Impactos

“The Doctor”,1891; Samuel Luke Fields (1844-1927), Óleo sobre tela, Galeria Tate (Londres)

Vejo com frequência pessoas exaltando os progressos da medicina e se espantando ao pensar como a humanidade foi capaz de sobreviver sem eles. Citam os antibióticos, as ultrassonografias, as cirurgias e a vacinação em massa, dando a entender que só sobrevivemos por causa desses tantos avanços tecnológicos. Entretanto, a própria ciência reconhece que o impacto (não confundir com a eficiência) dessas novidades (todas elas surgidas a pouco mais de um século) na atenção à saúde foi diminuto. O aparecimento dos antibióticos, das vacinas e dos diagnósticos por imagem não produziu resultados significativos para a saúde global. Em verdade, o impacto real nunca ocorre por meio da ciência médica, mas da engenharia e da política: muito mais significativos para a saúde foram o saneamento básico, o transporte público, as janelas nas paredes, ventilação nas casas, roupa limpa, trabalho digno, limpeza urbana, higiene pessoal, serviço social, ar respirável, comida saudável e água limpa. A medicina, sem dúvida alguma, salva muitas vidas, e controla doenças que, antigamente, seriam inexoravelmente fatais. Todavia, seu impacto na saúde global humana é tímido.

A tuberculose e a Revolução Industrial tiveram uma relação complexa e profunda. A industrialização, que trouxe em seu bojo a urbanização e aglomeração de trabalhadores em ambientes insalubres e superlotados, contribuiu para a proliferação da doença, que se tornou um dos maiores problemas de saúde pública da época, conhecida como “peste branca”. Esta doença é um exemplo clássico: grande flagelo europeu dos séculos XVIII e XIX, ela teve uma queda brusca na sua mortalidade a partir da aplicação das leis trabalhistas que limitavam as horas trabalhadas, em especial nos porões de navios e no porto de Londres. Quando a estreptomicina começou a ser implementada, o número de pacientes graves já havia diminuído em mais de 90%. Segundo o pesquisador Frost, “nada teve mais influência sobre o declínio da tuberculose que a progressiva melhoria na ordem social” e que “um dos aspectos mais essenciais no efetivo controle da doença é a melhoria do padrão de vida dos estratos econômicos mais baixos”. Ou seja: o real impacto veio por meio da regulamentação rígida das relações de trabalho, a alimentação adequada e sobre a insalubridade da vida dos operários. Os antibióticos vieram muito depois, mas ganharam fama porque, com isso, seria possível vender remédios e fazer girar a roda da fortuna do capitalismo. E, percebam: não afirmo que os antibióticos sejam “inúteis” (apesar de serem perigosos); pelo contrário, salvam vidas e são indispensáveis no tratamento de pacientes gravemente enfermos. Entretanto, sua ação é multiplicada pela propaganda; o real efeito positivo para a saúde das populações vem das transformações sociais que ocorrem em função das lutas sociais.

Outra constatação: de todas as descobertas da área médica do século XX, a mais impactante foi a descoberta do aumento de absorção de água pelo túbulo distal do intestino quando, em uma solução salina, se acrescenta uma pequena quantidade de glicose. Para quem é atento, estou apenas descrevendo algo banal: o soro caseiro. Entretanto, essa descoberta foi brutalmente impactante, capaz de salvar milhões de crianças em África, vítimas de disenteria e outras doenças causadas pela água contaminada ou não tratada. Ou seja, o uso deste tratamento causou até um resultado demográfico, aumentando a expectativa de vida, e foi superior a qualquer novidade da medicina surgida na mesma época.

Em resumo, a tecnologia de medicamentos e equipamentos aplicada à medicina tem valor e preserva vidas, mas sua ação é muito menor do que as medidas sociais, políticas e estruturais que, neste caso, podem fazer revoluções significativas na sobrevida, no bem-estar, na longevidade e na saúde das populações. É essencial ter boas noções de epidemiologia ao tentar avaliar o real impacto da Medicina na saúde. Talvez um bom começo seja lendo Ivan Illich e “A Expropriação da Saúde – Nêmesis da Medicina”. Como pode ser visto na “Encyclopaedia Britannica“, “As visões de Illich sobre a classe médica, expostas em Medical Nemesis: The Expropriation of Health (1975), eram igualmente radicais. Ele contestava a noção de que a medicina moderna havia levado a uma redução geral do sofrimento humano e afirmava que a humanidade era, de fato, afligida por um número cada vez maior de doenças causadas por intervenções médicas. Além disso, argumentava que a medicina moderna, ao parecer oferecer curas para quase todas as condições — incluindo muitas que não haviam sido consideradas patológicas pelas gerações anteriores —, criava uma falsa esperança de que todo sofrimento pudesse ser evitado. O efeito, concluiu ele, era minar os recursos individuais e comunitários dos humanos para lidar com as inevitáveis ​​dificuldades da vida, transformando-os, assim, em consumidores passivos de serviços médicos.”

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Beleza e Poder

Virou uma espécie de mantra entre grupos identitários desmerecer a importância e o poder social da beleza. Desde o antigo “o que vale é a beleza interior”, passando por “beleza não põe a mesa” tendemos a desmerecer o juízo que as pessoas fazem do belo. Meu pai sempre me contava a história das suas observações na fila do banco quando, observando a reação das meninas do caixa, percebia a diferença de comportamento quando a pessoa a ser atendida era um homem bonito. Faziam isso de forma inconsciente, por certo, mas ficava evidente a diferença que as pessoas belas tinham nos prosaicos encontros cotidianos.

Pesquisas recentes indicam que a vida pode ser menos dura e mais lucrativa para pessoas mais atraentes. Segundo o economista especializado em mercado de trabalho Daniel Hamermesh, essas pessoas ganham em média US$ 237 mil (R$ 1,2 milhão) a mais ao longo da vida do que pessoas igualmente qualificadas, mas menos atraentes nos Estados Unidos. Elas também são mais propensas a serem promovidas no trabalho, negociar melhores empréstimos e atrair parceiros mais qualificados e bonitos.”

Inúmeros outros trabalhos demonstram a vantagem que as pessoas belas obtém nessa sociedade. Entretanto, existem indicadores indiretos da importância que essas questões têm nas sociedades humanas. O mercado da beleza feminina é um mercado vasto, abrangendo produtos, serviços e cirurgias estéticas, com um valor global estimado em US$ 430 bilhões (2,4 trilhões de reais). Em 2022, o Brasil faturou US$ 26,9 bilhões (150 bilhões de reais) neste mercado, ocupando a quarta posição mundial. O mercado de cirurgias estéticas, que é um dos segmentos mais lucrativos, cresceu para US$ 127,1 bilhões (711 bilhões de reais) em 2023. O mercado brasileiro de estética é considerado um dos maiores do mundo, movimenta R$ 48 bilhões anualmente e ocupa o terceiro lugar no ranking mundial.

Apenas como comparação, estão previstos R$ 226,4 bilhões para a educação e R$ 245,1 bilhões para a saúde pública. Desta forma podemos ver a importância que se dá à aparência e o valor que as sociedades dão a ela Com tanta atenção a esta faceta do sujeito – o aspecto externo – pode-se imaginar o poder que existe naqueles sujeitos belos e sedutores.

Também não é à toa que a mais épica das histórias antigas gira em torno do poder de uma bela mulher, capaz de produzir uma guerra de uma década entre duas cidades. Assim fez Helena, que pelo poder de sua beleza, levou gregos e troianos à guerra. Desta forma, é ingenuidade acreditar que a beleza, em especial a feminina, não seja uma força extremamente poderosa nas sociedades humanas, e não é por acaso que os homens de poder obsceno conquistam mulheres de beleza estonteante e hipnótica. Desconsiderar o valor da beleza na estruturação da humanidade é desmerecer a própria herança que recebemos dos mamíferos que nos cercam e nos antecederam.

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Romantismo tóxico

“Precisamos falar desse ‘romantismo tóxico’ que une homens mais velhos e meninas”.

Por que romantismo tóxico? Por que precisa ser isso o que une essas pessoas de idades díspares? Como afirmar que namorar alguém mais novo seja um pendor para a subjugar, e quando alguém muito mais novo entra neste tipo de relação há um desejo de ser oprimido?

As dinâmicas eróticas, afetivas e sexuais são únicas, subjetivas, pessoais e não há como saber o que realmente as conduz. Aliás, nem mesmo ao sujeito é dado saber, pois que as reais motivações para as escolhas amorosas estão escondidas no inconsciente. Entretanto, por que rotular a disparidade de idades como “tóxica”? E tóxica por parte de quem? Do sujeito mais velho e famoso que deseja rejuvenescer com um parceiro décadas mais novo? Ou do jovem desejando ascensão social e facilidades por meio da sensualidade de seu corpo atraente? Quem intoxica quem? Quem comanda ou detém o poder? O falo poderoso ou o corpo jovem e manipulador? Talvez, por que não, nenhum dos dois, se aceitarmos que estas relações também podem ser mediada por amor.

Por que é necessário achar que esse desnível de idade é tóxico? Olhe a experiência de outras mulheres, falando se suas experiências com homens mais velhos e mais jovens. Por que seria correto criminalizar relações que não se conformam à nossa visão específica de amor? Numa sociedade patriarcal, onde o poder está com os homens, é óbvio que ele será exercido nas relações afetivas. Entretanto, isto não é da essência dos homens, mas da essência do poder. Coloque o poder nas mãos das mulheres e o modelo se reproduz, como eu mostrei acima.

“Existem mulheres mais velhas que se envolvem com meninos, mas não é a norma, não é o mercado.”

Sim, não é o “mercado” porque poucas são as mulheres que ascendem a posições de poder. Entretanto, entre aquelas que atingem esta condição, seu valor social lhes oferece essa oportunidade. Repito: não é da essência dos homens e das mulheres, mas da essência do poder. Quem o detém (no patriarcado, majoritariamente os homens) terá a oportunidade de escolher seu parceiro mais belo e jovem, buscando nele a ilusão de eternidade.

Sabe o que me deixa triste? A ideia de que toda a relação de amor entre um homem mais velho e uma mulher mais jovem está regida pelo desejo de dominação, e que não passa de uma expressão machista de opressão. Mas, para aceitar isso, é necessário colocar as mulheres que se apaixonam por homens mais velhos como tolas, manipuláveis, ingênuas, frágeis ou submissas, quando a realidade nos mostra que, apesar da existência desse fenômeno, essa não é a totalidade e, penso eu, nem a maioria casos.

A emancipação das mulheres do jugo do patriarcado passa por reconhecer seus desejos e seu protagonismo nas escolhas amorosas, retirando-as da condição de objetos e alçando-as à posição de sujeitos de seu destino – inclusive no que diz respeito às suas escolhas eróticas. Acho curioso ver como algumas pessoas sabiam exatamente o que ocorria na cabeça daquela moça da foto, mas fazem isso julgando-a apenas pelos SEUS referenciais e experiências pessoais. Repito: se ainda existem elementos do patriarcado a modular estas relações, certamente que o mundo está em mudança, e não é justo acreditar que todas as relações construídas por esse modelo sejam fruto de estruturas opressivas ou masoquistas.

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O Parto Sitiado

É para mim uma realidade inconteste que a obstetrícia está sofrendo um cerco; a prática de atenção ao parto está sitiada, enclausurada e amordaçada, e as consequências para a sociedade podem ser trágicas. De um lado, os profissionais sofrem a pressão da sociedade, intoxicada pela mídia que coloca a cesariana como um “avanço civilizatório”, tratada como uma forma superior de atenção às mulheres, um direito garantido às “consumidoras”, uma prática limpa, higiênica, moderna, tecnológica e segura. Sabemos o quanto isso é falso, mas também temos noção da dificuldade de resistir ao paradigma hegemônico. Como consequência, se percebe na atualidade que a demanda pelos partos sem “sacrifício” (sacro ofício, trabalho sagrado) é uma realidade social e jurídica, que obriga médicos a adaptarem suas condutas às demandas do cliente, e não mais às bases científicas que normatizam o proceder e a conduta médica.

Além disso, obstetras são perseguidos de forma cruel e inexorável quando resultados negativos ocorrem, inobstante sua culpa, bastando para isso que não sigam o catecismo da sua corporação – mesmo quando estas regras se afastam claramente dos pilares de respeito à integridade física de mães e bebês. Outro problema urgente surgido pela enxurrada de cesarianas realizadas a pedido, é que esta situação torna inviável a ação ética de obstetras que levam a sério a ideia de não causar dano aos seus clientes. Mais ainda, está cada vez mais claro que não existem recursos – materiais e humanos – para dar conta de tantas cirurgias e suas consequências, em especial aquelas que ocorrem no sistema público de saúde. Portanto, se trata de um drama ético, jurídico e econômico. Por certo que esta tendência alienante da obstetrícia contemporânea agrada aos poderes corporativos e institucionais – médicos, hospitais, indústria farmacêutica, indústria de equipamentos, etc – mas não é o mais seguro para os pacientes que atravessam o desafio do parto e do nascimento.

Alguns dirão que esta situação ocorre pela liberdade de escolha das mulheres, e qualquer cerceamento desta seria um retrocesso. Sempre foi minha visão de que é necessário respeitar aquilo decidido pelos sujeitos, mesmo quando sabemos que se tratam de escolhas ruins. Todavia, numa sociedade de controle massivo pela propaganda, esta escolha das mulheres não pode ser julgada como “livre e consciente”; elas sofrem um bombardeio brutal e cotidiano dos meios de comunicação, os quais moldam seu pensar e constroem seus valores. Portanto, a escolha pela alienação no parto não é livre; é fruto de uma construção social que criminaliza a vivência fisiológica e protagonista do nascimento.

Cabe à sociedade, e em especial às mulheres, a mudança desse cenário. “O parto humano será o que fizermos dele” e, portanto, é nossa responsabilidade construirmos alternativas ao modelo tecnocrático do nascimento. Ele não surgirá por decreto ou por dádiva, mas pelo debate, pela escuta do contraditório, pela elaboração de propostas e acima de tudo por meio da luta incessante por sua implementação.

E que assim seja…

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Macartismo obstétrico

Estamos diante de um dilema crucial para o futuro da assistência ao parto neste país. A sinalização recente aponta para a criminalização do parto normal e a percepção da humanização do nascimento como uma “ideologia exótica”, o que se configura um desastre não apenas para os profissionais que procuram respeitar os direitos reprodutivos e sexuais de suas pacientes, mas também uma tragédia para as próprias mulheres, impedidas definitivamente de exercer o protagonismo sobre seus corpos. O objetivo inconfesso por trás das perseguições aos profissionais do parto humanizado é impedir que as mulheres tenham voz e que possam tomar decisões sobre seus partos; a forma de levar essa ideia adiante é penalizar – até encarcerar – os profissionais do parto que aceitam respeitar os desejos e escolhas de suas clientes.

O resultado imediato será um incremento das cesarianas, que já ultrapassaram 60% do total de nascimentos no Brasil, pois os médicos sempre se protegem usando como escudo a ideologia hegemônica. A longo prazo veremos a absoluta artificialização do nascimento, que transformará as mulheres em “contêineres fetais“, alienadas em definitivo de qualquer decisão sobre seus filhos e como eles chegam ao mundo. Percebam que nenhum médico é processado por (ab)usar de cesarianas, inobstante os resultados – até mesmo desfechos fatais; a tecnologia, mesmo quando sem indicação e sem qualquer justificativa, os protege. Nesse contexto de “macartismo obstétrico”, a paciência, o respeito aos tempos e às subjetividades e a vinculação com as evidências científicas são defeitos, não virtudes. Agir conforme as determinações da OMS e mesmo do Ministério da Saúde do Brasil não é algo a ser elogiado; é uma atitude que coloca médicos em risco.

Para evitar perder sua profissão, ser processado, perder seu patrimônio e até ser preso, o profissional deverá ser incoercível e violento e deverá agir com a mão pesada, sem levar em conta qualquer questão subjetiva. Deverá objetualizar ao extremo suas pacientes, enxergá-la como uma ameaça, e se esconder atrás de práticas ultrapassadas, violentas e perigosas, mas que garantem a satisfação das corporações e das instituições que lucram com a alienação das mulheres e o controle absoluto sobre seus corpos. A lógica é a mesma da polícia: quem reclamar da violência aplicada contra o cidadão é “a favor de bandidos”; quem questionar a violência obstétrica e os abusos das cesarianas está “contra a tecnologia” e estimulando mortes evitáveis. Por trás desses discurso, a “carta-branca” para que médicos e policiais atuem da forma que mais lhes beneficia; a moeda circulante é o medo.

Não se trata apenas de restaurar a justiça, de analisar os fatos, de aceitar os limites da medicina, mas também de compreender que esta injustiça contra os médicos e parteiras que abraçam as propostas da humanização levará a um aumento considerável da morbidade e mortalidade maternas, além de consequências terríveis para os bebês nascidos sob o controle da tecnocracia sem limites. O ataque ao parto normal cobrará um preço alto em vidas humanas.

Este debate não se encerra no julgamento dos profissionais, na sua prisão ou liberdade e na justiça que se fará. O resultado da reação aos avanços da humanização apontará para onde desejamos que se situe o futuro da assistência ao parto. Se apostamos na alienação das mulheres e a penalização da medicina baseada em evidências, o resultado será o pior possível. Julgar médicos que defendem o parto normal e as escolhas informadas de seus pacientes como criminosos que agem dolosamente é uma aberração jurídica inédita, cujas consequências serão sentidas por toda a sociedade.

A escolha precisa ser feita. Que parto desejamos para nossos netos?

Crucial choice

We are facing a crucial dilemma for the future of childbirth care in this country. Recent signs point to the criminalization of natural childbirth and the perception of humanization of childbirth as an “exotic ideology”, and that is a disaster not only for professionals who seek to respect the reproductive and sexual rights of their patients, but also a tragedy for women themselves, who are permanently prevented from exercising agency over their bodies. The unspoken objective behind the persecution of natural childbirth professionals is to prevent women from having a voice and from being able to make decisions about their births; the way to carry this idea forward is to penalize – even imprison – birth professionals who agree to respect their clients’ wishes and choices.

The immediate result will be an increase in Cesarean rates, which have already exceeded 60% of all births in Brazil, as doctors always protect themselves by using hegemonic ideology as a shield. In the long term, we will see the absolute artificialization of birth, which will transform women into “fetal containers”, permanently alienated from any decision about their children and how they come into the world. Note that no doctor is prosecuted for (ab)using c-sections, regardless of the results – even fatal outcomes; technology, even when not indicated and without any justification, protects them. In this context of “obstetric McCarthyism”, patience, respect for time and subjectivity and connection with scientific evidence are defects, not virtues. Acting in accordance with the determinations of the WHO and even the Brazilian Ministry of Health is not something to be praised; it is an attitude that puts doctors at risk.

To avoid losing their profession, being sued, losing their assets and even being arrested, professionals must be uncontrollable and violent and must act with a heavy hand, without taking into account any subjective issues. They must objectify their patients to the extreme, seeing them as a threat, and hide behind outdated, violent and dangerous practices, but which guarantee the satisfaction of corporations and institutions that profit from the alienation of women and absolute control over their bodies. The logic is the same as that of the police: anyone who complains about violence against citizens is “in favor of criminals”; anyone who questions obstetric violence and the abuse of cesarean sections is “against technology” and encouraging preventable deaths. Behind this discourse is the “carte blanche” for doctors and police officers to act in the way that best benefits them; the official language in childbirth is fear.

It is not just about restoring justice, analyzing the facts, and accepting the limits of medicine, but also about understanding that this injustice against doctors and midwives who embrace the proposals of humanization will lead to a considerable increase in maternal morbidity and mortality, as well as terrible consequences for babies born under the control of an unlimited technocracy. The attack on natural childbirth will exact a high price in human lives.

This debate does not end with the trial of professionals, their imprisonment or release, and the justice that will be served. The outcome of the reaction to advances in humanization will indicate where we want the future of childbirth care to be. If we bet on the alienation of women and the penalization of evidence-based medicine, the result will be the worst possible. Judging doctors who defend natural childbirth and the informed choices of their patients as criminals who act intentionally is an unprecedented legal aberration, the consequences of which will be felt by the entire society.

The choice needs to be made. What kind of childbirth do we want for our grandchildren?

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Consensos

“Todos na sala discordaram dele, e mesmo assim ele se negou a reconhecer que estava errado. Fez isso porque escolheu se manter ignorante”.

Vamos ponderar que, dizer que alguém está errado apenas porque 4 ou 5 pessoas (ou mesmo 500) afirmaram o contrário e refutaram as provas apresentadas, não é um bom argumento. Não se pode aceitar que a verdade seja decidida por votação. “A Terra é plana ou esférica? Não sei, vamos votar?” ou então “Existe (ou não) aquecimento antropogênico porque a maioria dos cientistas concorda”. Isso, para a ciência séria, tem pouco valor. Quando Copérnico anunciou sua teoria sobre o heliocentrismo, muito mais do que 5 ou 6 de seus pares afirmaram que ele estava errado. Com Galileu ocorreu o mesmo, e por isso mesmo foi até julgado e condenado. Copérnico e Galileu seriam, para suas épocas, “negacionistas do geocentrismo”?

Não apenas eles, este é um mal que acomete a quase todos os gênios da humanidade: o isolamento e a incompreensão. Poderia citar milhares de outros exemplos de pensadores como Freud, Espinoza, Nietzsche, Marx, entre tantos que sofreram rechaço por parte da imensa maioria de seus colegas em seu tempo, mas que apesar da solidão produzida por suas ideias, carregavam a verdade em suas ideias. Isso prova a todos nós o quanto a verdade não é democrática; em verdade é poderíamos dizer que ela é “aristocrática” e “meritocrática”. Nietzsche, inclusive, afirmava que o verdadeiro gênio só teria sua obra reconhecida um século após a sua morte. Em vida, seria fatalmente maltratado, desprezado e incompreendido. Ele foi a prova de suas próprias ideias.

Certa vez Albert Einstein recebeu um manifesto assinado por inúmeros cientistas reunidos em um congresso, o qual, de maneira enfática, refutava uma de suas teses. Quando viu o número de assinaturas, ele comentou: “Meu Deus, mas para que tantos? Bastaria apenas um, munido de bons argumentos”. Ou seja: o número de pessoas que discorda de você é irrelevante; os argumentos que ela traz ao debate é que são os elementos essenciais.

Além disso, as pessoas não “escolhem se manter ignorantes”; elas apenas não conseguem enxergar o mundo por uma perspectiva diversa daquela que lhes oferece uma explicação segura e confortável do mundo. O medo delas é trocar aquilo que lhes garante uma compreensão mais coerente do universo e que lhes oferece mais segurança (que pode ser qualquer coisa, como a crença em Deus ou a descrença num princípio criador), por um salto no escuro, que lhes deixa com o medo e as incertezas de um novo paradigma.

Não tenha medo de carregar uma verdade solitariamente, mesmo quando muitos a contestam. Esteja sempre aberto a mudar sua posição e transformar o modo como enxerga o mundo, mas não se deixe atemorizar pelas falsas unanimidades. A verdade não é amiga da popularidade; muitas verdades que hoje nos abrem portas para o conhecimento foram, no seu tempo de despertar, tratadas como anátemas perigosos ou tolices inaceitáveis. 
 

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Batom

A esquerda, embriagada pelas ações ilusoriamente favoráveis à democracia por parte do STF, agora aplaude quando seus ministros aplicam uma pena violenta e draconiana a uma mulher que escreveu “perdeu mané” em um monumento em Brasília. Ao fazer isso, exaltam um dos pilares da ideologia da extrema direita: o punitivismo, que sustenta a jurisdição americana e sua defesa da pena capital, e até mesmo os seus ídolos mais recentes, como Nayib Bukele. Com isso, aumentam exponencialmente a população carcerária, usando como substrato ideológico uma perspectiva moral, sem levar em consideração os fatores que que estão na gênese da criminalidade: a sociedade de classes e o capitalismo concentrador de renda.

A única ação desta bolsonarista foi o batom na estátua. Ninguém pode ser condenado por organizar um acampamento, escrever suas ideias no Facebook ou querer o fim de um governo. Quem pode fazer a conexão entre um batom na estatua e a derrubada de um governo? Não existe justificativa jurídica para essa sentença absurda. Olhem os autos!!! Na sentença não se lê nada sobre acampamentos ou suas ideias. Ela foi mesmo condenada pelo “crime hediondo” de passar batom numa estátua. Essa sentença é criminosa e a esquerda cirandeira, que hoje bate palma para os golpistas do STF, em breve vai lamentar. Haverá choro e ranger de dentes.

Que isso tenha sido escrito pelo Zeca Dirceu, cujo pai foi condenado (e posteriormente perdoado) pelo mesmo STF lacaio dos interesses imperialistas – usando para isso a famosa frase “não tenho provas, mas a jurisprudência internacional me permite” – é absolutamente surreal. Esse tipo de apoio a uma instituição burguesa venal, que foi responsável pelo golpe em Dilma e pela prisão ilegal de Lula é inaceitável.

Pior, colocar na prisão uma mãe cujo único crime factual foi riscar de batom uma estátua (o resto não passa de conjecturas), recebe o apoio da esquerda, que será a próxima vítima do poder absoluto da suprema corte. Enquanto essa esquerda identitária não entender que o bolsonarismo é apenas a ponta incomoda e boquirrota do poder burguês continuaremos a apostar nesse punitivismo cafona e cruel.

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Bolhas

É muito fácil (e até rápido) para um indivíduo com fragilidade emocional tornar-se vítima do seu próprio fanatismo. Dentro da bolha paranoica que criam para si, tudo faz sentido, tudo se encaixa em seu modelo pré-estabelecido. Para estes, existem os “maus e os bons”, e os malévolos são sempre os outros, jamais aqueles que circulam dentro de suas trincheiras; para estes, até as ações mais cruéis – como um genocídio – têm explicações e justificativas. Criam um mundo baseado na hierarquia moral, em fatores intrínsecos da alma humana, e oferecem pouco valor ao mundo real, as lutas cotidianas, as diferenças de oportunidade e os condicionantes sociais. Tal perspectiva acaba produzindo sujeitos apartados da realidade dos fatos, onde a marcha do mundo não ocorre por forças econômicas, geopolíticas ou pela busca de recursos, mas por questões anímicas como a bondade e a fraternidade ou seu contraponto, a maldade e o egoísmo – ou, como dizem, a “falta de Deus”. Por isso a união tão forte dessa direita com as religiões.

Neste processo, o uso da linguagem é por demais essencial para a condução das narrativas. O objetivo não é a demonstração racional da diferença entre modelos econômicos e de governança, mas tratar aqueles que enxergam o mundo de forma diferente como degenerados. Por isso os palestinos são “terroristas”, enquanto a morte de 20 mil crianças que se escondem nas tendas em Gaza não transforma os israelenses em monstros. Por isso a ideia disseminada de que Israel se “defende” quando a realidade joga em nossas faces que são os palestinos os que procuram desesperadamente se proteger de uma ocupação violenta, humilhante e assassina. É desta maneira que a imprensa chama os israelenses nas mãos do Hamas de “reféns”, mas não trata assim os quase 10 mil palestinos feitos reféns nas masmorras imundas de Israel, onde se praticam todas as violações dos direitos humanos imagináveis, que deixariam corados até mesmo os ideólogos nazi e os seguidores de Adolf.

Para sujeitos que defendem o indefensável – como afirmar a culpa dos palestinos pela morte de suas próprias crianças – nenhum argumento racional jamais será suficiente. Dentro de seu sistema de crenças, qualquer apelo à racionalidade é visto como ataque à sua visão de mundo. Portanto, oferecer fatos a quem está envolto em sentimentos e emoções pode soar como uma heresia, um absurdo, um crime hediondo. Com fascistas, portanto, a conversa precisa ser diferente.

Spoiler: não é com amor.

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Pampa’s League

A ideia dos clubes uruguaios Peñarol e Nacional jogarem o campeonato gaúcho não me parece a mais justa. Imagine o que aconteceria com o campeonato uruguaio sem estes dois gigantes. A minha proposta é muito mais radical e eu a apresentei há mais de 20 anos. Seria algo como Pampa’s League (nome foi ideia do Oscar Krost) que incluiria clubes do Uruguai e do Rio Grande do Sul em um grande campeonato do cone sul, que seriam vistos futebolisticamente como pertencentes a um único Estado (algo que produz arrepios na nuca dos separatistas).

Enquanto ocorre a disputa, os campeonatos uruguaio (apertura) e gaúcho da série especial continuariam ocorrendo sem os clubes da Pampa’s League. Estes clubes restantes disputariam, em seus respectivos campeonatos locais, 2 vagas de cada país no campeonato do próximo ano, em modelo ascenso e descenso. Poderia ser um campeonato de 12 clubes, 6 de cada país. Haveria assim uma Copa Uruguai-RS, que teria como participantes 4 campeões mundiais, e ao todo seriam 13 Copas Libertadores ganhas pelos clubes disputantes. Nenhum campeonato regional teria essa imensidão de clubes com conquistas internacionais.

O campeonato gaúcho seria mais disputado e equilibrado, com vencedores do interior que teriam a oportunidade de jogar um campeonato bi-nacional no ano seguinte. Não tenho dúvida que seria bom para os clubes uruguaios e ótimo para os times gaúchos.

Que acham?

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Cadáver insepulto

Apesar da evidência dos massacres de Israel, que se mantém mesmo com a condenação do mundo inteiro, ainda subsistem comentários de puro lixo sionista nas redes sociais, cheios de fanatismo supremacista. Comumente, ignoram a própria história colonial de Israel, um país criado pelo roubo das terras palestinas, pelo terrorismo infame do Irgun e do Haganá, pelos massacres, pela morte de crianças, pelas prisões infectas, as torturas e o colonialismo mais vil e abjeto. Tais palavras ficarão para sempre no ambiente das redes sociais como um testemunho de covardia e desrespeito com as vidas de mais de 50 mil mortos, causados diretamente pelo colonialismo assassino e racista de Israel. É uma profunda vergonha ver essa imundície escrita em português.

Perceba como os comentários fascistas usam das mesmas palavras mágicas de sempre: chamam os inimigos de “terroristas” para assim classificar os combatentes que lutam pela libertação da Palestina. Tratam os israelenses capturados como “reféns”, mas os palestinos torturados como prisioneiros. Defendem que a potência invasora tem o “direito de se defender”, mas negam o mesmo direito aos milhões de palestinos esmagados pela opressão e pelo apartheid sionista. Desta forma, procuram desviar do nosso olhar a colonização, as mortes de crianças, o genocídio planejado e a limpeza étnica incessante, para justificá-los mediante uma cruzada moral, que tenta eliminar os terroristas, o “mal”, os deteriorados e “fanáticos do islã”.

Nesta ofensiva sionista só uma coisa é indecente e depravada: a ocupação racista por Israel que se expressa por apartheid, mortes, prisões arbitrárias, abuso de crianças, crimes sexuais, torturas de todo tipo, maus tratos e genocídio. Israel representa o imperialismo mais decadente e abjeto, a perversão e o abuso; a falta de lei e a negação da civilização. Israel é a selva, o câncer do mundo, e o planeta tem o direito de se defender dessa aberração. Como todo representante de um Império decadente, a queda de Israel será pelo terror, que nada mais é que o desespero pelo fim de um ciclo de opressão.

Os textos de apoio a Israel usam a retórica padronizada dos sionistas, que invertem as responsabilidades e apontam dedos acusatórios às próprias vítimas. Por isso, a culpa dos massacres é dos palestinos, que são “oprimidos pelo Hamas”, e que deveriam ter aceitado a vida miserável oferecida pelos sionistas sem jamais reclamar. Esta narrativa começou com um monstro chamado Golda Meir, a grande patronesse do Apartheid sionista que, do alto de sua bestialidade, falou para Anwar Sadat, presidente do Egito: “Jamais os perdoaremos por obrigarem nossos filhos a matarem os seus”. Nada poderia ser mais monstruoso, obsceno, perverso e degenerado.

Entretanto, a bravura e a resiliência do povo palestino servem como um exemplo para todo o planeta. O sionismo demonstra de forma inconteste os sinais de sua decrepitude. É um cadáver racista e fétido, que apenas aguarda o momento para ser descartado. Somente quando Israel cair o mundo poderá respirar em paz.

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Arquivado em Causa Operária, Palestina