando houver um recurso admitido. Como ele é o intérprete máximo da legislação, acaba sendo um guia de orientação aos demais tribunais, sua jurisprudência acaba sendo, na prática, vinculante. Os Tribunais Populares podem dividir-se em tribunais locais, intermediários ou superiores. Os primeiros, Tribunais Populares Básicos, localizam-se em distritos e municípios. Tribunais Populares Intermediários, uma instância acima, situam-se nas capitais das províncias ou regiões autônomas. Já os Tribunais Populares Superiores, que estão abaixo do Supremo, são 31 e estão em províncias ou municípios dependentes diretamente do governo central.” Como pode ser dito que a China é uma ditadura, afirmando que o “judiciário está na mão do presidente”? O sistema russo é ainda mais ocidentalizado, assim como o de Cuba, mas isso não impede a nossa imprensa burguesa de chamar de ditaduras tudo aquilo que não é espelho.
Por que todos os políticos democraticamente eleitos e que se posicionam contrários ao imperialismo são chamados de ditadores? Maduro foi eleito democraticamente, Putin da mesma forma. O presidente de Cuba e da China através dos sistemas sociocráticos de suas democracias, mas todos são chamados de “ditadores” apenas porque se opõem aos interesses do poder Imperial. Não é interessante? Fosse isso adequado, não poderíamos esquecer do Ditador Bush, cuja reeleição foi uma fraude, mas por que a Globo e o Estadão jamais usaram esse epíteto para designar o presidente americano?
Seria Lula subserviente à China e à Rússia apenas por perceber a necessidade de estreitar laços com estas potências? Putin e Xi são os líderes da “nova ordem”, que já controla o maior PIB do planeta e quase 80% da população mundial. Por que haveria Lula de se omitir dessa aliança que só tem a nos ajudar? Quem perdoaria Lula caso perdesse essa oportunidade histórica de se unir aos líderes do mundo multipolar? Putin e Xi são mesmo admiráveis em suas posições contra-hegemônicas e de enfrentamento ao imperialismo. Na verdade, estamos testemunhando os últimos anos da presença de 3 grandes lideres mundiais no nosso convívio: Putin, que tirou a Rússia do buraco causado pela derrocada criminosa do socialismo por Yeltsin e Gorbachev, de Xi Jinping, que alçou a China a primeira nação desenvolvida do mundo e Lula, líder popular que se contrapõe (ainda que de forma limitada e atabalhoada) ao poderio massacrante do imperialismo fascista e assassino.
Repito, a pergunta mais justa seria: por que deveria Lula desprezar essa chance histórica de oferecer protagonismo ao Brasil e de estar ao lado da corrente mais importante da política e da economia do século XXI?
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Mãe
Hoje meus pais completariam 67 anos de casados. Como houve mudança recente das leis de divórcio no plano espiritual, não tenho certeza se continuam juntos, mas pelas palavras do meu pai acredito que sim. Dizia ele que pretendia casar de novo com minha mãe nas próximas 20 encarnações – só depois daria “um tempo”. Foi uma relação que durou quase 70 anos, desde o namoro até a morte de ambos. Como sempre, eu acho que essas relações duradouras seguem um padrão bem característico, quando voluntárias, por certo. É necessário que ambos tenham um específico fetiche, talvez mesmo um tipo de fragilidade, algo que os faz procurar no outro sua completude, mesmo quando o mais fácil seria seguirem sozinhos. Essa característica podia ser encontrada em ambos, e por isso ficaram tanto tempo juntos. Aliás, além dessa relação com o amor romântico, minha mãe sempre teve outra característica muito curiosa: ela era apaixonadamente francofílica; desde jovem cultivava um amor desmedido pela França, sua língua, sua história e sua cultura, tudo isso misturado com uma xenofilia ingênua.
A francofilia veio da infância, vivida nos anos 30 em uma cidade provinciana como Porto Alegre. Na época assistíamos à decadência elegante da cultura francesa, que hoje não passa de um arremedo da importância que outrora teve no cenário das artes e das letras do mundo ocidental. Minha mãe era vidrada na França, em Paris, no encanto e na sofisticação da “cidade luz”. Além disso, ela adorava o idioma, que aprendeu a falar estudando sozinha em casa. Tenho guardados até hoje seus livros rabiscados em francês, o “Petit Robert” e seus cartõezinhos de cartolina rabiscados com frases escritas na língua de Victor Hugo e Émile Zola.
A sua xenofilia (amor pelo que é estrangeiro) era um traço curioso. Ela ficava espantada com o desenvolvimento tecnológico dos países da centralidade do capitalismo, e resumia esse aparente sucesso em uma palavra que usava constantemente: “pujança”. Dizia ela: “Os europeus fazem essas maravilhas devido à pujança do seu povo”, mas não adiantava muito que um comunista como eu explicasse a ela a origem criminosa da riqueza dos colonizadores europeus. Para os americanos a mesma admiração. Quando passava pela praia do Lami, às margens do Guaíba, em Porto Alegre, exclamava: “Imagine isso aqui nas mãos dos americanos. Tudo limpinho, tudo cheiroso, resorts, praias limpas, restaurantes”. Mal sabia ela que os americanos gerenciam, mas quem paga a conta de toda essa modernidade somos nós.
Apesar dessa paixão pelo estrangeiro, ela não era uma pessoa que desprezava o Brasil e os brasileiros. Tinha paixão pela natureza do nosso país e nossa miscigenação, e concordava ser nosso destino criar uma grande nação abaixo do Equador. Na grande expansão japonesa dos anos 80, quando o país viveu um furor desenvolvimentista e tecnológico, ela me dizia: “Calma, calma. O Japão é um país maravilhoso, mas o futuro não está lá. O país que vai liderar o mundo no século XXI é a China. Tem muita gente – e também muita pujança”. A China, na época, tinha um PIB menor que o do Brasil, e 80% da sua população ainda vivia no campo, mas minha mãe sacou com precisão que um país gigante e com uma economia centralizada com o tempo se tornaria uma nação de inclusão e progresso.
Tenho certeza que eles estão festejando hoje os 67 anos de união, e felizes por terem aproveitado a estadia terrena para oferecer bons exemplos a todos que com eles conviveram.
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Cachorros

Vou contar uma história sobre cães: quando era pequeno meu vizinho tinha um cachorro peludo e brabo chamado “Fully”, que me dava muito medo. Brabo, irritante, neurótico, barulhento e traiçoeiro. Era um cachorro pequinês, e por isso nunca consegui resolver meu trauma com esta raça de cães. Um dia avançou no meu irmão menor, que era bem pequeno ainda, e tive que segurá-lo no colo para que o maldito não o mordesse. Pois quis o destino que, na primeira vez que fui à China – mais especificamente em Beijing – eu encontrasse ao lado de uma barraca na feira de rua um cachorro muito bonitinho. Era tipo o nosso caramelo, marrom, magricela, alegre e simpático, que ficava balançando a cauda sem parar, com aspecto dócil e amável. Fiquei magnetizado pelo cachorrinho, mas quando me aproximei senti um arrepio no couro cabeludo e fui tomado por um sentimento de de puro pavor. Por instantes fiquei paralisado, por certo pelo retorno do recalcado dos temores infantis.
Não, ele não me mordeu, nem ameaçou. Ficou balançando o rabo e me olhando. Porém, quando me aproximei dele me dei conta que naquela cidade, inobstante a raça… todo o cachorro é pequinês.
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Propaganda

Quando eu era criança um dos programas de maior sucesso da TV era a comédia dramática M*A*S*H* (Mobile Army Surgical Hospital – Hospital Móvel do Exército Norte-Americano), que retratava o cotidiano de um hospital de campanha americano na guerra da Coreia. Foi exibida pela CBS entre 1970 e 1983, e seu capítulo final foi durante décadas o recorde de audiência na TV americana. A série era uma brilhante comédia sobre dois cirurgiões, Hawkeye e “Trapper” John McIntyre (Alan Alda e Wayne Rogers), e suas traquinagens no hospital, em especial com seus superiores, sempre retratados como tolos e incompetentes. Ambos os cirurgiões aliavam suas excelentes habilidades cirúrgicas com um humor ácido e zombeteiro. O programa também era moralista ao extremo; os cirurgiões pegavam todas as mulheres, mas nunca as casadas; faziam troça de um casal (o cirurgião chefe e “hot lips”, uma enfermeira) que tinham um caso. Colocavam um nerd como figura importante e um “falso trans”, que se vestia de mulher para ser mandado embora – sem jamais conseguir.
Os 13 anos da série são um brilhante exemplo do “empacotamento americano”. Ele funciona quando um fato vergonhoso da história americana é empacotado como algo heroico, grandioso ou cômico e vendido desta forma “adocicada” para sua população e para todos os cantos do Império. Nesse contexto, a guerra na Coreia – ou a Guerra de Libertação Nacional para os coreanos – é retratada como algo engraçado, pitoresco, com figuras cativantes e com espaço para brincadeiras. Nesta série, os americanos são mostrados como nobres, justos, corretos misericordiosos e bons, e o coreanos como miseráveis, carentes e vítimas inocentes de uma guerra criada pelos comunistas que odeiam a liberdade.
Logo após a derrocada japonesa na guerra com o exército americano, a parte sul da Coreia saiu do controle japonês para se tornar um entreposto americano no mar da China. Enquanto isso, o norte mantinha sua luta pela libertação total do país, eliminando o último dos invasores: os americanos e seus sequazes. Pelo forte sentimento anticomunista (medo da União Soviética) a guerra foi um exemplo de brutalidade e de abusos contra os direitos humanos, tornando-se um divisor de águas do imperialismo. Até então, nunca havia ocorrido em tempos modernos tamanha crueldade com um país e seu povo como o ocorrido lá. Essa guerra se tornou o marco de violência, o modelo a ser aplicado em todas as outras intervenções imperialistas, como no Vietnã, Iraque, Afeganistão, Líbia e outros. Os Estados Unidos jogaram sobre a península coreana 635 mil toneladas de bombas e 33 mil toneladas de Napalm – mais bombas foram jogadas pelos americanos na Coreia Popular (Coreia do Norte) do que durante a guerra do Pacífico contra o Japão, apenas 6 anos antes. O famoso General MacArthur desejou explicitamente a utilização de bombas atômicas na península – entre 30 e 50 delas na fronteira com a Manchúria – o que deixaria um rastro imenso de destruição e radioatividade.
O norte do país foi totalmente destruído: hospitais, escolas, conventos, diques, represas, plantações, casas, indústrias e pontes jogando a Coreia na “idade da pedra”. Inúmeros massacres foram realizados pelos soldados americanos ou sob a sua supervisão, mas nada disso aparece – nem de forma sutil – nos 13 anos em que a série americana esteve no ar. Literalmente tudo foi bombardeado. No espaço de 3 anos os americanos mataram 1/5 da população civil do norte, por volta de 3 milhões de pessoas (a imensa maioria civis – mulheres e crianças), e estabeleceram no sul uma ditadura que perdurou por décadas. Apesar disso, um armistício foi declarado em 1953 e a Coreia Popular conseguiu estabelecer a autonomia sobre a parte ao norte do paralelo 38. No início dos anos 70, em uma forma diabólica de fazer desaparecer tantos crimes, eu e milhões de americanos dávamos risadas assistindo as travessuras dos médicos e enfermeiras na península coreana.
“O que quase nenhum americano sabe ou lembra é que nós bombardeamos o Norte inteirinho por 3 anos, sem nenhum tipo de cuidado em relação aos civis”, explica Bruce Cumings, historiador da Universidade de Chicago, em seu livro “The Korean War: A History”.
O “empacotamento” também foi feito com os filmes de Hollywood em relação ao massacre das populações indígenas no século XIX na conhecida “corrida do ouro”. Surgiram a partir daí os filmes de faroeste (Far West, o oeste longínquo), Os Pioneiros, Rin tin tin, Gary Cooper, John Wayne, Forte Apache, etc. Um dos maiores genocídios do século XIX foi empacotado e vendido para o mundo como a vitória dos “pioneiros” cristãos contra as populações primitivas e violentas. E que história eles contam sobre a segunda guerra mundial? Ora, de que foram os vencedores, mesmo que qualquer historiador sério, baseado em números de soldados perdidos, unidades de infantaria e a importância logística cruciais das vitórias ao leste, reconheça que a grande responsável pela vitória contra o nazismo tenha sido a União Soviética e sua “Grande Guerra Patriótica“.
Somos bombardeados pela propaganda imperialista de forma incessante, ininterrupta, massiva e persistente. Tudo o que sabemos do mundo, em especial dos países da resistência ao imperialismo como Palestina, Rússia, Cuba, China e a Coreia Popular, vem de fontes empenhadas nesse tipo de empacotamento, pela falsificação da verdade, pela mentira contumaz e pela desumanização dos outros povos, de forma que só seja possível chegar até nós a versão escolhida pela máquina de propaganda controlada pelos Estados Unidos. A liberdade de um povo também significa contar sua própria história, e como diria Milan Kundera “A Luta do homem contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento”.
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Serjão dos Foguetes

Sabe qual o drama do Serjão dos Foguetes? O mesmo de quase todos os “produtores de conteúdo” do YouTube: a tirania do papel em branco, o mais terrível dos opressores para quem está conectado ao mundo do entretenimento.
Vamos combinar que existe muito material para falar de astronomia e geofísica – esta última é a área na qual ele tem formação. Há como falar dos achados incríveis do James Webb, das descobertas de exoplanetas, da Lua, de Marte, da viagem interplanetária, de Vênus, do furacão de Júpiter, da vida fora da Terra, de visitantes alienígenas, das teorias sobre o Oumuamua, etc., mas a gente sabe que existem tormentos para quem quer continuar a falar indefinidamente. O primeiro é que, apesar de vasto, estes temas não são infinitos; não há como repetir 4 ou 5 vezes um programa sobre a Lua ou sobre os satélites de Saturno. Desta forma, uma solução encontrada é sucumbir à “síndrome de Caetano”, que é a tendência a dar opinião sobre coisas sobre as quais não tem muito conhecimento. Aqueles que se deixam contaminar por ela acabam falando demais por terem atingido um grau de notoriedade que faz com que jornalistas fiquem insistindo em obter sua opinião sobre temas aleatórios. Eu sei o quanto é difícil ser humilde nessas horas e dizer: “não tenho opinião formada sobre isso”, e ter a grandeza de uma Glória Pires na premiação do Oscar. A maioria sucumbe a ideia ilusória de que sua opinião é indispensável.
Serjão era quase uma unanimidade entre aqueles que gostam de ciência popular. Com seu jeito de nerd, gordão, sorridente, brincalhão, e muito comunicativo, ele explica a astrofísica como se fosse um professor bonachão das séries iniciais de um colégio público. Não se furtava a brincar com o “mundial inexistente do Palmeiras”, com as teses amalucadas dos terraplanistas e com as descrições de visitantes extraterrestres a visitar nosso planetinha. Tudo ia muito bem, e seu canal já havia passado alguns muitos milhares de inscritos e, direi eu, de forma merecida, até porque sou um dos fãs dos seus programas.
O problema começou a ocorrer quando Sérgio Sacani – seu verdadeiro nome – começou a dar mostras de que, além de ser um excelente comunicador e divulgador científico, estava alinhado com as correntes mais conservadoras do pensamento político contemporâneo, flertando com a extrema direita e o bolsonarismo. Quando sua biografia foi exposta surgiram manifestações no mínimo comprometedoras, em especial quando sugeriu a morte do presidente Lula, mesmo que em forma de brincadeira. A partir daí, ficou claro que sua posição no espectro político estava situada muito mais à direita do que gostaríamos, em especial por ele ser um propagador do conhecimento científico. Serjão apoia a ciência ao mesmo tempo em que se aproxima dos grupos que mais a atacam. Também é notória a sua vinculação com figuras icônicas da extrema direita mundial, em especial Elon Musk. Sua defesa se baseava em uma Fake News: um fantasioso diálogo entre o herói bilionário e a “ONU” a respeito de uma doação de 6 bilhões de dólares para acabar com a fome, para a qual ele exigia a “nota” dos gastos para, só então, investir nessa iniciativa. Tudo indica que o diálogo e as exigências do dono da Tesla eram apenas uma forma de propaganda.
A privatização da Petrobrás, que ele defende, é uma das suas opiniões mais controversas. Para ele, “a Petrobrás está cheia de pessoas que não fazem nada, está inchada“. Assim, uma empresa nas mãos de investidores, entregue pelo governo à iniciativa privada, seria uma forma de deixar a empresa mais saudável, usando o velho argumento de que as empresas privadas são mais “honestas” e mais “enxutas”. Para ele, a importância estratégica de ter o petróleo sob o controle do governo é menos importante do que se livrar de funcionários que, segundo ele, pouco ou nada produzem. Também é pródigo em atacar a China, tratando sua ciência como se fosse inferior à americana, o padrão de excelência.
Assim, o que vemos com Sérgio Sacani, longe de ser um desvio na curva, é um padrão no comportamento dos divulgadores de conhecimento nas redes sociais. Assim que ele começou a falar de assuntos como geopolítica, capitalismo, sociedade, privatizações, socialismo, China, Coreia Popular e o significado dos bilionários na sociedade capitalista ficou evidente sua verdadeira essência conservadora. A exaltação do bilionário Elon Musk, visto com ele como um “gênio” e mecenas da ciência, e a de Lula, visto como alguém que poderíamos eliminar, deixa muito clara sua perspectiva de mundo. Porém, não é certo culpá-lo por estas opiniões fora do seu métier; ele na verdade sucumbe à tentação irresistível de ficar tratando de assuntos que desconhece; na maioria das vezes “ouviu o galo cantar mas não sabe onde”. Muito do que ele fala de política, do PT, do Lula, de Elon Musk, da China, da Coreia Popular é suco de senso comum, um amontoado de informações sem fonte e sem qualquer comprovação científica. Essa adesão oportunista aos cânones científicos é o que existe de mais censurável; quando é para criticar os terraplanistas a vinculação à ciência é mandatória; afinal, como tratar destes assuntos e ao mesmo tempo desprezar toda a ciência que sustenta nossa visão do cosmos? Todavia, quando critica os “vagabundos da Petrobrás” não é necessário mostrar nenhuma comprovação de que os funcionários da nossa maior estatal são relapsos – sua percepção pessoal e isolada é suficiente. Ou seja: ciência para quem precisa de ciência; senso comum quando interessa.
Entretanto, eu ainda prefiro esquecer as mancadas do Serjão dos Foguetes e escutar apenas as coisas interessantes que ele apresenta. Acho que é razoável e justo distanciar o autor da obra, o divulgador científico da sua posição política. Por outro lado, que isso fique como ensinamento: o fato de um sujeito ter uma vida acadêmica abundante, rica e ter acumulado conhecimento sobre um tema específico, não garante que tenha informações suficientes para tratar com profundidade outros temas. A compartimentalização do conhecimento nos permite que sejamos doutos em determinada especialidade e totalmente ignorantes em muitas outras. Nosso erro é valorizar as opiniões dessas pessoas fora dos seus domínios, onde eles possuem a mesma profundidade de saber do que qualquer um de nós.
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Apenas imagine…
Faça um simples exercício de imaginação e pense como reagiríamos se a China comunista tivesse esmagado uma rebelião no Tibete e, através de um bombardeio incessante sobre regiões densamente habitadas e houvesse matado mais de 15 mil civis, entre estes 8700 crianças tibetanas – até agora. Diante de tamanha matança, como seriam as manchetes nos principais meios de comunicação do ocidente? Como seriam tratados os chineses e suas autoridades? Que país europeu estaria apoiando a China e sua carnificina com slogans “I Stand with China”?
Por que a diferença no tratamento destes dois episódios desumanos e brutais? O que está por trás desse horror que não sejam os interesses capitalistas, o racismo e a perversidade mais explícita? Qual a diferença entre os campos de concentração nazi e o campo de concentração de Gaza? Por que aceitamos as desculpas cretinas dos apoiadores de Israel, aceitando haver razão para matar 1000 crianças para atingir um único combatente do Hamas? A resposta é óbvia: Israel é uma ponta de lança do imperialismo cravada no Oriente Médio, às custas da liberdade e da autonomia da Palestina. Além disso, Israel, através do AIPAC, financia a maioria dos políticos americanos, em especial do partido Democrata. Fica fácil entender porque tanto amor devotado a esta colônia europeia branca entre os países árabes.
Acrescento a estes questionamentos, perguntas direcionadas à imprensa: por que insistimos em chamar o Hamas de terrorista, e não chamamos de terroristas os brancos e europeus que roubaram suas terras, os humilharam e torturaram a ponto de não restar nenhuma alternativa além da reação violenta e feroz? Qual a razão para acreditarmos como aceitáveis as milhares de violências cotidianas cometidas contra a população palestina, mas nos escandalizamos quando aqueles que sofrem os abusos durante décadas finalmente reagem às agressões? Por qual motivo aceitamos o Apartheid declarado e explícito que impede o acesso dos palestinos à plena cidadania? “Dos rios dizemos violentos, mas não chamamos violentas as margens que os oprimem”. (Bertold Brecht)
Não é possível calar-se diante do apoio necessário à Palestina. É necessário que as denúncias se mantenham; é preciso expressar cotidianamente nossa inconformidade. Precisamos deixar claro o lado da história em que nos colocamos, apresentando a todos, e a todo momento, a realidade desumana do sionismo. Não permita que normalizem o racismo, a exclusão e o preconceito contra a coletividade Palestina. Peço para cada um que olhe para a foto desse texto e se imagine correndo com um filho nos braços, recém retirado dos escombros de sua casa, covardemente destruída pelas bombas sionistas. Difícil? Se esta identificação é complicada, então imagine que é uma criança loira e de olhos azuis atacada por nazistas no gueto de Varsóvia; talvez com esta pequena alteração na cor da pele fique mais fácil criar esta identificação. Miko Peled, ativista israelense pela palestina, filho de um general israelense que atuou na Guerra dos 6 dias, afirma que é “impossível vencer os palestinos”. Em uma postagem recente, deixa claro que a guerra contra Gaza é a guerra contra a paz. A imaginária vitória de Israel nessa guerra genocida significaria a vitória do racismo, da exclusão, da brutalidade e do abuso. Por isso somos todos Palestina Livre.
Palestine will be free!!!
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Guerra e Opinião Pública
Nos últimos dias apareceram duas manobras da grande imprensa corporativa manobras claramente farsescas para tentar mudar a opinião pública sobre a guerra de Israel contra os palestina. A primeira foi uma operação da Polícia Federal contra supostos agentes do Hezbollah que estariam agindo no Brasil e planejando ataques “terroristas”. Imaginar que este partido libanês estaria desejando promover ataques contra um país que tem a maior colônia libanesa do mundo por si só não faz sentido. O caso fica ainda mais obscuro quando o Mossad – uma verdadeira organização terrorista de caráter internacional – diz que ajudou a polícia brasileira e aplaude a ação dos policiais brasileiros. Toda a acusação é muito frágil, sem evidências claras, e parece mesmo uma peça de publicidade para criar a narrativa batida de uma luta da “civilidade” ocidental contra o “fanatismo terrorista” do oriente. O outro caso foi a aparição de Bolsonaro com o embaixador de Israel no Brasil, tentando angariar frutos eleitorais para a direita brasileira ao vincular este encontro com uma possível liberação dos reféns brasileiros do sionismo israelense. Mais uma estratégia de propaganda descarada para que Israel fortaleça seus vínculos com a extrema direita fascista brasileira.
Talvez a pressa em mudar a narrativa se deva ao fato de que o mundo inteiro começa a mudar sua opinião e seu apoio à causa de Israel. Os ataques covardes, a morte de crianças, a destruição de hospitais, médico e ambulâncias mostram as verdadeiras intenções genocidas de Israel, mas a cortina de fumaça de imprensa ocidental – totalmente vendida para o imperialismo – começa a se dissipar pela avalanche de depoimentos e comprovações em contrário. Uma pesquisa nos Estados Unidos aponta que, no que concerne à posição de Biden sobre a guerra contra o povo Palestino, ele tem apenas 10% de aprovação no grupo de 18 a 35 anos. Ou seja, a juventude americana , aquela que vai morrer no caso de uma guerra aberta, é absolutamente contrária ao conflito. A imensa maioria do povo americano se opõe ao suporte americano para o estado terrorista de Israel. É notório que os impostos americanos financiam as bombas que matam crianças na Palestina, e isso começa a pesar na opinião pública americana. As últimas manifestações, ocorridas em diversas cidades americanas, deixam bem claro para que lado o povo americano está se dirigindo. A posição do sionismo e sua ação genocida na Palestina não consegue mais se sustentar, por mais que fortes poderes e quantidades imensas de dinheiro tenham comprado a mídia corporativa americana para favorecer o colonialismo racista de Israel.
Na verdade, se olharmos para o conjunto das nações do planeta, apenas Estados Unidos, seus vassalos europeus, Japão e Austrália apoiam Israel nesse enfrentamento. Por certo que nesse grupo há dinheiro e poder, mas o grosso da população está ao lado da Palestina. Se somarmos China, Índia, Bangladesh, Paquistão, Brasil, Indonésia, Nigéria temos apenas nesses 7 países quase a maioria absoluta da população mundial. A opinião pública do planeta, as marchas, os debates na Internet, a derrota da retórica sionista, as manifestações de chefes de governo, tudo isso está mudando a trajetória desse conflito. Isso fez com que a esperada “invasão de Gaza” não tenha ocorrido.
Além das questões relacionadas ao rechaço mundial à postura criminosa de Israel há outro fator importante sobre o fracasso (até agora) da invasão por terra. Os especialistas são claros: o exército de Israel é formado majoritariamente por um contingente não profissional, “garotos de apartamento”, sem preparo, sem condições físicas para suportar um combate em cada rua, cada viela, cada beco, no corpo-a-corpo, de forma desgastante (moral e fisicamente), com a morte espreitando em cada esquina e num terreno cheio de túneis que apenas os habitantes de Gaza dominam. Há o temor por parte dos sionistas de que Gaza possa se tornar o novo Vietnã, com baixas gigantescas de combatentes sionistas, um cemitério de jovens sionistas, o que dará ao imperialismo um novo fracasso retumbante, como o foram o Vietnã, a Síria e o Afeganistão.
As cartas estão na mesa. O sionismo está com seus dias contados, e seu fim será determinado pela comunidade internacional, a exemplo do que ocorreu com o Apartheid da África do Sul. Exatamente pela ação corajosa do Hamas, desafiando a arrogância militar de Israel, pela primeira vez em décadas existe uma uma luz no fim do túnel, e como todos sabemos, só quando Israel se sentir acuado poderemos ter uma real esperança de paz na região.
Arquivado em Causa Operária, Palestina
Pânico no Império
Só quem sofreu lavagem cerebral não entende porque estamos vivenciando um forte e consistente surto de propaganda contra os BRICS nos últimos tempos. Os ataques à Rússia e à China estão cada vez mais frequentes, mas é importante entender a razão dessa violência – recheada de mentiras e fake news – contra as duas principais potências que enfrentam o imperialismo.
A Rússia era o país mais miserável da Europa na primeira década do século XX, sendo governada por um Czar assassino e um modelo feudal de produção. Bastaram 50 anos da revolução socialista para a União Soviética colocar um homem em órbita na Terra, ainda antes dos americanos. E isso depois de perder 20 milhões dos seus habitantes na guerra que venceu por todos nós. Hoje a Rússia é o terceiro país do mundo por paridade de consumo, graças ao que sobrou de socialismo àquele país e às alianças formadas com a China. Já a China foi invadida, saqueada e roubada pelos europeus (em especial o Império Britânico) até quando promoveu sua revolução em 1949. Foi destruída e subjugada pelo exército japonês durante a segunda guerra mundial e hoje é a economia mais forte e pujante do mundo – em pouco tempo ultrapassará os Estados Unidos.
A China em 30 anos tirou 800 milhões de pessoas da fome, mais que o dobro da população americana. Vietnã é um estado próspero e superou o Brasil na produção de Café. Cuba é socialista e independente do imperialismo, e apesar de ser pobre, tem um PIB 10x superior ao seus vizinhos capitalistas como El Salvador, Rep Dominicana, Haiti, Belize, Honduras etc. E ainda sofre bloqueios terríveis há 60 anos que interrompem seu crescimento. É triste lembrar que até 1997 a China tinha um PIB menor que o do Brasil. O que houve com eles que não ocorreu conosco?
Quem não se importa com a pobreza é quem a produz: a exploração capitalista, sua ética do lucro e a exploração infinita através da escravização dos povos. O discurso antissocialista, pró capitalista e de suporte ao imperialismo só viceja naqueles cujas mentes foram lavadas e escovadas pela propaganda imperialista durante décadas, gente que trabalha para comer e sobreviver apenas para que os donos do poder possam continuar milionários.
Arquivado em Causa Operária, Política










